quarta-feira, 5 de junho de 2024

Por que plano de cessar-fogo em Gaza se transformou em jogo mortal de sobrevivência

Para os líderes do Hamas e de Israel, acabar com a guerra em Gaza tornou-se um jogo mortal de sobrevivência.

Os termos em que a guerra finalmente terminará poderão determinar em grande parte o seu futuro político e o seu controle do poder. E para o líder do Hamas, Yahya Sinwar, até mesmo a sua sobrevivência física.

É em parte por isso que as negociações anteriores falharam. É também por isso que a questão de como acabar permanentemente com os combates foi adiada para as últimas fases do plano delineado pelo presidente dos EUA, Joe Biden, na sexta-feira (31/5).

Essa transição entre as negociações sobre um acordo limitado de reféns por prisioneiros para as discussões sobre um cessar-fogo permanente seria, reconheceu Biden, “difícil”.

Mas é também aí que o sucesso ou o fracasso deste último acordo provavelmente dependerá.

O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, tem fortes razões internas para querer levar este acordo com um passo de cada vez.

A primeira fase, conforme delineada por Biden, prevê a libertação de dezenas de reféns, vivos e mortos. Isso seria amplamente bem-vindo em um país onde o fracasso em libertar todos os detidos pelo Hamas é, para muitos, uma mancha moral flagrante na sua gestão da guerra.

Mas é pouco provável que o Hamas entregue os seus reféns mais sensíveis politicamente – mulheres, feridos, idosos – sem algum tipo de garantia de que Israel não reiniciará a guerra quando eles voltarem para casa.

Vazamentos, citados pela mídia israelense na manhã de segunda-feira (3/6), sugeriram que Benjamin Netanyahu teria dito a colegas parlamentares que Israel seria capaz de manter suas opções em aberto.

Essa opção, de retomar os combates – até que o Hamas seja “eliminado” – é, alguns acreditam, o mínimo que os parceiros de coligação de extrema-direita de Netanyahu irão exigir.

Sem o seu apoio, ele enfrenta a perspectiva de eleições antecipadas e a possível continuação de um julgamento por corrupção.

Netanyahu precisa manter abertas as suas opções a longo prazo, para ter uma hipótese de ganhar o seu apoio para qualquer acordo inicial de reféns. Os líderes do Hamas, por outro lado, irão provavelmente querer garantias de cessar-fogo permanentes desde o início.

Acordos anteriores desabaram neste abismo. A superação agora dependerá de quanta margem de manobra Netanyahu terá com os seus aliados governamentais de extrema-direita para encontrar alternativas à “eliminação” do Hamas – e até que ponto os líderes do Hamas estão preparados para considerá-las.

Netanyahu falou no fim de semana sobre a destruição das “capacidades militares e de governo” do Hamas e sobre a garantia de que o grupo não represente mais uma ameaça para Israel.

Poucos contestam que o Hamas sofreu grandes perdas na sua infraestrutura militar – e até, dizem alguns, no seu apoio público em Gaza e no seu controle das ruas.

Mas não há sinais de que Israel tenha matado ou capturado os seus principais líderes, Yahya Sinwar e Mohammed Deif. E deixá-los livres em Gaza para celebrar a retirada das forças israelitas significaria um desastre político para o primeiro-ministro israelita.

Na segunda-feira, o Departamento de Estado americano disse que os EUA não receberam uma resposta do Hamas sobre o acordo proposto.

Um porta-voz disse que, embora as capacidades do Hamas tenham "degradado constantemente" nos últimos meses, o grupo continuava a ser uma ameaça e os EUA não acreditavam na sua eliminação completa por vias militares.

Separadamente, o porta-voz militar, contra-almirante Daniel Hagari, disse que os militares israelenses seriam capazes de garantir a segurança de Israel no caso de qualquer trégua e acordo de reféns realizado pelo governo.

No entanto, Yanir Cozin, correspondente diplomático da estação de rádio militar de Israel, GLZ, acredita que Netanyahu não acabará com a guerra até que possa defini-la como um sucesso.

“Um acordo que libere o Hamas é um grande fracasso”, disse ele. “Oito meses depois, sem termos alcançado nenhum dos objetivos da guerra – acabar com o Hamas, trazer de volta todos os reféns ou proteger as fronteiras – ele [Netanyahu] não quer acabar com a guerra. Mas ele também entende que não pode esperar até as próximas eleições israelenses em 2026.”

“Se ele puder dizer: ‘Exilamos Yahya Sinwar e Mohammed Deif, eles não vivem em Gaza’ – e se as pessoas que vivem perto de Gaza e da fronteira norte puderem regressar – penso que isso poderá fazer com que ele mantenha seu governo unido. Mas são muitos ‘se’.”

É muito pouco provável que o Hamas concorde com o exílio ou a rendição das suas principais figuras. Mas estão surgindo divisões claras entre os líderes do Hamas dentro e fora de Gaza.

O ex-primeiro-ministro israelense Ehud Barak, que também atuou como ministro da Defesa, disse à rádio israelense na segunda-feira (3/6) que o presidente Biden anunciou o acordo “depois de ver que Netanyahu só avança quando tem certeza de que Sinwar recua”.

“Como você acha que Sinwar reagirá quando ele tende a concordar e então lhe dizem: 'mas seja rápido, porque ainda temos que matá-lo depois que você devolver todos os reféns”, disse ele.

Entretanto, dezenas de milhares de israelitas deslocados após os ataques do Hamas em 7 de outubro estão atentos ao próximo movimento do seu primeiro-ministro.

Entre eles está Yarin Sultan, uma mulher de 31 anos, mãe de três filhos, que fugiu da sua casa em Sderot, na fronteira de Gaza, na manhã seguinte aos ataques do Hamas. Ela diz que não irá para casa até que Yahya Sinwar e Mohammed Deif não estejam mais livres.

“Este cessar-fogo vai nos matar”, disse ela à BBC. “Vamos libertar os reféns, mas daqui a alguns anos vocês serão os próximos reféns, serão as próximas pessoas a serem assassinadas, as próximas mulheres a serem violadas – tudo isto vai acontecer novamente.”

¨      Israel lançou 70 mil toneladas de bomba em Gaza, superando marca da 2ª Guerra Mundial, diz relatório

Desde de outubro do ano passado, o número de bombas enviadas à Faixa de Gaza por Tel Aviv ultrapassou as bombas lançadas em Dresden, Hamburgo e Londres durante a Segunda Guerra Mundial, apontou o relatório do Monitor Euro-Mediterrânico de Direitos Humanos.

A organização, com sede em Genebra, estimou o número de toneladas de bombas israelenses lançadas sobre o enclave palestino ao cobrir o período entre 7 de outubro e 24 de abril.

"Estima-se que Israel tenha lançado mais de 70 mil toneladas de explosivos na Faixa de Gaza, além de suas operações de demolição, resultando na destruição de todos os edifícios a uma distância de até um quilômetro no leste e no norte da Faixa, a fim de criar uma chamada zona-tampão", de acordo com a organização de monitorização dos direitos humanos, citada pela agência Anadolu.

Os alemães bombardearam Londres, lançando cerca de 18.300 toneladas de bombas entre 1940 e 1941, segundo várias estimativas. Os aliados lançaram 8.500 toneladas de bombas sobre Hamburgo no verão de 1943, disse Hendrik Althoff, pesquisador do Departamento de História da Universidade de Hamburgo.

Os aliados também utilizaram 3.900 toneladas de bombas em Dresden em fevereiro de 1945, segundo registros históricos. No total, são cerca de 30.700 bombas, 39.300 a menos do que as lançadas em Gaza.

Desde então, mais de 36.500 palestinos foram mortos em Gaza, a maioria mulheres e crianças, e quase 83 mil ficaram feridas, segundo as autoridades de saúde locais. Do lado israelense, foram 1.200 mortas e 253 sequestradas.

Quase oito meses após o início da guerra entre Israel e Hamas, vastas áreas do enclave estavam em ruínas no meio de um bloqueio paralisante de alimentos, água potável e medicamentos.

¨      Novas falas do Irã sobre armas nucleares são 'explosivas' ante caldeirão no Oriente Médio, diz mídia

Declarações recentes de atuais e antigos responsáveis ​​iranianos de que a sua doutrina nuclear oficial que proíbe o desenvolvimento de uma bomba poderia ser revista estão em foco na reunião da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) esta semana em Viena, escreve a Bloomberg.

Qualquer decisão de retirada do acordo internacional relativo às capacidades nucleares do Irã e de construção de uma arma poderia desencadear uma corrida armamentista regional e aumentar dramaticamente as tensões entre a república islâmica e o Ocidente, relata a mídia.

"Muitos países disseram que se o Irã obtiver armas nucleares, farão o mesmo. Adicionar armas nucleares ao caldeirão do Oriente Médio é uma péssima ideia", disse Rafael Grossi, diretor-geral da AIEA, citado pela agência.

No mês passado, um importante legislador e um antigo chanceler do Irã afirmaram à imprensa estatal que o país poderia mudar a sua posição em relação às armas nucleares se Israel atacasse a sua infraestrutura nuclear.

Os comentários foram feitos depois de Teerã e Tel Aviv quase terem entrado em guerra em abril.

Diplomatas estão ponderando se devem aprovar uma resolução de censura condenando o Irã pelas declarações e por supostamente bloquear uma investigação da AIEA sobre partículas de urânio detectadas em um local não declarado, mas Grossi ainda acredita que o diálogo seja possível.

"Falei com o ministro das Relações Exteriores em exercício há alguns dias e não tenho dúvidas de que o Irã continuará trabalhando com a AIEA", disse Grossi, referindo-se a uma conversa em 31 de maio com Ali Bagheri Kani, nomeado para liderar o Ministério das Relações Exteriores iraniano até que um novo governo seja formado.

Os Estados Unidos deram um ultimato à república islâmica na última reunião da AIEA: "Coopere ou enfrentará censura", o que poderia levar a um encaminhamento para o Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU). No entanto, foram os próprios EUA que se retiraram do acordo do Plano de Ação Conjunto Global (JCPOA, na sigla em inglês), em 2018.

O acordo garantia que o programa nuclear do Irã seria exclusivamente pacífico e estabelecia o calendário e as disposições para o cancelamento das sanções norte-americanas e europeias relacionadas ao país do Oriente Médio.

 

Fonte: BBC News Mundo/Sputnik Brasil

 

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