Nina
Lemos: Defensores do PL do aborto não se importam com crianças
Se apoiadores
da "PL do estupro" realmente quisessem ajudar, ao invés de punir
meninas vítimas de violência, estariam pensando em aprovar mais dinheiro para a
construção de creches em projetos de apoio a mães solo.
"Toda
a estrutura da família foi destruída". Essa frase foi exibida no domingo
no Fantástico e foi dita por um familiar de uma menina de 14 anos que ficou
famosa em 2020 pelos piores motivos. A garota, moradora do Espírito Santo,
tinha dez anos quando foi estuprada por um tio, engravidou e virou um símbolo
da violência com qual os "defensores da vida" (com muitas aspas
mesmo) tratam as crianças vítimas de estupro no Brasil.
Em
2020, ao descobrir que a criança estava grávida, sua família entrou na Justiça
pedindo que ela tivesse direito a um aborto legal – o que é previsto pela lei
brasileira. Eles conseguiram, mas o procedimento foi feito em meio a
manifestantes berrando na entrada do hospital, fanáticos tentando impedir que
ela fizesse o que queria, ampla cobertura da mídia, ameaças e assédio
psicológico. Ou seja, o que já era uma tragédia, piorou (e muito) com a ajuda
da extrema direita e dos ativistas radicais contra o aborto.
Essa
turma, que aumentou o trauma de uma criança e de uma família submetida a uma
das piores coisas que podemos imaginar, é a mesma que está, hoje, defendendo a
PL 1.904, chamada muito justamente de "PL do Estupro".
O
absurdo do projeto de lei, que provoca indignação Brasil afora (e também
repercussão no exterior), equipara a interrupção da gestação após 22 semanas ao
homicídio, aumentando de dez para 20 anos a pena máxima para quem fizer o
procedimento. O mesmo vale para crianças e mulheres que foram estupradas – que
pela lei brasileira têm direito legal ao aborto.
O
projeto foi colocado na quarta-feira para votação com urgência pelo presidente
da Câmara, Arthur Lira, do PP.
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E as crianças?
O
autor do projeto é o "defensor da vida" (sic) Sóstenes Cavalcante, do
PL. E agora, eu pergunto: ele e seus aliados estão preocupados com a vida das
crianças? Não, certo?
Uma
prova disso é que, se o projeto for aprovado, meninas vítimas de estupro (como
a garota do Espírito Santo, que em geral, demoram mais tempo para descobrir ou
contar que estão grávidas por desconhecimento do próprio corpo e também por
vergonha da família) seriam obrigadas a levar a gravidez até o fim mesmo sem
condições físicas e/ou psicológicas para isso. Ou seja, essa turma diz
"lutar pela vida", mas não quer, de fato, proteger as crianças.
E
não é só quando tentam obrigar crianças a gerarem frutos de estupro que eles
provam que não ligam para elas. Se estivessem preocupados mesmo, ao invés de
punir meninas, eles estariam pensando, por exemplo, em aprovar mais dinheiro
para a construção de creches, em projetos para dar apoio a mães solo – afinal
mais da metade dos lares brasileiros são chefiados por mulheres.
Só
para citar alguns exemplos do "amor" dessa turma pelas crianças.
Durante a pandemia, o ex-presidente Jair Bolsonaro, do mesmo partido do
deputado autor da "PL do estupro" e da turma "pró-vida",
vetou o projeto que dava prioridade a mulheres chefes de família no recebimento
do auxílio emergencial. Essas mães estavam desesperadas para comprar, por
exemplo, comida para seus filhos. Ele também vetou um aumento da verba
destinada a merendas escolares. Ou seja, eles defendem o feto, querem impedir
mulheres e meninas de serem donas de seus corpos e puni-las, mas, se a mulher
mantiver a gravidez e tiver o filho, ela e o filho que se se virem.
Outro
motivo que nos leva a achar que realmente não é a preocupação com
"vida" que move o autor da PL e seus defensores são as implicações
políticas desse debate que toma conta do Brasil.
Segundo
analistas políticos, Arthur Lira teria colocado esse projeto para ser votado
com urgência por puro interesse político a quatro meses das eleições
municipais. Não pela primeira vez, os direitos das mulheres estariam sendo
usados como chantagem e moeda de troca pelos "donos do poder".
"Além da convicção retrógrada há nisso uma campanha política oportunista,
óbvio. A extrema direita, com apoio da direita, quer atrair Lula 3 para
batalhas de alto risco", escreveu o colunista da Folha de S. Paulo Vinicius
Torres Freire.
Acredito
ser difícil que essa atrocidade seja aprovada. Isso porque a maioria dos
brasileiros liga, sim, para crianças. Uma enquete online da Câmara dos
Deputados sobre a PL já tem mais de um milhão de votos e 88% dos participantes
afirmaram discordar totalmente do projeto. Mulheres (e também homens) tomam as
ruas de todo o país contra o projeto e representantes de diversos segmentos da
sociedade (independente de preferência partidária) se levantam contra o
retrocesso. Há, no momento, uma espécie de repulsa à barbárie que esse projeto
representa. Nem tudo está perdido.
• Oito vezes em que o aborto avançou e
retrocedeu no Brasil
No
Brasil, o aborto é autorizado por lei desde 1940 em casos de gravidez
decorrente de estupro e risco à vida da gestante, bastando para isso o
consentimento dela ou de seu responsável legal (Decreto-Lei nº 2.848, Art.
128).
Desde
2012, por entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), o aborto também é
permitido em casos de anencefalia do feto – um tipo de má-formação congênita
incompatível com a vida fora do útero e caracterizada pela ausência total ou
parcial do encéfalo.
Não
há prazo limite para a realização do aborto nessas três situações.
As
penas para gestantes que abortem fora dessas condições variam de um a três anos
de reclusão. No caso dos que participam do aborto, quem ajudar a gestante com o
consentimento dela está sujeito a pena de um a quatro anos de reclusão. As
penas são maiores em casos não consensuais ou que tenham como consequência
lesões graves ou a morte da gestante, podendo chegar a 20 anos.
Apesar
das três hipóteses legais de aborto, é comum que crianças e mulheres nessas
situações tenham o acesso ao procedimento dificultado.
Veja
abaixo momentos em que o aborto avançou ou retrocedeu no Brasil.
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2005: Proposta para descriminalizar aborto mobiliza conservadores
Em
2005, durante a primeira presidência de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o
governo criou uma comissão para elaborar uma proposta de revisão da lei que
pune o aborto. Após ficar quase 15 anos parado no Congresso, o PL 1135/1991,
que propunha a descriminalização da interrupção da gravidez até o terceiro mês
de gestação, quase foi a votação.
A
movimentação acabou contribuindo para a organização de setores conservadores
contrários ao aborto. Desde então, diversas propostas para restringir o aborto
legal ou bani-lo completamente tem tramitado na casa, sempre com o patrocínio
da bancada evangélica. O tema também é frequentemente evocado em época de
campanha eleitoral.
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2012: STF descriminaliza aborto de anencéfalos
Em
2012, o STF decidiu, por placar de oito votos contra dois, pela
descriminalização de abortos de fetos anencéfalos – considerados
"natimortos cerebrais" por definição do Conselho Federal de Medicina
(CFM) à época.
Até
então, mulheres nessa situação estavam sujeitas a ter que levar uma gestação
adiante contra sua vontade, mesmo sabendo que seus filhos, se viessem ao mundo,
só sobreviveriam por poucas horas ou minutos. Decisões individuais na Justiça
já autorizavam o procedimento desde 1989, mas em alguns casos a liminar só saía
depois que as mulheres já tinham dado à luz e os filhos já estavam mortos.
"Nós
consideramos que essa imposição de um prolongamento do sofrimento inútil dessa
mulher viola a dignidade da pessoa humana. Nós sustentamos que esse é um
momento de tragédia pessoal na vida da mulher. Algumas mulheres querem levar a
gestação a termo, outras não querem. Cada um tem o direito de se comportar de
acordo com seu sentimento e sua convicção. O Estado não tem o direito de tomar
essa decisão pela mulher", argumentou à época perante o STF o advogado e
professor de Direito Constitucional da Universidade Estadual do Rio de Janeiro
(UERJ) Luís Roberto Barroso, que em 2013 virou ministro da Corte.
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2012, 2022: Prazo para a interrupção da gravidez
Embora
não exista um prazo limite para a realização do aborto legal, uma norma técnica
do Ministério da Saúde publicada em 2012, durante o governo de Dilma Rousseff
(PT) recomendava "limitar o ingresso para atendimento ao aborto previsto
em lei com 20 semanas de idade gestacional" e orientava os profissionais
de saúde a recusarem atendimento após as 22 semanas.
Nesses
casos, segundo o documento, "a mulher deve ser informada da
impossibilidade de atender a solicitação do abortamento e aconselhada ao
acompanhamento pré-natal especializado, facilitando-se o acesso aos
procedimentos de adoção, se assim o desejar".
Em
2022, último ano do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), orientação
semelhante voltou a ser repetida em novo manual. O texto destacava que
"todo aborto é um crime, mas quando comprovadas as situações de excludente
de ilicitude após investigação policial, ele deixa de ser punido" –
requisito que não existe na lei. Também limitava o aborto até 21 semanas e 6
dias de gestação, sob o argumento da "viabilidade fetal", e
recomendando, depois disso, "a manutenção da gravidez com eventual doação
do bebê após o nascimento".
O
manual de 2022 chegou a ser retirado de circulação depois pelo governo Lula,
mas o Ministério da Saúde acabou voltando atrás após repercussão negativa entre
setores conservadores.
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2016: Primeira Turma do STF decide por descriminalização do aborto até a 12ª
semana
Em
novembro de 2016, a Primeira Turma do Supremo decidiu pela
inconstitucionalidade da criminalização do aborto até a 12ª semana. Foi a
primeira vez que a tese foi defendida na corte, mas o julgamento não teve
efeito vinculante – ou seja, valeu apenas para o caso específico julgado à
época.
Em
reação à decisão, deputados articularam uma proposta para incluir na
Constituição o conceito de proteção da vida "desde a concepção". Na
prática, a mudança inviabilizaria qualquer interrupção de gravidez, mesmo nos
casos hoje considerados legais.
A
proposta está parada na Câmara desde 2017, mas deputados têm agido
continuamente para tentar desenterrá-la.
Também
em 2016, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) estendeu a decisão do STF que
autorizava o aborto de fetos anencéfalos a outros casos de malformações
incompatáiveis com a vida.
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2020: Ministério da Saúde orienta médicos a acionar polícia em casos de estupro
Uma
portaria de 2020 do Ministério da Saúde, à epoca sob a administração
ultraconservadora do governo Jair Bolsonaro, passou a orientar médicos a informarem a polícia caso
atendam mulheres que buscam interromper a gestação decorrente de estupro.
Uma
primeira versão da portaria também obrigava os profissionais da saúde a
oferecer às mulheres vítimas de estupro exames de ultrassom para ver o feto ou
embrião antes de interrupção da gravidez, e exigia que fossem mantidas
possíveis evidências materiais do crime de estupro, como fragmentos do embrião
ou feto.
A
medida, que foi revogada logo nos primeiros dias do governo Lula, foi criticada
por especialistas por violar a previsão de sigilo em atendimentos de saúde e
aumentar as chances de a mulher recorrer ao aborto ilegal.
Técnicos
do governo Bolsonaro, porém, argumentaram em 2022 que a orientação aos
profissionais de saúde para que notificassem a polícia estava amparada por lei
de 2003 que instituiu essa obrigação nos casos "em que houver indícios ou
confirmação de violência contra a mulher".
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Setembro de 2023: Ministra Rosa Weber vota favorável em ação para
descriminalizar aborto até a 12ª semana
A
ministra Rosa Weber votou favorável à descriminalização do aborto até a 12ª
semana de gestação na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 442
(ADPF 442). A ação tramita no STF desde 2017, mas foi pautada no sistema
eletrônico da corte por Weber para que ela pudesse dar seu voto antes de se
aposentar do STF.
O
julgamento da ADPF 442, porém, foi migrado depois disso para o plenário físico,
e não tem data para acontecer.
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Abril de 2024: Norma do CFM dificulta aborto legal
Resolução
editada em abril pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) passou a proibir
médicos de realizarem a assistoliaa partir da 22ª semana de gestação. O
procedimento, recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) nesses casos,
evita que o feto seja retirado do útero com sinais vitais.
Com
isso, médicos que realizassem a assistolia nas hipóteses legais de aborto
ficariam sujeitos a punições administrativas e processos criminais.
A
resolução foi especialmente criticada porque é nos casos de estupros de
crianças e pré-adolescentes que a gravidez costuma ser detectada em um estágio
já mais avançado. Além disso, vítimas de estupro não raro enfrentam
constrangimentos e percalços ao tentarem interromper legalmente a gravidez.
Isso atrasa o processo e leva muitas a abortarem depois das 22 semanas.
A
norma do CFM foi suspensa liminarmente em maio por decisão do ministro
Alexandre de Moraes, do STF, e motivou a ADPF 989, que visa garantir o direito
ao aborto legal e seguro nos casos já previstos em lei.
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Junho de 2024: Deputados querem punir vítima de estupro com pena maior que a do
estuprador
Em
reação à decisão de Moraes e à ADPF 989, a bancada conservadora no Congresso
fez avançar um projeto de lei na Câmara que equipara a homicídio abortos
realizados após a 22ª semana de gestação, com pena de 6 a 20 anos de prisão –
mesmo em caso de estupro, feto anencéfalo ou risco à vida da gestante.
Se
aprovado, vítimas de estupro que abortarem depois desse período estarão
sujeitas a penas maiores que as de seus próprios estupradores (6 a 12 anos).
Especialistas
apontam que crianças vítimas de violência sexual seriam as mais afetadas pela
mudança na lei, já que, justamente por causa da pouca idade, é comum que a
gravidez só vá ser percebida num estágio avançado.
Batizado
por críticos de "PL do estupro", o projeto de lei é ainda um aceno do
presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), à base de deputados bolsonaristas
que o elegeu em 2023.
• PL antiaborto deve afetar meninas
vítimas de estupro
Deputados
federais estão em campanha para aprovar, sem debates ou consultas públicas, um
projeto de lei que equipara o aborto realizado após 22 semanas de gravidez ao
crime de homicídio, mesmo em caso de estupro. A proposta quer alterar o Código
Penal, que, desde 1940, não estabelece limite de tempo para realizar o
procedimento em casos de abuso sexual.
O
plenário da Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (12/06), em votação
relâmpago, o pedido de urgência para votar o projeto antiaborto. Ou seja, o
texto pode ser votado diretamente, sem ter que passar por comissões temáticas
da casa, onde poderiam ser feitas audiências e outros ritos para analisar e
debater a proposta.
A
proibição é uma demanda da bancada evangélica e veio em resposta à decisão do
ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), que suspendeu
todos os processos judiciais e procedimentos administrativos e disciplinares
derivados de resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM).
A
resolução do conselho também dificultou o acesso ao aborto em caso de estupro e
proibiu médicos de realizarem a assistolia. O procedimento, que consiste em
injetar medicações para interromper os batimentos cardíacos do feto, é
recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) nos casos de aborto legal
acima de 20 semanas de gestação, e evita que o feto seja retirado do útero com
sinais vitais.
Hoje,
o aborto é permitido pela lei em três casos no Brasil: gravidez decorrente de
estupro, risco à vida da mulher e anencefalia do feto. O serviço deve ser
oferecido gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Se
o projeto – endossado por 32 deputados – vingar, meninas e mulheres que fizerem
aborto após a 22ª semana de gestação estarão sujeitas a penas de até 20 anos de
reclusão. O profissional da saúde que realizar a assistolia também pode ser
condenado criminalmente.
A
pena para vítima de violência sexual que engravidou e decidiu abortar poder ser
maior inclusive do que a aplicada ao próprio estuprador. A pena para esses
crimes vai de 5 a 10 anos de reclusão, quando a vítima é adulta; de 8 a 12 anos
quando a vítima é menor de idade, de acordo com o Código Penal. No caso de
estupro de vulnerável, quando a vítima tem menos de 14 anos ou não tem
condições de reagir, a pena vai de 8 a 15 anos. E somente em casos em que o
crime é praticado contra vulnerável e resulta em lesão corporal grave, é que a
pena pode chegar a 20 anos – o tempo máximo de reclusão que a lei prevê para
quem praticar o aborto.
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"PL da gravidez infantil"
Segundo
a ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, o projeto em tramitação na Câmara vai
agravar os casos de gravidez de meninas até 14 anos e revitimiza vítimas de
estupro.
"Não
é por acaso que os movimentos feministas e de mulheres vêm intitulando o
Projeto de Lei 1.904/2024 de 'PL da Gravidez Infantil'", afirmou a
ministra, em nota, em referência à campanha de ativistas e famosas nas redes
sociais contra o projeto.
"Seja
por desinformação sobre direitos e como acessá-los, exigências desnecessárias,
como boletim de ocorrência ou autorização judicial; ou pela escassez de
serviços de referência e profissionais capacitados, o Brasil delega a
maternidade forçada a essas meninas vítimas de estupro, prejudicando não apenas
o futuro social e econômico delas, como também a saúde física e
psicológica", explica Gonçalves.
Meninas
vítimas de violência sexual enfrentam, além do trauma em si, uma série de
obstáculos para a realização do aborto. Os sinais da gravidez muitas vezes são
detectados mais tarde, por falta de conhecimento do próprio corpo e de apoio da
família. O acesso ao procedimento médico é uma saga à parte.
Apenas
3,48% dos municípios brasileiros têm serviço de aborto legal, explica Rebeca
Mendes, advogada do projeto Vivas, que auxilia mulheres e meninas a terem
acesso a serviços de aborto legal. "As poucas meninas que reafirmam que
querem acesso ao direito ao aborto legal têm que fazer essa peregrinação. E se
são meninas periféricas, pobres, que não têm condições financeiras para se
deslocar, às vezes nem dentro da própria cidade, elas não chegam [aos serviços
de atendimento] em tempo."
O
problema se agrava em casos em que o agressor é também o responsável legal pela
vítima. Isso faz com que os sinais da gravidez sejam identificados tardiamente
– o que costuma ser feito por profissionais presentes na rede de proteção da
criança, como a escola.
Apenas
três hospitais realizam a assistolia fetal no Brasil. Eles estão em Minas
Gerais, Bahia e Recife. Uma quarta unidade de saúde, o Hospital Vila Nova
Cachoeirinha, em São Paulo, encerrou o serviço em dezembro de 2023.
Mendes
aponta ainda que grande parte dos serviços não funciona, ou criam barreiras
burocráticas para o procedimento.
Como
aconteceu em Santa Catarina, em 2022, quando uma criança de 10 anos, vítima de
estupro, descobriu a gravidez apenas na 22ª semana de gestação. Inicialmente,
ela não conseguiu acesso ao aborto. A juíza que cuidou do caso enviou a criança
a um abrigo para impedir a mãe de "realizar qualquer procedimento para
causar a morte do bebê". A magistrada também pressionou a menina a dizer
que suportaria ficar mais tempo com o bebê.
• A cada dia, 38 meninas de até 14 anos
viram mães no Brasil
Segundo
dados do Ministério da Mulher, em média, 38 meninas de até 14 anos se tornam
mães a cada dia no Brasil, de acordo com dados do SUS. Em 2022, foram mais de
14 mil gravidezes entre meninas com idade entre 10 e 14 anos no país.
Em
2022, o Brasil registrou cerca de 75 mil casos de estupro – o maior da série
histórica, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Seis em cada
dez vítimas eram crianças de até 13 anos, 57% eram negras e 68% dos estupros
ocorreram na residência das vítimas.
"Ou
seja, as principais vítimas de estupro no Brasil são meninas de até 14 anos,
abusadas por seus familiares, como pais, avôs e tios. São essas meninas que
mais precisam do serviço do aborto legal, e as que menos têm acesso a esse
direito", afirma a ministra Cida Gonçalves.
O
ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, afirmou, em suas redes sociais,
que o projeto "é uma imoralidade, uma inversão dos valores civilizatórios
mais básicos. É difícil acreditar que sociedade brasileira, com os inúmeros
problemas que tem, está neste momento".
Fonte:
Deutsche Welle
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