quinta-feira, 20 de junho de 2024

Negócio da China: Brasil pode ganhar com a venda de parte da Avibras para o capital chinês?

Atravessando um momento de crise financeira, a Avibras pode vender parte de suas ações a uma empresa de capital estrangeiro. Após desistência de uma interessada australiana, informações de veículos brasileiros dão conta de que uma estatal chinesa pode vir a ser sócia da companhia brasileira.

Na última quinta-feira (13), durante um evento on-line em comemoração aos 25 anos do Ministério da Defesa, o ministro da pasta, José Mucio, anunciou a desistência da australiana DefendTex em adquirir parte da Avibras.

Ainda na mensagem, o ministro relatou o interesse de uma segunda empresa em comprar 49% da companhia brasileira. Mucio não deu mais detalhes, alegando que o candidato pediu sigilo. Entretanto, segundo informações da Folha de S.Paulo, trata-se da estatal chinesa Norinco, uma gigante da indústria bélica mundial.

Brasil ganha em aproximação com os chineses da indústria bélica?

Brasil e China já possuem programas de cooperação, como o caso do Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres. O eventual acordo com a estatal chinesa na aquisição de parte da Avibras poderia beneficiar a companhia brasileira na abertura de novos mercados, segundo José Augusto Zague, pesquisador do Grupo de Estudos de Defesa e Segurança Internacional (Gedes), da Universidade Estadual Paulista (Unesp).

Com mais de 60 anos de existência, a Avibras, responsável por projetar e desenvolver mísseis e foguetes, é considerada a maior empresa privada de sistemas de defesa do Brasil. Além da importância para a Defesa nacional — a Avibras é credenciada pelo Ministério da Defesa como Empresa Estratégica de Defesa (EED) —, ela concentra a maior parte dos seus clientes em forças armadas internacionais, como as de Iraque, Arábia Saudita, Catar, Angola, Líbia, Indonésia e Malásia.

Com a chegada da estatal chinesa, é possível considerar a abertura de "um mercado de exportação para os países que estão mais próximos à China ou ao Sul Global", considera o especialista.

A parceria pode representar, sobretudo para os chineses, a chance de ter "uma subsidiária no Brasil que seja complementar às outras áreas em que ela já atua no segmento de defesa", diz Zague. Nesse sentido, outro atrativo destacado pelo especialista seria o interesse no acervo técnico da indústria aeroespacial.

•           Acordo pode apresentar contrapontos?

Um dos problemas que a Avibras pode ter, caso a negociação se concretize, são as sanções por parte dos EUA. De acordo com Zague, tendo ou não o controle, ou seja, mesmo que a empresa chinesa não adquira a maior parte percentual da companhia, ainda assim vai ser alvo de sanções dos Estados Unidos.

Atualmente, o Astros — sistema de artilharia de foguetes e mísseis — depende de peças fornecidas por empresas norte-americanas. O acordo com os chineses representaria, então, um empecilho. Para reverter o possível cenário, empresas chinesas deveriam passar a fornecer "componentes equivalentes aos fornecidos pelos EUA", sugere o pesquisador.

A presença da estatal asiática minaria, segundo o especialista, negociações dos materiais desenvolvidos pela Avibras com países parceiros dos EUA e da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN).

Entretanto "o sistema Astros, que é o principal produto da Avibras, nunca foi vendido a esses países. Foi vendido a países do Oriente Médio lá nos anos 1980, à Indonésia mais recentemente, mas não aos países da OTAN, por exemplo", pondera Zague.

O especialista chama a atenção também para um eventual problema de adaptação: "Nas Forças Armadas brasileiras, há uma tendência à aquisição de material ocidental".

"Fazer uma mudança nesse modelo vai depender muito das Forças Armadas, e existe uma ligação muito estreita, especialmente de oficiais mais graduados das Forças Armadas, com os Estados Unidos", complementa.

Nesse sentido, é interessante observar, conforme o analista, a visita do general Tomás Paiva à China.

O comandante do Exército visita o país asiático no início de julho. Em entrevista ao Estado de S. Paulo, Paiva defendeu a ampliação de parcerias estratégicas com a China e outros países do BRICS, afirmou que Brasil e China têm cooperação e realizam intercâmbio de cursos para militares e elogiou o potencial de ciência e tecnologia chinês.

Paiva ressaltou ao jornal que a viagem está focada em ciência, tecnologia e capacidades militares. "Eles são avançados na parte de missilística, têm dois conceitos que são muito interessantes, que são muito modernos hoje, que são antiacesso e negação de área", disse o general durante a entrevista.

Avibras: por que não estatizar?

Elo fundamental da Base Industrial de Defesa (BID) brasileira, a Avibras elenca pedidos de estatização da empresa como forma de tentar mudar o atual momento da companhia.

A possibilidade, no entanto, é bastante remota, conforme analisa Zague. "Não vejo a possibilidade de o Estado ficar com o controle acionário da Avibras. Não é interessante para o Estado, neste momento, ter esse controle. Ainda que seja uma empresa estratégica, que interesse muito às Forças Armadas."

O Brasil atualmente conta com poucas empresas da base industrial de defesa, como a Indústria de Material Bélico do Brasil (Imbel).

Adquirir o controle da Avibras poderia inclusive acarretar um problema para o Estado, segundo o especialista.

"Há questões de dívidas e tudo mais que precisam ser assumidas. Penso que não é a melhor solução [estatizar a Avibras]. Não vejo isso no horizonte", finaliza Zague.

 

•           Embraer indica busca por parceira americana: 'Estamos sendo agressivos em diversas frentes nos EUA'

No segundo semestre de 2023, a Embraer deu início a um projeto estratégico nos Estados Unidos e ampliou o número de funcionários em seus segmentos de defesa e segurança.

A empresa quer entrar no mercado norte-americano com suas aeronaves de defesa, explorando novos produtos e até oportunidades de fusões e aquisições, segundo o CEO da Embraer, Bosco da Costa Júnior.

"Estamos sendo muito agressivos em diversas frentes dentro dos EUA", disse Costa Júnior segundo o jornal O Globo, acrescentando que a empresa está "tentando ser parceira do governo estadunidense".

Ainda de acordo com o executivo, a fabricante brasileira de aeronaves está "explorando novos produtos e a venda de dois portfólios de segurança de defesa".

Costa Júnior acrescentou que a empresa também quer apresentar o KC-390 para fuzileiros navais e Força Aérea dos Estados Unidos.

"Já temos uma linha de montagem final do Super Tucano [caça de defesa aérea] nos Estados Unidos, mas acreditamos que o KC-390 poderia desempenhar um papel importante no mercado dos EUA. Estamos lá tentando promover e apresentar o KC-390 para fuzileiros navais e Força Aérea dos Estados Unidos porque acreditamos que o modelo poderia agregar um valor adicional a essas entidades do governo", afirmou Costa Junior, citado pela Folha de S.Paulo.

No começo do ano, a empresa assinou um memorando de entendimento com a companhia indiana Mahindra para colaborar na encomendas da aeronave KC-390 para Força Aérea da Índia, conforme noticiado.

Na apresentação de resultados do primeiro trimestre deste ano, a companhia brasileira comemorou o voo inaugural do KC-390 pela Força Aérea húngara. Lá, a aeronave ainda tem de passar por uma campanha de testes antes de entrar em serviço, destaca a Folha.

O KC-390, avião de transporte militar mais moderno do mercado, pode transportar mais carga útil (26 toneladas) em comparação a outros aviões de transporte militar de médio porte, ao mesmo tempo que o modelo voa a 870 quilômetros por hora.

Até o momento, o KC-390 Millennium foi selecionado para Força Aérea de Brasil, Portugal, Hungria, Países Baixos, Áustria, República Tcheca e, mais recentemente, Coreia do Sul.

 

•           Fuzileiros navais: tropa de elite do Brasil será referência no uso de armas não letais

Considerada uma das mais respeitadas e reconhecidas tropas militares do Brasil, o Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha agora quer se tornar referência no uso das chamadas armas não letais. Isso após o início de um projeto inédito no país em parceria com uma das principais companhias do setor de Defesa brasileiro.

Do litoral às regiões ribeirinhas da Amazônia, do Pantanal à Caatinga, a presença em praticamente todo o território nacional de uma das principais tropas das Forças Armadas do Brasil, cuja origem está ligada a então Brigada Real da Marinha do Reino Unido de Portugal: o Corpo de Fuzileiros Navais (CFN). Com cerca de 18 mil militares, é a força da Marinha brasileira responsável por combates terrestres e especializada em guerra anfíbia (quando uma ação ofensiva sai do mar para incursão por terra em regiões hostis).

•           Quem são os fuzileiros navais?

Reconhecida pela Organização das Nações Unidas (ONU) no nível mais alto de classificação militar mundial para reação rápida de combate, o CFN inicia a preparação para se tornar referência no uso de armas não letais.

No início do mês, a Marinha do Brasil assinou um acordo com a empresa brasileira Condor Tecnologias Não Letais, referência para o setor em todo o Hemisfério Sul.

Comandante do Material de Fuzileiros Navais, o vice-almirante Rogério Lage disse à Sputnik Brasil que as tropas foram escolhidas para dar início ao projeto, que posteriormente poderá ser expandido para outras forças brasileiras, "pela capacidade que a instituição desenvolveu ao longo dos mais de 216 anos de existência e da experiência acumulada nos mais diversos empregos em situação real".

"Além disso, trata-se da única tropa das Forças Armadas brasileiras 100% profissional, ou seja, todos os seus integrantes foram aprovados em concurso público, passaram por rigoroso processo seletivo e são submetidos constantemente a diversos treinamentos e variadas simulações de combate", explica, ao acrescentar que o modelo é inspirado no Programa Conjunto de Emprego de Material Não Letal do Departamento de Defesa dos Estados Unidos (DoD, na sigla em inglês).

Conforme o vice-almirante, por meio da parceria com a empresa brasileira serão desenvolvidas novas tecnologias e uso das armas não letais nos mais "diferentes cenários de atuação". O protocolo foi negociado ao longo dos últimos meses e conta com três eixos principais: conhecimento, direcionamento futuro, além de preparo e emprego.

"Este Protocolo de Intenções é a semente para um programa conjunto das Forças Armadas sobre tecnologias não letais. Estamos entusiasmados com as perspectivas que esta colaboração oferece e ansiosos pelos avanços e pelas inovações que surgirão desta parceria", declarou durante a assinatura o diretor-executivo da Condor, Frederico Aguiar.

•           Quais os tipos de armas não letais?

Rogério Lage explica que as armas não letais permitem o uso proporcional da força, principalmente em situações com civis. "É um instrumento desenvolvido com a finalidade de provocar incômodo para interromper comportamento violento e cessar hostilidades. Nesse sentido, seu emprego possibilita a adoção de medidas eficazes contra elementos adversos, principalmente em operações de Garantia da Lei da Ordem (GLO) e operações de paz, reduzindo danos colaterais e estruturas importantes ou elementos que possam estar se opondo ao avanço da tropa do Corpo de Fuzileiros Navais", pontuou.

No ano passado, a CFN atuou de forma inédita em uma GLO, convocada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em novembro do ano passado para atuar junto aos portos e aeroportos de São Paulo e Rio de Janeiro, a fim de fazer frente ao aumento de crimes como tráfico de drogas e de armas nos terminais.

No início de maio, quando a operação foi renovada por mais 30 dias, a reportagem da Sputnik Brasil conversou com o capitão de mar e guerra (fuzileiro naval) Alex Ribeiro, comandante do 1º Batalhão de Infantaria de Fuzileiros Navais, responsável por gerir as operações no Porto de Itaguaí, na Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Somente em uma das ações foram apreendidos pelo menos 200 quilos de cocaína no casco de um cargueiro, que seguiria para a Alemanha.

"Como exemplo de emprego pode ser citada a atividade de controle de distúrbios, em que a tecnologia não letal é usada para dispersar ou controlar grandes grupos de pessoas sem causar danos permanentes", acrescentou o vice-almirante.

•           Quem são os fuzileiros navais?

Já o especialista em assuntos militares Pedro Paulo Rezende enfatizou à Sputnik Brasil que o investimento pela Marinha em tecnologia não letal no CFN também ocorre diante do tipo de função dessas tropas.

"Os fuzileiros navais são uma força de imposição de paz básica. Quer dizer, são os primeiros a desembarcarem caso haja conflito civil, e a ONU [Organização das Nações Unidas] entra no pacote. Em vez de chegar usando armas de fogo e outras munições, muitas vezes você tem que ter um tipo de equipamento que sirva para dispersar a multidão", destacou.

Rezende acrescenta ainda que tornar os fuzileiros referência no emprego dessas tecnologias militares é uma "maneira de o Brasil projetar sua força" internacionalmente. As tropas possuem a classificação 3 da ONU, a mais elevada, uma das poucas com essa posição disponíveis para atuação no mundo, já que as outras estão empregadas em conflitos ao redor do globo. "É um excelente caminho [usar os fuzileiros] para você iniciar o projeto [de desenvolvimento de tecnologia não letal]. Podem ser armas de choque, gases incapacitantes, mas que não são letais", diz.

O especialista ainda traz outro exemplo, desenvolvido pelo Ministério da Defesa brasileiro para uma operação no exterior. "Quando eu estava lá, desenvolvemos um sistema de arma não letal que era um aviso sonoro que atordoava quem tentasse invadir o navio da Marinha do Brasil. Isso foi utilizado no Líbano, era um sistema de ultrassom que causava náuseas para quem tentasse entrar sem autorização na fragata. É algo muito bom também para trabalhar contra piratas", finalizou.

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

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