Prefeito de Eldorado do Sul terraplanou
terreno em APA às margens do Rio Jacuí
A EVG Terraplanagem e
Transporte, empresa da família do prefeito de Eldorado do Sul (RS), Ernani
Gonçalves (PDT), realizou obra irregular de aterramento dentro de uma Área de
Proteção Ambiental (APA) na região metropolitana de Porto Alegre. O caso ocorreu
em 2013 na APA do Delta do Jacuí, entre o primeiro e o segundo mandatos de
Ernani como prefeito e gerou uma ação do Ministério Público do Rio Grande do
Sul (MPRS), que apontou danos ambientais resultantes do serviço.
O aterro “impede e
dificulta o desenvolvimento da vegetação naquela porção de Ilha das Flores,
assim como modifica o sistema hídrico da área e de seu entorno, rico em
banhados, em campos inundáveis, com impactos sobre a flora e a fauna da
região”, dizia o documento do MPRS, na época.
A área, uma faixa
urbanizada estreita na APA do Delta do Jacuí, fica entre os municípios de
Eldorado do Sul e Porto Alegre, uma das regiões mais atingidas pelas enchentes
que devastaram o estado nas últimas semanas. Ainda de acordo com o documento do
MP, a licença ambiental para a realização do trabalho estava vencida.
“Ernani de Freitas
Gonçalves afirmou para a Autoridade Policial que possui uma empresa de
terraplanagem, explicando ter sido contratado pelo acusado no ano de 2013”,
informa o texto da ação. O serviço consistia em nivelar o terreno, utilizando
escavadeira hidráulica com esteira.
Os contratantes da
obra de terraplanagem eram Ivo Emar Maciel Schmitt, responsável pela licença, e
Elaine Carbon Bettio, apontada na ação como proprietária do terreno, ambos
denunciados pelo MP. Ivo, que foi absolvido no processo, já faleceu. Ele havia
sido contratado por Elaine e subcontratou a empresa ligada a Ernani.
A EVG Terraplanagem e
Transporte está registrada em nome de Neusa dos Reis Gonçalves, esposa do
prefeito, e de Guilherme dos Reis Gonçalves. Na ocasião da fiscalização, havia
um funcionário da empresa no local. Posteriormente, Ernani foi chamado para prestar
depoimento às autoridades policiais.
PRESERVAÇÃO DO DELTA
DO JACUÍ É CENTRAL PARA CONTENÇÃO DE ENCHENTES
A APA do Delta do
Jacuí foi criada em 2005, por meio da Lei Estadual nº 12.371 e abrange uma área
de 22.826 hectares, entre os municípios de Porto Alegre, Eldorado do Sul,
Canoas, Nova Santa Rita e Triunfo. O local abriga o Parque Estadual Delta do
Jacuí, uma área de proteção integral que corresponde a 62% do território da
APA.
De acordo com a lei de
criação, a APA é composta por terras
públicas e privadas e tem por finalidade a proteção dos recursos hídricos ali
existentes, em especial as áreas de influência fluvial, os ecossistemas de banhados,
restingas e floresta estacional decidual, com o objetivo de disciplinar o
processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos
naturais.
Em agosto de 2023,
deputados estaduais instalaram a Frente Parlamentar em Defesa da Área de
Proteção Ambiental (APA) Estadual Delta do Jacuí e do Parque Estadual Delta do
Jacuí (PEDJ), na Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul. Entre
as propostas da frente está a efetivação dos Planos de Manejo das Unidades de
Conservação.
O Rio Jacuí é responsável
por 85% das águas que abastecem o Lago Guaíba, cartão postal e principal via de
escoamento hídrico da capital gaúcha com o mar. Os banhados e campos alagáveis
cumprem uma importante função ecossistêmica: eles drenam até 60% da água das
chuvas, retendo o fluxo dos rios e reduzindo o risco de enchentes.
Em entrevista
concedida no ano passado ao portal Sul 21, o coordenador do Atlas Ambiental de
Porto Alegre, Rualdo Menegat, já alertava para o aumento na incidência de mega
inundações associada à conversão das áreas inundáveis para uso agrícola e
imobiliário: “Há elementos agravantes que são relativos ao uso do solo, tanto
rural, como também no urbano”, pontuou. “Isso agrava essas enchentes de uma
forma avassaladora”.
FILHO DO PREFEITO
CHEGOU A SER PRESO DURANTE O PRIMEIRO MANDATO
Ernani Gonçalves está
em seu terceiro mandato como prefeito em Eldorado do Sul. Ele esteve à frente
do Executivo municipal entre 2009 e 2012 e voltou à prefeitura no período de
2017 a 2020.
Em 2012, um ano antes
da investigação relativa à obra irregular de terraplanagem realizada pela EVG,
a Justiça determinou a exoneração por nepotismo de três secretários municipais.
Um deles, o filho Vanderlan dos Reis Gonçalves, chegou a ser preso, em 2010,
por posse ilegal de armas. (A EVG tem as iniciais de Ernani, Guilherme e
Vanderlan.)
A ação ajuizada pelo
Ministério Público Estadual aponta que os titulares das pastas de Transportes e
Trânsito, Vanderlan Gonçalves, de Assistência Social e Trabalho, Neusa dos Reis
Gonçalves, e de Compras e Patrimônio, Edi Elesbão da Luz Reis, eram filho,
esposa e cunhado do prefeito.
A reportagem buscou
contato com a prefeitura de Eldorado do Sul, mas não obteve retorno até o
fechamento.
• Povos indígenas do Rio Grande do Sul
manifestam-se contra a lei do marco temporal no STF
O Povo Xokleng, de
Santa Catarina, instaurou um incidente de inconstitucionalidade sobre a Lei
n°14.701/2023, a lei que estabelece o marco temporal da Constituição Federal de
1988 para a demarcação de terras indígenas, no âmbito do RE 1.017.365 (Tema 1031),
que trata sobre o assunto, com repercussão geral, no Supremo tribunal Federal.
O Ministro Edson Fachin recebeu a petição e, no dia 08 de maio, abriu prazo
para a manifestação das partes e dos amicus curiae, dentre os quais os povos
originários do Rio Grande do Sul estão habilitados.
Assim que os Povos das
Terras Indígenas Passo Grande do Rio Forquilha, Kandóia, Rio dos Índios,
Votouro, GojJur, GojVéso, Acampamento SEASA, Campo do Meio, Carazinho, Mato
Castelhano, Sêgu, Araça’í, Palmas e Toldo do Pinhal protocolaram no dia 18 de
maio, por meio de seus advogados, petição reforçando o argumento do Povo
Xokleng contra a famigerada lei que estabelece o marco temporal.
Como é sabido de
todos, a Constituição Federal não estabelece marco temporal; pelo contrário,
são reconhecidos aos indígenas os direitos originários sobre as terras que
tradicionalmente ocupam (artigo 231, da CF). Se for aceita norma que determine
marco temporal, estar-se-á atingindo direitos humanos fundamentais, cláusula
pétrea da Constituição.
Ainda deve-se lembrar
que a Constituição de 1988 é marco da redemocratização do País, findando com a
Ditadura Civil-Militar. A Constituição foi fruto de intensas mobilizações da
sociedade por democracia e por direitos, com forte participação do movimento
indígena. Muitos povos, comunidades indígenas foram removidos de suas terras
por ação dos governos militares e seus parceiros. Se, por acaso, a tese do
marco temporal sobressair, significará a efetivação dos crimes, das violações
perpetradas pela Ditadura, justamente o que a Constituição veio superar e
reparar.
Fonte: De Olho nos
Ruralistas/Combate Racismo Ambiental
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