Memórias Póstumas: "A democracia
ocidental está morta, e jamais esteve viva”
Imaginemos um mundo
onde as pessoas possam viver em liberdade. Um mundo onde os cidadãos e cidadãs
são livres para escolherem seus líderes com liberdade e universalidade de
votos. Onde todas as pessoas têm a possibilidade de escolherem seus destinos,
suas profissões, seus futuros e, em resumo, fazerem suas escolhas. Neste mundo,
todos e todas são iguais e desfrutam de plenos direitos não somente perante a
lei, mas moralmente e na prática também. Todos podem enriquecer e se tornarem
líderes também, donos de empresas, grandes empresários. Mas, sobretudo, todos
tem seus direitos de expressarem suas formas de pensar, de ver o mundo, de
viver o mundo e de ser. E utilizam estes direitos para protestarem, levantarem
suas vozes quando veem algo errado no mundo que vem e vivem.
Este mundo está morto.
Mas ele já esteve, em algum momento, vivo?
Na última semana,
forças de defesa civil palestinas encontraram valas comuns no entorno dos
hospitais de al-Nasser – em Khan Yunis, ao sul da Faixa de Gaza – e al-Shifa –
na Cidade de Gaza. Entre 300 e 400 corpos foram encontrados em ambos os
hospitais, que no mês de março foram alvos de incursões terroristas pelas
Forças de Ocupação de Israel, deixando um rastro de destruição estrutural,
terror nas memórias palestinas, e as agora descobertas evidências contundentes
de genocídio, atrocidades e crimes de guerra sionistas. Entre os corpos, foram
encontradas mulheres e crianças, além de equipes médicas ainda em seus
uniformes, pacientes ainda com suas pulseiras hospitalares, e indivíduos com as
mãos presas às costas, sinais claros de tortura e de execuções sumárias.
As autoridades
palestinas em Gaza exigem investigações internacionais independentes imediatas,
um pedido também feito pela União Europeia e pela ONU, enquanto as autoridades
sionistas apenas fazem pouco caso dos achados e alegam que os corpos já estavam
enterrados antes das ações terroristas sionistas nos hospitais. Em entrevista à
Sky News, Fleur Hassan-Nahoum – vice-prefeita de Jerusalém e enviada especial
do Ministério de Relações Exteriores de Israel – desavergonhadamente alegou que
os corpos encontrados pertenciam a combatentes do Hamas e, num impressionante
ato falho, assumiu que os corpos encontrados com as mãos presas às costas
“provavelmente foram presos por nós [Israel]” antes de serem executados, e que
foram mortos porque “devem ter revidado”. Ao vivo em entrevista ao monopólio de
mídia britânico, uma enviada do regime de apartheid e genocídio sionista
assumindo que seu exército – o mais imoral do mundo – cometeu crimes de guerra.
Kay Burley, a entrevistadora, ainda indagou “como eles podem ter revidado com
as mãos presas às costas”, ao que a porta-voz do terrorismo sionista respondeu,
com a arrogância magnânima que somente o sionismo é capaz de produzir, que “não
se sabe o que eles estavam fazendo antes de suas mãos estarem presas às costas,
não é?”. Em outras palavras, na visão sionista são permitidas execuções
sumárias caso o indivíduo tenha combatido contra seus invasores.
As descobertas das
valas comuns ocorrem em meio a uma onda crescente de protestos contra o
genocídio sionista em todas as partes do mundo “ocidental”. No coração dos
imperialismos ianque e europeu, a juventude tem erguido suas vozes e colocado
seus corpos em serviço da defesa do povo palestino. Acampamentos, protestos,
passeatas surgem a cada dia em praças, ruas e, principalmente, universidades.
Professores, estudantes e até familiares de docentes e discentes vem promovendo
um movimento cada vez crescente nas maiores universidades, principalmente dos
USA, como o jornal A Nova Democracia noticiou no dia 26. O início do movimento
universitário se deu, nada mais, nada menos, que na Universidade de Columbia,
em Nova Iorque, onde ensinava o grande ativista palestino Edward Said, quando
estudantes acamparam no campus exigindo desinvestimento e sanções a Israel. Em
pouco tempo, mais de 40 outros campi já se juntaram ao protesto, incluindo
algumas das mais famosas universidades ianques como Harvard, Yale, UCLA e Princeton
– onde ensinou Albert Einstein, que além de um grande gênio, se opunha à
partilha da Palestina em dois Estados, favorecendo a fundação de um Estado
democrático e binacional.
Não somente nos USA,
como também na Europa, jovens, professores e estudantes se firmam ao lado do
invencível povo palestino. Em Sorbonne, na França, a mais antiga universidade
do “mundo ocidental”, estudantes se colocam em frente ao prédio histórico com bandeiras
palestinas e kufiyas – o “lenço” tradicional palestino. Poucos dias antes,
estudantes de ciências políticas também protestavam de forma similar na também
histórica faculdade parisiense Sciences Po. E na Alemanha o povo ocupou as
praças e ruas com cantos e gritos de “Palestina Livre”, em frente ao Reichstag
em Berlim.
Mas este mundo onde a
liberdade de se manifestar e o dever de se opor a um genocídio são preservados;
este mundo está morto, e jamais esteve vivo. A democracia ocidental, esta
farsa, ilusão, truque de mãos, é natimorta. A democracia ocidental quer, em seus
últimos suspiros, deixar claro que ela sempre foi um mito, uma mentira contada
por senhores fartos e empanturrados com a miséria alheia. A miséria que os
alimenta, desta vez, é a do povo palestino enquanto este sofre um genocídio.
Com exceção das universidades francesas, em quase todas as outras instâncias
das manifestações mencionadas, as polícias ianque e alemã agiram com tal
brutalidade que é reminiscente das divisões nazistas e, claro, sionistas. As
cenas são de meia dúzia de homens policiais, armados, às vezes com armaduras de
choque, brutalizando e agredindo mulheres, idosos, jovens estudantes e
experientes professores em seus próprios campi. Legiões vestidas de negro, como
os Camisas Negras fascistas italianos, com seus cassetetes e armas de choque, colocando
seus pesos de joelhos sobre os pescoços de cidadãos que pensavam que, um dia,
talvez, este mundo tenha sido livre.
A democracia ianque,
aquela que permitiu a escravidão negra por quase tanto tempo quanto o Brasil,
que se dividiu em uma Guerra Civil para decidir se a escravidão negra era justa
ou não, que destruiu nações mundo afora durante todo o século XX e chega agora,
ao século XXI, como o maior aliado, fornecedor, protetor, facilitador,
padrinho, patrão, patrono do regime mais genocida, carniceiro e criminoso dos
últimos 80 anos. A democracia ianque tira sua máscara de vez e se prova, enfim,
um mito. Uma história pra boi dormir. Enquanto a social-democracia alemã, os
mesmos que encomendaram os assassinatos de Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht,
os mesmos que assistiram e permitiram a ascensão do Partido Nazista na década
de 1920 e 1930; a social-democracia alemã, que força o povo palestino a pagar o
preço dos crimes que a Alemanha cometeu contra o povo judaico; a
social-democracia alemã jamais deixou de ser o que sempre foi. Resta àqueles
estudantes, professores, civis, pais e filhos ianques, alemães, franceses e todos
os outros de todo o mundo terem a consciência das ilusões, dos truques de
espelhos cada vez mais fraturados. A democracia ocidental está morta, e jamais
esteve viva. E junto dela, enterrada em vala comum como os mais de 400
palestinos assassinados pelo imoral exército sionista encontrados na semana
passada, jaz a lenda da humanidade ocidental. E agora, finalmente, o mundo
inteiro está vendo.
Ao verme que primeiro
roeu as frias carnes do cadáver deste mito da democracia ocidental burguesa e
desta lenda da humanidade ocidental, dedico aqui, como dessaudosa lembrança,
estas Memórias Póstumas.
Fonte: A Nova
Democracia
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