Mais de 300 milhões de menores ao ano
sofrem abuso online
Mais de 300 milhões de
crianças – ou seja, 12,6% dos menores de idade em todo o planeta – são vítimas
da exploração e abuso sexual online todos os anos, segundo o primeiro estudo
global sobre o tema publicado nesta segunda-feira (27/05).
Pesquisadores da
Universidade de Edimburgo, na Escócia, concluíram que, nos últimos 12 meses,
uma em cada oito crianças foi vítima de captura, compartilhamentos e exposições
de imagens e vídeos ilegais em todo o planeta.
O Instituto Childlight
de Segurança Global Infantil da universidade alerta que isso corresponde a 302
milhões de menores de idade. O relatório dos pesquisadores alerta que, ao mesmo
tempo, houve uma proporção semelhante de solicitações (12,5%), como mensagens
de texto com conteúdo sexual ou pedidos para atos sexuais por parte de adultos
e outros jovens.
Os casos variam, da
extorsão sexual, onde os criminosos exigem dinheiro das vítimas para não
publicar imagens íntimas, ao abuso da inteligência artificial para criar os
chamados vídeos e imagens deepfake.
Embora este seja um
problema mundial, a pesquisa indica que os riscos são particularmente altos são
nos Estados Unidos, onde um entre cada nove homens admitiu algum tipo de ofensa
sexual a menores através da internet. No Reino Unido, 7% dos homens britânicos
– o que equivale a 1,8 milhão de pessoas – admitiu o mesmo.
"Os materiais de
abusos de crianças são tão abundantes que os arquivos são relatados às agências
de monitoramento ou às polícias a cada segundo", afirmou o
diretor-executivo do Instituto Childlight, Paul Stanfield. "Isso é uma
pandemia de saúde global que foi mantida às escondidas por tempo demais. Ocorre
em todos os países, e está crescendo exponencialmente, portanto, exige uma
reação global", acrescentou.
• Autoridades despreparadas
No mês passado, a
polícia do Reino Unido alertou sobre grupos de criminosos na África Ocidental e
no Sudeste da Ásia que atuam nos esquemas de extorsão sexual contra menores.
Esses casos – em particular, contra meninos adolescentes – explodem em todo o mundo,
segundo a polícia e ONGs especializadas.
Os criminosos se
apresentam com perfis falso de outros jovens, entrado em contato através de
redes sociais antes de passarem para os serviços de mensagens encriptados, nos
quais encorajam as vítimas a enviarem imagens íntimas.
Eles costumam praticar
as chantagens dentro de uma hora após o contato inicial. Sua motivação, ao
invés da gratificação sexual, é extorquir a maior quantidade de dinheiro
possível.
O diretor-executivo da
Interpol, Stephen Kavanagh, advertiu que os métodos tradicionais adotados pelas
autoridades de segurança não conseguem lidar adequadamente com o problema.
"Temos que fazer mais juntos em nível global, incluindo treinamento para
investigadores especiais, melhor compartilhamento de dados e equipamentos para
combater de maneira mais eficaz essa pandemia e o mal que ela faz a milhões de
jovens em todo o mundo", afirmou.
• França quer proibir pais de postar fotos
dos filhos
O nascimento de um
bebê, seu primeiro sorriso, seus primeiros passos – os pais geralmente se
alegram com esses marcos iniciais na vida de seus filhos. Tais momentos
especiais são frequentemente capturados em fotos e apresentados com orgulho a
parentes e amigos. Embora possa ser irritante para alguns, isso nunca chegou a
ser um problema – desde que o álbum de fotos sumisse de volta na estante. Com o
advento das redes sociais, no entanto, cada vez mais fotos de crianças são
postadas publicamente na internet, algo que pode ter consequências indesejadas
no futuro.
• 1.300 fotos antes do 13º aniversário
"Em última
análise, muitas vezes se trata de reconhecimento por meio de mecanismos como
curtidas ou corações, por exemplo", explica Sophie Pohle, consultora de
educação em mídia do Fundo Alemão para Crianças em Berlim.
Às vezes, acrescenta a
especialista, compartilham-se desde as primeiras imagens do ultrassom, mas
também fotos na praia, de festas de aniversário ou do primeiro dia na
escolinha. "Em princípio, não há nada que não seja mostrado."
Há também casos em que
crianças pequenas são comercializadas para fins publicitários, quando
influenciadores digitais as usam em anúncios de cosméticos ou roupas de bebê,
por exemplo. E no entanto, todo mundo tem direito à sua própria imagem. E isso
se aplica também – e especialmente – às crianças.
Até os 13 anos de
idade, cada criança já possui, em média, cerca de 1.300 fotos circulando na
rede, alertou a ativista pelos direitos infantis Anne Longfield em um relatório
de 2018, quando atuava como Comissária da Infância na Inglaterra. O fenômeno
tem até um nome próprio: "sharenting", formado pelas palavras em
inglês "to share" (compartilhar) e "parenting"
(parentalidade).
• Consequências da postagem indiscriminada
de fotos
Mas a internet não
esquece jamais. Essa frase conhecida pode, de fato, tornar-se um problema. Por
exemplo, quando as próprias crianças não estão satisfeitas com suas fotos.
"O que os pais
descrevem como fofo, às vezes é visto pelas crianças como incrivelmente
embaraçoso", explica a consultora do Fundo Alemão para Crianças. "E
se algo assim entra em circulação pública, é claro que pode se tornar alvo de
bullying, insultos ou comentários de ódio."
Ela aponta que as
imagens também podem ser um problema mais tarde, em processos de seleção para
um emprego, por exemplo, quando o departamento de RH de uma empresa resolve
pesquisar no Google sobre determinado candidato e se depara com "fotos
realmente desagradáveis".
Foi justamente para
chamar a atenção para problemas como esses que a blogueira Toyah Diebel lançou
em 2019 o projeto #deinkindauchnicht (seu filho também não, em alemão). A ideia
por trás: "Uma foto sua assim, você jamais postaria. Seu(sua) filho(a)
também não."
Além disso, muitas
vezes não é apenas o rosto da criança que aparece nas fotos, mas também seu
ambiente privado: o quarto, a casa, o jardim. Também é comum que tais imagens
venham acompanhadas de dados adicionais, como o nome da criança ou sua data de
nascimento.
"Esses dados
acoplados também podem ser usados para tirar conclusões sobre onde a criança
mora", alerta Sophie Pohle. E isso não é um problema somente sob o prisma
da proteção de dados: "Claro que sempre existe o risco de que tais
informações e imagens caiam nas mãos erradas e circulem em círculos de
pedófilos, por exemplo".
Em 2019, um relatório
do portal online jugendschutz.net, criado por meio de uma parceria entre os
governos federal e estaduais da Alemanha, apontava que o Instagram era usado
por uma rede de "pessoas com interesse sexual em crianças". Redes do tipo,
conta a especialista, pegam fotos de crianças e as compartilham acompanhadas de
hashtags ou comentários sexuais.
Poucos se dão conta do
alcance do material compartilhado. "Os pais têm uma noção relativamente
boa de que postagens públicas no Facebook, TikTok ou Instagram são
problemáticas", afirma Pohle. "Ao mesmo tempo, eles veem [aplicativos
como] Messenger e Whatsapp como algo mais ou menos privado e, acabam
compartilhando lá de forma ainda mais desinibida." Por meio da função de
status, por exemplo, todo o círculo de conhecidos pode ter acesso às fotos.
"O cerne da
questão é quão grande é o senso de responsabilidade dos pais neste assunto e
como isso se reflete, por exemplo, nas configurações de privacidade nas redes.
Eu realmente compartilho as fotos publicamente ou apenas com meus seguidores?",
pontua Pohle, lembrando que nem mesmo em um chat privado se pode ter absoluta
certeza de que uma foto não será repassada sem permissão.
• Compartilhar imagens de crianças pode
ser proibido por lei
Para coibir a
divulgação particularmente excessiva de imagens com potencial de ferir a
dignidade, a França segue agora um caminho único no mundo: quer proibir os pais
de compartilhar fotos de seus filhos nas redes sociais sem a permissão dos
menores.
Um projeto de lei
sobre o tema prevê que, em caso de divergências entre os pais, possam ser
adotadas inclusive ações legais, como proibir um dos pais de postar ou
compartilhar fotos de seus filhos sem a permissão do outro. Em casos extremos,
os pais poderiam até perder o direito de controlar os direitos de imagem de
seus filhos.
A nova proposta dá
também especial atenção à "exploração de imagens infantis em plataformas
online". Nesses casos, a renda adquirida através do uso comercial de fotos
de crianças deve ser depositada em uma conta que os jovens tenham acesso a partir
dos 16 anos.
O texto prevê ainda um
"direito ao esquecimento", segundo o qual as crianças poderiam ter
suas próprias fotos e vídeos removidos da internet posteriormente, se assim o
desejarem.
No geral, Pohle avalia
o projeto de lei francês de forma positiva. Ele reforça, afinal, os direitos
individuais dos menores já consagrados na Convenção das Nações Unidas sobre os
Direitos da Criança.
"A questão não é
que a postagem de fotos de crianças na internet deva ser proibida como um todo,
mas evitar o uso excessivo e desrespeitoso delas nas redes sociais", diz
Pohle.
"O direito à
própria imagem significa que cabe a cada pessoa decidir por si mesma que
imagens suas podem ou não ser publicadas. E é por isso que é absolutamente
importante, do ponto de vista dos direitos da criança, envolvê-las na decisão e
também aceitar um 'não' em vez de simplesmente ignorá-lo."
O projeto legislativo
francês é inédito no mundo. Sendo assim, avalia Pohle, a educação ainda é o
principal meio de proteger as crianças das consequências indesejadas do
compartilhamento de imagens. Em creches, escolas, plataformas de mídia social,
mas também e principalmente com os próprios pais.
Em primeiro lugar, as
famílias "devem desenvolver um entendimento comum de como tratar fotos com
respeito e responsabilidade", diz Pohle . "Isso porque, o mais tardar
quando as crianças ganham seu primeiro smartphone, elas mesmas entram nas
mídias sociais, onde, é claro, também são fortemente influenciadas pela maneira
como isso era abordado pela família."
Fonte: Deutsche Welle
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