Lava Jato admitiu em 2015 que grampo em
Youssef arriscava anular a operação; Deltan retaliou delegados
Um novo lote de
mensagens da Operação Spoofing obtido pelo Jornal GGN na tarde desta sexta (24)
comprova que a força-tarefa da Lava Jato no Ministério Público Federal no
Paraná, antes coordenada por Deltan Dallagnol, sabia desde 2015 que “arriscava”
anular toda a operação com a escuta clandestina instalada pela Polícia Federal
na cela do doleiro Alberto Youssef, um dos principais delatores.
Conscientes do perigo,
os diálogos mostram que os procuradores agiram pessoalmente – ora usando a
mídia contra agentes federais que apuravam o caso, ora pressionando a defesa de
Youssef a recuar da denúncia – para que a ameaça de nulidade não se concretizasse.
O grampo ilegal,
descoberto ainda em 2014, foi objeto de sindicâncias da Polícia Federal que
acabaram arquivadas precocemente. Em entrevista exclusiva ao GGN nesta semana,
o advogado de Youssef, Antonio Figueiredo Basto, afirmou que há digitais dos
procuradores da Lava Jato e do ex-juiz Sergio Moro no arquivamento.
• “É arriscado”
Os novos diálogos da
Spoofing evidenciam que os procuradores estavam preocupados com a hipótese de
nulidade que chegou a ser sustentada pela defesa de Youssef nos autos dos
processos conduzidos por Sergio Moro.
Deltan Dallagnol
tentou driblar a situação sugerindo ouvir Youssef “formalmente” para induzí-lo
a “consignar” que nunca fora confrontado com alguma informação obtida pela
escuta ilegal. Os colegas, no entanto, acharam o caminho perigoso. “É
arriscado”, respondeu o procurador Andrey Mendonça.
“Vamos tomar cuidado
com o Youssef, pois podemos ser acusados de manipulação”, acrescentou um outro
procurador – possivelmente Carlos Fernando dos Santos Lima. Orlando Martello
complementou: “Não adianta ouvir youssef. A nulidade decorreria da informação.
(…) Ou Seja, da informação obtida ilegalmente (…) É melhor não mexer e torcer
para não ter nada naquele computador”. O computador, no caso, eram dos
policiais federais, que já haviam sido apreendidos àquela altura.
• Ataque aos delegados
O diálogo sobre o que
fazer com Youssef ocorreu em 4 de julho de 2015. Na mesma conversa, Deltan
Dallagnol mostrou como usava setores da grande mídia em seus estratagemas. Ele
afirmou aos colegas que pediria ao Caex – órgão do Ministério Publico – para “levantar
informações” contra “Iegas e Mesquita”, que são José Alberto de Freitas Iegas e
Wagner Mesquita, dois delegados da PF que, à época dos fatos, reconheceram a
existência da escuta ilegal na cela de Youssef.
Deltan avisou ao grupo
de Telegram que vazaria ao Valor Econômico o material contra os delegados para
que uma matéria com “maldades” sobre eles saísse numa segunda-feira, mesmo dia
em que o jornal previa a publicação de uma entrevista com o então ministro
Marco Aurélio de Mello, do STF, afirmando que “escutas ilegais podem anular a
Lava Jato”.
No final daquela
conversa, o procurador Diogo Castor de Mattos demonstrou confiança de que o
Judiciário não teria coragem de enfrentar as nulidades da Lava Jato. “Quero ver
ser macho pra anular a Lava Jato”, disse Castor, ao que Deltan rebateu: “Quero
ver ser macho pra devolver mais de 500 milhões pros reus confessos”, em
referência aos acordos que já estavam sendo fechados pela força-tarefa.
• Pressão sobre advogados
As conversas entre
Deltan e seus colegas indicam ainda que o ex-procurador sempre teve
contrariedade com o fato da defesa de Youssef arguir a nulidade do processo por
diversas razões. A escuta clandestina na cela era apenas uma delas. Em 28 de
maio de 2015, após compartilhar com os colegas trechos da defesa de Youssef com
o pedido de nulidade, Deltan escreveu: “Com um colaborador desses, não
precisamos de adversários.”
Em 2 de julho de 2015,
Deltan escreveu a Januário Paludo e Carlos Fernando para reclamar que a defesa
insistia na tese de nulidade mesmo depois de “vocês falarem com eles e eles
dizerem que não fariam mais isso”, revelando que havia pressão contra o exercício
da ampla defesa. Januário afirmou que conversara com o advogado Figueiredo
Basto, que haveria recuado dessa linha de sustentação.
Ao GGN, Figueiredo
Basto afirmou que o acordo de delação premiada jamais foi a primeira opção de
Youssef, mas que foi impossível, àquela época, lutar pela nulidade da operação
com Moro na 13ª Vara e uma sequência de juízes alinhados com a Lava Jato em instâncias
superiores. Até hoje, a defesa não teve acesso à sindicância da PF que conteria
todas as manobras que levou ao arquivamento do caso dos grampos. O Supremo
Tribunal Federal foi acionado.
<<<<< Leia
os diálogos obtidos pelo GGN abaixo:
28 May 15
10:43:56 Deltan
Januário e CF, olhem o AY na defesa da OAS:
10:43:56 Deltan A peça
defensiva escrita em nome do acusado YOUSSEF foi juntada ao evento 147.
Sustenta: a) nulidade das interceptações1, ante a1) a ausência, na decisão que
afastou os sigilos telefônico e telemático e nas que prorrogaram o afastamento,
de apontamento de indícios prévios de autoria ou participação no fato
investigado e de delimitação dos fatos a serem investigados, a implicar
interceptação “em prospecção”, sem definição do “raio de alcance objetivo das
investigações”, em contrariedade ao art. 2º, I e p. único, Lei 9.296/96; a2)
vício de fundamentação nas decisões que afastaram os sigilos, por invocar a
gravidade e a natureza jurídica do fato, bem como a complexidade do caso, além
de repetir fundamentação usada em decisões anteriores, para autorizar as
medidas subsequentes; e a3) a existência de períodos de monitoramento não
albergados por decisão judicial, bem como de períodos fundados em decisões
judiciais de prorrogação proferidas após solução de continuidade das medidas
anteriores e com fundamentos inidôneos; b) nulidade, em razão dos vícios na
interceptação, das demais provas produzidas em inquérito policial, bem como da
denúncia e do seu recebimento, por ilicitude derivada; c) inversão de etapas
processuais, com c1) o recebimento da denúncia antes da apresentação da
resposta à acusação, em contrariedade ao art. 396, CPC; e c2) a designação de
audiência antes da citação do réu, da apresentação de resposta à acusação e da
possibilidade de absolvição sumária; d) necessidade de reunião de todos os
feitos criminais relacionados à 7ª fase da Operação Lava Jato em um único
processo, a fim de evitar contradição entre decisões, em observância aos arts.
76, I e III, e 79, CPP, por narrarem delito de organização criminosa integrado
por denunciados em comum, com conexão fática e instrumental, não podendo haver
o “fatiamento” da denúncia – que deveria tratar os fatos em “uma unidade fática
indivisível”, sob pena, ainda, de litispendência -, não estando presente motivo
apto que autorize o excepcional desmembramento, conforme o art. 80, CPP. Sobre
o mérito, após defender a legitimidade da colaboração premiada que firmou,
YOUSSEF afirma que não foi o líder da organização criminosa descrita nos autos,
tendo atuação subsidiária à dos agentes políticos e públicos envolvidos.
Defende que não pode ser responsabilizado por corrupção passiva, pois não tinha
qualquer ingerência na celebração de contratos com a Petrobras e não participou
do engendramento dos respectivos contratos, atuando somente na posterior fase
de lavagem dos correspondentes valores. Reputa de inepta a denúncia neste
ponto, por não referir qualquer conduta de YOUSSEF que caracterize a prática de
corrupção passiva, não descrevendo as condutas do réu que “omitiram ou
realizaram atos próprios de funcionários públicos”. Pede ainda a ordenação das
provas nos autos, a fim de facilitar o exercício do direito de defesa.
10:47:04 Deltan Com um
colaborador desses, não precisamos de adversários
2 Jun 15
09:58:33 Deltan Agora
quero ver quem quer se lotar em Curitiba… e o frio está chegando… Curitiba é
para os fortes
10:26:48 Deltan Caros,
quem redigiu o acordo do Julio Camargo? Precisamos da versão editável dele
11:39:08 Roberson MPF
Pessoal, Alberto Youssef sustentou preliminares de (a) nulidades das
interceptações, (b) inversão de etapas processuais (designação de aud antes da
resposta preliminar) e (c) necessidade de reunião das ações penais.
11:39:32 Roberson MPF
Protocolo efetuado no dia 01/06
11:43:20 Athayde
Pessoal, Alberto Youssef sustentou preliminares de (a) nulidades das
interceptações, (b) inversão de etapas processuais (designação de aud antes da
resposta preliminar) e (c) necessidade de reunião das ações penais.
11:43:25 Athayde
Protocolo efetuado no dia 01/06
11:46:00 Deltan
Januário e CF, eles fizeram isso depois de Vcs falarem com eles e eles dizerem
que não fariam mais isso… acho que era o caso de dizer, ainda que seja blefe,
que não dá mais para fazer acordo com eles como advogados, pq não são mais
confiáveis, ou algo assim…
21:00:04 Januario
Paludo Falei com o Figueiredo. Ele disse que já havia avisado a equipe e foi um
erro do bretas. Vamos ver amanhã o que ele resolve.
4 Jul 15
11:46:24 Deltan VALOR:
sai na segunda entrevista do Marco Aurélio STF dizendo que as escutas podem
anular lava jato
11:47:16 Deltan O que
acham de ouvir Y formalmente para consignar que ele nunca foi confrontado com
nada dessa suposta escuta? Preventivamente , antes que eles desenvolvam a tese
de nulidade?
11:47:24 Deltan
Arriscado?
11:53:52 Deltan O
valor vai publicar maldades do Mesquita e Iegas se dermos
11:54:08 Deltan Vou
passar um material na segunda que tenho do Mesquita
12:11:40 Vamos tomar
cuidado com o Youssef, pois podemos ser acusados de manipulação.
12:13:36 Creio que
podemos fazer um artigo a respeito. Mas vamos esperar um pouco.
12:15:52 Minha vontade
é somente dizer que há desinformados emitindo irresponsavelmente, ou pior,
opiniões.
12:17:44 Eu já separei
o artigo do Fernando Rodrigues. Por isso quero o acordo com a Borghi-Lowe, para
poder entrar na SECOM.
12:49:48 Vou escrever
um artigo chamado ‘O Ministro boquirroto’
13:10:48 Andrey B
Mendonça Deltan, o Y ja me falou q acha q descobriram algo por conta dessa
interceptação
13:10:52 Orlando SP
Não adianta ouvir youssef. A nulidade decorreria da informação
13:11:08 Andrey B
Mendonça Eh arriscado
13:11:20 Orlando SP Ou
Seja, da informação obtida ilegalmente
13:11:49 Orlando SP É
melhor não mexer e torcer para não ter nada naquele computador
13:12:08 Orlando SP
Apreenderam os computadores dos dps tb!
13:44:20 Deltan Ich…
Tomara que não achem os vazamentos dos DPs kkkk
13:44:47 Deltan Pedi
um levantamento do Coex de tudo que tem do Iegas e do Mesquita
14:11:20 Diogo Quero
ver ser macho pra anular a lavajato
14:11:32 Diogo Se
fizer isto vai ter revolução
14:16:56 Deltan Iero
ver ser macho pra devolver mais de 500 milhões pros reus confessos
14:43:40 Deltan To
levantando hoje a questão do Iegas e Mesquita pro Valor publicar junto na
segunda, qdo for falar do Marco Aurélio
19 Jun 15
18:31:16 Januario
Paludo Figueiredo:Petição de desistência protocolada
18:31:32 Januario
Paludo Aos 45 minutos. Tem que ver!!!
18:37:40 Deltan Hahaha ah garoto
18:37:48 Deltan E nos? Desistimos?
18:38:56 Januario
Paludo No. Mas eu só acredito vendo a petição.
• Lava Jato fraudou investigação que teria
evitado delação de Youssef, diz advogado do doleiro
Em entrevista
exclusiva ao Jornal GGN, o advogado Antônio Figueiredo Basto, defensor de
Alberto Youssef na Lava Jato, afirmou que o acordo de delação premiada com a força-tarefa
de Curitiba “jamais” teria acontecido se a investigação sobre o grampo ilegal
não tivesse sido arquivada precocemente, jogando para debaixo do tapete mais
uma nulidade praticada pela operação em sua origem.
O arquivamento tem as
digitais de agentes da Lava Jato em Curitiba e, mais grave do que isso, segundo
Basto relatou ao GGN, houve também “fraude”, já que foram prestadas informações
falsas à sindicância que apurava o origem e intuito do grampo ilegal.
“Nós tomamos medidas
durante anos para ter acesso [à sindicância que foi arquivada e está em
sigilo]. Recentemente, o juiz da 13ª Vara nos negou acesso dizendo que não
havia interesse da defesa em conhecer aqueles autos. Como não temos interesse?
Temos interesse, sim! Muda totalmente o acordo do Youssef”, disse Basto.
“Se tivéssemos a
oportunidade de combater [a operação] com essa nulidade, certamente o acordo
não teria aconteceria. Ou não aconteceria nas condições em que aconteceu. A
ideia nunca foi fazer acordo. O acordo vai acontecer depois que o [ex-gerente
da Petrobras] Paulo Roberto Costa ter feito, e quando já não havia mais como
escapar daquele assédio e pressão [para delatar]”, revelou Basto.
Na entrevista ao
jornalista Luis Nassif, transmitida ao vivo no Youtube, na noite de quarta
(22), Figueiredo Basto afirmou que a Lava Jato tem três “nulidades grosseiras”
em sua origem:
• a 13ª Vara Federal de Curitiba não tinha
competência para julgar todos os casos;
• Sergio Moro era suspeito em relação a
Youssef, a quem já tinha julgado antes, no caso Banestado;
• a intercepção ilegal na cela de Youssef
é uma prova ilícita que gerou centenas de horas gravadas – que provavelmente
foram usadas pela Lava Jato para criar estratagemas.
Com base nessas três
nulidades, Basto – que levou ao Supremo Tribunal Federal sua demanda a respeito
do grampo ilegal – defende que “a Lava Jato seja anulada por completo. Não pode
ser anulada em frações, para um ou para outro. (…) Tem que se ter coragem de
dizer: nós erramos, o Estado brasileiro errou, os tribunais erraram. E, agora,
os que erram têm que ser responsabilizados.”
SERGIO MORO, DELTAN
DALLAGNOL E A FALSIFICAÇÃO
Basto relatou ao GGN
que após seu sócio, Luis Gustavo Flores, registrar a famosa foto onde Youssef
segura o aparelho clandestina localizado em sua cela, a defesa procurou Sergio
Moro oficialmente para saber se ele tinha autorizado grampo da Polícia Federal
na cela do doleiro. “Ele disse que não. Nós denunciamos esse fato e,
imediatamente, eles varreram tudo para debaixo do tapete”, disse Basto.
Segundo o advogado,
Moro estaria implicado na história porque um ex-delegado da Polícia Federal, O
Moscardi Grillo, confessou à época que “Moro exigiu que ele entregasse os
relatórios [da sindicância] ao Moro antes de qualquer outra pessoa. Ou seja,
havia uma interferência do juiz diretamente numa investigação da PF, o que é um
abuso, um absurdo. Não estou dizendo que Moro sabia da interceptação; agora,
que ele depois atuou de forma direta para que isso fosse encoberto, não há
dúvida.”
Já sobre o papel dos
procuradores de Curitiba no arquivamento do caso, Basto invoca as conversas
reveladas na Operação Spoofing. “Na Spoofing você vê o [procurador] Orlando
Martello dizendo que qualquer advogado mediano anularia a operação inteira em
razão da gravidade daqueles fatos, e o Deltan Dallagnol imediatamente responde:
‘precisamos tomar providências para anular isso [a sindicância para apura ro
grampo] o mais rápido possível’. Não passaram 10 dias, e isso foi arquivado a
pedido do Januário Paludo – contrariando, inclusive, o relatório da Polícia
Federal que insistia em continuar a investigação. Ainda assim, um juiz federal
daqui de Curitiba [Nivaldo Brunoni] arquivou a investigação [em 2019, sem a PF
ter tido tempo de realizar diligências básicas].”
Para Basto, “o mais
grave de tudo isso é que eles falsificaram, houve a falsificação numa
sindicância, que é a 04/2014, dizendo que aquele aparelho era para gravar
Fernandinho Beira-Mar. Mentira, quando ele estava preso na Superintendência da
Polícia Federal, esse aparelho sequer havia sido adquirido pela PF. Ele estava
cadastrado para outra operação, com Alberto Youssef. E eles mentiram mais:
disseram que o aparelho não estava ativo. Um laudo da própria PF desmentiu. Não
só estava ativo como houve interceptação e gravaram várias e várias horas que
ninguém sabe o que tem. Ou seja, é uma prova ilícita que estava no cerne da
Lava Jato.”
“Entramos com medidas
no Supremo Tribunal Federal para que seja apurado, porque não houve vontade de
apurar. Todas as tentativas que eles fizeram [para abafar o caso] estão dentro
da sindicância 05/2015, a qual elucida todas as falsidades“, pontuou Basto,
frisando que só conseguiu avançar com o caso de Youssef quando o juiz federal
Eduardo Appio assumiu a 13ª Vara. No entanto, Appio sofreu um revés na Justiça
e foi removido para uma Vara previdenciária. “O colocaram num exílio jurídico
porque ele estava tirando do armário os esqueletos mais pobres que estavam
escondido.”
Fonte: Jornal GGN
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