Cusco: as histórias e os sabores da antiga
capital do Império Inca
Um dos países mais
fascinantes da América do Sul, o Peru possui admiração e reconhecimento a nível
mundial. O território é abundante em riquezas histórico-culturais e
gastronômicas, em que a cada ruína visitada e a cada garfada dada conseguimos
sentir a herança singular deixada por estas terras.
Além da capital Lima,
um dos lugares que potencializam esse poderoso conjunto é Cusco, cidade nos
Andes peruanos que desempenha papel importantíssimo na história: foi a capital
e o coração do antigo Império Inca, em que hoje abriga muitos símbolos arqueológicos
que formam a identidade do país.
Literalmente de tirar
o fôlego, Cusco fica a 3.400 metros acima do nível do mar e é por si só um
Patrimônio Mundial da UNESCO, que destaca seu antigo centro urbano com funções
religiosas e administrativas.
Antes das gravações da
quinta temporada do CNN Viagem & Gastronomia na cidade, visitei Cusco há
cerca de 20 anos em uma viagem de mochilão de 13 dias pelo Peru. Depois de
tanto tempo, tenho certeza: a cidade está maior e vibrante, também segura e organizada,
ao mesmo tempo que continua a carregar sua essência intocável do passado.
Em resumo, Cusco é
assim: nos entrega experiências. É um local de muita cultura e história, mas
também uma cidade com um quê de agito jovem e astral lá em cima.
• A cidade
Base para conferirmos
de perto as maravilhas de Machu Picchu, uma das sete maravilhas do mundo, tanto
o centro quanto o entorno de Cusco possuem ruínas e construções históricas que
datam desde os Incas, do século 15, passando pela herança colonial espanhola,
do século 16.
Ruas estreitas pelo
centro são repletas de lojas, restaurantes e bares, criando uma atmosfera
vibrante e ao mesmo tempo acolhedora.
A Plaza de Armas é o
coração do centro histórico, onde tanto os incas quanto os espanhóis também a
utilizaram como núcleo. Hoje ela é cercada de construções coloniais e
religiosas, como a Catedral de Cusco e a Igreja Companhia de Jesus, assim como
lojas e restaurantes.
Apesar do estilo
colonial prevalecer, interessante é que a maioria das construções daqui ainda
possuem algumas paredes incas em suas fundações.
Vale lembrar que os
3.400 metros de altitude nos fazem ter reações adversas, como dores de cabeça,
cansaço e até falta de ar. A dica é pegar leve no primeiro dia e ter à nossa
disposição chá da folha de coca e muña. Em certos casos, hotéis também oferecem
cilindros de oxigênio para ajudar na aclimatação.
Para chegar em Cusco a
partir do Brasil é necessário pegar um voo internacional para Lima, a capital,
e depois um voo doméstico de cerca de 1h15 até o aeroporto da cidade.
Vale lembrar que a
língua oficial do Peru é o espanhol e que a moeda é o sole (novo sol peruano),
em que R$ 1 equivale atualmente a 0,74 da moeda local.
• Para entender Cusco: breve história
Cusco tem uma história
de mais de três mil anos. No entanto, o período mais conhecido e importante da
história da cidade, é sem dúvida, a época dos Incas.
Esta civilização
fundou a cidade no século 13 e a transformou em sua capital no século 15,
quando iniciaram a construção do Templo Qorikancha, a fortaleza de Saqsaywaman
e Machu Picchu, por exemplo. Com Cusco como centro, os Incas governaram um
império do Equador até o Chile e da costa do Pacífico até a Amazônia.
Em 1533, os espanhóis
liderados por Francisco Pizarro conquistaram a cidade e o Império Inca. Os
colonizadores derrubaram muitas das construções e impuseram sua própria cultura
e religião. A Catedral de Cusco e o Convento Santo Domingo, erguido em cima do
antigo templo do sol, são exemplos notáveis da arquitetura colonial espanhola
por aqui.
Ao longo dos séculos,
Cusco se tornou um importante centro religioso e cultural da América do Sul, em
que nos lembra tanto a grandeza do Império Inca quanto a influência da colonização
espanhola.
• Templos: onde as divindades e a
engenhosidade Inca se encontram
É a partir das ruínas
dos templos deixados pelos Incas que conseguimos entender um pouco mais de suas
crenças e avançados conhecimentos na matemática e na astronomia. A religião dos
Incas acreditava em divindades como o Sol, a Terra e a Lua.
Portanto, podemos ver
de perto e com os próprios olhos as maravilhas criadas por esse povo em torno
destes deuses. É de se surpreender ainda pensar sobre suas construções, que são
formadas por rochas de mais de 100 toneladas cortadas perfeitamente a ponto de
se encaixaram umas com as outras – isto por volta do século 15, há mais de 600
anos.
Vale dizer que para
entrar nas atrações é necessária a compra do Boleto Turístico de Cusco, que
possui diferentes taxas e abrange diferentes locais. O boleto pode ser
adquirido na entrada das próprias atrações, em agências de turismo ou no centro
de informações turísticas da cidade.
• Saqsaywaman e suas impressionantes
rochas
Uma das mais
impressionantes estruturas arqueológicas remanescentes em Cusco, o Saqsaywaman
era o segundo templo mais importante dos Incas.
Estar aqui é ver com
nossos próprios olhos a engenhosidade desta civilização: a construção, que
remonta ao século 15, foi erguida com enormes blocos de pedra que pesam até 125
toneladas e se encaixam perfeitamente. Meu tamanho perto das pedras, por exemplo,
chega a ser ínfimo.
Segundo Alicia Macedo,
guia de turismo que nos auxiliou durante a passagem pelo templo, “nada foi
feito de argila, somente barro para encaixar as pedras”. Ela aponta também que
portas e janelas em forma de trapézio foram feitas para que as estruturas tivessem
uma maior estabilidade.
O local é formado por
uma série de pequenas torres e muros que são verdadeiras obras-primas – além de
bons engenheiros, os Incas também eram bons matemáticos e astrônomos.
O templo, porém, foi
praticamente dizimado pelos espanhóis, só restando alguns grandes paredões de
rochas. Pouco se sabe sobre o propósito exato do templo: pesquisadores afirmam,
na verdade, que o Saqsaywaman pôde ter sido uma fortaleza militar e que até 20
mil pessoas trabalharam em suas obras.
Da parte que sobrou,
ao norte da cidade, podemos apreciar ainda vistas panorâmicas para Cusco e para
os Andes peruanos.
• Q’enqo e seu uso religioso
A cerca de três
quilômetros do centro de Cusco fica o templo Q’enqo, palavra em quechua que
quer dizer labirinto, escolhido para ser um local de cerimônias religiosas e de
rituais.
Construído pelos
antigos Incas durante o século 15, aqui podemos ver mais uma vez a exímia
construção dos Incas com enormes rochas – algumas possuem até relevos em forma
de serpentes e outras figuras míticas.
Interessante é que
aqui podemos adentrar uma galeria subterrânea com uma única saída e entrada: é
a representação da vida e da morte. O templo ainda é composto por anfiteatro e
canais de água.
Acredita-se que aqui
eram cultuados o deus do Sol, Inti, e a deusa da Terra, Pachamama.
Para além de sua
importância, o marco arqueológico nos entrega vistas privilegiadas das
montanhas peruanas e da cidade.
• Qorikancha, Templo do Sol, e o passado
colonial espanhol
Em poucas palavras, o
Qorikancha foi simplesmente o mais importante templo nos tempos áureos da
civilização Inca. Para se ter uma noção de sua relevância, o templo foi para os
Incas o que o Vaticano é para os católicos.
Conhecido como Templo
do Sol, a construção do século 15 fica na Praça Santo Domingo e permanece com
algumas partes quebradas de antigos paredões de rochas.
Esta é uma das
indicações da passagem dos espanhóis por aqui: como forma literal e impositiva
de se sobrepor à religião e aos valores Inca, os colonizadores construíram um
convento em cima do templo.
Assim, o Convento de
Santo Domingo foi erguido para atender às necessidades dos colonizadores. Hoje
vemos ainda alguns paredões e sistemas de drenagem, em que é interessante notar
como as estruturas da ordem dos dominicanos foi construída em cima dos restos
do templo – e como este sobreviveu ao tempo.
• Sabores locais: Peru e heranças
espanholas
Uma das portas de
entrada mais celebradas para que conheçamos de fato o Peru é a sua gastronomia.
A dica é vivenciar sua rica cultura gastronômica tanto em restaurantes
cultuados quanto ao lado das barraquinhas de rua.
Aqui encontramos uma
mistura de sabores indígenas e influências espanholas, com pratos e bebidas
tradicionais que refletem a abundante história da localidade.
Vale lembrar que a
região possui uma grande variedade de ingredientes locais, como milho, batata,
quinoa, carne de alpaca e de porco, além de uma grande variedade de ervas e
especiarias.
Os tradicionais Pisco
Sour e a Chicha Morada também não podem faltar por aqui entre uma garfada e
outra. Abaixo, seleciono três restaurantes superconhecidos da cidade – e do
país – onde os sabores regionais são ressaltados e a cultura do Peru
valorizada.
• Chicha, por Gastón Acúrio
No segundo andar de
uma casa colonial a apenas um quarteirão da Plaza de Armas, o chef Gastón
Acurio, eleito um dos melhores chefs do mundo, honra e valoriza os sabores e a sabedoria
de Cusco.
Com vários
restaurantes sob sua batuta, digo que Gastón, inclusive, é mais do que um chef
de cozinha, mas sim um promotor da gastronomia peruana – seus créditos vão para
a internacionalização do ceviche, por exemplo, prato hoje espalhado pelo mundo
inteiro.
Aqui no Chicha, porém,
tudo é sobre comida regional: os produtos são daqui, assim como as tradições e
cultura local e garantem pitadas apetitosas aos pratos.
A casa descontraída
nos oferece combinações interessantes que funcionam, como carpaccio de alpaca e
chips. Também experimentei um sorvete de cerveja com compota de maçã – pedida
recomendada por aqui. Ceviche, é claro, também é a pedida certa. A casa trabalha
com menu regional, escolhas do chef e também menu-degustação de oito tempos.
Em suma, é daqueles
restaurantes que não podemos deixar de ir, seja para adentrar um pouco mais em
uma cozinha de renome, seja para experimentar sabores locais, ou ainda sentir a
vibração da vizinhança.
• Limo
A cozinha nikkei é
hoje uma das mais cultuadas ao redor do mundo, em que a fusão entre o Peru e o
Japão nos concede refeições para lá de incríveis e saborosas.
E um dos melhores
pontos para apreciar essa bem-vinda mistura é no Limo, que nos serve sushi,
sashimi e ceviches em plena Plaza de Armas, com vistas diretas para a praça, a
Catedral de Cusco e a Igreja da Companhia de Jesus.
Para melhor
acompanhar, peça algum drinque autoral ou sucos refrescantes.
Cicciolina
Já uma escolha
tradicional em Cusco, o Cicciolina é um bar de tapas com menu tradicional mas
que se renova com cada prato do dia.
A casa, que fica no
segundo andar de um casarão colonial na Calle Palacio, tem ambientes
diferentes, como o do bar de tapas e do restaurante propriamente dito.
Da cozinha saem
ingredientes regionais que misturam tradição e toques modernos. São muitos
sabores experimentados pelos pratos e a dica é justamente essa: mergulhar de
cabeça – e boca! – nas combinações, texturas e gostos.
• Hotéis: luxo em construções históricas
Junto de seus templos,
de sua vibração e da gastronomia ímpar, Cusco ainda nos oferece uma cartela
hoteleira da mais alta qualidade. Interessante notar que muitos dos principais
hotéis da cidade ocupam edifícios históricos restaurados, que aliam história e
elegância às habitações modernas.
Um desses exemplos é o
Belmond Palacio Nazarenas, situado em um antigo convento do século 17. O pé
direito é original, com detalhes que remetem o tempo todo à cultura peruana e
seu passado: afrescos coloniais e pinturas emolduradas a ouro estão dispostas
pelo hotel.
São cerca de 55
quartos divididos em diferentes categorias, spa com tratamentos que utilizam
insumos locais e ainda a primeira piscina ao ar livre de Cusco. A cozinha serve
uma culinária peruana moderna com ervas e flores comestíveis cultivadas aqui
mesmo.
E uma novidade: Pía
León, chef por trás do Central, melhor restaurante da América Latina por cinco
vezes seguidas, e do Kjolle, ambos em Lima, é a diretora culinária do novo
Mauka, restaurante no hotel que visa a fartura da culinária cusquenha e seus
diversos produtos, desde as montanhas andinas até a floresta amazônica.
Outro dos hotéis em
locais históricos e que merece a menção é o Monasterio, também sob selo de
qualidade da Belmond.
Localizado em um
antigo mosteiro do século 16 a uma curta distância da Plaza de Armas, o
empreendimento brilha nossos olhos com jardins exuberantes, grandes paredes de
pedra e obras históricas.
Móveis em madeira
maciça juntos dos lençóis brancos marcam os quartos, assim como alguns
apartamentos dispõem de oxigênio suplementar para nos auxiliar contra os
efeitos das altas altitudes. Os restaurantes servem típica culinária peruana
com toques internacionais.
Mas uma das melhores
experiências gastronômicas acontece mesmo em uma espécie de capela do hotel: o
jantar neste espaço é uma das experiências oferecidas no hotel – e uma das mais
emocionantes que fiz na vida.
É tocante entrar em um
ambiente onde funcionários estão misteriosamente vestidos com roupas que os
cobrem dos pés às cabeças e adentrar um local adornado por santidades e
detalhes em ouro com dois cantores líricos cantando a plenos pulmões. Parece
uma cena saída diretamente da ficção.
Fonte: CNN Brasil
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