terça-feira, 29 de agosto de 2023

Centrão tentará manter chantagem a Lula por todo mandato

Mesmo após o desfecho da reforma ministerial, com a acomodação de Progressistas (PP) e Republicanos em ministérios e no segundo escalão, a percepção no governo é de que remanescerão focos de turbulência na Câmara dos Deputados, embora a expectativa seja de períodos mais longos de estabilidade.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) retornou nesse domingo do périplo pela África, e seu núcleo de articuladores políticos espera que ele finalmente resolva o impasse sobre o ingresso dos novos aliados na base nesta semana.

Uma fonte credenciada do Palácio do Planalto ouvida pelo Valor admitiu que não há expectativa de que as negociações no varejo com o grupo político do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), acabem quando as mudanças no primeiro escalão forem concluídas porque há medidas provisórias, projetos de lei relacionados ao arcabouço fiscal, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a lei orçamentária a serem votados até o fim do ano.

Articuladores políticos e auxiliares presidenciais acreditam que cada votação dessas matérias demandará uma delicada negociação por dois motivos. O primeiro deles é o sistema de pesos e contrapesos entre os Poderes, de modo que o Congresso não avalizará todos os pleitos do Executivo.

A segunda razão, entretanto, é que mesmo com a concessão de dois ministérios, além de postos no segundo escalão, para PP e Republicanos, ainda chegarão faturas do grupo de Lira em algumas votações, embora em menor escala.

Em contrapartida, há o sentimento de que o diálogo com a Câmara vai melhorar, e de que Lira tende a calibrar o estilo “morde e assopra” adotado desde a vitória de Lula, durante as articulações da proposta de emenda à Constituição (PEC) da transição.

O Valor apurou que Lira tem afirmado a interlocutores que, até o momento, nada foi pactuado. Mas tem assegurado que, no momento em que fizerem um acordo com o governo, será cumprido, eles estarão na base, e trabalharão pela estabilidade. “Não existe meio acordo, se tem acordo, é para ser cumprido”, tem dito Lira, segundo relatos de interlocutores.

Enquanto o acordo não se consuma, entretanto, continua o clima de insatisfação entre deputados do Centrão. Nos bastidores, Lira tem reiterado as críticas de que Lula reservou espaço muito melhor para as bancadas do Senado na Esplanada, e o quinhão da Câmara estaria desproporcional ao peso da Casa nas votações.

É nesse contexto de descontentamento que dois deputados do PP ouvidos pelo Valor, em condição de anonimato, avaliam que a nomeação do líder da bancada, André Fufuca (PP-MA), para o ministério a ser definido por Lula, não vai alterar o número de votos da legenda na Câmara. Alegam que os deputados de viés governista – majoritariamente dos Estados do Nordeste e Norte – já votam com o governo, enquanto os bolsonaristas não mudarão de posição.

Para esses correligionários de Lira, a cessão de um ministério para o PP contribuirá para o governo melhorar a interlocução com o presidente da Câmara. De outro lado, a Lira interessa o papel de principal interlocutor junto a Lula, que raramente se reporta diretamente aos líderes. Esse protagonismo garante a Lira manter-se no controle do processo sucessório na Câmara, e de seu grupo político.

Mesmo após o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, anunciar, publicamente, que Lula havia avalizado as indicações de Fufuca, do PP, e Silvio Costa Filho (PE), do Republicanos, para se tornarem ministros, os deputados continuam indóceis, aguardando a definição dos espaços.

Lira continuará influenciando as votações nas bancadas. No caso do PP, por exemplo, depois que Fufuca assumir o ministério, o novo líder da bancada deve ser o deputado Doutor Luizinho (PP-RJ), aliado de primeira hora de Lira. Para isso, ele deixaria o cargo de secretário de Saúde do Rio de Janeiro para atender à convocação do presidente da Câmara.

Nesse pano de fundo, é ilustrativo que os deputados tenham rejeitado a emenda do líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), ao projeto do novo arcabouço fiscal, que abriria espaço de R$ 32 bilhões no Orçamento para o governo.

Mesmo com os nomes dos ministros anunciados publicamente, o Centrão avisou o governo que não chancelaria a emenda. Diante da recusa, foi feito um acordo para que o tema volte a ser discutido no âmbito da LDO, que tem como relator o deputado Danilo Forte (União Brasil-CE). Ele tem perfil independente, mas é um dos parlamentares mais próximos de Lira.

PP e Republicanos têm contrariado o governo em votações pontuais recentes, em claro recado de insatisfação com a demora no desfecho da reforma ministerial. Na última semana, as duas siglas, e os demais partidos da base votaram para manter na pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) uma PEC que desagrada o governo. Trata-se da PEC do BNDES que prevê que empréstimos da instituição destinados a operações no exterior exigirão aval prévio do Congresso.

Simultaneamente, Arthur Lira tem investido na tática do “morde e assopra” nas votações estratégicas para o governo. Nos últimos dois meses, em meio à arrastada negociação com Lula, Lira dispara contra o governo, para em seguida, entrar em campo para amenizar o prejuízo.

Em junho, o Senado devolveu o texto revisado do novo arcabouço fiscal para a Câmara antes do recesso informal, mas o projeto não foi apreciado pelos deputados. Lira prometeu que levaria à votação tão logo os deputados retornassem a Brasília, o que não ocorreu.

Ao contrário, alegou que não havia acordo, e a votação quase não ocorre antes do prazo do envio da lei orçamentária, que é 31 de agosto, para aflição dos governistas. A proposta foi votada, mas os deputados não entregaram o que era prioridade para o governo: a emenda dos R$ 32 bilhões a mais no Orçamento.

Lira ainda derrubou duas medidas provisórias como recado para o governo de que não concorda com o uso indiscriminado da ferramenta, e demonstrou que nada avançará na Casa sem prévio acerto com ele e com os líderes.

Os deputados aprovaram as medidas provisórias do salário mínimo e da correção da tabela do Imposto de Renda, de ampla repercussão social. Mas deixaram caducar outras duas menos expressivas: uma delas sobre a retomada das obras na área de educação, e outra regulamentando mudanças no vale-refeição.

Em outro movimento, Lira excluiu da medida provisória o dispositivo sobre a taxação dos fundos “offshore”, exigindo que a matéria seja reenviada à Casa na forma de projeto de lei. O artigo é fundamental para compensar o Tesouro das perdas com a revisão da tabela do Imposto de Renda.

É fato que o governo derrapou ao enxertar o texto na MP sem prévia negociação com os líderes. Mas o novo projeto de lei da taxação dos fundos offshore demandará cuidadosa e paciente negociação para ser votado e aprovado no prazo desejado pela Fazenda.

Em outra frente, Lira instalou a comissão parlamentar de inquérito (CPI) que investiga o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). No entanto, revogou a convocação do ministro da Casa Civil, Rui Costa, para depor no colegiado, e ajudou na articulação para substituir os quadros radicais no colegiado.

Em novo movimento para tensionar o governo, Lira estimulou a fritura do ministro da Agricultura Carlos Fávaro, representante da bancada do PSD no Senado. A pasta da Agricultura esteve sob o comando do PP nos governos Michel Temer e Jair Bolsonaro.

Uma fonte do PSD disse ao Valor que Lira está fazendo o “jogo do poder”, “criando um problema que é maior para resolver outro problema”, que é a reforma ministerial. Mas esta fonte não acredita que Lula entre em rota de colisão com o PSD, diante da pressão de Lira. “O PSD é harmônico, não tem sentido Lula mexer com o partido”, afirmou, sobre a pasta da Agricultura migrar para o grupo de Lira.

 

       Centrão precisa mais de Lula que Lula do Centrão

 

Não se faz o que Lula está fazendo com o Centrão. Como um governo tão inclusivo, a ponto de ter incluído Cristiano Zanin no Supremo Tribunal Federal, retarda a inclusão do Centrão?

É falta de piedade. O Centrão depende para sobreviver de cargos no governo, muitos cargos, e da liberação de emendas ao Orçamento. Diz-se que a liberação corre solta. Se corre, não basta.

No próximo ano teremos eleições municipais. Serão milhares de cargos em disputa. Quem não encontra abrigo no governo federal concorre em desvantagem. É o que ensina a história.

Antigamente existia o voto de opinião. Candidatos se elegiam defendendo suas opiniões sobre qualquer coisa. Era o voto ideológico. Hoje, poucos se elegem assim. Política virou negócio.

O Centrão nasceu na Assembleia Nacional Constituinte de 1988. Nunca chegou ao Poder com um candidato próprio. Desistiu de ter um. Alia-se a quem possa chegar. É assim desde sempre.

Não discrimina, porém. Aliou-se à direita (Fernando Collor de Mello, Fernando Henrique Cardoso duas vezes). Aliou-se quatro vezes à esquerda (Lula e Dilma, embora tenha derrubado Dilma).

De novo aliou-se à direita (Michel Temer, para acabar com a Lava-Jato). E, por último, à extrema-direita. O Centrão gosta de golpe, é fato, mas prefere jogar dentro das quatro linhas da Constituição.

Mal Bolsonaro deu as costas, ou melhor: mal o Brasil deu as costas a Bolsonaro, o Centrão voltou-se para Lula, e à falta de votos no Congresso, Lula voltou-se para o Centrão.

Há um novo produto na praça: o Centrão de oposição ao governo, mas sensível aos apelos do governo. Oposição, sim, mas defensor intransigente “dos superiores interesses nacionais”

É essa posição (não confunda com oposição) que faz o Centrão aprovar projetos do governo, e uma vez que aprova, quer ser recompensado. Lula já entendeu, mas protela protela…

Pura maldade. O Centrão está com um pé na UTI. Porá os dois se Lula continuar viajando sem anunciar as prometidas mudanças no governo. Dizem que elas começarão nesta semana. A ver.

Dizem que os primeiros nomes do Centrão a assumirem ministérios serão os deputados federais André Fufuca, do PP do Maranhão, e Silvio Costa Filho, do Republicanos de Pernambuco.

O PP de Arthur Lira (AL), presidente da Câmara dos Deputados, e do senador Ciro Nogueira (PI), ex-chefe da Casa Civil do governo Bolsonaro? Exatamente. Que é que tem?

Republicanos, o partido do governador bolsonarista de São Paulo, Tarcísio de Freitas? Esse mesmo. Bolsonaro brigou com Tarcísio por causa da reforma tributária, mas os dois fizeram as pazes.

Mas, e se Lula resolver adiar outra vez a entrega de prebendas ao Centrão? Ele é bem capaz disso. Para quem já sofreu tanto na vida, fazer os outros sofrerem um pouquinho parece coisa natural.

Alguns líderes do Centrão somatizam os atrasos. Um está internado em um hospital de Brasília com dor na coluna. O outro espera ficar sozinho na sua sala para então andar capengando.

O PL de Valdemar da Costa Neto, partido de Bolsonaro, está cada vez mais impaciente. Tem votado ajudando o governo como pode, mas há limites para tudo. Os que são contra ajudar, reclamam.

O pastor evangélico e deputado bolsonarista Marco Feliciano (SP), por exemplo, está irritado. Escreveu em um grupo de WhatsApp:

“Precisamos de uma vez por toda saber o que, como partido, somos! Fica confuso ter que olhar orientação de partido e oposição!! PL é ou não oposição? A maioria não é oposição?”

É mais não, Feliciano. Tudo dependerá do valor das prebendas. Não esqueça que nas eleições presidenciais de 2002, em troca de 6 milhões de reais, o então partido de Valdemar apoiou Lula.

Como é, Lula? Ou dá ou desce.

 

       Novo ministro do Turismo vai desbolsonarizar a pasta

 

No cargo há pouco mais de um mês, o ministro do Turismo, Celso Sabino, traça as bases de um novo projeto que pretende atrair visitantes a Brasília para terem contato com símbolos nacionais dos quais o bolsonarismo se apossou. Fontes do Palácio do Planalto, ouvidas reservadamente, consideram que a proposta pode ajudar o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no esforço de reconquistar a identidade cívica nacional.

Segundo esses interlocutores, a ideia agradou ao núcleo do governo e até Lula mostrou interesse pelo projeto. O programa piloto, antecipado pelo ministro na entrevista ao Correio, publicada ontem, é chamado Turismo Cívico/Conheça a Capital Federal, e deve se combinar ao programa de passagens aéreas por R$ 200, anunciado, em março, pelo ministro dos Portos e Aeroportos, Márcio França. Também pode haver uma redução de até 50% nas diárias de hotéis, nos finais de semana, fora da alta temporada para fomentar o fluxo de visitantes à capital.

O programa privilegiará a utilização da atividade ociosa de aviões e hotéis nos finais de semana e, inicialmente, a ideia é trazer estudantes secundaristas, universitários e professores. Com o êxito da iniciativa, outros projetos da pasta devem apostar na ampliação do público para destinos no contrafluxo da alta temporada.

Para Manoel Linhares, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH), o projeto será fundamental para o setor, segundo ele o mais atingido pela pandemia da covid-19. “Estamos trabalhando em conjunto. A ideia surgiu das nossas conversas com o ministro. Vamos aguardar a parte aérea, mas estamos trabalhando junto com o ministério para conjugar a hotelaria ao programa das passagens baratas”, explicou.

Linhares acredita que a maioria dos mais de 30 mil estabelecimentos hoteleiros do país representados pela entidade devem aderir ao programa. Mas pondera que o número de quartos oferecidos em cada unidade deve variar conforme a realidade da média de ocupação de cada hotel ou pousada durante o ano.

Em conjunto com o projeto do turismo de “desbolsonarização”, que colocará Brasília como foco — sobretudo porque foi na capital federal que seguidores radicais do ex-presidente invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes, em 8 de janeiro —, o Ministério do Turismo também defendeu a criação de uma espécie de Lei Rouanet para o setor, com a concessão de isenções tributárias para as empresas que financiarem projetos turísticos.

Além dessa iniciativa, Sabino articula no Senado um espaço na reforma tributária para acomodar o setor nas exceções, incluindo as atividades turísticas nas menores tarifas do novo IVA (Imposto sobre Valor Agregado). Essa questão, porém, pode colocá-lo em rota de colisão com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que já se manifestou contrariamente à ampliação no rol de isenções tributárias ou de alíquotas de tributação menores.

 

Fonte: Valor Econômico/Metrópoles/Correio Braziliense

 

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