quinta-feira, 31 de agosto de 2023

Golpe de Estado no Gabão: Militares tomam poder e presidente deposto é preso

Um grupo de alta patente das Forças Armadas do Gabão anunciou um golpe de Estado nesta quarta-feira (30), em rede nacional. Eles alegaram fraude nas eleições gerais do país, que ocorreram no fim de semana e indicaram a vitória do atual presidente, Ali Bongo.

Bongo foi colocado em prisão domiciliar, disseram os militares, que também fecharam as fronteiras do país.

Em uma transmissão ao vivo na rede de televisão nacional, o grupo do alto escalão das Forças Armadas anunciou que:

  • Reivindica a tomada de poder;
  • Todas as instituições estatais, como o Senado e a Assembleia Nacional, estavam dissolvidas;
  • As fronteiras terrestres e áreas do país foram fechadas;
  • As eleições foram uma fraude e, portanto, estavam anuladas - no sábado (26), após o fechamento das urnas, o governo emitiu um toque de recolher noturno e cortou os serviços de internet de todo o país, o que levantou suspeitas e preocupações quanto à transparência no processo eleitoral.

"Em nome do povo gabonês, nós decidimos defender a paz e colocar um fim no regime atual", afirmaram os militares na televisão.

·         Eleições

Nas eleições realizadas no sábado, Ali Bongo Ondimba, que governa o país há 14 anos, foi reeleito com cerca de 64% dos votos para um terceiro mandato, segundo a autoridade eleitoral do país.

A família de Bongo governou a nação produtora de petróleo durante 56 anos - ou seja, quase todo o período pós independência da nação, que era colônia da França até 1960.

Após o anúncio do golpe, centenas de pessoas foram às ruas em tom de comemoração pela saída de Bongo do poder - vídeos nas redes sociais mostram celebrações nas ruas.

·         Repercussões

O chanceler da União Europeia, Josep Borrell, afirmou que acompanha o caso e que o bloco deve discutir a situação no Gabão.

"Se for confirmado, é um outro golpe militar que aumenta a instabilidade em toda a região", disse, acrescentando que a situação é um grande problema para a Europa.

O governo russo também falou sobre o golpe e se disse preocupado com a situação no país africano.

"Moscou recebeu com preocupação relatos de uma acentuada deterioração na situação interna no amigo país africano. Continuamos monitorando de perto o desenvolvimento da situação e esperamos por sua rápida estabilização", disse a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Maria Zakharova.

O país tem 2,3 milhões de habitantes, dos quais mais de 30% vivem em condição de pobreza.

·         Disputas na África

O Gabão fica África Central, na costa oeste do continente. Essa não é a primeira vez que o presidente do país sofre uma tentativa de golpe de Estado.

Em 2019, militares que tentaram tomar o poder acabaram sendo presos. À época, o governo determinou um toque de recolher na capital e cortou o acesso à internet.

Recentemente, outro país africano que enfrentou um golpe militar é o Niger. Uma junta militar tomou o poder no fim de julho. O país era uma das poucas democracias na região conhecida como Sahel, que abrange uma faixa do continente africano.

Além do Níger, Mali e Sudão também estão sob comando militar. Ambos os países têm atuação do Grupo Wagner, que é ligado à Rússia.

Especialistas afirmam que a África tem se tornado um campo de batalha entre a Rússia e o Ocidente, com disputa por influência na região do Sahel. Recursos naturais abundantes em alguns países africanos são um ponto importante no interesse pela região.

 

Ø  Chanceler da UE classifica situação no Gabão como 'grande problema' para a Europa

 

O diplomata espanhol Josep Borrell, Alto Representante da União Europeia para Assuntos Estrangeiros e a Política de Segurança, manifestou nesta quarta-feira (30/08) sua preocupação com os acontecimentos no Gabão, após uma reunião com os ministros de Defesa do bloco, realizada na cidade espanhola de Toledo.

O chanceler da União Europeia (UE) classificou o levante militar no Gabão como um “golpe de Estado, que aumentará a instabilidade em toda a região”, e lembrou de situações similares ocorridas em países africanos recentemente, como são os casos de Mali, Burkina Faso, República Centro-Africana e mais recentemente o Níger.

“Certamente, precisamos pensar mais profundamente sobre o que está a acontecer na região e tentar melhorar a nossa política em relação a estes países. Este é um grande problema para a Europa”, alertou Borrell.

A crise política no Gabão teve início nesta mesma quarta-feira, após o levante promovido por um grupo de altos oficiais militares que derrubou o governo do presidente Ali Bongo Ondimba, que governa desde 2009 e que foi reeleito recentemente para um terceiro mandato consecutivo – em eleições que, segundo os opositores e os grupos militares insurgentes, foram fraudadas.

Vale destacar que a família Bongo mantém o poder no Gabão há 55 anos: antes de Ali Bongo Ondimba, sei pai, Omar Bongo, governou o país por 42 anos, entre 1967 e 2009.

Curiosamente, o líder do levante é uma pessoa historicamente próxima ao clã Bongo: se trata do general Brice Oligui Nguema, comandante da Guarda Republicana Gabonesa desde 2020 e que iniciou sua carreira na corporação quando assumiu o cargo de ajudante de ordens do presidente Omar Bongo, nos Anos 2000.

Oligui é o líder provisório da junta militar que assumiu o poder no Gabão. Por sua parte, o presidente deposto, Bongo Ondimba, fez um apelo por ajuda internacional: “envio uma mensagem a todos os nossos amigos em todo o mundo para lhes dizer para fazerem barulho”, disse em um vídeo gravado no Palácio Presidencial.

 

Ø  Por que golpes militares são recorrentes no continente africano

 

Uma epidemia de golpes de Estado marca o continente africano, que desde 1952 registrou 98 bem-sucedidas tomadas de poder, moduladas por má gestão, corrupção e falência das instituições, entre outras mazelas que assolam seus países. O último golpe ocorreu nesta quarta-feira no Gabão, quando militares anunciaram a deposição de Ali Bongo, logo após declarar-se vitorioso numa eleição que lhe garantiria o terceiro mandato.

Pela primeira vez em 56 anos as forças armadas do Gabão se voltaram contra o regime comandado pela família Bongo, dissolvendo instituições e anulando as eleições, que foram denunciadas como fraudulentas pela oposição, sem observadores políticos ou cobertura da mídia.

Bongo herdou o poder do pai, Omar, há 14 anos. Seu principal adversário, o Albert Ondo Ossa, obteve 30% dos votos e liderou uma campanha que teve como slogan: “O Gabão não é propriedade dos Bongo.”

O panorama é recorrente no continente: militares interferem para depor ditadores ou dinastias longevas. Mas, em geral, a tomada de poder não resulta na prometida estabilidade política. Nos últimos três anos, oito países africanos, todos ex-colônias francesas, sofreram golpes de Estado.

No Chade, em 2021, uma junta militar interveio para assegurar a governança do general Mahamat Idriss Deby, após a morte do pai, Idriss, que governava o país há três décadas.

No Mali, um grupo de coronéis depôs o presidente Ibrahim Boubacar Keita e, após enfrentar protestos populares, cedeu o poder a um governo civil de transição, derrubado por um segundo golpe militar.

Níger era considerado uma espécie de oásis pelo Ocidente, parceiro no combate ao terrorismo promovido por jihadistas islâmicos, e recebeu vultuosa ajuda financeira dos EUA e da França.

Em julho passado, contudo, soldados prenderam o presidente Mohamed Bazoum em casa e instalaram uma junta militar para governar o país. O líder golpista, general Abdourahamane Tchiani, prometeu devolver o Níger a um governo civil em três anos.

Os sucessivos golpes em países que foram colonizados pela França expressam também uma disputa entre Ocidente e Rússia pela influência na África e o ressentimento contra a ex-colônia por apoiar alguns desses regimes.

No Níger, o presidente e aliado do Ocidente era, por outro lado, tachado de marionete. A tomada de poder foi seguida por protestos populares e ataques à embaixada francesa. Em Burkina Faso, o governo militar que depôs em janeiro de 2022 o presidente Roch Kabore encerrou um acordo que permitia às tropas francesas operarem no país.

Assim, a raiva popular contra o legado colonial da França foi atribuída como um fator encorajador para que os militares agissem e a usassem como justificativa aos golpes em série promovidos nesses países.

 

Ø  Sete golpes de Estado em três anos na África; relembre

 

A África foi testemunha de sete golpes de Estado desde agosto de 2020. O mais recente deles foi nesta quarta-feira (30) no Gabão.

Um grupo de alta patente das Forças Armadas do Gabão anunciou um golpe de Estado, em rede nacional. Eles alegaram fraude nas eleições gerais do país, que ocorreram no fim de semana e indicaram a vitória do atual presidente, Ali Bongo.

Bongo foi colocado em prisão domiciliar, disseram os militares, que também fecharam as fronteiras do país.

>>> Relembre abaixo os outros golpes:

·         Níger

O regime militar que surgiu de um golpe de Estado no Níger formou um governo, informa um decreto assinado pelo novo homem forte do país, o general Abdourahamane Tiani, lido na televisão nacional durante a madrugada de 10 de agosto.

O governo, anunciado pouco antes de uma reunião de cúpula crucial nesta quinta-feira em Abuja (Nigéria) entre os países vizinhos do Níger na região da África Ocidental, é liderado pelo primeiro-ministro Ali Mahaman Lamine Zeine.

O novo Executivo inclui 20 ministros: os titulares da Defesa e do Interior são generais do Conselho Nacional para a Salvaguarda da Pátria (CNSP) que tomou o poder.

O novo governo marca a consolidação do regime militar desde que derrubou, em 26 de julho, o presidente eleito Mohamed Bazoum, detido desde então.

A formação do gabinete coincide com uma reunião da Comunidade Econômica de Estados da África Ocidental (Cedeao) em Abuja, que pretende tomar "decisões importantes", segundo o bloco regional.

A organização reiterou a preferência pela via diplomática para "restabelecer a ordem constitucional" no Níger, mas não descartou o uso da força.

·         Burkina Faso: dois golpes em 8 meses

Em 24 de janeiro de 2022, o presidente Roch Marc Christian Kaboré foi expulso do poder pelos militares. O tenente coronel Paul Henri Sandaogo Damiba se tornou presidente em fevereiro.

Em 30 de setembro, Damiba foi destituído pelos militares e o capitão Ibrahim Traoré foi nomeado presidente de transição até as eleições presidenciais, previstas para julho de 2024.

·         Sudão

Em 25 de outubro de 2021, os militares liderados pelo general Abdel Fatah al Burhan expulsaram os líderes civis de transição, que supostamente lideravam o país para a democracia depois de 30 anos de ditadura de Omar al Bashir, destituído em 2019.

Desde 15 de abril de 2023, uma guerra provocada por uma luta de poder entre o general Burhan e seu ex-número dois Mohamed Hamdan Daglo causou ao menos 5.000 mortos no país.

·         Guiné

Em 5 de setembro de 2021, o presidente Alpha Condé foi deposto por um golpe militar. Em 1º de outubro, o coronel Mamady Doumbouya tornou-se presidente.

Os militares prometeram devolver o poder aos civis eleitos até o final de 2024.

·         Mali: dois golpes de Estado em 9 meses

Em 18 de agosto de 2020, o presidente Ibrahim Boubacar Keita foi deposto por militares e em outubro se formou um governo de transição.

Mas em 24 de maio de 2021, os militares prenderam o presidente e o primeiro-ministro.

Em junho, o coronel Assimi Goita tomou posse como presidente de transição.

A junta se comprometeu a devolver o poder aos civis depois das eleições, previstas para fevereiro de 2024.

 

Fonte: g1/Opera Mundi

 

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