Golpe de Estado no Gabão: Militares tomam poder e presidente deposto é
preso
Um grupo de alta patente das Forças Armadas
do Gabão anunciou um golpe de Estado nesta quarta-feira (30), em rede
nacional. Eles alegaram fraude nas
eleições gerais do país, que ocorreram no fim de semana e indicaram
a vitória do atual presidente, Ali
Bongo.
Bongo foi colocado em prisão domiciliar, disseram
os militares, que também fecharam as fronteiras do país.
Em uma transmissão ao vivo na rede de televisão
nacional, o grupo do alto escalão das Forças Armadas anunciou que:
- Reivindica a tomada de poder;
- Todas as instituições estatais, como o Senado e a Assembleia
Nacional, estavam dissolvidas;
- As fronteiras terrestres e áreas do país foram fechadas;
- As eleições foram uma fraude e, portanto, estavam anuladas - no
sábado (26), após o fechamento das urnas, o governo emitiu um toque de recolher noturno e cortou os serviços de
internet de todo o país, o que levantou suspeitas e
preocupações quanto à transparência no processo eleitoral.
"Em nome do povo gabonês, nós decidimos
defender a paz e colocar um fim no regime atual", afirmaram os militares
na televisão.
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Eleições
Nas eleições realizadas no sábado, Ali Bongo
Ondimba, que governa o país há 14 anos, foi reeleito com cerca de 64% dos votos
para um terceiro mandato, segundo a autoridade eleitoral do país.
A família de Bongo governou a nação produtora de
petróleo durante 56 anos - ou seja, quase todo o período pós independência da
nação, que era colônia da França até 1960.
Após o anúncio do golpe, centenas de pessoas foram
às ruas em tom de comemoração pela saída de Bongo do poder - vídeos nas redes
sociais mostram celebrações nas ruas.
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Repercussões
O chanceler da União Europeia, Josep Borrell,
afirmou que acompanha o caso e que o bloco deve discutir a situação no Gabão.
"Se for confirmado, é um outro golpe militar
que aumenta a instabilidade em toda a região", disse, acrescentando que a
situação é um grande problema para a Europa.
O governo russo também falou sobre o golpe e se
disse preocupado com a situação no país africano.
"Moscou recebeu com preocupação relatos de uma
acentuada deterioração na situação interna no amigo país africano. Continuamos monitorando de perto o
desenvolvimento da situação e esperamos por sua rápida estabilização",
disse a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Maria Zakharova.
O país tem 2,3 milhões de habitantes, dos quais
mais de 30% vivem em condição de pobreza.
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Disputas na África
O Gabão fica África Central, na costa oeste do
continente. Essa não é a primeira vez que o presidente do país sofre uma
tentativa de golpe de Estado.
Em 2019, militares
que tentaram tomar o poder acabaram sendo presos. À época, o governo determinou um toque de recolher na capital e
cortou o acesso à internet.
Recentemente, outro país africano que enfrentou
um golpe militar é o Niger. Uma junta militar tomou o
poder no fim de julho. O país era uma das poucas democracias na região
conhecida como Sahel, que abrange uma faixa do continente africano.
Além do Níger, Mali e Sudão também estão sob
comando militar. Ambos os países têm atuação do Grupo Wagner, que é ligado à
Rússia.
Especialistas afirmam que a África tem se tornado
um campo de batalha entre a Rússia e o Ocidente, com disputa por influência na
região do Sahel. Recursos naturais abundantes em alguns países africanos são um
ponto importante no interesse pela região.
Ø Chanceler da UE classifica situação no Gabão como 'grande problema'
para a Europa
O diplomata espanhol Josep Borrell, Alto
Representante da União Europeia para Assuntos Estrangeiros e a Política de
Segurança, manifestou nesta quarta-feira (30/08) sua preocupação com os acontecimentos no Gabão, após uma reunião com os ministros de Defesa do bloco, realizada na
cidade espanhola de Toledo.
O chanceler da União Europeia (UE) classificou o
levante militar no Gabão como um “golpe de Estado, que aumentará a
instabilidade em toda a região”, e lembrou de situações similares ocorridas em
países africanos recentemente, como são os casos de Mali, Burkina Faso,
República Centro-Africana e mais recentemente o Níger.
“Certamente, precisamos pensar mais profundamente
sobre o que está a acontecer na região e tentar melhorar a nossa política em
relação a estes países. Este é um grande problema para a Europa”, alertou
Borrell.
A crise política no Gabão teve início nesta mesma
quarta-feira, após o levante promovido por um grupo de altos oficiais militares
que derrubou o governo do presidente Ali Bongo Ondimba, que governa desde 2009
e que foi reeleito recentemente para um terceiro mandato consecutivo – em
eleições que, segundo os opositores e os grupos militares insurgentes, foram
fraudadas.
Vale destacar que a família Bongo mantém o poder no
Gabão há 55 anos: antes de Ali Bongo Ondimba, sei pai, Omar Bongo, governou o
país por 42 anos, entre 1967 e 2009.
Curiosamente, o líder do levante é uma pessoa
historicamente próxima ao clã Bongo: se trata do general Brice Oligui Nguema,
comandante da Guarda Republicana Gabonesa desde 2020 e que iniciou sua carreira
na corporação quando assumiu o cargo de ajudante de ordens do presidente Omar
Bongo, nos Anos 2000.
Oligui é o líder provisório da junta militar que
assumiu o poder no Gabão. Por sua parte, o presidente deposto, Bongo Ondimba, fez um apelo por
ajuda internacional: “envio uma mensagem a todos os nossos amigos em
todo o mundo para lhes dizer para fazerem barulho”, disse em um vídeo gravado
no Palácio Presidencial.
Ø Por que golpes militares são
recorrentes no continente africano
Uma epidemia de golpes de Estado marca o continente
africano, que desde 1952 registrou 98 bem-sucedidas tomadas de poder, moduladas
por má gestão, corrupção e falência das instituições, entre outras mazelas que
assolam seus países. O último
golpe ocorreu nesta quarta-feira no Gabão, quando militares anunciaram a deposição de
Ali Bongo, logo após declarar-se vitorioso numa eleição que
lhe garantiria o terceiro mandato.
Pela primeira vez em 56
anos as forças armadas do Gabão se voltaram contra o
regime comandado pela família Bongo, dissolvendo instituições e anulando as eleições, que foram
denunciadas como fraudulentas pela oposição, sem observadores políticos ou
cobertura da mídia.
Bongo herdou o poder do pai, Omar, há 14 anos. Seu
principal adversário, o Albert Ondo Ossa, obteve 30% dos votos e liderou uma
campanha que teve como slogan: “O Gabão não é propriedade dos Bongo.”
O panorama é recorrente no continente: militares interferem para depor ditadores ou
dinastias longevas. Mas, em geral, a tomada de poder não resulta na
prometida estabilidade política. Nos últimos três anos, oito países
africanos, todos ex-colônias francesas, sofreram golpes de Estado.
No Chade, em 2021, uma junta militar interveio para assegurar a governança do
general Mahamat Idriss Deby, após
a morte do pai, Idriss, que governava o país há três décadas.
No Mali, um
grupo de coronéis depôs o presidente Ibrahim Boubacar Keita e, após
enfrentar protestos populares, cedeu o poder a um governo civil de transição,
derrubado por um segundo golpe militar.
O Níger era considerado uma espécie de oásis pelo Ocidente, parceiro no combate ao terrorismo promovido
por jihadistas islâmicos, e recebeu vultuosa ajuda financeira dos EUA e
da França.
Em julho passado, contudo, soldados prenderam o presidente Mohamed
Bazoum em casa e instalaram uma junta militar para governar o país. O
líder golpista, general Abdourahamane Tchiani, prometeu devolver o Níger a um
governo civil em três anos.
Os sucessivos golpes em países que foram
colonizados pela França expressam
também uma disputa entre Ocidente e Rússia pela influência na África e
o ressentimento contra a ex-colônia por apoiar alguns desses regimes.
No Níger, o presidente e
aliado do Ocidente era, por outro lado, tachado de marionete. A tomada de poder foi seguida por protestos populares e ataques à
embaixada francesa. Em Burkina Faso, o governo militar que depôs em janeiro de 2022 o presidente Roch
Kabore encerrou um acordo que permitia às tropas francesas operarem no país.
Assim, a
raiva popular contra o legado colonial da França foi atribuída como um fator
encorajador para que os militares agissem e a usassem como
justificativa aos golpes em série promovidos nesses países.
Ø Sete golpes de Estado em três anos na África; relembre
A África foi testemunha de sete golpes de Estado
desde agosto de 2020. O mais recente deles foi nesta quarta-feira (30) no
Gabão.
Um grupo de alta patente das Forças Armadas do
Gabão anunciou um golpe de Estado, em rede nacional. Eles alegaram fraude nas
eleições gerais do país, que ocorreram no fim de semana e indicaram a vitória
do atual presidente, Ali Bongo.
Bongo foi colocado em prisão domiciliar, disseram
os militares, que também fecharam as fronteiras do país.
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Relembre abaixo os outros golpes:
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Níger
O regime militar que surgiu de um golpe de Estado
no Níger formou um governo, informa um decreto assinado pelo novo homem forte
do país, o general Abdourahamane Tiani, lido na televisão nacional durante a
madrugada de 10 de agosto.
O governo, anunciado pouco antes de uma reunião de
cúpula crucial nesta quinta-feira em Abuja (Nigéria) entre os países vizinhos
do Níger na região da África Ocidental, é liderado pelo primeiro-ministro Ali Mahaman
Lamine Zeine.
O novo Executivo inclui 20 ministros: os titulares
da Defesa e do Interior são generais do Conselho Nacional para a Salvaguarda da
Pátria (CNSP) que tomou o poder.
O novo governo marca a consolidação do regime
militar desde que derrubou, em 26 de julho, o presidente eleito Mohamed Bazoum,
detido desde então.
A formação do gabinete coincide com uma reunião da
Comunidade Econômica de Estados da África Ocidental (Cedeao) em Abuja, que
pretende tomar "decisões importantes", segundo o bloco regional.
A organização reiterou a preferência pela via
diplomática para "restabelecer a ordem constitucional" no Níger, mas
não descartou o uso da força.
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Burkina Faso: dois golpes em
8 meses
Em 24 de janeiro de 2022, o presidente Roch Marc
Christian Kaboré foi expulso do poder pelos militares. O tenente coronel Paul
Henri Sandaogo Damiba se tornou presidente em fevereiro.
Em 30 de setembro, Damiba foi destituído pelos
militares e o capitão Ibrahim Traoré foi nomeado presidente de transição até as
eleições presidenciais, previstas para julho de 2024.
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Sudão
Em 25 de outubro de 2021, os militares liderados
pelo general Abdel Fatah al Burhan expulsaram os líderes civis de transição,
que supostamente lideravam o país para a democracia depois de 30 anos de ditadura
de Omar al Bashir, destituído em 2019.
Desde 15 de abril de 2023, uma guerra provocada por
uma luta de poder entre o general Burhan e seu ex-número dois Mohamed Hamdan
Daglo causou ao menos 5.000 mortos no país.
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Guiné
Em 5 de setembro de 2021, o presidente Alpha Condé
foi deposto por um golpe militar. Em 1º de outubro, o coronel Mamady Doumbouya
tornou-se presidente.
Os militares prometeram devolver o poder aos civis
eleitos até o final de 2024.
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Mali: dois golpes de Estado
em 9 meses
Em 18 de agosto de 2020, o presidente Ibrahim
Boubacar Keita foi deposto por militares e em outubro se formou um governo de
transição.
Mas em 24 de maio de 2021, os militares prenderam o
presidente e o primeiro-ministro.
Em junho, o coronel Assimi Goita tomou posse como
presidente de transição.
A junta se comprometeu a devolver o poder aos civis
depois das eleições, previstas para fevereiro de 2024.
Fonte: g1/Opera Mundi
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