quinta-feira, 31 de agosto de 2023

Golpistas acampados queria atacar equipe de transição de Lula

A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) fez um monitoramento diário da movimentação nos dois meses que durou o acampamento golpista montado em frente ao Quartel General do Exército, em Brasília, após o segundo turno das eleições do ano passado. Relatórios produzidos pelo órgão apontam que, no período, o grupo planejou realizar uma “vigília” contra a equipe de transição do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, tentou mudar a localização das barracas para as imediações do Palácio da Alvorada e, em algumas ocasiões, se desentendeu sobre estratégias de atuação.

Um alerta emitido pela Abin no dia 7 de novembro informava sobre uma mobilização para o grupo ir até o Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), a cerca de 20 quilômetros do QG do Exército, onde estava acampado, protestar contra futuros integrantes do governo eleito. Naquele momento, o local estava sendo preparado para receber a equipe de Lula. “Circula em aplicativos de mensageria e redes sociais convocação para realização de ato sob o mote de ‘vigília de boas vindas’ contra a equipe de transição do governo, instalada no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). O objetivo seria realizar o ato diariamente durante todo o período de transição”, diz trecho do relatório.

Na ocasião, a segurança no CCBB foi reforçada com o efetivo da Polícia Militar e vistorias semanais do esquadrão anti-bombas da Polícia Federal. Nenhum protesto foi registrado.

Os informes da Abin começaram em 1º de novembro de 2022, no dia seguinte ao segundo turno das eleições. Na ocasião, os agentes registraram a presença de “veículos motorhome, infraestrutura de barracas e toldos” na região do QG do Exército. “Não há previsão de desmobilização do protesto”, apontou a Abin.

Durante o monitoramento, os oficiais da agência de inteligência identificaram uma série de rixas internas entre os acampados. Uma delas ocorreu a quatro dias da posse de Lula, no dia 28 de dezembro, quando uma parte dos manifestantes queria ocupar a Esplanada dos Ministérios, o que poderia afetar a organização da cerimônia que simboliza o início do novo governo. A discussão, segundo a Abin, acabou em confusão “Houve um princípio de tumulto em razão da presença de indivíduo contrário ao acampamento no local. Ele foi expulso por pessoas que fazem segurança velada da manifestação”, diz o informe. Sem acordo, eles permaneceram em frente ao QG do Exército.

Um mês antes, em 29 de novembro, outras divergências foram anotadas pela Abin. Um grupo de 50 pessoas foi para a frente do Ministério da Justiça pedir o “estabelecimento de Garantia da Lei e da Ordem (GLO)”. “Há divergências de posicionamento quanto à realização da marcha, o que tende a limitar o seu alcance. Parte dos manifestantes concentrados no QGE critica a ação e solicita que o protesto permaneça nas proximidades do QGE”, acrescenta outro alerta.

No dia da cerimônia de diplomação de Lula no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 12 de dezembro, o órgão de inteligência acompanhou o passo a passo da movimentação do grupo. Apontou que os manifestantes estavam “divididos” sobre ir ao Alvorada ou à Esplanada dos Ministérios para protestar contra o petista. “Manifestantes acampados no QG estão divididos sobre deslocamento. Parte do grupo planeja ir para Esplanada. Outro grupo pretende se juntar aos que estão desde a noite anterior no Palácio do Alvorada. Um terceiro grupo planeja ir para o Tribunal Superior Eleitoral”, diz o alerta.

Durante o dia, a cerimônia de diplomação de Lula ocorreu sem incidentes. A maioria dos acampados no QG foi ao Alvorada, “onde aguarda pronunciamento do atual presidente da República”. “Aproximadamente mil pessoas no local”.

À noite, contudo, parte do grupo se dirigiu até a sede da Polícia Federal para protestar contra a prisão de um indígena apoiador de Bolsonaro que frequentava o acampamento. Lá, eles ganharam o reforço de um efetivo extra que saiu do QG.

“Sete ônibus saindo agora do QGE em direção à Polícia Federal. Desses, três já saíram. Com indígenas e não indígenas, além de algumas caminhonetes”, diz o alerta da Abin emitido no dia. Os informes seguintes relatam as cenas de destruição vistas no centro de Brasília naquele dia, que envolveu o incêndio de carros e ônibus, tentativa de invasão ao prédio da PF e quebra de vidraças de uma delegacia.

Em um relatório de inteligência de 13 de dezembro do ano passado, o órgão afirmou em suas “considerações finais” que o acampamento estava “relacionado” a “incidentes violentos” ocorridos em Brasília que poderiam “inspirar” novos conflitos.

“Os incidentes violentos observados em Brasília estariam relacionados à dinâmica própria da organização da manifestação em frente ao QGE, com grupos heterogêneos divergindo sobre a orientação do movimento, e foram deflagrados após prisão de liderança do acampamento. Até o momento não há indicativo de que novos atos violentos estejam sendo organizados. No entanto, a efetividade das ações simultâneas e difusas na área central da capital federal, dificultando a capacidade de resposta estatal, pode inspirar manifestantes mais exaltados a adotar novamente táticas semelhantes de confrontos”, diz o documento.

 

       Cabo extremista lotado no Comando do Exército ameaçava a posse de Lula

 

Em 1º de dezembro passado, a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) produziu um relatório sobre “ameaças extremistas à transição de governo” e o enviou para o gabinete de transição chefiado pelo hoje vice-presidente da República Geraldo Alckmin (PSB). Entre outros itens, o documento alertava quanto à presença de um militar extremista com “conhecimento de fabricação de explosivos” em um dos locais mais estratégicos das Forças Armadas: o Gabinete do Comandante do Exército em Brasília (DF).

O indivíduo em questão era o cabo do Exército Pedro Henrique Santana Brandão, que, de acordo com a Abin, era ligado ao grupo extremista Defesa da Ordem e do Progresso (DOP) – que defendia a “revolução armada no Brasil por meio da prática de atos violentos, como sequestros ou assassinatos, contra a classe política”.

À Agência Pública, o Centro de Comunicação Social do Exército informou que, à época da produção do relatório de inteligência, Brandão estava, de fato, lotado no Gabinete do Comandante da força, posto que ocupou até o último dia 28 de fevereiro, quando foi “licenciado das fileiras do Exército”. O motivo da licença, no entanto, não foi revelado.

De acordo com a Abin, ele divulgava sua proximidade ao Comando do Exército, o que poderia destacá-lo em meio ao grupo de extremistas. Na foto que o identifica no relatório obtido pela reportagem, ele veste farda.

“Nas reuniões do grupo [extremista DOP] realizadas virtualmente, Pedro Brandão demonstra liderança, conduz as conversas e tem cobrado comprometimento e objetividade dos membros”, relatava a agência de inteligência ao gabinete de transição, que também foi informado que este mesmo militar defendia que seu grupo conseguisse “recursos financeiros por meios ilícitos” para realizar seus objetivos antidemocráticos.

Na avaliação da Abin, Brandão representava nível “médio” de ameaça graças a seu “acesso e/ou competência com armas de fogo e/ou explosivos”, “envolvimento recente em atividades extremistas”, “ameaças a figuras políticas ou instituições estatais no contexto político eleitoral” e “discurso radicalizado e/ou de apoio à ação violenta com fins ideológicos, incluindo a presença em grupos com objetivos extremistas”.

Entre os outros extremistas que compõem o DOP, na avaliação da inteligência, cinco representavam risco “médio” e um teve seu nível de ameaça categorizado como “alto” por ser o “membro mais radicalizado” e já ter defendido que fossem realizados “atos violentos” nas cidades dos integrantes, espalhadas em estados como Rio de Janeiro, Santa Catarina, Goiás, Mato Grosso e Paraná.

Vale lembrar que a Pública foi a primeira a revelar, no último dia 21 de agosto, como a Abin avaliava que as eleições de 2022 trouxeram um elemento novo ao caldeirão político brasileiro – no caso, o envolvimento de grupos supremacistas e neonazistas em pautas políticas e manifestações.

Segundo outro relatório, produzido no último dia 28 de dezembro, “adeptos de movimentos de deslegitimização (sic) do Estado, de supremacismo branco e neonazismo” passaram a constituir “os vetores mais prováveis de ameaças extremistas ideologicamente motivadas no contexto da posse presidencial” de Lula.

 

       Relatora expõe conversas golpistas de ex-comandante da PMDF

 

A senadora Eliziane Gama (PSD-MA), relatora da Comissão Mista Parlamentar de Inquérito (CPMI) do 8 de janeiro, expôs, ontem, um áudio de teor golpista, compartilhado por Fábio Augusto Vieira, ex-comandante da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF), às vésperas do segundo turno das eleições presidenciais de 2022. O policial presta depoimento nesta manhã no colegiado. 

No áudio compartilhado por Vieira com outros integrantes da PMDF, o autor afirma que “Bolsonaro está preparado com o Exército para fazer a mesma coisa que aconteceu em 1964”. A mensagem, como reforçou a relatora da comissão, é manipulada. Trata-se de uma montagem com diversas falas de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) sendo, portanto, falsa, e golpista.  

Eliziane Gama disse que o fato do áudio ter sido compartilhado mostra que  existia, dentro da PMDF, uma possível conivência com os atos que se sucederam poucos meses: a depredação dos prédios dos três Poderes. “O senhor fazia esse compartilhamento desse áudios editados, áudios fakes, sendo transferidos por membros do alto-escalão da Polícia Militar de Brasília”, afirmou a parlamentar.

Em seguida, ela também perguntou ao ex-comandante se “existia um clima golpista na PMDF”, mas o depoente decidiu ficar em silêncio a todos os questionamentos feitos pelo colegiado.

•        Tentativa de golpe

Além do áudio, a relatora da CPMI ainda mostrou um quadro enviado pelo coronel Marcelo Casimiro para Fábio Augusto Vieira, em que o militar explica “supostas alternativas à sucessão presidencial”. “As mensagens clamavam que as intervenções seriam para atender a um pedido do povo, para que as Forças Armadas tomassem as ruas”, disse Eliziane Gama.

Nesta mensagens, são citados o artigo 142 da Constituição, a Intervenção Militar e, posteriormente, uma Intervenção Federal. A parlamentar afirmou que Casimiro disse que as alternativas eram “uma explicação, de fato, interessante”. 

Eliziane Gama revelou outras mensagens trocadas entre Vieira e Casimiro, inclusive sobre as urnas eletrônicas. Em uma dessas conversas, em que se falava sobre um possível relatório emitido pelas Forças Armadas sobre uma suposta fraude nas urnas, que teriam resultado na vitória do então candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o ex-comandante respondeu dizendo: “a cobra vai fumar”.

“O conteúdo [das mensagens] não servirá para comprovar nada, mas servirá para acirrar os ânimos e provocar explicações”, teria dito Casimiro ao depoente, em uma das mensagens compartilhadas entre os dois. Para a senadora, essas mensagens e fotografias do dia 8 de janeiro, que mostram policiais parados enquanto manifestantes subiam a rampa do Congresso, demonstram que houve um planejamento da PMDF para que o esquema de segurança na data “desse errado”. 

 

       Bolsonarista alvo da PF insinua ameaça

 

Um dia após a Polícia Federal deflagrar nova fase da Operação Lesa Pátria, que realizou mandados de busca e apreensão contra o deputado estadual Amauri Ribeiro (União Brasil-GO), o perfil do parlamentar fez duas publicações no Instagram. Ontem, o celular do parlamentar foi apreendido pela corporação e, de acordo com a defesa, ainda não foi devolvido.

Amauri Ribeiro é ex-prefeito de Piracanjuba, no interior de Goiás e, segundo a PF, a 15ª fase da Lesa Pátria investiga os crimes de “abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado, associação criminosa, incitação ao crime, destruição e deterioração ou inutilização de bem especialmente protegido e crimes da lei de terrorismo”.

As ações foram autorizadas pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. A PF vasculhou endereços ligados ao parlamentar em Goiânia e Piracanjuba.

Um dia após a operação, o perfil de Amauri Ribeiro no Instagram fez duas postagens. A primeira traz uma mensagem: ‘Olhe para cima, que é de lá que vem tua força!’. Na segunda publicação, Amauri Ribeiro publica o discurso do parlamentar Fred Rodrigues (Democracia Cristã), em que o colega da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego) diz que o caso é “perseguição política”. Nas postagens, Ribeiro usa sempre o bordão “Tá dado o recado!”.

Ontem, após a operação da Polícia Federal, o advogado Demóstenes Torres, que defende o parlamentar, informou que “pedirá acesso aos autos que originaram a medida cautelar de busca e apreensão”. O parlamentar prestou depoimento à PF na tarde desta terça-feira e “continuará ao dispor para qualquer outro esclarecimento”, segundo a defesa. Ainda segundo Torres, o celular só será devolvido “depois de periciado”.

Em junho deste ano, Ribeiro fez um discurso na Alego no qual admitia ter ajudado financeiramente o acampamento e que, por essa lógica, “também deveria estar preso”. Em sua fala, ele defendia a liberdade do coronel Benito Franco, preso pela PF durante outra fase da Lesa Pátria. O policial militar, que comandou a Rotam entre janeiro de 2019 e agosto de 2021, foi liberado dois meses depois.

— A prisão do coronel Franco é um tapa na cara de cada cidadão de bem neste estado. Foi preso sem motivo algum, sem ter feito nada. Eu também deveria estar preso. Eu ajudei a bancar quem estava lá. Pode me prender, eu sou um bandido, eu sou um terrorista, eu sou um canalha, na visão de vocês. Eu ajudei, levei comida, levei água e dei dinheiro — disse Ribeiro, no plenário.

Após a repercussão negativa das declarações, o parlamentar recuou e disse que as suas falas foram “retiradas de contexto com o claro e evidente objetivo de associar sua imagem aos atos criminosos que aconteceram em Brasília”. Na visão dele, o acampamento golpista não tinha relação com as invasões e depredações de 8 de janeiro, das quais ele disse discordar.

Em uma entrevista à Rádio Bandeirantes, ele afirmou que “não seria idiota de falar um absurdo desses”.

Ribeiro tem uma trajetória política marcada por polêmicas. Em 2019, Amauri viralizou nas redes sociais ao tomar posse com a mulher sentada no seu colo. Quando era vereador, partiu para cima de um colega da oposição que tinha deficiência física porque discordou de sua fala, que denunciava funcionários-fantasmas na prefeitura. Em outra ocasião, agrediu um homem numa obra, quando soube que a “peãozada” não estava recebendo. No meio do mandato de prefeito, ele ainda deu uma surra na filha de 16 anos — que denunciou o caso à polícia — ao flagrar no celular dela fotos íntimas do namorado.

 

Fonte: O Globo/Agencia Pública/Correio Braziliense

 

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