Com mais de R$73 milhões em multas, fazendeiros frustram operação do
Ibama na Amazônia
“Uma clara confiança na impunidade.” Assim resume
um relatório do Ibama ao descrever a atuação de um grupo de empresários que há
15 anos recebe multas por desmatamento e por desrespeitar embargos, criando
gado em pastos considerados ilegais no sul do Amazonas. Na região, que desde
2016 vem despontando no ranking do desmatamento da Amazônia, fazendas acumulam
pilhas de infrações ambientais e seus proprietários respondem a processos
judiciais – acusados de desmatar, desrespeitar embargos ou impedir a
regeneração de mais de 70 quilômetros quadrados de floresta para dar lugar a
seus rebanhos de gado.
Em abril, o Ibama montou uma operação para
apreender 2.324 animais de uma das fazendas consideradas irregulares do grupo.
O plano do órgão ambiental era doar para programas sociais a carne dos bois que
estivessem prontos para o abate e encaminhar as vacas e bezerros para o curso
de veterinária da Universidade Federal de Rondônia (Unir).
Mas um dos homens que se declaram proprietário da
área recorreu à Justiça e conseguiu uma decisão favorável que impossibilitou a
ação do órgão ambiental.
A Agência Pública acompanhou a operação do Ibama e
detalha nesta reportagem as dificuldades enfrentadas pelo órgão para combater o
desmatamento. Um pecuarista e um grupo de empresários capixabas ligados à área
são réus em seis ações civis públicas do Ministério Público Federal (MPF) por
dano ambiental e receberam 53 multas que somam mais de R$ 73 milhões. De acordo
com infrações ambientais registradas pelo Ibama, eles seriam responsáveis pelo
desmatamento ou impedimento de regeneração de 70,6 quilômetros de floresta na Amazônia,
entre 2007 e 2023.
• Como
gato e rato: Ibama e os desmatadores
Era perto das 23 horas quando o fiscal do Ibama
posicionou o drone para alçar voo. Na noite úmida que envolvia o entorno do
quilômetro 180 da rodovia Transamazônica, o agente ambiental se preparava para
monitorar o rebanho de mais de 5 mil cabeças de gado que pastava em uma área
embargada. “Tá vendo? Agora o movimento está normal. Parece que não tem ninguém
abrindo porteira para o gado fugir”, comentou, indicando as dezenas de vacas e
bois espalhados pelo terreno que, antes de ser desmatado ilegalmente, era
coberto de floresta amazônica.
Ao lado de um policial que empunhava um fuzil, o
agente ambiental tentava varrer com o drone os cerca de 30 quilômetros
quadrados de pastos formados mesmo depois de diversas autuações e embargos do
Ibama apontando a ocorrência de crimes ambientais. O fiscal fazia a primeira
ronda da noite e perto das 3 horas da manhã repetiria o procedimento. O
monitoramento noturno tinha motivo: dois dias antes, os fiscais ambientais
haviam notado uma movimentação estranha no gado que vigiavam. “Suspeitamos que
o fazendeiro quer atrapalhar nosso trabalho aqui, mandando funcionários
soltarem à noite o gado que apreendemos”, explicou à Pública Odir Batista,
agente do Ibama.
Naquela noite, 28 de abril, o clima não era de
otimismo entre os 32 agentes públicos que dormiam acampados na fazenda União
Santo Antônio – Figueira, uma das maiores de criação de gado em Santo Antônio
do Matupi, distrito de Manicoré, no sul do Amazonas. Já fazia 30 dias que
fiscais ambientais, agentes da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e da Força
Nacional tinham tomado o controle da propriedade e montado suas barracas ao
lado do galpão-sede da fazenda na expectativa de cumprir uma decisão do Ibama
de 2017. O objetivo era confiscar 2.324 cabeças de gado em uma área irregular,
liberando o pasto para a regeneração da floresta. Mas um revés judicial
atrasava os planos do Ibama, impossibilitando o cumprimento da apreensão e
deixando para os agentes ambientais a tarefa de tomar conta do rebanho enquanto
a situação não se resolvia nos tribunais.
A ação dos agentes ambientais na fazenda Santo
Antônio era parte da Operação Retomada, deflagrada pelo Ibama no fim de março
como uma das estratégias para coibir o desmatamento em epicentros de destruição
da floresta amazônica. Focando em propriedades que colecionam infrações
ambientais, a operação planejava confiscar animais que estivessem em áreas
desmatadas ilegalmente, desrespeitando embargos. “Nós temos aquelas figuras que
desrespeitam a infração atrás de infração. E nós temos o entendimento que, para
o dano ambiental parar, esses infratores precisam tomar prejuízo, sentir no
bolso”, explica Bruno Barbosa, um dos agentes do Ibama responsáveis por
deflagrar a Retomada.
Escolhida como um dos alvos da operação, a história
da fazenda Santo Antônio mostra como multas e processos por danos ambientais
são insuficientes para deter a pecuária irregular no sul do Amazonas. O
município onde fica a fazenda, Manicoré, esteve entre os 20 com maiores alertas
de desmatamento da Amazônia Legal nos últimos três anos. Em paralelo, Manicoré
viu crescer o tamanho de seus rebanhos bovinos, seguindo a tendência que se
alastra pela Amazônia Legal: depois da retirada da madeira e de finalizada a
derrubada da floresta, o gado é o primeiro a chegar.
Localizada em Santo Antônio do Matupi – vilarejo na
beira da Transamazônica –, a fazenda entrou na mira dos órgãos ambientais há
mais de 15 anos. Em um documento, o Ibama caracteriza a atuação de seus
proprietários como uma “jornada de destruição ambiental”. Em 2017, uma operação
de fiscalização identificou que uma área embargada do tamanho de 3 mil campos
de futebol continuava sendo usada irregularmente dentro da fazenda Santo
Antônio. Na época, já haviam sido lavradas ao menos 13 multas ambientais no
local, desde 2007. O Ibama determinou então que os fazendeiros transferissem os
animais que estavam nas áreas embargadas para uma área de pasto regularizado.
O prazo para transferência do gado venceu sem os
proprietários se mexerem. Então, o Ibama determinou a apreensão dos animais,
seguindo a legislação que prevê que bens e produtos decorrentes de infrações
ambientais podem ser apreendidos do infrator.
O auto de infração, de 6 de junho de 2017, que declarou
a apreensão e perdimento do gado descreve: “os proprietários da fazenda não têm
preocupação alguma de serem autuados pelo Ibama”. E argumenta: “Acreditamos que
a única maneira de causar algum desconforto na maneira criminosa de ação do
grupo, que no passar dos anos vem obtendo vultosos lucros com a criação de gado
em cima de áreas embargadas pelo Ibama, seja o prejuízo causado por uma
apreensão, que cessaria o lucro obtido da atividade ilícita da criação de gado
em áreas embargadas”.
Douglas Louzada, o pecuarista no nome de quem está
registrada parte das terras e que atualmente se declara único responsável pela
fazenda, recorreu da decisão de apreensão do rebanho e o processo caminhou com
lentidão nos arquivos do Ibama durante a gestão do órgão sob Bolsonaro. Nesse
intervalo, o gado seguiu engordando no pasto.
• R$ 20
milhões de lucro como saldo dos crimes ambientais
Em 2023, como parte das estratégias de impor freios
aos desmatadores, o Ibama decidiu retomar e fazer valer a decisão, planejando a
apreensão do gado que já estava, em teoria, pronto para ser confiscado.
“Somente desde 2017, o autuado [responsável pela fazenda] já pode ter obtido
aproximadamente 20 milhões de reais com sua conduta ilegal”, estimou o Ibama em
um parecer de abril último. Segundo o documento, a cada ciclo de três anos
desrespeitando o embargo, o rebanho irregular estaria rendendo um lucro mínimo
de R$ 10 milhões aos proprietários.
Mesmo com o histórico de multas, nos últimos anos a
quantidade de animais da fazenda Santo Antônio só cresceu – repetindo o padrão
de transformação da floresta em pasto que se espalha violentamente no sul do
Amazonas, uma das principais fronteiras de desmatamento ilegal e queimadas da
Amazônia. Os municípios vizinhos à fazenda, como Nova Aripuanã e Apuí, além de
Lábrea, também localizada no sul do Amazonas, figuram há anos no ranking de
destruição da floresta – Lábrea e Apuí aparecem na lista dos dez municípios que
mais desmatam desde 2013.
Foi o contexto da região e a longa ficha de
infrações ambientais dos proprietários da fazenda que levaram, no fim de março,
os agentes da Operação Retomada até a sede da Santo Antônio com a expectativa
de conseguir retirar o rebanho e fazer o embargo ser cumprido. Os agentes da
operação passaram dias contabilizando, separarando e organizando os animais
para que fossem retirados.
No entanto, em 18 de abril a juíza Solange Salgado
Silva acolheu no Tribunal Regional Federal (TRF-1) um mandado de segurança
impetrado pelos advogados de Douglas Louzada, frustrando o planejamento do
órgão ambiental. A decisão proibiu os agentes da Operação Retomada de retirar o
gado, em caráter de urgência, considerando que o processo administrativo do
Ibama que autorizava a apreensão havia prescrito.
Na sentença, a juíza recupera uma decisão recursal
do Ibama, assinada pelo presidente da gestão passada, Eduardo Bim, na
antevéspera do natal de 2022. No recurso, o presidente do órgão argumenta que o
perdimento do gado estaria prescrito, pois o processo tinha ficado sem
despachos por mais de três anos. A decisão recursal tomada no apagar das luzes
da gestão bolsonarista do Ibama foi questionada pela atual gestão, que, em
março de 2023, em nova decisão recursal, apontou que o perdimento do gado não
estaria prescrito – citando uma normativa técnica do órgão que estabelece que
movimentações de expediente interno seriam suficientes para interromper a
prescrição de casos de infrações ambientais.
Em sua decisão, a juíza aponta que a nova decisão
recursal do Ibama que mantinha a apreensão do gado “carece de legalidade” e
“fomenta insegurança jurídica ao querer impor entendimento criado ‘no âmbito do
Ibama'”, indo na direção oposta à jurisprudência que indicaria a prescrição.
Procurada pela reportagem, a magistrada indicou que todas informações constam
na decisão e não quis comentar.
Quando a Pública esteve na fazenda Santo Antônio,
no fim de abril, os agentes ambientais ainda tinham esperança de que a decisão
da juíza fosse revertida e pudessem tirar o gado de lá. A gestão do Ibama que
assumiu após a vitória de Lula havia planejado a operação fazia meses, se
apoiando no despacho que tinha revertido a decisão de prescrição de multas
tomada no governo Bolsonaro.
Mas, no começo de maio, os agentes ambientais
sairiam da fazenda Santo Antônio sem os bois. “Achava que era quase certeza que
o Ibama ia vencer na Justiça, pelo tamanho do dano ambiental. Isso mostra uma
fraqueza na questão jurídica. Dá uma vantagem para quem está desobedecendo à
lei”, lamentou Odir Batista, após ter deixado a propriedade onde acampou por
mais de 20 dias.
Após a decisão que frustrou os planos do órgão
ambiental, o Ibama recorreu com um agravo de instrumento, que enumera
movimentações internas no processo do perdimento do gado, argumentando contra a
prescrição. O recurso interposto pela Advocacia-Geral da União (AGU) apresenta
o histórico de infrações ambientais cometidas na fazenda desde 2007 e os
repetidos desrespeitos aos embargos. “Isso sinaliza que a transgressão
ambiental ‘compensa’ para o infrator, uma vez que ele obtém ganhos fáceis com a
exploração de recursos naturais, como o solo, sem a obrigação de internalizar
os impactos negativos sentidos pela coletividadade”, descreve. O pedido de
tutela de urgência do Ibama ainda estava pendente, aguardando decisão, até a
publicação desta reportagem.
Durante as semanas em que os fiscais passaram
controlando a fazenda, percorrendo os pastos em suas caminhonetes de dia ou
fazendo rondas com o drone durante a noite, registraram outras infrações
ambientais nas áreas vizinhas. Segundo um relatório feito durante a operação,
mesmo após as multas e embargos, os proprietários da fazenda seguiam desmatando
novas áreas, ampliando as áreas de pasto. Uma foto que mostra um agente da
Retomada ao lado de uma árvore recém-cortada nas imediações da fazenda dá
dimensão do que havia na área antes dos pastos cobertos de capim: floresta com
árvores com diâmetro maior que 1,60 metro.
Vendo tão de perto a escala das infrações
ambientais, parecia difícil imaginar que os proprietários da fazenda se
safariam das consequências pela destruição catalogada durante anos pelo Ibama.
“Mas a gente sabe que pessoas que têm uma área como essa, com essa quantidade
de gado bem cuidado, têm muito poder”, destaca Odir.
• Um
“laranja” para assumir as multas
Mais de 4 mil quilômetros separam a sede da fazenda
Santo Antônio da cidade onde vivem os homens que investiram o dinheiro para
formar os pastos embargados pelo Ibama. No centro do município capixaba de
Colatina, em uma das avenidas principais de comércio, a loja Mercadão Moda se
destaca com letreiro amarelo e vitrines com ofertas de camisetas. É nesse
endereço que cinco homens capixabas declaram residir, segundo consta nos
processos por desmatamento ilegal a que recorrem contra o Ibama e contra o MPF.
Fachada da loja Mercadão Moda, no centro do
município capixaba de Colatina
Israel Guariento, Martinho Demoner, Cilas de
Almeida Reis Filho, Cirênio de Almeida Reis e Renato de Almeida Reis dividem a
sociedade de ao menos 11 empresas, a maioria dedicada ao comércio de roupas e
itens de decoração para casas. Demoner e Guariento são empresários conhecidos
no ramo do varejo no Espírito Santo e junto com Cilas e Cirênio têm mais de 30
lojas em cidades do interior do estado capixaba, de Minas Gerais e da Bahia.
Além de sócios nas lojas de varejo, respondem
juntos a duas ações civis públicas, acusados pelo MPF de serem os responsáveis
pela destruição de cerca de 530 hectares de floresta na fazenda Santo Antônio e
em outra propriedade na mesma região. Nas ações, além dos empresários capixabas,
também aparece como réu Douglas Louzada Neves – que atualmente é quem se
declara publicamente como o único responsável pela área alvo do Ibama e atual
dono.
É em nome de Douglas que pesa a maior parte das
infrações ambientais da fazenda nos últimos anos. É ele quem foi até a
delegacia de Manicoré registrar um Boletim de Ocorrência se queixando de que o
Ibama, a PRF, a Força Nacional e a Polícia Federal teriam invadido sua
propriedade, em uma afronta aos agentes da Operação Retomada quando chegaram
para apreender o gado. E é Douglas quem é conhecido na região como dono da
fazenda.
Mas um documento interno do Ibama aponta que
Douglas seria apenas um laranja do grupo de empresários do Espírito Santo,
sendo contratado para administrar as fazendas. Com base em documentos de
processos administrativos, contratos de compra e registros de imóveis
certificados, o relatório do Ibama de 2017 aponta que os verdadeiros
proprietários da fazenda Santo Antônio seriam os cinco empresários capixabas,
reunidos em um grupo apelidado de G5.
“Como podemos averiguar tanto o Sr. Douglas é
apenas ‘laranja’ do grupo G5 para se apresentar junto aos órgãos ambientais e
assumir as autuações sendo que o Sr. Douglas além de ‘laranja’ exerce o papel
de gerente do grupo G5 na administração das propriedades localizadas na região
do Distrito de Santo Antônio do Matupi”, registra o documento.
A Pública procurou Douglas, que não quis se
manifestar. Seu advogado, Denis Monteiro Lopes, conversou com a reportagem e,
em relação à acusação do Ibama de Douglas ser um “laranja” das propriedades dos
empresários, afirmou que Louzada é o único dono da fazenda. “Eu não tenho como
entrar nesse mérito com você, é uma ligação [feita] pelo órgão. E o órgão
[Ibama] tem que tentar provar, como eu estou provando para eles o contrário. É
uma questão de discussão judicial”, disse.
Em entrevista à Pública, Martinho Demoner declarou
falar em nome de todo o grupo de empresários capixabas e afirmou que eles
venderam as propriedades para Douglas. “Não temos mais nada a ver com o caso”,
disse. “Eu costumava ir para lá pescar, mas foi tanto problema naquela região
que hoje nem vou mais, quero ficar longe daquilo tudo”, declarou. Segundo
Demoner, as propriedades foram vendidas, os empresários saíram no prejuízo e não
sabem mais notícias da região. Ele afirmou não saber precisar quando foi feita
a venda. “Não consigo me lembrar, mas foi vendido como que há oito ou dez anos
atrás.”
Empresários são acusados pelo MPF de serem os
responsáveis pela destruição de cerca de 530 hectares de floresta na fazenda
Santo Antônio
Registros autodeclaratórios no Cadastro Ambiental
Rural (CAR) indicam que algumas propriedades teriam sido transferidas para
Douglas em 2017. Mas, na base de dados do Incra, partes das propriedades seguem
com registro certificado em nome de alguns dos empresários capixabas. À
Pública, Demoner confirmou que Douglas chegou a trabalhar para ele e seus
sócios como administrador das fazendas, mas afirmou que agora todas as fazendas
são somente de responsabilidade do pecuarista.
Documentos acessados pela reportagem indicam que,
antes de Douglas, o grupo de empresários teria outro homem encarregado de
administrar as fazendas e no nome de quem foram registradas várias multas
ambientais entre 2010 e 2014. De acordo com documentos juntados pelo Ibama no
processo , Leandro Rodrigues Figueira teria sido o primeiro pecuarista parceiro
do grupo, responsável por cuidar dos rebanhos nas propriedades do G5 entre 2011
e 2013.
Quando rompeu com o G5, Leandro assinou um acordo com
os empresários que registra que várias das despesas das fazendas eram pagas
pelas Lojas Mercadão, de Colatina. O documento mostra, por exemplo, que o
investimento para implantação das fazendas – cerca de R$ 1 milhão para abrir
estradas, fazer cercas e georreferenciamento – foi inteiramente financiado
pelos empresários capixabas. Segundo o acordo, obtido pela Pública, os lucros
com a exploração de madeira das áreas garantiria a devolução do dinheiro para
os empresários, e Leandro, por não ter investido, não receberia.
No período em que administrou as propriedades,
Leandro recebeu 11 autuações ambientais, que somam R$ 4.495 milhões. Na mesma
época, o pecuarista indicou o nome do próprio filho, ainda menor de idade, como
proprietário de algumas fazendas para receber outras cinco autuações, no valor
de R$ 12.102 milhões somadas.
“Este modus operandi é típico em propriedades na
Amazônia, quando alguém se identifica como responsável por determinado imóvel
apenas para receber as autuações dos órgãos ambientais”, aponta o documento do
Ibama.
A Pública tentou contato com Leandro Figueira, que
não retornou até a publicação.
• Fazendas
e crimes ambientais em três municípios
A atuação do grupo e de Douglas não se limita à
fazenda Santo Antônio, de onde o Ibama tentou retirar o gado. A Pública apurou
que tanto Leandro e Douglas como os próprios empresários acumulam multas
ambientais por desmatamento de várias áreas espalhadas por outros municípios no
sul do Amazonas.
Multas abrangem área de mais de 70 km2 de floresta
Em outras propriedades, multas lavradas no nome de
Douglas Louzada estão registradas ao lado de autuações que apontam Martinho
Demoner ou Israel Guariento, por exemplo, como responsáveis por áreas
destruídas de floresta.
Além da fazenda que tem mais de 5 mil animais em
Manicoré, as multas indicam que o grupo também teria investido em derrubar a
floresta para criar gado nos municípios vizinhos Apuí e Nova Aripuanã. Ao menos
12 autuações do Ibama registram outra pilha de crimes ambientais em um complexo
de terrenos anexos à chamada fazenda Araras – Fortaleza , localizada em Nova
Aripuanã – que foi registrada no sistema certificado de imóveis do Incra em
nome do empresário Demoner.
Como acontece na fazenda Santo Antônio, o histórico
das multas no complexo da fazenda Araras permite visualizar o avanço do
desmatamento, abrindo mais e mais áreas de pasto, ano a ano, independentemente
das infrações ambientais registradas.
Em 2014, por exemplo, Demoner foi autuado por
desmatamento de uma área sem autorização e parte de seu pasto foi embargada.
Como não respeitou o embargo e seguiu deixando o gado normalmente na área,
voltou a ser autuado em 2021.
O mesmo se repete no nome de Douglas Louzada, em
outras partes da mesma fazenda: em 2017 foi notificado para retirar um rebanho
de uma área embargada, não cumpriu e, três anos depois, foi novamente autuado
por impedir a regeneração de área, mantendo o gado irregular.
O levantamento feito pela reportagem com base nas
autuações do Ibama e nos processos em tramitação ilustra um ciclo que teria se
repetido atravessando os anos: principalmente a partir de 2014, os empresários
e os administradores das fazendas ligadas ao G5 foram multados por desmatamento
e tiveram áreas embargadas. Na sequência, com intervalo de anos ou meses, receberam
outras autuações por não cumprirem os embargos, continuando a utilizar as áreas
irregulares. Depois, em outras ações de fiscalização do Ibama, novamente
receberam multas por impedirem a regeneração da floresta. Seguindo esse padrão,
o grupo continuou comercializando animais engordados nos pastos irregulares e
expandiu o negócio para novas áreas.
Entre 2014 e 2023, foram ao menos 53 infrações
ambientais diferentes, segundo dados do Ibama levantados pela Pública. O valor
das multas somadas chega a R$ 73.402 milhões. As autuações se espalham por ao
menos seis propriedades diferentes ligadas ao G5, acessadas por estradas de
terra que saem de diferentes alturas da Transamazônica.
Cerca de 70 quilômetros quadrados – o que equivale
a aproximadamente quatro vezes a ilha de Fernando de Noronha – é o tamanho da
área destruída ou multada por impedimento ilegal de regeneração da floresta,
nas infrações registradas no nome de Douglas Louzada ou dos empresários do G5,
segundo levantamento feito pela reportagem.
• Processados
pelo MPF por dano ambiental em seis ações
Além das multas, os cinco empresários capixabas e
Douglas Louzada respondem juntos a duas ações que correm na Justiça, acusados
pelo MPF de desmatamento e dano ambiental em áreas dos municípios de Manicoré e
Apuí, no sul do Amazonas. As ações pedem que os réus sejam condenados a pagar
indenizações e reverter o dano ambiental, reflorestando as áreas destruídas.
Pela destruição de uma área equivalente a 460
campos de futebol, o MPF pede o pagamento de R$ 7.240 milhões , somando
indenização e valores para recuperação ambiental da área. Em outra ação que
coloca somente Douglas como réu pela destruição de cerca de 751 hectares na
mesma região, o valor pedido é de R$ 12.115 milhões.
Ao todo, correm quatro ações civis públicas por
desmatamento contra Douglas Louzada e outras duas em que o nome do pecuarista
figura ao lado dos empresários do Espírito Santo. O valor das seis ações que
pedem indenização e reflorestamento pela destruição ambiental soma R$ 26.767.237,85.
O mesmo escritório de advocacia que defende Douglas
Louzada nos processos iniciados no Ibama é responsável pela defesa dos
empresários capixabas nas ações abertas pelo MPF. As ações foram iniciadas em
2017 e até a publicação desta reportagem ainda estavam tramitando, aguardando
desfecho.
Fonte: Por Clarissa Levy - Colaboradora: Bianca
Muniz/Agencia Pública
Nenhum comentário:
Postar um comentário