sexta-feira, 14 de fevereiro de 2025

Maria Carmo: Trump taxará Argentina, do amigo Milei

O presidente da Argentina, Javier Milei, viaja na próxima quarta-feira (19) para Washington. Será sua nona viagem aos Estados Unidos desde sua posse, há um ano e dois meses. Milei participará, novamente, da Conferência Política da Ação Conservadora (CPAC). Ele não perde uma reunião da CPAC desde que chegou à Casa Rosada.

É esperada a presença de Donald Trump e Milei pretende ter uma reunião bilateral com o presidente dos Estados Unidos, além das fotos e vídeos juntos que registraram nos últimos tempos. Na Argentina, a pergunta é se a admiração de Milei por Trump e suas cartilhas parecidas em alguns tópicos significará resultados para o país.

As cartilhas dos dois incluem semelhanças como a tesoura na estrutura do Estado, a relação prioritária com Israel, oposição contra a agenda de igualdade de gêneros e de inclusão de gêneros e o anúncio de saída da Organização Mundial de Saúde (OMS) – no caso da Argentina, os cientistas argentinos alertam para o risco desta decisão para a área de pesquisas e saúde do país. Ao mesmo tempo, Milei continua repetindo o chavão de Trump, adaptado para seu país – “Make Argentina great again”. E considerando Trump e Elon Musk amigos sintonizados com seus atos e pensamentos.

Nesta quarta-feira, porém, Trump disse, na sua coletiva diária à imprensa, que a Argentina também será alvo da tarifa de 25% sobre alumínio e aço. “Temos um pouco de déficit com a Argentina, como todos”, disse Trump, ao ser perguntado se o país presidido por Milei seria isento das tarifas.

O objetivo da Casa Rosada é chegar a um acordo de livre comércio com os Estados Unidos. A Argentina integra o Mercosul. E um acordo unilateral não está previsto no bloco que reúne Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. Até agora, como dizem em Buenos Aires, ‘mucho ruido y pocas nueces’ (barulheira sem resultados).

Milei pretende, além do acordo de livre comércio, o respaldo da Casa Branca para que a Argentina tenha novo acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Segundo ele, o acordo está praticamente garantido. Já as empresas do setor de aço e de alumínio divulgaram comunicados, nesta quarta-feira em tom de preocupação, após as declarações de Trump. E esperam que a ‘amizade’ entre Milei e Trump as exclua da tarifa de 25%. Por enquanto, a exclusão foi descartada por Trump.

 

¨      Trump redesenha a política externa dos EUA. Por André Gattaz

Nesta última quarta-feira (13/2), em Kiev, o presidente ucraniano reuniu-se finalmente com um representante do novo governo dos EUA. Para desolação de Zelensky, que esperava receber Donald Trump em pessoa, o representante enviado foi o Secretário do Tesouro, Scott Bessent. E, em vez de uma discussão sobre as propostas de paz, Zelensky teve que ouvir sobre a nova política de Trump para a Ucrânia: não mais oferecer dinheiro a Kiev, mas emprestar, ou trocar por Terras Raras (importante insumo da indústria de tecnologia do qual a Ucrânia tem fartas reservas). Em suma: acabou o “almoço grátis”.

Ao mesmo tempo em que Bessent reunia-se com Zelensky, Trump conversava com o presidente russo Vladimir Putin por telefone, numa chamada que durou 90 minutos. Esta conversa, deixando não apenas Zelensky fora das negociações de paz, mas também os líderes europeus Starmer, Macron, Sholz e Ursula von der Leyen, evidenciou como o conflito na realidade opõe os Estados Unidos à Rússia. 

Não se deixe enganar pela lenda do expansionismo russo, que perturba o sono dos europeus e está levando à sua derrocada econômica. Conforme planejado pelo Departamento de Estado sob Joe Biden, a guerra contra a Rússia, com a Ucrânia apoiada financeiramente e militarmente pela Europa e pelos EUA, levaria ao “colapso financeiro e militar” russo. Porém, passados três anos, constata-se que apesar de problemas, a economia russa vem crescendo mais do que a dos países do G7 e sua produção militar não dá mostras de se esgotar, enquanto os estoques militares ocidentais começam a ficar esvaziados. Além disso, no campo de batalha, o avanço russo, apesar de lento, é constante, enquanto a Ucrânia ressente-se da falta de material humano.

Trump parece ter reconhecido o custo excessivo das “guerras eternas” para o contribuinte estadunidense, decretando assim a mudança de posição não apenas em relação à Ucrânia, mas em relação à Europa em geral. Seu foco, conforme expresso pelo Secretário de Estado Marco Rubio, são suas próprias fronteiras (imigração) e a China. 

Horas antes do encontro em Kiev, o novo Secretário da Defesa estadunidense, Peter Hegseth, em Bruxelas, detalhava para uma atônita plateia as novas diretrizes do governo dos EUA no que se refere à Ucrânia e à Europa, afirmando: 1) a Ucrânia não fará parte da OTAN; 2) a Ucrânia não retornará às suas fronteiras de 2014; 3) não haverá soldados dos EUA nas possíveis forças de manutenção da paz entre a Rússia e a Ucrânia; 4) a partir de agora a Europa deve cuidar de si mesma no que se refere à segurança. 

No discurso de Hegseth houve uma forte dose de realismo, com a clara afirmação da nova política externa estadunidense, focada no “America First”. A primeira afirmativa, sobre a impossibilidade do acesso ucraniano à OTAN, apenas reconhece a realidade concreta de que a possível entrada da Ucrânia na OTAN foi o o estopim da chamada Operação Miltar Especial russa e nunca será aceita por Putin. Quanto à constatação de que a Ucrânia não retomará suas fronteiras de 2014, também é o reconhecimento do óbvio: desde aquele ano a Crimeia foi anexada à Federação Russa como República da Crimeia, e separatistas pró-russos reivindicam parte das províncias (oblast) de Donetsk e Luhansk. Além disso, durante os quase três anos de guerra, a Rússia conquistou grande parte destas duas províncias, além de Zaporizhia e Kherson, e não há evidências de que pretenda abandonar toda essa região, limítrofe à Rússia e com expressiva população russófona.

Quanto à terceira e quarta afirmações de Hegseth, estas sim constituem um divisor de águas na relação dos Estados Unidos com a Europa. O país contribuiu com os esforços de guerra dos vencedores dos dois conflitos mundiais iniciados na Europa (dos quais se beneficiou amplamente) e depois garantiu a segurança do lado capitalista do continente diante da ameaça soviética. Porém, a presença militar estadunidense na Europa e no restante do mundo durante a segunda metade do século XX e início do XXI é o principal fator que ao longo das décadas contribuiu para o crescimento de sua gigantesca dívida pública. Trump parece reconhecer isto ao afirmar que deixará para os europeus cuidar de suas próprias fronteiras e exigir que cada país contribua com 5% de seu PIB para a OTAN (o que significaria aumentar em 150% os gastos de defesa dos já endividados países europeus). 

Trump, com sua personalidade disruptiva, disposto a não deixar pedra sobre pedra do velho arcabouço da República Constitucionalista, rasgando acordos previamente assinados, desrespeitando práticas aceitas da diplomacia, ameaçando os países mais fracos com tarifas ou outras penalidades, não esconde a admiração por líderes autocráticos como Putin e Xi Jinping, o homem forte chinês. A “camaradagem” com Putin, no entanto, vem sendo vista com desconfiança na Europa, cujos líderes foram desprezados. Teme-se que se repita, às custas da Ucrânia, uma nova “Conferência de Munique”. Nesta conferência, ocorrida em 1938, as potências da época cederam partes da Checoslováquia à Alemanha Nazista, numa política de “apaziguamento” que veio a mostrar-se fracassada com a posterior expansão nazista e início da guerra. 

Além de deixar de lado ucranianos e demais líderes europeus, a nova posição dos EUA evidencia a quase total aceitação dos termos de Putin para a paz: a não entrada da Ucrânia na Otan, a manutenção do controle sobre as zonas russófonas no leste da Ucrânia e a derrubada do atual governo de Kiev, considerado ilegítimo por Moscou. Sobre este último aspecto, vem crescendo o movimento interno e externo para que Zelensky promova sua própria substituição por um líder mais capaz de falar em nome dos ucranianos. Com sua queda, e a disposição de Trump em aceitar os termos de Putin, poderemos ver em breve o fim do conflito, e a anexação de facto de cinco regiões ucranianas à Federação Russa, numa eloquente derrota para os Estados Unidos e a Europa Ocidental. 

 

Fonte: Brasil 247

 

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