sexta-feira, 14 de fevereiro de 2025

Flávio Aguiar: Em Gaza, Netanyahu e Trump imitam Hitler

Tenho lido comentários que consideram uma “maluquice” o plano de Trump para “limpar” Gaza de seus escombros materiais e humanos e ali construir uma espécie de Balneário Camboriú, ou nova Riviera Mediterrânea para quem tenha gosto eurocêntrico.

Sim, é uma maluquice, mas que tem profundas raízes no DNA de formação dos Estados Unidos. E em outro DNA também perverso, como se verá ao longo deste artigo. Desde a ocupação britânica, o futuro Estados Unidos se viu a braços sobre o que fazer com as populações nativas.

A relação entre estas populações e os colonos europeus e seus descendentes era mediada pela expansão capitalista do projeto colonial e pelo sentimento religioso de serem estes herdeiros simbólicos das treze tribos de Israel que haviam deixado o Egito nos tempos bíblicos.

Esta imagem está preservada nas treze estrias brancas e vermelhas que ornam a bandeira norte- americana desde o início. Elas lembram as faixas de nuvens que guiavam as treze tribos de Israel em seu Êxodo pelo deserto, brancas à noite e vermelhas de dia. E justificavam o sentimento de superioridade daqueles colonos sobre os demais povos em torno, fossem os nativos ou os escravos africanos também vindos de além- mar.

A independência das colônias e sua marcha para o oeste, naquilo que se convencionou chamar de “Manifest Destiny”, agravou o conflito entre colonos e nativos, e o cerceamento das liberdades destes e o esbulho de seus territórios.

Esta nova condição inspirou o “Indian Removal Act”, promulgado pelo presidente Andrew Jackson em 1830. O decreto autorizava a remoção “voluntária” ou forçada de populações nativas das terras cobiçadas pelos colonos que avançavam para o oeste. De um modo geral, o decreto possibilitava o deslocamento dessas populações para territórios a oeste do rio Mississípi.

Calcula-se que, entre 1830 e 1841, 60 mil nativos foram forçados a abandonar seus territórios originais em direção ao oeste ou do sul para o norte, sendo alojados em terras inóspitas e desfavoráveis à sobrevivência.

Esta prática continuou pelas décadas seguintes, abrindo o que a tradição batizou de “A Trilha das Lágrimas”, pois muitos destes migrantes forçados pereceram no caminho, devido a doenças ou às duras condições de vida nos pontos de chegada.

Ao longo do tempo, estas reservas territoriais tiveram suas áreas reduzidas. E, no século XX, houve uma mudança conceitual na distribuição das terras: ao invés da concessão de reservas coletivas, elas passaram a ser concedidas individualmente a proprietários isolados, o que contribuiu mais ainda para a redução das áreas afetadas. Foi a primeira política de “limpeza étnica” da história dos Estados Unidos, algo que está por trás da proposta de Trump para Gaza.

A situação só mudou a partir de 1934, depois da vitória de Franklin Delano Roosevelt na eleição de 1933 e sua política do New Deal, que passou a reconhecer direitos adquiridos pelos povos nativos, estendendo-lhes também cuidados assistenciais em matéria de saúde.

Imagino que este “Indian New Deal” de Roosevelt, como ficou conhecido, seja abominado por Trump e sua trupe como: “coisa de comunista”.

Mas tem mais. Uma outra grande tradição de planejar deslocamentos forçados pertence ao regime nazista alemão.

A primeira proposta de solução para o “problema judaico” na Alemanha e na Europa ocupada não foi o extermínio. Foi a deportação forçada para Madagascar, então uma colônia da França recém-ocupada pelas tropas do III Reich.

Essa proposta foi formulada por Franz Rademacher, um diplomata alemão nomeado diretor da “Seção Judaica” do Ministério de Relações Exteriores em 1940, depois da tomada de Paris. A proposta foi aceita por Hitler e pelos demais membros do comando nazista. E o encarregado de viabilizá-la administrativamente foi nada mais nada menos do que Adolf Eichmann.

A proposta tinha antecedentes. Já fora defendida por notáveis antissemitas, como o alemão Paul de Lagarde no século XIX, e os britânicos Henry Hamilton Beamish e Arnold Leese no XX.

Entretanto a proposta não prosperou. Os nazistas pensavam em pô-la em prática usando como meio de transporte a frota comercial britânica, depois que a Inglaterra fosse ocupada. Porém os aviões da Luftwaffe perderam a batalha aérea para a Royal Air Force, e os britânicos mantiveram seu poderio naval, impedindo a emigração forçada.

Ainda assim, os nazistas pensaram em deslocar os judeus para a Sibéria, depois da invasão da União Soviética pela Operação Barbarossa, deflagrada em 22 de junho de 1941. Imaginavam que a União Soviética desmoronaria em poucas semanas, o que não aconteceu.

Ao fim e ao cabo a proposta de deportação foi substituída pela “Solução Final para a Questão Judaica”, concertada na sinistra Conferência de Wannsee, dirigida por Reinhard Heydrich, em 20 de janeiro de 1942 e secretariada pelo mesmo Adolf Eichmann, também encarregado de viabilizá-la administrativamente.

A atitude de Trump choca, mas não surpreende. O que surpreende, e também choca, é sua recepção pelo comando do governo israelense. Ela vai na esteira de um verdadeiro torcicolo ético, pois demonstra que a inspiração do governo de Netanyahu e seus neofascistas é uma complicada operação coletiva de transferência psicológica. Eles agora têm por alvo os “seus judeus”, identificando-se não com as lutas heróicas de seu povo, como no Gueto de Varsóvia, mas com as práticas abomináveis dos algozes de seus antepassados.

<><> Hamas diz que vai respeitar termos do cessar-fogo

O grupo terrorista Hamas, que controla a Faixa de Gaza, afirmou nesta quinta-feira (13) que vai respeitar os termos do cessar-fogo e libertará os três reféns israelenses no sábado, como combinado.

O anúncio ocorre após mediadores pressionarem o Hamas para que o acordo seja totalmente cumprido, garantindo que as trocas de reféns sejam retomadas nos prazos previamente acordados e que Israel cumpra o protocolo humanitário.

Após intensas conversas com Israel e Hamas desde quarta, os mediadores conseguiram nesta quinta-feira com que as partes envolvidas se comprometam a seguir com a implementação do cessar-fogo em Gaza, disse uma autoridade palestina à agência de notícias Reuters.

Mais cedo, o Hamas havia afirmado em comunicado que não deseja o fim do acordo de cessar-fogo com Israel, que interrompeu a guerra que já durava 15 meses no território palestino.

A trégua no território palestino estava "por um fio" em meio a um aumento de tensões entre Israel e Hamas. Ambos os lados se acusam de violar os termos do cessar-fogo, e Netanyahu ameaçou retomar o conflito caso o grupo terrorista não liberasse os reféns no sábado.

O governo de Israel convocou reservistas para se prepararem para uma possível reativação do conflito em Gaza. A próxima libertação de reféns, no sábado, prevê a entrega de mais três israelenses.

O Hamas justificou a suspensão acusando Israel de "atrasar o retorno de pessoas deslocadas ao norte de Gaza", "atingindo-as com bombardeios e tiros em várias áreas da Faixa" e de violar o acordo sobre suprimentos de ajuda.

Em resposta, Israel acusou o Hamas de uma "violação completa do acordo de cessar-fogo e do acordo para libertar os reféns".

Na terça-feira (11), o presidente dos EUA, Donald Trump, insistiu no ultimato que deu ao grupo terrorista na segunda-feira (10), quando afirmou que Gaza viraria um inferno se o Hamas não libertasse todos os reféns - de uma só vez - no fim de semana.

O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, repetiu a ameaça de Trump na terça e declarou que vai retomar os confrontos em Gaza se o Hamas não soltar os reféns até o meio-dia de sábado.

¨       Israel tem histórico de não respeitar seus próprios acordos, afirma líder do Hamas

Em entrevista para Opera Mundi, um dos líderes do Hamas, Osama Hamdan, explicou a cautela que o grupo palestino tem demonstrado com relação à capacidade de Israel em não cumprir os termos do acordo de cessar-fogo na Faixa de Gaza, vigente entre as partes desde 19 de janeiro.

Em um trecho da entrevista, que vai ao ar nesta sexta-feira (14/02), às 11h, no Youtube de Opera Mundi, o jornalista Breno Altman perguntou ao líder palestino se ele acredita que o cessar-fogo será totalmente respeitado por ambas as partes, principalmente se Tel Aviv “poderia quebrar o cessar-fogo, por exemplo, quando todos os reféns forem devolvidos?”.

 “Vamos falar sobre, por exemplo, o Acordo de Oslo. Deveria ter sido encerrado depois de cinco anos com o Estado palestino. Isso não aconteceu. Isso não aconteceu depois de mais de 30 anos da assinatura do acordo”, recordou o membro do escritório político do Hamas.

Segundo ele, os palestinos estão respeitando todos os acordos e seguirão respeitando: “se você quiser falar sobre o Hamas, se esse acordo fosse respeitado pelos israelenses, continuaremos trabalhando com base neste acordo. Se não o fizeram, se eles voltassem a atacar os palestinos, a ação normal seria fazer o melhor para proteger nosso povo”.

Hamdan concluiu o tema dizendo que “aquele que pode violar esse acordo é o lado israelense. Nós anunciamos e mantivemos anunciando que vamos respeitar o que assinamos, mas isso é limitado pela reação israelense”.

O conteúdo completo da entrevista com Osama Hamdan estará disponível nesta sexta, no canal do YouTube de Opera Mundi. Esta será a segunda entrevista de Breno Altman com a liderança palestina. A primeira foi transmitida em outubro de 2023, após o começo do massacre de Israel em Gaza.

¨       Em defesa da soberania palestina, Arábia Saudita usa imprensa estatal para rechaçar Netanyahu

A Arábia Saudita lançou “uma campanha contundente” em sua imprensa estatal contra o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu. O motivo foi um comentário do político de extrema direita sobre a criação de um Estado palestino no país do Golfo Pérsico, na última semana.

Durante uma entrevista do Canal 14 de Israel com Netanyahu, o apresentador disse erroneamente que as relações entre a Arábia Saudita e Israel seriam normalizadas apenas mediante o estabelecimento de um “Estado saudita”, quando, na verdade, seria “Estado palestino”.

Em resposta, o primeiro-ministro corrigiu o jornalista, e fez um comentário em tom de humor: “A menos que você queira que o Estado palestino seja na Arábia Saudita”. “Eles têm muito território”, acrescentou.

O jornal inglês Financial Times, que considerou as declarações na mídia saudita um “bombardeio excepcionalmente hostil, que só poderia ter sido publicado com a aprovação das autoridades” do país, separou algumas publicações contrárias a Netanyahu.

Uma reportagem da emissora estatal Al Ekhbariya afirmou que Netanyahu é um “sionista e filho de um sionista”, de modo que “herdou o extremismo em seus genes”. 

“A ocupação não tem uma cara boa ou uma cara feia. Ela tem apenas uma face, que é Benjamin Netanyahu”, afirmou ainda a matéria

No canal de televisão Al Arabiya, durante um de seus programas, o apresentador questionou a saúde mental de Netanyahu: “talvez tenha sido um caso de alucinação?.

Já um colunista do jornal Okaz classificou os comentários de Netanyahu como “tolos e ridículos”.

<><> Histórico

Assim como o Egito e a Jordânia, a Arábia Saudita virou coadjuvante dos planos do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e Netanyahu para o deslocamento forçado dos palestinos da Faixa de Gaza em destino aos países mencionados.

Antes do ataque do Hamas em 7 de outubro de 2023 e o genocídio promovido por Israel no enclave palestino, a Arábia Saudita estava próxima de normalizar suas relações com Tel Aviv, com a mediação dos Estados Unidos sob o governo de Joe Biden (2021-2025). 

“O reino teria concordado em estabelecer relações diplomáticas formais com Israel em troca de um pacto de defesa com os EUA e assistência com um programa nuclear”, explica o Financial Times. 

Com a retaliação desproporcional de Israel contra Gaza, Riade (capital saudita) condenou a ofensiva de Tel Aviv e endureceu sua posição contra a normalização das relações, que só devem alcançar um acordo caso haja solução de dois estados na região. 

Mohammed bin Salman, príncipe herdeiro da Arábia Saudita, já chegou inclusive a afirmar que seu país apenas se relacionaria com Israel caso houvesse um Estado palestino independente, incluindo Gaza e a Cisjordânia, tendo Jerusalém Oriental, ocupada por Tel Aviv, como sua capital.

Trump e bin Salman tiveram uma boa relação durante o primeiro mandato do republicano (2017-2021). Nesta administração, que vai até 2029, o reino saudita afirmou que planejava investir US$ 600 bilhões nos EUA. 

Contudo, com as recentes afirmações de Trump sobre o deslocamento forçado de palestinos e intenções de expropriação imobiliária de Gaza, ao descrever o enclave palestino como “Riviera do Oriente Médio”.

“Alcançar uma paz duradoura e justa é impossível sem que o povo palestino obtenha seus direitos legítimos de acordo com as resoluções internacionais, como já foi esclarecido anteriormente tanto para o antigo quanto para o atual governo dos EUA”, respondeu então o reino da Arábia Saudita. 

¨      Irã promete construir 'mil novas instalações nucleares' em caso de ataque

O presidente do Irã, Masoud Pezeshkian, falou sobre um possível ataque inimigo às instalações nucleares do país, nesta quinta-feira (13).

Após uma reportagem do jornal "The Washington Post" dizer que a Inteligência dos EUA acredita que Israel provavelmente lançará um ataque preventivo ao programa nuclear do Irã até o meio do ano, Pezeshkian afirmou na mídia estatal:

"Eles nos ameaçam dizendo que vão atingir instalações nucleares... Se vocês atacarem uma centena delas, construiremos outras mil... Vocês podem atingir os edifícios e os lugares, mas não podem atingir aqueles que os constroem".

Também nesta quinta, o comandante da Força Aérea iraniana, Hamid Vahedi, falou sobre um possível ataque e ameaçou: "Dizemos a todos os países, amigos e inimigos, que a doutrina do nosso país é defensiva, mas responderemos com força contra qualquer ataque inimigo".

Em outubro do ano passado, Irã e Israel trocaram ataques. Em meio às tensões causadas pelas ofensivas israelenses em Gaza e no Líbano, o governo de Teerã lançou mísseis em apoio aos aliados do Hamas e do Hezbollah.

Nesta segunda-feira (10), o presidente dos Estados UnidosDonald Trump, levantou a possibilidade de Israel atingir o Irã em uma entrevista à Fox News, dizendo que preferiria fazer um acordo com o Irã para impedi-lo de obter uma arma nuclear.

"Todos acham que Israel, com nossa ajuda ou nossa aprovação, vai entrar e bombardeá-los pra caramba. Eu preferiria que isso não acontecesse", disse.

Apesar da declaração, foi o próprio Trump que reiniciou a escalada de tensões com o Irã. Logo após tomar posse, ele anunciou que iria buscar um Acordo de Paz Nuclear com o Irã, mas restabeleceu uma política de "pressão máxima" e ameaçou destruir o país em caso de retaliação.

Em resposta às declarações do presidente americano, o ministro das Relações Exteriores de Teerã falou que um ataque dos EUA ao país seria um "erro" e levaria a uma "guerra total".

Já o líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei, pediu que seu governo recuse qualquer negociação com Estados Unidos, alegando que seria "imprudente":

"Não se deve negociar com um governo desses. É imprudente, não é inteligente, não é honroso negociar", disse Khamenei, lembrando que os Estados Unidos "arruinaram, violaram e destruíram" o acordo nuclear de 2015.

Na terça (11), na ONU, enviado especial do país descreveu declarações dadas pelo presidente americano, Donald Trump, como "imprudentes e inflamatórias" e ameaçou: "Qualquer ato de agressão terá consequências severas".

 

Fonte: Outras Palavras/Opera Mundi/g1

 

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