Elcemir Paço Cunha:
… Pois não sabem o que fazem. Ou sabem?
O atual debate
sobre inflação no Brasil é uma dessas oportunidades que reflete o conflito
essencial que está no âmago da vida econômica da sociedade. Muito disso se deve
às respostas apresentadas em termos práticos para enfrentar essa pressão
inflacionária, especialmente a que rebate nos gêneros alimentícios.
Todos sabemos que a
variação dos preços desses produtos afeta mais diretamente as chamadas classes
médias e baixas. E o remédio principal para combatê-la, por meio da manipulação
da taxa de juros, também. Isso já mostra de partida sobre qual base as medidas
são tomadas. É uma alternativa existente na caixa de ferramentas acumuladas ao
longo dos últimos cem anos pelo menos. O fato de tomar essa ferramenta e não
outra, ou não admitir uma combinação de ferramentas, diz muito a respeito do
que está em jogo.
Para a maioria dos
analistas formou-se tardiamente a constatação de que as percepções das pessoas
sobre a economia (tanto no Brasil quantos nos EUA) desde 2022 eram afetadas
pela pressão inflacionária sobre os gêneros alimentícios. Essa pressão era
maior do que a média da taxa geral medida e assim segue desde então. Esse
problema, especialmente no Brasil, refletiu-se também na aspereza entre
executivo e COPOM no último ano, como todos também sabem.
Uma parte do
problema envolvia e envolve saber quais fatores estão de fato acionando a
inflação de alimentos.
Nesse plano, o
COPOM sempre defendeu se tratar de um aumento da demanda. Daí a decisão de
acionar uma de suas ferramentas prediletas e subir os juros para desacelerar a
economia, gerando desemprego e rebaixando salários. Esse é o plano declarado em
suas atas: provocar uma recessão. Essa posição tem amplo apoio entre os
economistas mais ortodoxos, operadores das finanças, gestores de fundos. A
imprensa em geral, e com exemplos contumazes, os segue de perto
como tem sido a praxe há décadas. Ao fundo está o argumento de que o
crescimento atual brasileiro não seria sustentável por ir além da capacidade
“normal” da oferta, provocando um hiato de produto que força a subida dos
preços. Por isso cabe um freio desse crescimento em ajuste à capacidade
nacional. É uma teoria cuja história e influência
merece atenção. Mas as atas do COPOM não são material informativo suficiente
dessa teoria nem de bons fundamentos para as decisões de juros que parecem as
embasar.
Noutro caminho,
muitos dos chamados heterodoxos já questionavam em 2022
se de fato se tratava de inflação de demanda. Do lado do executivo, aqui e ali
apareceu em 2023 timidamente a tese de que a inflação então registrada decorria
dos vários aumentos dos custos dos insumos em geral, especialmente os
referentes ao mercado internacional desde a pandemia. O ministro Haddad
recepcionou Isabella Weber que naquela época já
falava a
respeito da inflação motivada pelos custos, mas também pelo oportunismo em
variados setores econômicos que viram a chance de aumentar, e de modo algo
articulado, as suas margens de lucro nessa remarcação dos preços. Ela sugere o
caminho do controle estratégico de preços de determinados itens por meio de
medidas não meramente formais, a exemplo do México e Espanha. Faltam dados
sobre esse quadro de custos e subida articulada dos preços no Brasil.
Com menor audiência
e pompa, Baccarin e amigos têm insistido (de modo resumido e aprofundado) no fato de que a
pressão inflacionária decorre há muito da internacionalização da produção
brasileira de alimentos e sem mecanismos internos de compensação, como estoques
reguladores por exemplo. Com a subida internacional dos preços de produtos como
café e carne, os preços internos são forçados para cima uma vez que o Brasil é
um grande exportador desses produtos. No caso dos lácteos, os preços internos
seguem os aumentos internacionais uma vez que o país é um importador.
É coisa certa que a
inflação é uma resultante de muitos fatores combinados. Alguns podem pesar mais
do que outros em momentos e contextos diferentes. E não é aqui que vamos
resolver a questão. Mas dos três grupos de explicações anteriores chama a
atenção um fato importante: exatamente o grupo que possui menor influência é
também aquele que apresenta melhor qualidade de dados e análise sobre quais
fatores têm exercido considerável influência.
Os heterodoxos
acima apenas suspeitam que a inflação não seja de demanda. Convenhamos que o
executivo não fez muita coisa com essa suspeita desde 2023 no sentido de
enfrentar criativamente a questão. Os ortodoxos se apegaram à teoria do hiato
de produto e escutam mais os operadores das finanças. As atas do COPOM,
compreensivelmente lacônicas, demonstram nada ou quase nada que prove
publicamente haver crescimento acima da capacidade, lastreando assim suas
decisões que afetarão milhões de pessoas com dor e sofrimento.
A maioria dos
críticos dessas medidas sugere que o remédio não é adequado para a doença.
Recentemente circulou que o mercado errou 95% das previsões sobre
economia e Bolsa desde 2021. Ainda assim continuam sendo aqueles que mais
influenciam quando é preciso definir a causa da inflação e as alternativas para
domá-la. E não faz muito tempo que Roberto Campos Neto, ex-Banco Central e
expoente da ortodoxia, disse não saber “por que alguém acredita no que a
gente fala”.
Bem, parece que conhecimento das coisas e provas de sua correção não são
prerrequisitos para provocar recessão, desemprego e baixa nas rendas a
propósito de enfrentar a inflação de preço internacional. Ou, talvez
contrariamente a seus críticos, sabem exatamente o que fazem.
¨ Fazenda
reduz previsão de crescimento do PIB para 2025 e aponta riscos externos
O Ministério da Fazenda
revisou para baixo a previsão de crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) em
2025, passando de 2,5% para 2,3%. O PIB é a soma de todas as riquezas
produzidas pelo país em um ano, e a revisão se deve a fatores internos e
externos. O aumento na taxa básica de juros e o cenário conjuntural externo
foram destacados no documento "2024 em retrospectiva e o que esperar para
2025", da Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Fazenda.
"A gente espera uma
desaceleração do ritmo de crescimento. Estamos atravessando um ciclo de aumento
de juros, que tem impacto no ritmo de atividade", afirmou o secretário de
Política Econômica, Guilherme Mello, de acordo com a Folha de S. Paulo. Para o ano de 2025, a
Fazenda projeta uma aceleração no setor agropecuário, mas uma redução no
desempenho da indústria e dos serviços.
A SPE alerta para os riscos
de um "aumento muito acentuado do protecionismo nos EUA", que, se
ocorrer, pode levar o Federal Reserve (FED) a interromper o ciclo de redução de
juros. Caso isso aconteça, as projeções para o Brasil podem ser revistas.
Nesta quinta-feira (13), o
presidente dos EUA, Donald Trump, afirmou em sua rede social Truth Social que
as últimas três semanas foram as melhores, mas que esta quinta promete ser um
"grande dia" devido às tarifas recíprocas que pretende implementar. A
medida afetaria países que aplicam taxas sobre importações dos EUA.
Quanto à inflação, a
previsão da Fazenda é que a meta seja novamente descumprida, com uma alta de
4,8% nos preços, conforme medido pelo IPCA. Esse resultado seria equivalente ao
índice registrado em 2024.
Apesar de o indicador
superar a meta, a Fazenda acredita que os preços de alimentos devem cair neste
ano. "Os preços de carnes tendem a desacelerar até o final do ano, menos
impactados pela reversão no ciclo de abate do gado e pelo avanço das exportações",
observa o documento. Também há perspectivas favoráveis para o arroz, feijão,
alimentos in natura e derivados de soja e leite, devido às boas expectativas
para o clima e para a produção agrícola em 2025.
Ainda conforme a reportagem,
a Fazenda prevê um aumento nos preços de trigo e derivados, em razão de uma
colheita baixa no ano passado. Mello ainda ponderou que "a taxa de câmbio
utilizada foi a do Focus, de R$ 6 para cada dólar. Caso o câmbio mais apreciado
[se mantenha], em R$ 5,73, isso terá impacto no nosso cenário
inflacionário". "Nossa safra mais forte e a produção maior de
petróleo também devem impactar [no câmbio]".
¨ Varejo do
Brasil fecha 2024 com maior expansão em 12 anos
O setor de varejo do Brasil registrou em 2024 o maior crescimento das
vendas em 12 anos, embora tenha apontado enfraquecimento no final do ano em
linha com as expectativas de perda de força gradual da economia.
As vendas varejistas tiveram queda de 0,1% em dezembro na comparação com
o mês anterior, segundo dados divulgados nesta quinta-feira pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O resultado mensal ficou aquém da expectativa em pesquisa da Reuters de
estabilidade. Na comparação com mesmo mês do ano anterior, houve aumento de
2,0%, segundo o IBGE, contra projeção de ganho de 3,5%..
Ainda assim, o setor registrou em 2024 crescimento de 4,7%, o oitavo ano
de expansão e no ritmo mais intenso desde 2012 (+8,4%).
O varejo teve um ano de 2024 amplamente positivo, mostrando resiliência
em meio a um mercado de trabalho aquecido, expansão do crédito e aumento da
renda.
No entanto, mostrou desaceleração do ritmo com quedas seguidas nos
últimos dois meses do ano, em um aceno às expectativas de perda de força
gradual da economia que deve se estender para o início de 2025.
Isso ocorre em um ambiente de redução do impulso fiscal e aperto
monetário, o que encarece o crédito. Em janeiro, o Banco Central elevou a taxa
básica de juros Selic em 1 ponto percentual como indicado, a 13,25%, e deve
adotar nova alta na próxima reunião.
"Para 2025, projetamos uma desaceleração no crescimento devido à
redução dos estímulos fiscais e de crédito, além da inflação e juros
elevados", disse Igor Cadilhac, economista do PicPay. "Apesar desse
cenário desafiador, esperamos que a retração seja relativamente moderada.
Alguns fatores devem ajudar a sustentar o consumo das famílias, como o mercado
de trabalho aquecido e o aumento da massa salarial."
Em dezembro, cinco dos oito setores pesquisados no varejo restrito
apresentaram retração de vendas em relação a novembro, sendo as mais intensas
de Equipamentos e material para escritório, informática e comunicação (-5,0%);
Artigos farmacêuticos, médicos, ortopédicos e de perfumaria (-3,3%); e
Combustíveis e lubrificantes (-3,1%).
No comércio varejista ampliado, que inclui as atividades de veículos,
motos, partes e peças; material de construção e atacado de produtos
alimentícios, bebidas e fumo, o volume de vendas em dezembro caiu 1,1% ante o
mês anterior. Mas ainda fechou 2024 com alta acumulada de 4,1%, a maior desde
2021 (+4,5%).
No âmbito do varejo ampliado, oito das onze atividades pesquisadas
fecharam o ano com ganhos, com destaque para Artigos farmacêuticos, médicos,
ortopédicos e de perfumaria (14,2%); Veículos e motos, partes e peças (11,7%);
Outros artigos de uso pessoal e doméstico (7,1%) e Material de construção
(4,7%)
“Em termos setoriais, o grande destaque foi o setor farmacêutico, que é
a única atividade a sustentar também oito anos de crescimento contínuo",
disse o gerente da pesquisa, Cristiano Santos.
As três atividades que sofreram queda em 2024 foram Combustíveis e
lubrificantes (-1,5%); Atacado especializado em produtos alimentícios, bebidas
e fumo (-7,1%); e Livros, jornais, revistas e papelaria (-7,7%).
“O segmento de livros, jornais, revistas e papelaria já vem acumulando
quedas há alguns anos, a última alta foi em 2022. Isso está relacionado ao
crescente processo de digitalização de parte de seus produtos. O que vem
sustentando essa atividade é o livro didático", completou Santos.
Os dados do varejo são os mais recentes a apontar desaceleração da
atividade econômica no final do ano passado no Brasil, juntando-se à produção
industrial e ao volume de serviços, que apresentaram desempenhos semelhantes.
Fonte: Jornal
GGN/Brasil 247
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