sexta-feira, 20 de dezembro de 2024

Orgulho da 'barriga de chope' é ignorância sobre riscos da gordura visceral

Você tem aquele tio do churrasco que não abre mão de uma picanha suculenta, uma cervejinha gelada e o clássico pão de alho com manteiga derretendo? Ou talvez um irmão ou amigo que está sempre presente num rodízio de fim de semana, exibindo orgulhosamente a sua famosa "barriga de chope"?

Quem sabe ele até brinque, apontando para a barriga: "Um homem sem barriga é um homem sem história!".

Se essa cena soa familiar, saiba que isso tem outro nome: gordura visceral, e é algo que na verdade merece bastante atenção.

Os médicos usam o termo "visceral" porque essa gordura se acumula dentro da cavidade abdominal (perto da barriga) e pode interferir no funcionamento de diversos órgãos. Ela é bem diferente da gordura subcutânea (mais comum nos quadris e coxas) e até mais perigosa.

“A gordura visceral é mais metabolicamente ativa e prejudicial do que a subcutânea, aumentando os riscos de síndrome metabólica e doenças cardiovasculares”, explica Caio Victor Coutinho, nutricionista e conselheiro do Conselho Federal de Nutrição (CFN).

⚠️ Mas atenção: não são apenas a cerveja ou o chope os grandes vilões. Qualquer exagero no consumo de calorias pode causar esse efeito, que é mais comum, especialmente entre os homens, devido à forma como o corpo masculino tende a acumular adiposidade na região abdominal.

Abaixo, entenda por que isso acontece, quais são os sinais de alerta e como reverter o quadro.

Gordura visceral x subcutânea

Antes de entender os riscos da "barriga de chope", é importante conhecer os diferentes tipos de gordura que podem se acumular no corpo. E existem dois principais: a gordura subcutânea e a gordura visceral.

A subcutânea é aquela que fica logo abaixo da pele, podendo ser pinçada entre os dedos. Ela também é chamada de “gordura mole” e é pouco presente em homens, mas mais comum nas mulheres devido ao estrogênio, um hormônio que favorece seu acúmulo em áreas como quadris e coxas.

A gordura visceral (a da “barriga de chope”), por outro lado, está localizada mais a fundo, atrás dos músculos abdominais, ao redor de órgãos como o fígado, estômago e intestinos. E justamente por causa disso ela é mais perigosa.

Há dois pontos de atenção a serem considerados.

Embora não seja a tão perigosa, a GORDURA SUBCUTÂNEA é a mais difícil de eliminar.

No caso da gordura visceral, o acúmulo está relacionado não apenas ao peso total da pessoa, mas também à forma como o corpo armazena gordura. Isto é, quando o corpo atinge o limite de armazenamento de gordura subcutânea, ele começa a depositar gordura de maneira disfuncional, em lugares onde normalmente não deveria, como ao redor dos órgãos.

“Ou seja, não é apenas o excesso de gordura, mas o acúmulo em áreas que normalmente não servem para essa reserva, como o fígado”, detalha Paulo Augusto Miranda, presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM).

Esse processo está relacionado a mudanças na forma como o corpo utiliza a energia que consome, o que gera um desequilíbrio entre o que é ingerido e o que é gasto. Assim, a gordura visceral, por ser mais metabolicamente ativa, pode afetar o funcionamento desses órgãos, levando a problemas mais graves.

“Quando essa capacidade de armazenamento no subcutâneo chega ao limite e o balanço energético continua positivo, mudanças metabólicas começam a ocorrer, resultando em uma adiposidade patológica”, acrescenta Miranda.

Quando prestar atenção?

Claudia Arouca, profissional de educação física e presidente da Academia Brasileira de Personal Trainers (ABPT), explica que um dos principais indicadores para avaliar esse risco é a relação cintura-quadril (RCQ), uma medida ajuda a identificar se o acúmulo de gordura visceral está em níveis preocupantes.

📝 SAIBA COMO MEDIR: Primeiro, meça a circunferência da sua cintura acima do umbigo, e do quadril na parte mais larga. Em seguida, divida o valor da cintura pelo do quadril; isto é, se a cintura for 80 cm e o quadril 100 cm, a relação será 0,8.

Para mulheres:

O ideal é que a relação cintura-quadril fique abaixo de 0,85.

Para homens:

O ideal é que a relação cintura-quadril seja menor que 1,0.

"Valores acima desses limites indicam maior probabilidade de desenvolver doenças crônicas e problemas cardiovasculares, como infarto e hipertensão", diz Arouca.

Fora isso, Coutinho também lembra que é importante procurar um profissional adequado para uma melhor avaliação do quadro, como um nutricionista, que pode fazer uma avaliação completa da saúde do paciente, analisando não apenas exames de sangue, mas também medidas do corpo, como a circunferência da cintura.

Com isso, é possível também identificar sinais do problema bem no começo. Aliado a isso, o nutricionista também pode calcular índices, como a quantidade de gordura no fígado, que são importantes para detectar riscos e tomar medidas preventivas a tempo.

Fora isso, Miranda também lembra que é importante procurar um profissional adequado, como um nutricionista ou endocrinologista, para uma avaliação mais detalhada e cuidadosa do quadro. Isso porque, além do aumento da circunferência abdominal e do peso, as outras alterações causadas pelo acúmulo de gordura visceral geralmente são assintomáticas.

No entanto, se o aumento de peso for significativo, algumas pessoas podem observar sintomas como dores articulares, dificuldades no sono, como apneia do sono, entre outros. Mas, ainda assim, essas alterações não são facilmente detectadas, o que torna a situação mais delicada.

"É importante ressaltar que o diagnóstico do excesso de gordura abdominal pode ser feito de maneira simples e prática. A simples medição da circunferência abdominal ou o acompanhamento do peso corporal já são formas eficazes de identificar um possível acúmulo de gordura visceral, tanto em homens quanto em mulheres. Esse é um ponto essencial, pois o diagnóstico precoce facilita a adoção de estratégias para prevenir complicações mais sérias", detalha o especialista.

Riscos associados

O nutricionista e conselheiro do Conselho Federal de Nutrição (CFN), Caio Victor Coutinho, explica que quando consumimos álcool, seja ele na forma de chope ou vinho, o corpo o processa de uma forma específica: ele é primeiro transformado em acetaldeído no fígado, depois em acetato, um tipo de substância que o corpo usa para gerar energia.

Isso acontece porque o etanol (o principal composto do álcool) é oxidado e, nesse processo, interfere no funcionamento do metabolismo.

Ou seja, o álcool diminui a capacidade do corpo de queimar gordura de maneira eficiente, o que acaba fazendo com que ela se acumule na região abdominal, levando à famosa “barriga de chope”.

Apesar disso, Coutinho ressalta que não é só o álcool que causa esse problema. Na verdade, qualquer ingestão excessiva de calorias, principalmente por meio de alimentos processados ou bebidas açucaradas, pode gerar o acúmulo de gordura visceral, especialmente na região abdominal.

E como esse tipo de gordura se acumula ao redor dos órgãos internos, ela não apenas afeta a estética, mas também tem sérios impactos sobre a saúde.

Ela contribui, por exemplo, para a doença hepática gordurosa ao promover o depósito de gordura no fígado. Estudos também mostram que o aumento da adiposidade visceral está correlacionada com desequilíbrios hormonais em homens e mulheres. — Caio Victor Coutinho, nutricionista e conselheiro do Conselho Federal de Nutrição (CFN).

Nos homens, ela pode reduzir a testosterona e aumentar os níveis de estrogênio, o que impacta a fertilidade. Já nas mulheres, pode interferir na função ovariana e no equilíbrio hormonal.

Já quando há o acúmulo de gordura no músculo, isso afeta também a forma como ele responde à insulina, o que aumenta a resistência ao hormônio. Ou seja, o corpo precisa produzir mais insulina para controlar os níveis de glicose no sangue, o que pode levar ao desenvolvimento de diabetes tipo 2.

Movimentar o corpo e prestar atenção na alimentação

Para ajudar pacientes que têm dificuldade em perder gordura visceral de maneira sustentável, o segredo é adotar uma abordagem equilibrada, combinando mudanças na alimentação com uma reeducação comportamental.

A personal trainer Claudia Arouca explica que o objetivo é evitar dietas muito restritivas, que podem levar ao efeito sanfona, e, em vez disso, focar em escolhas alimentares mais saudáveis e duradouras.

Uma boa estratégia nutricional é a dieta mediterrânea, que é rica em alimentos frescos e naturais, como frutas, vegetais, grãos integrais e gorduras saudáveis.

Ao consumir entre 6 e 10 porções diárias de frutas e vegetais (cerca de 500g), é possível melhorar a qualidade da dieta e garantir a ingestão de nutrientes importantes, como fibras, antioxidantes e vitaminas.

Isso ajuda na redução da gordura abdominal e no aumento da saúde geral do organismo. Ou seja, quanto mais nutritivos forem os alimentos, mais eficaz será o emagrecimento.

Outra parte importante desse processo é o uso de técnicas da nutrição comportamental. Isso envolve, por exemplo, o auto-monitoramento da alimentação, ajudando o paciente a perceber os momentos em que há comportamentos alimentares disfuncionais ou exagerados. Dessa forma, o paciente consegue tomar consciência dos próprios hábitos e fazer ajustes.

Outro ponto fundamental é estabelecer metas realistas e alcançáveis, que permitam mudanças graduais e consistentes e focar em exercícios físicos. Reconhecer e recompensar pequenos progressos também é essencial para manter a motivação e aumentar as chances de sucesso.

Assim, a chance de o paciente seguir um plano de alimentação a longo prazo aumenta consideravelmente, evitando o efeito sanfona e promovendo a perda de peso de forma saudável.

O ideal também é procurar um profissional de educação física, seja ele de uma academia ou um personal trainer. Ele fará uma avaliação detalhada para entender a situação atual e, assim, ajudar a atingir os objetivos de forma mais eficiente, saudável e rápida. — Claudia Arouca, profissional de educação física e presidente da Academia Brasileira de Personal Trainers (ABPT).

 

Fonte: g1

 

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