112 anos de Luiz
Gonzaga: vida e obra do ‘Rei do Baião’
Em 13 de dezembro
de 1912, nascia o cantor, compositor e instrumentista pernambucano Luiz
Gonzaga.
Alcunhado “Rei do
Baião”, Gonzaga operou uma bem sucedida adaptação dos ritmos folclóricos e
regionais como o baião, xaxado e o xote para o circuito comercial.
Seu trabalho deu
enorme contribuição à valorização da cultura nordestina e concebendo uma
expressão musical inovadora, que teve grande influência sobre a música
brasileira.
Notabilizou-se
igualmente por suas canções antológicas, imbuídas de regionalismo lírico,
abordando com maestria o cotidiano do sertanejo, a natureza, o flagelo da seca
e os problemas sociais do Nordeste.
·
Quem
foi Luiz Gonzaga
Luiz Gonzaga nasceu
na Fazenda Caiçara, em Exu, no Sertão de Pernambuco, filho dos lavradores Januário
José dos Santos e Ana Batista de Jesus.
Ainda criança,
aprendeu a tocar o fole de oito baixos do pai e trabalhou na lavoura junto com
a família. Aos 13 anos comprou sua primeira sanfona e passou a se apresentar em
festas de casamento, forrós e bailes.
Adolescente,
apaixonou-se por Nazarena, filha de um coronel da região. Incomodado com a
origem humilde de Gonzaga, o pai da jovem proibiu o namoro.
A insistência em se
encontrar com Nazarena custou ao jovem uma surra dos pais e uma ameaça de morte
do coronel. Indignado com a situação, vendeu sua sanfona e usou o dinheiro para
fugir de casa, rumando para o Ceará.
Em Fortaleza,
Gonzaga se alistou no Exército e foi chamado a servir na Revolução de 1930 —
movimento armado que encerrou o pacto oligárquico da República Velha e culminou
com a ascensão de Getúlio Vargas à Presidência.
Foi enviado para o
Piauí, onde combateu os soldados que se recusaram a aderir ao movimento. Dois
anos depois, viajou ao Mato Grosso, a fim de resguardar as fronteiras nacionais
durante a Guerra do Chaco.
Por fim, foi
realocado para Minas Gerais, onde teve aulas de música com o acordeonista
Domingos Ambrósio. Permaneceu no Exército por quase uma década, dando baixa em
1939, já no Rio de Janeiro.
·
Gonzaga
no Rio de Janeiro
Na antiga capital,
Gonzaga se sustentou tocando sanfona nos bares da Zona do Mangue e nos cabarés
da Lapa, com um repertório de músicas da moda — tangos, valsas e foxtrotes.
Na noite carioca,
conheceu o violinista baiano Xavier Pinheiro, que se tornaria seu amigo e eventual
colaborador.
Em busca de
oportunidades, passou a frequentar os programas de calouros nas rádios
cariocas, mas não conseguiu se destacar a princípio.
Convencido por
amigos a incluir músicas nordestinas em seu repertório, surpreendeu-se com a
reação positiva do público.
Assim, quando
retornou ao programa de calouros de Ary Barroso na Rádio Tupi, o jovem se apresentou com a canção “Vira e
Mexe”, um “chamego” tipicamente nordestino de sua autoria.
O experimento deu
certo: Gonzaga obteve nota máxima e levou o prêmio de 150 mil réis.
O sucesso na
apresentação resultou em convites para outros projetos. Após participar como
músico de apoio em uma gravação da dupla Genésio Arruda e Januário França,
Gonzaga recebeu oferta de um contrato com a gravadora RCA.
Em maio de 1941,
gravou como sanfoneiro a mazurca “Véspera de São João” e a valsa “Numa
Serenata”.
No mês seguinte,
lançou a valsa “Saudades de São João del Rey” e o chamego “Vira e Mexe”.
Entre 1941 e 1945,
Gonzaga gravou 32 discos, sempre como solista de sanfona. Paralelamente, atuou
na Rádio Clube (participando do programa Alma do Sertão), na Rádio Tamoio (onde
se apresentou como sanfoneiro) e na Rádio Nacional.
No mesmo ano de
1945, gravou sua primeira canção como cantor, “Dança Mariquinha”, com letra de
Miguel Lima.
·
Gonzagas
e parcerias musicais
Intencionando criar
um repertório que expressasse a identidade nordestina, Gonzaga estabeleceu uma
prolífica parceria com Humberto Teixeira.
Entre 1947 e 1952,
a dupla compôs 27 músicas, incluindo algumas das mais célebres obras do
cancioneiro nacional.
Versando sobre o
flagelo da seca, a toada “Asa Branca” se tornaria um verdadeiro hino sertanejo
e permanece até hoje como uma das canções mais regravadas na história.
“Baião”, por sua
vez, se converteu em um marco da música brasileira, ensejando a valorização do
folclore nordestino e o surgimento de um novo gênero musical, por vezes
intitulado “forró pé de serra”, assentado na adaptação dos ritmos regionais ao
acompanhamento de um trio musical, composto por sanfona, zabumba e triângulo.
O novo ritmo seria
predominante no panorama musical brasileiro até a década de 60 e teria enorme
influência sobre a produção musical ulterior.
Gonzaga e Humberto
Teixeira também gravaram muitos outros sucessos, incluindo “Assum Preto”, “Qui
Nem Jiló” e “Juazeiro”.
Pouco tempo depois,
Gonzaga estabeleceria outra colaboração bastante produtiva com o compositor
pernambucano Zé Dantas.
A parceria resultou
em 46 composições, incluindo hits como “O Xote das Meninas”, “Vem Morena”, “A
Dança da Moda”, “Cintura Fina”, “Vozes da Seca” e “A Volta da Asa Branca”.
·
Gonzaga
cangaceiro e sertanejo
Em consonância com
a aspiração de representar a “nordestinidade”, Gonzaga operou uma profunda
mudança em seu visual, substituindo o paletó e a gravata pela indumentária
cangaceira e sertaneja.
De Lampião, adotou
o chapéu meia-lua de couro, as alpercatas e os bornais. Dos vaqueiros do
Sertão, emprestou a tradicional jaqueta de couro.
A indumentária de
Gonzaga contribuiu em grande parte para a construção da identidade visual
associada ao nordestino, que permanece até hoje viva no imaginário nacional.
Após a morte de Zé
Dantas, Gonzaga estabeleceu nova parceria com João Silva, que resultaria no
lançamento de dezenas de novas canções, incluindo “Danado de Bom”, “Forró de
Ouricuri”, “Arcoverde Meu”, “Nem se Despediu de Mim” e a célebre polca “Pagode
Russo”.
Não obstante, o
surgimento da Bossa Nova, Jovem Guarda e a eclosão de novos ritmos
influenciados pelo jazz e pela música norte-americana do pós-guerra reduziram o
espaço de Gonzaga nos circuitos comerciais e levaram a mudanças significativas
no gosto musical da população dos grandes centros urbanos.
Ignorado pelas
grandes rádios, Gonzaga se voltou para as plateias do interior, passando a se
apresentar em pequenos festivais, circos e praças públicas.
O apoio equivocado
de Gonzaga a burocratas ligados à ditadura militar (1964-1985) também
contribuiu para o seu isolamento na comunidade artística.
Nos anos seguintes,
Gonzaga gravaria uma série de composições sob um crescente influxo
místico-religioso (“Ave Maria Sertaneja”, “Padroeira do Brasil”, “Canaã”, etc.)
e produziu obras em parceria com o filho, Gonzaguinha.
·
A
volta de Gonzaga
Nos anos 70, em
paralelo com o lançamento de coletâneas, observou-se um gradual reavivamento do
interesse pela sua obra.
Gonzaga também
retomou a temática da música de protesto, denunciando a opressão imposta ao
povo nordestino, magistralmente expressa em sua “Missa do Vaqueiro”.
Em 1980, foi
chamado para cantar para o Papa João Paulo II durante a visita do pontífice ao
Brasil. No ano seguinte, lançou o LP “A Festa”, em colaboração com seu fillho
Gonzaguinha, Emilinha Borba, Dominguinhos e Milton Nascimento, abrangendo
interpretações de clássicos como “Luar do Sertão”.
Gonzaga participou
dos esforços contra a grande seca que assolou o nordeste entre 1979 e 1984,
causando mais de três milhões de mortes.
Além de contribuir
com a coleta de alimentos e insumos, o músico gravou composições aludindo ao
evento, nomeadamente “Sequei os Olhos”, produzida em parceria com João Silva.
Nos anos seguintes,
participou de projetos em parceria com Alceu Valença, Elba Ramalho, Sivuca, Gal
Costa, Oswaldinho do Acordeon e Dominguinhos, entre outros.
Em 1984, foi
agraciado com Prêmio Shell da Música Popular Brasileira. Dois anos depois,
participou do festival “Couleurs Brésil”, sediado na França. Seguiu ativo até o
fim da vida, realizando shows, gravando canções inéditas e lançando coletâneas.
·
Morte
de Luiz Gonzaga
Luiz Gonzaga
faleceu em Recife em 2 de agosto de 1989, aos 76 anos de idade. Foi
postumamente homenageado por seu filho com o álbum “Luizinho de Gonzaga”.
Em 2008, a
prefeitura de Recife inaugurou um memorial em sua homenagem.
Quatro anos depois,
em seu centenário de nascimento, Gonzaga foi tema do samba-enredo da escola
Unidos da Tijuca e teve sua obra rememorada por filmes, documentários e uma
série de shows.
Porta-voz da
cultura nordestina, Luiz Gonzaga operou uma verdadeira revolução na música
nacional.
Suas concepções
artísticas inovadoras influenciaram gerações inteiras de artistas brasileiros,
abrangendo dos ícones da MPB ao rock nacional, ao passo que sua expressão
poética dignificou a luta do homem do Sertão.
Desde 2005, o Dia
Nacional do Forró é celebrado em sua data de nascimento.
Fonte: Opera Mundi
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