quinta-feira, 19 de dezembro de 2024

Fernando Nogueira da Costa: Desigualdade na renda, moradia e instrução

Síntese de Indicadores Sociais de 2024, publicada pelo IBGE, apresenta uma análise abrangente das condições de vida da população brasileira, com foco nas desigualdades sociais, embora sejam insuperáveis no capitalismo com Estado de direito. Programas de transferência de renda, como o Bolsa Família, têm um papel importante na redução da pobreza – não da desigualdade de renda e da riqueza.

As desigualdades sociais se manifestam em todas as áreas analisadas, mas mulheres, pessoas pretas ou pardas, jovens e moradores de áreas rurais enfrentam maiores dificuldades em relação a trabalho, renda, educação e saúde.

Síntese de Indicadores Sociais de 2024 analisa a distribuição de renda no Brasil entre 2012 e 2023. Ressalta a influência da dinâmica do mercado de trabalho e dos programas de transferência de renda sobre os rendimentos, a desigualdade e a pobreza monetária.

O período analisado foi marcado por oscilações econômicas, incluindo a crise de 2015-2016 e a pandemia de COVID-19 em 2020. Essas crises afetaram o mercado de trabalho, com queda na renda agregada e destruição de postos de trabalho. A partir de 2022, houve uma recuperação do mercado de trabalho, com crescimento do PIB e redução das taxas de desocupação e subutilização.

Em 2023, o rendimento médio real habitual da população ocupada aumentou 7,1%, indicando uma recuperação do mercado de trabalho. Todas as atividades econômicas apresentaram crescimento no rendimento médio, com destaque para Alojamento e Alimentação, Outros Serviços e Comércio e Reparação.

No entanto, a estrutura do mercado de trabalho brasileiro é desigual. O rendimento médio varia muito entre diferentes setores, com Serviços Domésticos apresentando os menores rendimentos e informação, atividades financeiras e outras atividades profissionais, juntamente com administração pública, educação, saúde e serviços sociais, registrando os maiores valores.

A população preta ou parda recebe rendimentos médios inferiores aos da população branca. Essa disparidade se mantém ao longo dos anos, independentemente do nível de instrução ou do número de horas trabalhadas. Em 2023, a população ocupada de cor branca ganhava, em média, 69,9% a mais diante a de cor preta ou parda.

A ampliação dos programas de transferência de renda, como o Bolsa Família, no período pós-pandemia, resultou em um aumento da participação dos benefícios sociais na composição da renda dos domicílios, especialmente entre aqueles com menores rendimentos. Em 2023, os benefícios de programas sociais representavam 57,1% da renda dos domicílios com rendimento domiciliar per capita de até ¼ de salário mínimo, em contraste com 23,5% em 2012.

A análise da pobreza monetária, utilizando a linha de pobreza do Banco Mundial de US$ 6,85 por dia (PPC 2017), revela: mais de 58,9 milhões de pessoas no Brasil estavam em situação de pobreza em 2023. A extrema pobreza, medida pela linha de US$ 2,15 por dia, atingia 9,5 milhões de pessoas. A pobreza e a extrema pobreza são mais prevalentes nas áreas rurais e entre certos grupos populacionais, como crianças e pessoas com menor nível de instrução.

A redução da pobreza e da extrema pobreza, em 2023, foi impulsionada pelo aumento dos valores dos benefícios do Bolsa Família e pelo dinamismo do mercado de trabalho. Sem os programas de transferência de renda, a extrema pobreza teria aumentado em 2023.

No entanto, a desigualdade de renda – e, pior ainda, a da riqueza – persiste como um problema estrutural insuperável. É evidenciada pela disparidade nos rendimentos médios entre diferentes grupos populacionais e setores da economia.

Síntese de Indicadores Sociais de 2024 examina a relação entre as condições de moradia e a pobreza monetária no Brasil. Demonstra como aspectos como a estrutura física dos domicílios, a segurança da posse e o acesso a serviços básicos impactam a riqueza familiar e contribuem para a estratificação social.

Apesar da maioria (70%) da população brasileira residir em domicílios próprios, a segurança da posse varia muito entre diferentes grupos socioeconômicos. Ainformalidade da propriedade é mais frequente entre a população em situação de pobreza, com 19,6% das pessoas com rendimentos abaixo da linha de extrema pobreza residindo em domicílios próprios sem documentação, em contraste com 9% no conjunto da população. Essa informalidade limita o acesso a crédito e investimentos, impactando a capacidade de acumulação de riqueza das famílias.

O ônus excessivo com aluguel, definido como o aluguel mensal igual ou superior a 30% do rendimento domiciliar, também afeta desproporcionalmente a população em situação de pobreza. Em 2023, 11,2% da população em extrema pobreza enfrentava essa situação. Comprometia a renda disponível para outras necessidades básicas e investimentos e perpetuava o ciclo de pobreza.

As condições precárias da estrutura física dos domicílios também impactam a qualidade de vida e as oportunidades das famílias. A proporção de pessoas residindo em domicílios com paredes externas construídas com materiais não duráveis é maior entre a população em situação de pobreza, chegando a 2,6% na população em extrema pobreza.

Além disso, a inadequação domiciliar, como o número elevado de moradores por dormitório, é mais prevalente entre os mais pobres. Impacta a privacidade, o conforto e o desenvolvimento das famílias.

A falta de acesso a serviços básicos, como saneamento, água tratada e coleta de lixo, agrava as condições de vida da população em situação de pobreza e contribui para a estratificação social. Em 2023, a proporção de pessoas residindo em domicílios com esgotamento sanitário por rede coletora ou pluvial era bem menor entre a população em extrema pobreza (48,4%) em comparação com a população em geral (67,9%). A falta de saneamento básico aumenta a vulnerabilidade a doenças, afetando a saúde, a produtividade e a qualidade de vida das famílias.

A presença de bens duráveis nos domicílios, como máquina de lavar roupa e acesso à internet, também reflete as disparidades socioeconômicas e as oportunidades de diferentes grupos. Por exemplo, 51,4% das pessoas moravam em moradias com automóveis, mas dentre as na faixa de mais de 80% de rendimento domiciliar per capita eram 82,8%, na faixa até 20% eram 21,7%. A população em situação de pobreza possui menor acesso a esses bens e isso limita as oportunidades de educação, trabalho e lazer.

A SIS 2024 examina a distribuição da população brasileira por níveis de escolaridade. Essa desigualdade se relaciona com os níveis de rendimentos, evidenciando a forte correlação entre escolaridade e renda no Brasil.

O nível de instrução alcançado pela população adulta no Brasil é um reflexo do investimento em educação realizado em décadas anteriores. Em 2023, 45,6% das pessoas com 25 anos ou mais não haviam concluído a educação básica obrigatória (Ensino Médio), sendo 33,1% sem Ensino Fundamental completo e 12,5% sem Ensino Médio completo. Essa baixa escolaridade impacta diretamente as oportunidades de emprego e renda dessa parcela da população.

O estudo destaca a disparidade entre o Brasil e os países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em relação à conclusão da Educação Básica. Em 2023, a proporção de brasileiros de 25 a 64 anos sem Ensino Médio completo (40,1%) era acima do dobro da média dos países da OCDE (19,8%) em 2022. Essa diferença coloca o Brasil em desvantagem em termos de capital humano e desenvolvimento econômico.

A escolaridade é um fator determinante para a inserção no mercado de trabalho e para a obtenção de melhores rendimentos. A pesquisa analisa o nível de ocupação da população por nível de instrução. Quanto maior a escolaridade, maior a probabilidade de estar empregado e de receber melhores salários.

Em 2023, o nível de ocupação das mulheres com Ensino Superior Completo era três vezes maior diante o das mulheres sem instrução ou com Ensino Fundamental incompleto. Essa diferença ressalta a importância da educação para a autonomia econômica das mulheres, especialmente em um contexto de desigualdade de gênero no mercado de trabalho.

A pesquisa examina os rendimentos médios da população ocupada por nível de instrução, confirmando a relação positiva entre escolaridade e renda. Em 2023, a população ocupada de cor branca com Ensino Superior completo recebia, em média, R$ 40,24 por hora trabalhada, enquanto a população preta ou parda com a mesma escolaridade recebia R$ 28,11. Essa disparidade evidencia a persistência da desigualdade racial no mercado de trabalho brasileiro, mesmo entre aqueles com maior nível de instrução.

Síntese de Indicadores Sociais de 2024 analisa as desigualdades regionais e sociais na escolaridade. As taxas de analfabetismo variam bastante entre as regiões do país, sendo a Região Nordeste a com a maior taxa (11,2% em 2023), o dobro da média nacional. Essa disparidade regional reflete as desigualdades históricas no acesso à educação e nas oportunidades de desenvolvimento socioeconômico.

A pesquisa evidencia a forte correlação entre escolaridade e renda. A maior escolaridade está associada a maiores chances de emprego, melhores salários e maior qualidade de vida.

 

¨      O neofascismo e a manipulação da linguagem. Por Jair de Souza

Ao redor do planeta, o capitalismo está transitando uma etapa crucial de sua existência. Uma vez mais, a conjuntura geral prevalecente não permite que este sistema de exploração se mantenha incólume dentro de suas características habituais. Assim, para não sucumbir e ser substituído por outro de caráter diferente, as forças sociais que o sustentam e dele se beneficiam precisam encontrar maneiras de levá-lo a superar as enormes dificuldades com que se depara.

Ao recorrermos a nossa memória histórica, vemos que o fascismo, em alguma de suas variantes, é um dos recursos extremos aos quais as forças do grande capital costumam apelar com vistas a aniquilar a resistência popular e quaisquer outras ameaças a seus interesses em momentos de crises como a que estamos vivenciando na atualidade. Podemos mesmo considerar como enigmática a maneira como, em boa parte da Europa da primeira metade do século passado, o nazismo-fascismo foi a principal alternativa com a qual a burguesia procurou sair da situação desesperadora em que se encontrava. Com base numa análise retrospectiva, podemos concluir com muito fundamento que os capitalistas estão sempre dispostos a passar por cima de todos os pruridos, sejam eles de cunho moral ou ético, quando se trata de preservar seus privilégios de classe.

Embora as peculiaridades de cada região e cada momento influam nas formas específicas que o nazismo-fascismo adota, uma das facetas que está sempre presente é a inoculação e a exploração de um ódio cego e doentio contra os grupos humanos escolhidos para exercer o papel de inimigos comuns a serem combatidos e exterminados. Foi assim, por exemplo, na Alemanha hitlerista, onde os comunistas, os ciganos, os eslavos, os descapacitados físicos, os judeus, etc., serviram como bodes expiatórios e alvos preferenciais da ira nazista.

Nos dias de hoje, tanto na Europa como nos Estados Unidos, a fúria e a discriminação estão sendo lançadas contra os imigrantes provenientes de nações espoliadas por longo tempo pelo colonialismo e pelo imperialismo. Então, agora, depois de haver espalhado a desgraça e a morte pelo mundo afora, as classes dominantes dos países europeus e dos Estados Unidos decidiram atribuir a responsabilidade pelos problemas que suas próprias populações estão sofrendo àquela gente que se viu forçada a deixar suas terras de origem devido à falta de perspectivas que o colonialismo e o imperialismo ocasionaram por lá. Uma vez mais, a culpa do crime recai sobre aqueles que são suas maiores vítimas.

Seja qual for sua variante (hitlerista, mussoliniana, sionista, bolsonarista, lavajatista e outras), os pilares da ideologia fascista não se sustentam com amparo na verdade. Entretanto, seus propagadores jamais admitem sua essência mentirosa. Por isso, a manipulação da linguagem se torna uma das mais importantes ferramentas para ganhar apoio entre muitos daqueles que, ainda que se sintam insatisfeitos com as condições sociais imperantes, não têm clareza das causas reais de sua insatisfação. Em outras palavras, para ser aceito e adotado por amplos setores das massas populares, o fascismo depende necessariamente da hipocrisia. E, neste sentido, a linguagem desempenha uma função de enorme relevância, com o objetivo de criar uma realidade paralela, independente do mundo concreto.

Vamos tentar deixar mais bem assimilado este ponto através de alguns exemplos atuais desta nefasta maneira de ver e sentir o mundo.

Não obstante o número de grandes capitalistas não alcançar sequer 1% do total da população em nenhuma nação, eles buscam infundir nos restantes 99%, ou ao menos numa boa parcela deles, a ideia de que os valores e interesses cultivados por essa ínfima minoria também são válidos para todos os outros. Assim, por exemplo, quando algum multibilionário deseja preservar intacto seu monopólio comunicacional no ramo digital, ele jamais admitirá isto abertamente em público. O que ele vai fazer (por meio de seus serviçais, obviamente) é tratar de consolidar a percepção de que toda e qualquer regulação que se tente impor a sua atuação monopolista significará um cerceamento da liberdade de expressão da população como um todo, e não apenas uma tentativa de estabelecer limites a sua capacidade de manipular as mentes do conjunto da sociedade.

Igualmente, se o propósito for obter a anuência popular a propostas que visam manter o futuro de uma nação periférica atrelado às determinações das grandes potências imperialistas, seus prepostos locais não se atreverão a explicar abertamente quais são os motivos que de fato os estão impulsionando. Pelo contrário, quanto mais entreguistas forem, mais tentarão fazer-se passar por defensores sinceros da nação, ou seja, como louváveis patriotas. Em tal sentido, quem não se recorda que, no Brasil, o fascismo entreguista, que se expressa predominantemente por meio do bolsonarismo, adotou o verde e o amarelo de nossa bandeira como suas cores simbólicas? Por isso, sempre que queriam angariar apoio para a defesa de projetos visando entregar nossos recursos naturais às grandes potências capitalistas e reforçar nossa submissão aos Estados Unidos, seus líderes programavam atos políticos e recomendavam expressamente a seus seguidores que comparecessem vestidos com a camiseta da seleção brasileira de futebol, e dispostos a entoar com força as estrofes do hino nacional.

Por outro lado, apesar de serem notórios por seu elevado grau de depravação, os fascistas de todas as pelagens gostam de se apresentar como paladinos da defesa da família e dos bons costumes. Porém, procuram ignorar que as principais razões que causam a desintegração familiar são os baixos rendimentos de nossos trabalhadores e as extenuantes jornadas de trabalho a que são submetidos. São estes os fatores que mais lhes impedem de estar junto a suas famílias e oferecer-lhes condições de vida dignas. Portanto, o prioritário para quem de verdade se preocupa com a questão da desestruturação familiar deveria ser a exigência de que todos possam dispor de condições adequadas para criar seus filhos e cuidar bem de toda a família.

Do ponto de vista religioso, sabemos que nos países da Europa e da América, a maioria de seus habitantes se consideram cristãos. Contudo, embora a imagem de Jesus esteja indissoluvelmente associada à justiça, à solidariedade, à fraternidade, à paz e à opção preferencial pelos mais carentes, muitos dos que possuem e dirigem igrejas autoproclamadas cristãs são ativos expoentes políticos do fascismo. Eles defendem e pregam, na verdade, exatamente o oposto do que o legado de Jesus simboliza. Desse modo, na boca e nos escritos desses farsantes, Jesus foi transformado em um ardoroso capitalista, propondo e abençoando o egoísmo típico do capitalismo, pregando a discriminação, o ódio, a guerra e a defesa dos privilégios dos bilionários em detrimento dos mais necessitados.

Com as famigeradas teologias da prosperidade e do domínio, os capitalistas fascistas que se fingem de cristãos procuram conquistar apoio popular para seus projetos profundamente contrários a todas as aspirações de Jesus. Portanto, usam seu nome para garantir a persistência de todas as injustiças que ele sempre combateu. Usam o nome de Jesus para crucificá-lo novamente, em favor dos interesses das classes dominantes, às quais eles pertencem.

Além disso, através da manipulação das palavras bíblicas, os capitalistas fascistas que controlam tais igrejas induzem um enorme contingente de pessoas a sair em apoio de um dos mais horrendos crimes contra a humanidade de todos os tempos: o genocídio do povo palestino pelas forças do colonialismo sionista do Estado de Israel, que está ocorrendo neste momento. Como é possível aceitar que o nome e a simbologia de um ser tão entranhavelmente associado com o humanismo, a bondade, a justiça, o respeito à vida e à não-discriminação seja empregado para validar um dos atos mais monstruosos da história humana?

Para sintetizar o exposto nas linhas anteriores, todos os que nos interessamos pelo estudo da linguagem sabemos o poder que as palavras exercem na estruturação de nossa forma de pensar e de nos reconhecermos. Por isso, temos consciência de que, muitas vezes, elas são empregadas com o propósito de esconder os objetivos realmente almejados, assim como, em várias oportunidades, servem também como instrumento de autoengano, uma vez que, quando tem clareza de que suas pretensões não são nada solidárias ou justas, o ser humano tende a sentir a necessidade de iludir a si mesmo para, desta maneira, aliviar-se de uma possível dor de consciência.

 

Fonte: A Terra é Redonda/Brasil 247

 

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