AUMENTA A REPRESSÃO
GLOBAL AO ATIVISMO CLIMÁTICO
Estudo revela repressão global ao
ativismo climático e ambiental, incluindo assassinatos, prisões e leis
antiprotesto. Entenda os riscos.
A informação é
de University of Bristol.
Um novo relatório
revelou os inúmeros riscos enfrentados por participantes de protestos climáticos
e ambientais em
todo o mundo — e como mais países estão criminalizando e reprimindo essas
atividades em uma tentativa de controlá-las.
O relatório,
liderado pela Universidade de Bristol, é o primeiro a examinar
estatísticas globais sobre esse tipo de protesto e identificar tendências
alarmantes. Ele mostra que mais de 2.000 manifestantes
climáticos e ambientais foram mortos nos últimos 12 anos e que uma
série de novas legislações antiprotesto foi promulgada.
O documento faz um
apelo para que governos, forças policiais e o sistema jurídico ajudem a
proteger o direito das pessoas à reunião pacífica e à liberdade de expressão.
O autor principal,
Dr. Oscar Berglund, professor sênior
de Políticas Públicas e Sociais Internacionais na Escola de Estudos Políticos
da Universidade, afirmou: “Esta pesquisa lança uma luz importante sobre como
os protestos climáticos e ambientais crescentes estão sendo tratados
globalmente. Nossas evidências mostram claramente uma repressão global tanto em
democracias liberais quanto em autocracias.
“Isso é preocupante
porque foca as políticas estatais em punir a dissidência contra a inação em
relação às mudanças climáticas
e ambientais,
ao invés de tomar medidas adequadas sobre essas questões. Também representa
movimentos autoritários inconsistentes com os ideais de sociedades civis vibrantes
em democracias liberais.”
Os resultados
mostraram que assassinatos e desaparecimentos de ativistas climáticos e
ambientais são comuns em muitos países, com a ONG internacional
Global Witness relatando
pelo menos 2.106 mortes entre 2012 e 2023. O Brasil teve o maior
número, com 401 fatalidades, seguido pelas Filipinas com
298, Índia com 86 e Peru com 58.
De acordo com a
pesquisa, uma proporção significativa de protestos climáticos e ambientais
resultou em prisões. A maior proporção, de um em cada cinco protestos, foi
registrada na Austrália, seguida por 17% no Reino Unido — muito
acima da média internacional de 6,3%.
Manifestantes não
violentos também têm recebido longas penas de prisão como forma de dissuasão.
Por exemplo, neste ano, no Reino Unido, muitos ativistas climáticos foram
presos, com a sentença mais longa sendo de cinco anos.
O relatório define
os protestos ambientais como aqueles voltados para impedir projetos
específicos ambientalmente destrutivos, como exploração e extração de combustíveis
fósseis, desmatamento, construção de barragens ou mineração. Já os protestos climáticos são descritos
como eventos mais urbanos, que tendem a ter demandas políticas mais amplas,
como o fim da exploração de petróleo, ou exigências políticas mais abrangentes,
como a implementação de um Green New Deal.
Os pesquisadores
analisaram dados do Armed Conflict Location & Event Data (ACLED)
e da Global Witness para reunir informações globais e explorar
tendências, além de novas legislações antiprotesto introduzidas em diferentes
partes do mundo.
Foram identificadas
quatro principais formas de criminalizar e reprimir protestos climáticos e
ambientais: introdução de leis antiprotesto que criminalizam grupos,
criação de novos crimes, aumento das punições para crimes existentes, ampliação
dos poderes policiais e concessão de impunidade a agentes que prejudicam
ativistas. O protesto também é criminalizado por meio de processos judiciais.
O
Dr. Berglund explicou: “Isso envolve o uso de legislações existentes,
incluindo leis anti terrorismo ou contra o crime organizado, para reprimir
protestos. Os protestos climáticos estão sendo despolitizados nos tribunais,
proibindo menções às mudanças climáticas ou danos ambientais nos
processos ou alterando os procedimentos judiciais para aumentar a probabilidade
de condenação dos ativistas.”
A terceira
categoria é por meio da ação policial, realizada não apenas por agentes do
Estado, como polícia ou militares, mas também por segurança privada, militares
ou grupos do crime organizado. Isso inclui tentativas de impedir protestos
usando revistas, prisões, violência física e ameaças e intimidações contra
manifestantes.
O Dr. Berglund
afirmou: “Talvez o mais chocante seja que encontramos assassinatos e
desaparecimentos como algo comum em alguns países. De muitas formas, isso é uma
extensão das ações policiais, pois são realizadas ou permitidas pelas mesmas
autoridades, frequentemente após ameaças de morte e outras formas de
intimidação.”
O relatório faz
diversas recomendações, incluindo que as autoridades públicas realizem
avaliações regulares e publiquem dados demonstrando como suas ações ajudam a
proteger o direito à reunião pacífica e à liberdade de expressão. Também
solicita o fim do uso de legislações antiterrorismo e contra o crime organizado
contra ativistas climáticos e ambientais.
O
Dr. Berglund concluiu: “Os marcos dos direitos humanos devem estar no
centro das considerações e operações policiais para garantir que o público
possa exercer seu direito ao protesto sem impedimentos ou medo.
“Protestos
climáticos e ambientais estão se tornando cada vez mais comuns, e por boas
razões, à medida que a crise climática se agrava, e
as respostas a essas atividades estão evoluindo rapidamente. Mais pesquisas são
necessárias para compreender melhor a situação, de modo que medidas adequadas
possam ser identificadas e implementadas para proteger os direitos humanos e garantir
a segurança dos manifestantes.”
¨ O crime organizado transnacional e a
luta contra a crise climática. Por Regine Schönenberg
O crime organizado
transnacional, tradicionalmente associado ao tráfico de drogas, armas e
pessoas, também se revela como uma ameaça crescente à segurança climática
global. Regiões críticas para a saúde ambiental do planeta, como a Amazônia
brasileira, a Bacia do Congo e florestas do Sudeste Asiático, estão na linha de
frente dessa crise. Nessas áreas, crimes ambientais estão profundamente
interligados à degradação dos ecossistemas e à erosão da autoridade estatal,
criando um terreno fértil para a expansão de redes criminosas que exploram
tanto os recursos naturais quanto as populações locais.
De acordo com o
Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), crimes ambientais –
incluindo tráfico de vida selvagem, madeira, mineração ilegal e despejo de
resíduos tóxicos – movimentam entre US$ 110 bilhões e US$ 281 bilhões
anualmente. Essas atividades não apenas destroem ecossistemas vitais, mas
também perpetuam fluxos financeiros ilícitos e altos níveis de corrupção.
Na Amazônia brasileira, os exemplos são alarmantes. Um dos casos mais
emblemáticos é a mineração ilegal em terras indígenas, frequentemente promovida
por redes criminosas que utilizam equipamentos industriais para extrair ouro.
Em 2024, uma operação da Polícia Federal revelou o envolvimento de um senador e
candidato ao governo do Pará em atividades de mineração clandestina. As terras
indígenas, alvos constantes dessas práticas, também são usadas como base para
postos de gasolina e farmácias ilegais às vezes até controlados por políticos
locais, mascarando operações criminosas mais amplas das frações.
Um dos fatores
subjacentes é a grilagem de terras, um processo no qual terras públicas são
apropriadas ilegalmente, muitas vezes com uso de violência contra comunidades
locais. Empreendedores e políticos corruptos controlam as cadeias de
documentação em cartórios privados, permitindo que terras roubadas sejam
legalizadas. Esse ciclo não apenas promove a destruição ambiental, mas também
gera lucros que são reinvestidos em atividades ilícitas, como o tráfico de
drogas e armas.
Assim a expansão da
fronteira agrícola também é um motor da destruição. Desde os anos 1990, a chegada
da soja e o crescimento da pecuária intensificaram o desmatamento. Grandes
latifundiários, frequentemente envolvidos em esquemas criminosos, utilizam a
conversão de florestas em pastagens para lavar dinheiro e ampliar suas
fortunas.
A ausência do estado
em áreas remotas e a convivência de algumas lideranças locais agravam a
situação. Um exemplo revelador é o de uma ONG local que apoia mulheres na
produção de produtos florestais sustentáveis. Apesar de possuir financiamento
externo, o grupo enfrentou barreiras impostas por políticos e bancos regionais
ligados ao crime organizado, que bloquearam os recursos destinados ao projeto.
Enfrentar essa
crise exige uma abordagem multilateral, integrada e interdisciplinar. A criação
de um quarto protocolo para a Convenção das Nações Unidas contra o Crime
Organizado Transnacional (UNTOC), que trate especificamente de crimes
ambientais, é uma necessidade urgente. Esse protocolo pode estabelecer
definições claras, penalidades apropriadas e ferramentas investigativas robustas
para lidar com a complexidade desses crimes.
Além disso, há um
movimento crescente para incluir o Ecocídio como crime internacional,
reconhecendo a devastação ambiental como uma violação de direitos fundamentais.
Essa mudança não apenas responsabilizaria juridicamente os infratores, mas
também fortaleceria a proteção legal de ecossistemas essenciais.
No nível local, o
fortalecimento da governança é indispensável. Iniciativas comunitárias têm se
mostrado cruciais na resistência aos crimes ambientais. Na Colômbia,
comunidades indígenas e camponesas usam estratégias como sistemas de alerta
precoce, demarcação territorial com bandeiras brancas e práticas de soberania
alimentar para proteger suas terras. Na Amazônia, guardiões florestais
indígenas têm arriscado suas vidas para expulsar invasores e preservar seus
territórios, enfrentando violência e ameaças de morte.
Abordagens
inovadoras, como o reconhecimento da natureza como sujeito de direitos,
oferecem uma mudança paradigmática na relação entre humanidade e meio ambiente.
O pluralismo jurídico, que incorpora visões indígenas e comunitárias sobre o
uso e a proteção da terra, pode transformar a forma como tratamos recursos
naturais e promovemos a justiça ambiental.
A interseção entre
crime organizado e mudanças climáticas transcende fronteiras e requer ações
coordenadas. Governos, organizações internacionais e a sociedade civil devem
trabalhar juntos para restaurar o equilíbrio entre governança, biodiversidade e
resiliência climática.
Os exemplos da
Amazônia são emblemáticos dessa convergência de desafios. No entanto, eles
também oferecem lições importantes sobre resiliência e inovação comunitária. Ao
enfrentarmos essa última fronteira do crime, o futuro do planeta depende de
nossa capacidade de responder com coragem, cooperação e compromisso com um novo
paradigma de sustentabilidade e justiça.
Fonte: EcoDebate/Um
só Planeta
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