sexta-feira, 20 de dezembro de 2024

Mais de 130 cidades passaram nove meses em situação de seca desde o início da crise

A seca que afeta o Brasil já se arrasta por 18 meses. A estiagem começou em junho de 2023, não deu trégua e, segundo especialistas, ainda não há previsão de quando deve acabar. Isso se reflete em rios secos, comunidades isoladas e perdas bilionárias que marcaram o país em 2024.

Dados do do Centro Nacional de Monitoramento de Desastres Naturais (Cemaden) obtidos pelo g1 com exclusividade mostram que mais de 130 cidades pelo país enfrentaram ao menos nove meses consecutivos de estiagem neste período.

🔴 Os especialistas explicam que a intensidade da seca e os impactos têm a ver com fenômenos da natureza, como o El Niño. Mas, também com a ação humana, como as mudanças climáticas, o desmatamento e o uso ilegal do fogo, que cobriu o país de fumaça por meses.

Com isso, a estiagem foi se alastrando pelo mapa do Brasil. Segundo os dados do Cemaden, órgão que subsidia o governo nas ações de enfrentamento às crises climáticas, foram mais de 5 milhões de km² foram afetados, o que corresponde a aproximadamente 59% do território brasileiro – um recorde para o país.

Embora o Brasil esteja sob o mesmo efeito, as regiões enfrentam a seca em intensidade e extensões diferentes. Isso por dois motivos: o país tem dimensões continentais, com climas diferentes de Norte a Sul. E os fenômenos climáticos que resultaram na seca também agiram de forma diferente sobre as regiões.

O Cemaden avaliou o estresse da seca em cada estado, observando o tempo de impacto da crise por cidade no país.

O levantamento mostra que 137 cidades passaram mais da metade do período de crise em situação de seca, o que são nove meses sob esse estresse climático. O pior cenário, no entanto, foi no Norte do país. A cidade com o período mais longo de estiagem é Santa Isabel do Rio Negro, no Amazonas, que passou 14 meses em situação de seca.

·        Impactos pelo país

Segundo a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) são 2,8 milhões de pessoas afetadas pela crise com a seca no país. Isso se reflete em um cenário de tragédia em muitas cidades, com rios secos e comunidades isoladas, sem acesso á serviços básicos, fome e prejuízos bilionários na economia, que tem como pilar a agricultura e pecuária.

No Amapá, alunos de uma escola pública tiveram que caminhar cerca de uma hora para chegar até a escola. A imagem, que é impressionante, mostra eles andando me meio a lama, onde antes havia um rio.

No Amazonas, onde Santa Isabel do Rio Negro teve o pior cenário de seca no país, com 14 meses, o estado está em situação de emergência por causa da seca. Os principais rios estão em terra exposta, o que deixou milhares de pessoas sem acesso à água e vulneráveis as populações ribeirinhas, que vivem da pesca.

Enquanto a seca se alastrava, o fogo ilegal também tomou conta do país. Sem chuva para conter as chamas, uma nuvem densa de fumaça se formou e chegou a uma extensão de quase 5 milhões de quilômetros quadrados. Isso é quase 60% de todo o território nacional.

Enquanto as cidades sufocavam, biomas importantes como o Pantanal, Amazônia e Cerrado eram incendiados. O fogo chegou a extrapolar os períodos que antes era registrado. Em pleno dezembro, o Pará estava coberto de fumaça.

O problema não é só ambiental, o que por si só é grave, mas econômico. Segundo a CNM, em um balanço que reuniu alguns dos principais estados afetados, os prejuízos financeiros chegam a R$ 2 bilhões, entre perdas no setor agropecuário e gastos dos cofres municipais para o enfrentamento da crise. No entanto, o valor é subestimado, porque não inclui todas as regiões afetadas.

·        Por que o tempo de seca varia entre as cidades?

O país está sob um efeito de seca generalizado, segundo especialistas. Apesar disso, a intensidade e o momento em que ela chegou ou deu trégua em algumas regiões são diferentes em cada região e isso está diretamente relacionado às causas dessa crise.

<><>El Niño: 

- fenômeno responsável pelo aquecimento do Oceano Pacífico, contribuiu para a elevação das temperaturas no país e alterações nos padrões de chuva. Seu impacto gerou uma seca intensa no Norte do país, com recordes históricos.

<><> Bloqueios atmosféricos: 

- esses fenômenos barraram o avanço das frentes frias pelo país, resultando em chuvas abaixo da média em quase todo o território. O maior impacto foi registrado nas regiões Central e Sudeste do Brasil.

<><> Aquecimento do Atlântico Tropical Norte: 

- nos últimos meses, o Oceano Atlântico Tropical Norte apresentou temperaturas acima do normal, influenciando alterações nos padrões de chuva no Brasil.

O pesquisador Luiz Marcelo Zeri, do Cemaden, explica que a estiagem se intensificou à medida que os fenômenos se somaram, espalhando-se pelo país.

·        E o que esperar da seca a partir de agora?

A expectativa era de que a trégua ocorresse em novembro, mas isso não aconteceu por dois motivos: a estação chuvosa, prevista para começar em outubro, atrasou; e a La Niña, fenômeno que poderia trazer mais chuvas e reduzir as temperaturas, não se concretizou. Ela ainda pode chegar, mas mais fraca e mais tarde.

Luiz Marcelo Zeri explica que esses fatores poderiam trazer uma trégua, mas não uma solução definitiva. A seca foi tão severa que é necessário um longo período com chuvas acima da média para que as cidades se recuperem, o que não deve ocorrer tão cedo.

É necessário um período prolongado de chuvas acima da média para possibilitar a recuperação. Chuvas dentro da normalidade, como as atuais, não serão suficientes. São 18 meses de seca, um déficit muito alto. — Luiz Marcelo Zeri, pesquisador da área de secas do Cemaden.

A chegada do verão torna a situação ainda mais delicada. O aumento das temperaturas intensifica o processo de evapotranspiração – a perda de água do solo e dos rios. Com chuvas de intensidade comum, temperaturas mais altas e menos nuvens, características do verão, a perda de água se agrava, piorando a seca.

Embora o cenário seja incerto, as previsões apontam que, ao menos até março, a seca persistirá de forma mais intensa na região central do Brasil.

 

¨      Sem El Niño, Brasil terá mais chuvas no verão

O verão 2024/2025 tem início oficialmente às 6h21 do dia 21 de dezembro de 2024 (solstício de verão) prolongando-se até às 6h02 do dia 20 de Março de 2025.

Neste verão, não teremos os impactos do fenômeno El Niño, que no ano passado colaborou para manter a atmosfera global muito aquecida, contribuindo para ocorrência de ondas de calor e de eventos extremos no Brasil. 

Globalmente os oceanos permanecem quentes, havendo tendência de resfriamento apenas no Pacífico Equatorial na costa do Peru,  mas sem alcançar a configuração de um La Niña. 

<><> Verão sem La Niña

O oceano Pacífico Equatorial na costa do Peru permanece com uma tendência de resfriamento, mas tecnicamente, o conjunto de critérios para o fenômeno La Niña não está sendo verificado e não há previsão de formação do La Niña no decorrer do verão 2025. 

O fato de o oceano Pacífico Equatorial na costa do Peru estar com uma tendência de resfriamento, vai influenciar o padrão de chuva e de temperatura no Brasil neste próximo verão. Um dos efeitos desse padrão frio é o de facilitar a formação de corredores de umidade entre o Norte, o Centro-Oeste e o Sudeste do Brasil. 

<><> Frentes frias e ZCAS

O balanço de temperatura da superfície do mar no Atlântico Sul estará favorável ao avanço das frentes frias pela costa do Sul e da região Sudeste. A passagem destas frentes frias ajuda a canalizar o ar úmido do Norte para o Centro-Oeste e para o Sudeste estimulando as áreas de instabilidade.

Há possibilidade de formação de ZCAS – Zona de Convergência do Atlântico Sul – durante o verão 2025.

<><> ZCIT – Zona de Convergência Intertropical

Durante o verão e o outono no Hemisfério Sul, a ZCIT (Zona de Convergência Intertropical) é o principal sistema meteorológico que contribui para chuva volumosa no Nordeste e em parte no Norte do Brasil. 

Para o verão 2025, a previsão é de que ocorra um atraso na aproximação da ZCIT, pois o balanço de temperatura da superfície do mar entre o Atlântico Tropical Norte e Tropical Sul não está favorável.

O Atlântico Tropical Norte está mais quente que o Atlântico Tropical Sul, o que dificulta a aproximação da ZCIT na costa norte do Brasil. As áreas de instabilidade da ZCIT tendem a se organizar nas áreas oceânicas mais quentes.

<><> Oceanos quentes

A circulação atmosférica e oceânica no verão 2025 no Hemisfério Sul sentirá a influência dos oceanos quentes, como já ocorreu no verão passado. 

Globalmente, a maioria das áreas oceânicas do planeta continua com temperatura acima da média. Apenas a porção central e leste do Pacífico Equatorial, na costa peruana, está com temperatura um pouco abaixo da média.

A tendência do Pacífico equatorial um pouco frio será responsável apenas por uma parte do estímulo para que o verão 2025 seja com mais chuva do que o normal no Brasil. Ao longo da estação, outros fenômenos de escala mensal devem atuar para aumentar ou reduzir a chuva em algumas porções do país.

A chuva mais volumosa e frequente do verão 2024/2025 deve ocorrer nas Regiões Sudeste, Centro-Oeste, em muitas áreas do Norte e em parte do Nordeste. Na Região Sul, o verão será marcado por chuva irregular e espaçada, com vários dias de predomínio de tempo seco entre um episódio e outro de instabilidade.

A expectativa de mais nebulosidade e chuva sobre o país neste verão vai evitar os longos períodos de calor intenso no Centro-Oeste e no Sudeste, como ocorreu no verão 2023/2024.

Não há expectativa de ondas de calor de grande abrangência sobre o Brasil, como no verão 23/24, mas a Região Sul e também a Região Norte devem experimentar períodos quentes,  com alguns dias com calor acima do normal. No Sul, a tendência de aquecimento é especialmente o Rio Grande do Sul.

<><> Destaques regionais do verão 2025 no Brasil

 >>> Região Sul

Risco de ondas de calor principalmente no oeste dos estados de RS, SC e PR. 

Temperaturas mais elevadas e picos de calor em Porto Alegre

Leste de SC e PR tendem a apresentar temperaturas mais próximas da média, com um calor moderado. 

Janeiro com chuva irregular e mal distribuídas ao longo do mês.

Fevereiro tende a ter chuva um pouco acima da média no Sul, com pancadas frequentes, mesmo que forma isolada.

As frentes frias tendem passar rapidamente sobre a Região Sul.

>>> Região Sudeste

 Alternância entre semanas chuvosas com temperaturas próximas e/ou abaixo da média e semanas de calor e pancadas de chuva típicas de verão. 

O verão 2025 será menos quente do que o verão de 2023/2024, com períodos mornos pelo litoral da região, no leste de SP, RJ, ES, sul e leste de MG

Frentes frias avançam com frequência pela costa do Sudeste e ajudam a organizar os corredores de umidade, que aumentam a chuva, com possibilidade de formação de ZCAS – Zona de Convergência do Atlântico Sul

Verão 2025 trará mais chuva para o Sudeste do que no verão 2023/2024, o que vai ajudar a manter a temperatura próxima da média

>>> Região Centro-Oeste

Frequente formação de corredores de umidade e possibilidade de ocorrência de ZCAS.

Volumes de chuva acima da média, principalmente, no GO, MT e leste do MS. 

Não devem ocorrer ondas de calor frequentes, mas eventuais picos de calor podem afetar o centro-sul e oeste do MS ao longo do verão. 

O verão 2025 trará chuvas mais volumosas e frequentes do que no verão 2023/2024, o que vai deixar as temperaturas próximas da média.

<><> Região Nordeste

 Irregularidade da chuva continua no MA-TO-PI-BA na primeira quinzena de janeiro, o que fará a temperatura subir bastante.

Destaque para a atuação de corredores de umidade que estarão  posicionados para norte da posição climatológica, o que favorece a ocorrência de chuvas acima da média em grande parte do Nordeste. 

Atraso na aproximação da ZCIT no litoral norte do nordeste. A partir da segunda quinzena de janeiro esse sistema começa a se deslocar para a região favorecendo chuvas frequentes.

Verão 2025 terá calor ainda intenso no leste da BA, SE, AL e PE .

<><> Região Norte

Tempo abafado na maioria das regiões, com temperaturas acima da média em praticamente toda da Região Norte

Frequente formação de corredores de umidade e possibilidade de episódios de ZCAS.

Apesar da previsão de chover menos do que a média durante o verão, a chuva é volumosa e frequente, o que favorece a recuperação gradual dos rios na região. 

Não deve ocorrer novo recorde histórico de vazão baixa nos rios da Amazônia. 

 

Fonte: g1

 

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