segunda-feira, 24 de junho de 2024

O novo réptil de 237 milhões de anos de idade descoberto no Brasil

Um novo tipo de réptil que aparenta ser algo como uma mistura de um crocodilo com um dinossauro e que viveu há 237 milhões de anos, antes mesmo da era dos dinossauros, foi descoberto no Brasil.

O espécime tinha dentes em forma de punhal, adaptados para cortar carne, corpo esguio e ágil e dorso revestido por escudos dérmicos, que deveriam formar uma carapaça.

Mas era um pequeno entre seus semelhantes da época, com apenas 1 metro de comprimento e 25 centímetros de altura.

Ele compartilhava o habitat com espécies de aparência de crocodilo, como a dele, mas que chegavam a sete vezes o seu tamanho.

Batizado de Parvosuchus aurelioi, o animal teve seus fósseis descritos pelo paleontólogo Rodrigo Müller, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), no Rio Grande do Sul.

"Não esperava encontrar o crânio em meio à rocha. Como inicialmente só era possível ver vértebras, acreditava que não estaria preservado", diz Müller à BBC News Brasil.

No ramo da paleontologia, é muito incomum encontrar crânios de animais que viveram há centenas de milhões de anos.

"Exemplares do Triássico Médio (há 247 milhões e 237 milhões de anos) costumam ser achados como cacos de ossos, partes de coluna vertebral, pedaços da perna"', diz o paleontólogo Alexandre Kellner, um dos maiores especialistas do planeta em pterossauros e também diretor do Museu Nacional, no Rio de Janeiro.

A pedido da BBC News Brasil, ele leu e avaliou o artigo científico no qual o fóssil foi descrito por Müller.

"Muita sorte ele ter achado a cabeça do bicho, porque ela é fonte riquíssima de informações. É uma grande raridade na nossa profissão", comenta Kellner.

O estudo no qual Müller descreve a nova espécie encontrada foi publicado nesta quinta-feira (20/6) no periódico científico Scientific Reports, do grupo Nature.

•           Como novo réptil foi achado

O fóssil chegou à universidade como uma doação, em janeiro deste ano.

Ele foi encontrado pelo médico Pedro Lucas Porcela Aurélio, um entusiasta da paleontologia, conhecido dentre os cientistas da região de Santa Maria.

Ele achou a rocha na qual estava o crânio há cerca de cinco anos. "Encontrei em uma saída de campo em uma propriedade rural em Paraíso do Sul", conta ele, se referindo à cidade gaúcha.

Hoje com 66 anos de idade, Aurélio conta que é um paleontólogo amador desde os tempos de faculdade.

"Quando iniciei o curso de medicina na UFSM, passei a acompanhar alguns alunos do curso de biologia."

Com o tempo, tornou-se praxe sair com paleontólogos em busca de achados, sendo que é comum nesse campo que os cientistas aceitem esse tipo de auxílio de entusiastas voluntários.

Na região estão os Sítios Paleontológicos de Santa Maria, área referência para os estudos por abrigar fósseis do período dos dinossauros (que começaram a caminhar pela Terra há 230 milhões de anos, 7 milhões de anos depois do novo réptil brasileiro) e de antes deles.

No mesmo local onde Aurélio achou a rocha com o crânio, já foram descobertos, por exemplo, cinodontes (precursores dos mamíferos) e dicinodontes (parentes ainda mais distantes de mamíferos).

A nova descoberta consagra bem mais o sítio fossilífero “Linha Várzea 2”, nome dado pelos cientistas à localização específica onde se escavou o fóssil.

O médico guardou a rocha por anos e apenas recentemente, observando-a, percebeu que ali poderia haver um fóssil de interesse científico. Em janeiro, doou o item para a UFSM.

•           O pequeno réptil

"Ver aquele crânio ali, totalmente completo, foi emocionante, minhas mãos tremeram e precisei deixar o fóssil sobre a mesa até que eu conseguisse processar que tinha um réptil desconhecido na minha frente", recorda o paleontólogo Rodrigo Müller.

Após realizar os procedimentos técnicos para estudar o animal, o cientista começou o trabalho de descrevê-lo.

Primeiro, descobriu que se tratava de um membro do grupo Gracilisuchidae, que são da mesma linhagem dos jacarés e crocodilos modernos, apesar de não ser possível afirmar que se trata de um ancestral dos mesmos.

Esse achado, por si só, já seria considerado estrondoso pela comunidade científica. Até hoje, só havia outros três registros de animais desse tipo em todo planeta, um na Argentina e dois na China.

Havia desconfiança de que existiram exemplares de Gracilisuchidae no Brasil, mas esse se trata do primeiro fóssil a comprovar isso de forma inequívoca.

"Naqueles tempos, todos os continentes estavam unidos, formando o Pangeia, e é por isso que temos gracilissuquideos na América do Sul e também na China", explica Müller.

Porém, além de achar características do animal que o revelavam como membro desse grupo de quadrúpedes terrestres que caminharam pelo o que hoje é o Brasil, mas há 237 milhões de anos, o pesquisador identificou traços únicos no exemplar que tinha em mãos.

"A região do crânio, onde ficam alojados os músculos responsáveis pela mordida, tem um formato observado apenas nos gracilissuquideos e que consiste em uma redução de uma das aberturas, chamada de fenestra laterotemporal"', descreve o paleontólogo.

Mas ele acrescenta que o fóssil apresenta também "características únicas, o que justifica a criação de uma nova espécie, o que incluem as órbitas mais elevadas em relação ao observado em outros gracilissuquideos, a articulação craniomandibular situada acima da linha dos dentes e o púbis (osso da cintura pélvica) muito curto".

Ou seja, trata-se de uma novíssima espécie, a Parvosuchus aurelioi. "Parvosuchus" combina a palavra do Latim parvus (pequeno) e do grego suchus (crocodilo), em referência ao tamanho reduzido do animal em comparação com outros predadores de sua época.

No mesmo habitat, o pequeno réptil tinha de dividir espaço com, por exemplo, o colossal Prestosuchus chiniquensis, um réptil quadrúpede com mais de sete metros de comprimento, quase o dobro do tamanho de um moderno crocodilo-do-nilo.

"Esses predadores se destacavam. Por outro lado, também havia dicinodontes muito grandes, que são animais herbívoros e do tamanho de um rinoceronte", descreve Müller.

Sobre o ambiente daquela época, ele avalia que deveria ser de temperaturas muito mais elevadas do que hoje em dia, "e a maior parte da biodiversidade estava restrita às bordas do supercontinente, já que a região central era muito árida".

Já a segunda parte do nome da espécie, aurelioi, homenageia o médico Pedro Lucas Porcela Aurélio, aquele que doou o fóssil para a universidade.

Para ele, a descoberta "não foi obra do acaso, mas de uma procura metódica, uma busca onde se mistura aprendizado e prazer".

Alexandre Kellner, do Museu Nacional, no Rio, celebra a descoberta. Do ponto de vista científico, destaca que "aprendemos um pouco mais da diversidade reptiliana que existia em nosso país em tempos anteriores à época dos dinossauros".

Para ele, isso pode auxiliar em estudos sobre a evolução de espécies. "Influenciando nas ideias que temos de parentescos entre esses animais", complementa.

Todavia, Kellner também vê um sentido maior em investir em pesquisas desse tipo: "A curiosidade científica, em busca de entender como o planeta é como é, se trata de algo inerente à condição humana, o que nos diferencia de um leão, uma vaquinha, um beija-flor. Temos de divulgar e guardar as evidências que descobrimos para as nossas gerações futuras terem acesso ao nosso conhecimento".

 

•           Por que um dos felinos mais raros do mundo não está mais ameaçado de extinção

Um dos felinos mais raros do mundo, o lince ibérico, já não está mais classificado como ameaçado de extinção, de acordo com um relatório da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN).

Nesta quinta-feira (20/6), a UICN, que categoriza as espécies de acordo com o nível de risco que enfrentam numa "lista vermelha", mudou o lince ibérico de "em perigo" para "vulnerável", após um aumento significativo nos números.

A população da espécie cresceu de 62 indivíduos adultos em 2001 para 648 em 2022. Os linces jovens e adultos juntos têm agora uma população estimada em mais de 2.000, segundo a UICN.

Como o nome sugere, a espécie de felino selvagem tem a região ibérica – Espanha e Portugal – como seu lar.

De acordo com os dados do último censo, havia um total de 14 aglomerados onde os animais viviam estáveis e em reprodução. Destes, 13 estavam localizados na Espanha e um em Portugal.

O gato selvagem era comum em toda a Península Ibérica, mas a partir da década de 1960 o seu número despencou.

A perda de habitat, a caça e os acidentes rodoviários ajudaram a levar a espécie à beira da extinção.

O aumento deve-se, em grande parte, aos esforços de conservação que têm sido feitos centrados no aumento da abundância da sua principal fonte alimentar: o também ameaçado coelho selvagem, conhecido como coelho europeu.

Os programas para libertar centenas de linces em cativeiro e restaurar matagais e florestas também desempenharam um papel importante para garantir que o lince não esteja mais ameaçado.

Francisco Javier Salcedo Ortiz, coordenador responsável por liderar a ação de conservação, descreveu-a como “a maior recuperação de uma espécie de felino já alcançada através da conservação”.

Ortiz disse que ainda há “muito trabalho a fazer” para garantir que os animais sobrevivam e que a espécie possa se recuperar.

“Olhando para o futuro, existem planos para reintroduzir o lince ibérico em novos locais no centro e norte de Espanha”, acrescentou.

A área que a espécie ocupa agora é muito maior, segundo a UICN, subindo de 449 km², em 2005, para os 3.320 km² atuais.

Mas a agência de conservação alertou contra a complacência, pois afirmou que os ganhos alcançados podem ser revertidos. As ameaças incluem doenças transmitidas por gatos domésticos e dos coelhos selvagens dos quais se alimentam, assim como a caça furtiva e atropelamentos.

Estabelecida em 1964, a lista vermelha de espécies ameaçadas da UICN evoluiu para se tornar a fonte de informação mais abrangente do mundo sobre o estado de conservação de espécies animais, fungos e plantas.

 

Fonte: BBC News Brasil

 

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