terça-feira, 25 de junho de 2024

Entenda a medida provisória que ‘beneficia’ os irmãos Batista

Uma MP (medida provisória) enviada pelo governo ao Congresso neste mês para alterar uma série de regras no mercado de energia do Amazonas tem gerado questionamentos de representantes dos consumidores por, entre outros motivos, causar impactos nas tarifas de luz.

A iniciativa beneficia, na prática, uma empresa do grupo J&F da família dos irmãos Joesley e Wesley Batista.

O texto com as mudanças foi publicado pelo governo poucos dias após uma operação de R$ 4,7 bilhões da Âmbar, empresa de energia do grupo J&F (também dono da gigante de carnes JBS). A companhia comprou um conjunto de usinas termelétricas no estado, até então pertencentes à Eletrobras.

Conforme mostrou a Folha, a medida do governo faz com que a geração dessas termelétricas pare de ser parcialmente paga pela distribuidora local, a Amazonas Energia, e passe a ser totalmente bancada pelo conjunto de consumidores do Sistema Interligado Nacional.

A justificativa do Executivo federal é tornar viável a concessão de distribuição e evitar um cenário ainda pior, de caducidade.

Para 2024, a energia das térmicas incluídas na medida tem um custo estimado pelo mercado em R$ 2,7 bilhões. Hoje essa conta é coberta em menor parte pela companhia e, em maior parte, por subsídios pagos pelos consumidores pertencentes ao chamado mercado regulado do país (onde está a maior parte dos consumidores residenciais).

O problema de os pagamentos estarem hoje sob responsabilidade parcial da Amazonas é que a empresa vive em dificuldades financeiras há muito anos, devido a, entre outros motivos, a complexidade da operação local (o que inclui um alto índice de furtos de energia).

A companhia tem uma série de dívidas com as termelétricas da região. Só no quatro trimestre de 2023, a Eletrobras vendedora das usinas registrou provisão de R$ 328,7 milhões referentes à inadimplência da distribuidora.

De acordo com especialistas, alguma medida era esperada para resolver os problemas financeiros da distribuição e evitar um colapso no fornecimento de energia no estado. Mas, ao mesmo tempo, a decisão abriu caminho para a mudança nos pagamentos que, com as mudanças, passarão a ser feitos de forma garantida pelos consumidores.

Em nota, o governo reafirmou a necessidade da medida e negou que o movimento vai encarecer a energia para os brasileiros.

Em caráter reservado, no entanto, integrantes do Executivo reconhecem que a iniciativa deve elevar a conta mas apenas de parte dos consumidores, aqueles que estão no chamado mercado livre (onde estão principalmente as indústrias). Para os demais, a visão é que a tarifa pode até baixar.

Dois membros do governo ligados ao tema afirmam, inclusive, que a reclamação observada no setor é capitaneada por grupos que migraram para o mercado livre. É onde estão empresas de grande porte por exemplo, uma fábrica que escolhe comprar energia diretamente de um parque eólico ou solar.

Isso porque quem está no mercado livre (grandes comércios e indústrias) paga uma fatia menor, em relação a quem está no mercado regulado (principalmente residências), dos subsídios da chamada Conta de Consumo de Combustíveis (a CCC, que banca a maior parte dos pagamentos às térmicas em questão).

Já os contratos de energia de reserva, para onde as termelétricas estão sendo migradas, são arcadas por todos que estão no Sistema Interligado Nacional (o que inclui as grandes indústrias).

O presidente da Abrace, associação que representa os grandes consumidores de energia, Paulo Pedrosa, afirma que o movimento é prejudicial. "O pedaço que era pago pela Amazonas Energia foi jogado para o Brasil inteiro pagar. Vai pesar mais principalmente para a indústria do Norte", afirma.

Luiz Eduardo Barata, presidente da Frente Nacional dos Consumidores de Energia, disse haver impacto não só para clientes industriais e comerciais, como também para os residenciais. "O custo passará a ser dos consumidores de todo o Brasil. Isso tem impacto na inflação", afirmou.

A MP foi resultado de estudos feitos por um grupo de trabalho formado entre membros do governo e da Aneel para estudar a solução para o imbróglio no estado.

Além das iniciativas voltadas às usinas locais, há uma segunda seção da MP voltada especificamente à Amazonas Energia, concessionária de distribuição que compra energia das termelétricas. O texto flexibiliza uma série de condições para garantir a viabilidade econômica da concessão e transferir o controle societário como alternativa à extinção da concessão (cenário extremo que o governo busca evitar).

De acordo com Pedrosa, da Abrace, a medida ainda joga para os consumidores de todo o Brasil as perdas com o furto de energia observado no estado. Caso o comprador resolva o problema, fica com os recursos mesmo assim obtendo um duplo ganho. "Se o comprador resolve o problema, a empresa captura os ganhos. Esse é o grande ponto", disse.

A J&F, além de ter comprado as térmicas, está interessada em comprar a própria Amazonas Energia de acordo com integrantes do governo com conhecimento do assunto.

Baseado nos estudos, os técnicos concluíram pela necessidade de transferir a concessão para uma empresa que tenha condições de prestar o serviço com eficiência. Para isso, entenderam que era preciso mudar a lei com o intuito de permitir reembolso adequado em subsídios e tempo necessário para que o novo controlador consiga ajustar os níveis de perdas, inadimplência e custos operacionais.

O ministro Alexandre Silveira (Ministério de Minas e Energia) foi questionado no Congresso sobre o fato de a MP ter sido publicada logo após a compra da J&F. Ele disse que o timing foi uma mera coincidência.

"O Ministério de Minas e Energia já havia enviado há algum tempo o texto para a Casa Civil, mas as medidas que apontam a necessidade da mudança regulatória já são de meses. Nós estávamos instruindo adequadamente o processo para que isso se tornasse realidade", disse.

"Existe toda uma construção da medida, que foi feita há mais de um ano [...]. A Aneel notificou o ministério, disse que a concessionária [Amazonas] colapsaria, foi feito um grupo de trabalho, o grupo de trabalho definiu quais eram as medidas a serem tomadas", completou o ministro.

Ele afirmou que vários grupos nacionais de grande porte iniciaram uma análise detalhada dos números da Amazonas Energia para uma possível oferta (processo chamado de due dilligence) e também as térmicas locais. Ele citou como exemplo de potenciais compradores a Equatorial, a Aegea e o banco BTG.

"A transação feita entre a Eletrobras e a Âmbar Energia não passou pelo ministério, não é do interesse do ministério, não deve ser considerada pelo ministério", afirmou.

•           Câmara discute 'imposto do pecado' em nova audiência

O grupo de trabalho (GT) da Câmara dos Deputados encarregado de regulamentar a reforma tributária (PLP 68/24) promoveu nesta segunda-feira (24/6) uma nova audiência pública focada no Imposto Seletivo, conhecido como "Imposto do Pecado". O debate ocorrerá às 14h30 no plenário 2.

O Imposto Seletivo foi introduzido pela reforma tributária, aprovada em dezembro do ano passado, e incidirá sobre produtos considerados prejudiciais à saúde, como cigarros e bebidas alcoólicas, e ao meio ambiente, como carros a combustão. A regulamentação deste imposto está inserida no Projeto de Lei Complementar 68/24, que também estabelece o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS).

A proposta de regulamentação da reforma tributária foi apresentada pelo governo em abril. Com a implementação prevista para iniciar em 2026, o debate será fundamental para definir os detalhes técnicos e assegurar que os objetivos de saúde pública e proteção ambiental sejam alcançados sem comprometer a competitividade dos setores afetados.

Os deputados federais Claudio Cajado (PP-BA), Reginaldo Lopes (PT-MG), Hildo Rocha (MDB-MA), Joaquim Passarinho (PL-PA), Augusto Coutinho (Republicanos-PE), Moses Rodrigues (União-CE) e Luiz Gastão (PSD-CE) têm o total de 60 dias para concluir os trabalhos do colegiado e apresentar suas conclusões.

Ao Correio, o deputado Claudio Cajado explicou que ainda não é possível dar um indicativo de caminho que o grupo está tomando pois ainda há várias entidades representantes dos setores envolvidos para serem ouvidas. O GT deve se reunir com todos os representantes até a próxima quinta-feira (27).

“A expectativa é que devamos receber amanhã mais reivindicações do que sugestões dos setores afetados pelo imposto. A ideia é fazermos audiências até esta quinta-feira. Ou seja, estamos na rodada final de atendimentos das mesas de diálogo e das audiências”, explicou Cajado.

•           Relatório previsto para semana que vem

Após a rodada de conversas, o próximo passo do grupo é escrever um relatório que reúne todas as reivindicações expostas nas audiências e mesas de diálogos. O documento deve ser apresentado na próxima semana.

“O objetivo é começar a escrever o texto do relatório no próximo final de semana para que ele fique pronto até a quarta-feira da semana que vem, dia 3 de julho. No total 19 partes constituem os temas que estão sendo discutidos. O que for consenso de decisão entre o grupo e o governo já deve ficar resolvido. O que for dissenso vai para uma outra coluna de discussão e então vamos encaminhar para os líderes e para o [presidente da Câmara] Arthur Lira (PP-AL) definir o que vai ser feito. O que estamos fazendo é uma peneiragem e dar a nossa opinião”, explicou o deputado do PP.

O deputado Reginaldo Lopes, publicou neste domingo (23) em suas redes sociais, um balanço dos 20 dias de trabalho do grupo. De acordo com a publicação, foram realizadas 19 audiências públicas, com a reunião de 427 entidades e 868 especialistas.

“A reforma tributária é a mais importante para o nosso país. Com essa reforma, teremos ganho de produtividade, crescimento econômico, e mais justiça tanto tributária quanto social. Ela vai preparar o Brasil para o futuro, tornando nosso país um lugar melhor para investimentos e promovendo uma maior consciência fiscal e cidadã. [...] Nosso objetivo é entregar um sistema tributário justo, transparente e benéfico para todos os brasileiros”, afirmou o deputado petista na publicação.

•           Setor automobilístico

O gerente de imprensa da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Glauco Lucena, explicou ao Correio que porta-vozes do setor devem comparecer à audiência desta segunda-feira para expor suas reivindicações.

“A gente vai fazer uma defesa veemente para tirar os automóveis desse rol de produtos do imposto seletivo. Nós vamos ter 10 minutos para falar e todos os outros setores devem estar lá, cigarro, bebidas, embutidos e etc. A gente vai apresentar argumentos técnicos, econômicos e até filosóficos contra o princípio dessa lei que mostram que não faz o menor sentido colocar automóveis nesse tipo de imposto seletivo. É inédito se isso acontecer no Brasil”, afirmou Lucena.

O representante da Anfavea ainda explicou que um dos argumentos que deve ser exposto no plenário da audiência é o fato de que o aumento do imposto deve ocasionar o aumento de preço dos carros novos, podendo ocasionar o envelhecimento da frota automobilística no Brasil.

“Um argumento que posso adiantar é que na nossa visão, se a ideia é a preocupação com a saúde, o imposto seletivo deveria ser com produtos nocivos à saúde pública. Colocar carro novo, zero quilômetro, no imposto seletivo, você vai atrasar a renovação da frota, vai manter [nas ruas] carros [mais velhos]. O preço aumenta com o imposto, então você dificulta o acesso ao carro novo e deixa carros usados que são muito mais poluentes, mais inseguros, rodando nas ruas por mais tempo. Então esse é um dos argumentos centrais da nossa defesa”, explicou Glauco.

•           Expectativas para a audiência

Para as audiências desta semana, espera-se que sejam abordados diversos aspectos técnicos e econômicos relacionados ao “Imposto do Pecado". Entre os temas em discussão estão:

<><> 1. Definição das alíquotas: A metodologia para definir as alíquotas do IS (imposto seletivo), que serão estabelecidas posteriormente por lei ordinária, será um ponto central do debate. As alíquotas devem ser calibradas para balancear a arrecadação e os objetivos de saúde pública e proteção ambiental.

<><> 2. Impactos econômicos e sociais: Avaliar como o imposto afetará o consumo de produtos como cigarros, bebidas alcoólicas e veículos a combustão, além de discutir os possíveis benefícios para a saúde pública e a redução de poluentes.

<><> 3. Regulamentação e implementação: O cronograma para a implementação do imposto seletivo também deve ser discutido, incluindo a transição do sistema tributário atual para o novo modelo de impostos não cumulativos, prevista para começar em 2026.

<><> 4. Setores específicos: O impacto sobre indústrias específicas, como a do tabaco, bebidas e automotiva, será analisado. Representantes desses setores, incluindo associações industriais, devem apresentar suas preocupações e sugestões.

<><> Implementação do imposto seletivo

A reforma tributária aprovada em 2023, consolidada na Emenda Constitucional 132, trouxe significativas mudanças no sistema de tributos sobre consumo. Os novos tributos, o IBS e a CBS, substituirão PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS após um período de transição de 2026 a 2033. O Imposto Seletivo (IS) complementa essa estrutura, incidindo especificamente sobre produtos nocivos à saúde e ao meio ambiente.

 

Fonte: FolhaPress/Correio Braziliense

 

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