segunda-feira, 24 de junho de 2024

Bravata de deputado dos EUA deixa bolsonaristas em polvorosa

O deputado republicano Chris Smith, dos Estados Unidos, resolveu intimar o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, após ter tido acesso a “relatos alarmantes” advindos de parlamentares bolsonaristas que visitaram seu país recentemente. Ele enviou cartas ao STF, ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal intimando Moraes a “prestar esclarecimentos em até 10 dias”, em Washington DC.

A carta de Smith chegou nos gabinetes dos presidentes das casas: Luís Roberto Barroso (STF), Cármen Lúcia (TSE), Arthur Lira (Câmara) e Rodrigo Pacheco (Senado).

Smith se apresenta no documento como o presidente do Subcomitê de Direitos Humanos da Comissão de Relações Exteriores da Casa dos Representantes e afirma estar ciente a respeito de “graves violações de direitos humanos por parte do governo brasileiro”.

Entre as acusações a Moraes, principal alvo dos bolsonaristas na política e debate público brasileiros, constam violações à liberdade de imprensa, à imunidade parlamentar e uma irreal “invasão da jurisdição dos EUA”. Os questionamentos foram apresentados aos deputados americanos em maio. Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e o blogueiro Allan dos Santos estavam presentes à sessão.

Alexandre de Moraes, obviamente, ignorou a bravata. Mas nas redes sociais, figuras ligadas ao lavajatismo e ao bolsonarismo aproveitaram a deixa para ganhar uns ‘likes’. Uma dessas figuras foi o ex-procurador federal e ex-deputado federal cassado Deltan Dallagnol (Novo-PR) que no X, antigo Twitter, reproduziu as informações sobre o caso divulgadas por Lauro Jardim, no jornal O Globo.

A publicação fez sucesso entre os seguidores. Foram quase 300 mil visualizações até a noite desta sexta-feira (21), além de milhares de comentários e interações.

“Estou recebendo muitos comentários de gente perguntando o que pode acontecer, na prática, com Alexandre de Moraes depois da intimação do congressista americano (…) Para a turma do ‘ah, isso não adianta’, do ‘ah, isso não vai dar em nada’, fiz um vídeo quentinho explicando as consequências do que aconteceu hoje”, escreveu um empolgado Dallagnol.

Ao longo do seu vídeo “quentinho”, Dallagnol simplesmente ignora questões básicas de diplomacia e direito internacional e alega que, mesmo sem haver jurisdição, os EUA teriam poder para impor sanções ao governo brasileiro e a Alexandre de Moraes. Entre essas sanções estariam o bloqueio de contas bancárias e a proibição da realização de viagens.

Dallagnol recorre a um decreto de 2017 de Donald Trump que prevê que em casos de corrupção e/ou violações de direitos humanos os departamentos do Tesouro e de Estado dos EUA possam sancionar autores dessas condutas em países estrangeiros. Deltan então reconhece que é improvável que tais sanções sejam aplicadas durante o governo do democrata Joe Biden, mas aposta numa vitória de Trump nas eleições desse ano.

Acontece que a realidade é um pouco mais complicada do que o desejo ideológico. Na prática, não há qualquer jurisdição para um congressista dos EUA intimar um juiz da Suprema Corte de outro país. Os próprios EUA não possuem qualquer jurisdição legal em território brasileiro.

O Estado brasileiro, caso realmente viole direitos humanos, pode ser processado em tribunais internacionais, como o famoso Tribunal de Haia, na Holanda – o Tribunal Penal Internacional. Assim como os EUA e qualquer outro Estado nacional.

Os EUA, enquanto Estado nacional, não fazem parte de nenhuma instância dessa natureza e seu papel de “sherife do mundo” é mera retórica ideológica, sem respaldo em leis e tratados internacionais. Em outras palavras, uma eventual sanção contra Moraes seria interpretada pela comunidade internacional como um ato arbitrário e abusivo dos próprios EUA.

•           Quem são os sete deputados federais que podem perder o mandato por decisão do STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria, nesta sexta-feira (21), no julgamento que pode cassar o mandato de sete deputados federais. A ação se refere às "sobras eleitorais",  vagas não preenchidas pelos critérios do sistema proporcional.

O julgamento acontecia em plenário virtual, mas foi interrompido pelo ministro André Mendonça, que pediu destaque. Até o momento, seis ministros votaram a favor: Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Kássio Nunes Marques, Flávio Dino, Dias Toffoli e Cristiano Zanin. Apenas a ministra Cármen Lúcia votou contra.

Agora, a votação deve ser concluída de forma presencial. Caso seja aprovada, a decisão de invalidar a regra das chamadas sobras eleitorais pode ter efeito retroativo e afetar a composição da Câmara dos Deputados após as eleições de 2022. Com isso, sete deputados podem ter o mandato cassado.

<><> São eles:

•           Silvia Waiãpi (PL-AP)

•           Sonize Barbosa (PL-AP)

•           Goreth (PDT-AP)

•           Augusto Pupiu (MDB-AP)

•           Lázaro Botelho (PP- TO)

•           Gilvan Máximo (Republicanos-DF)

•           Lebrão (União Brasil-RO)

<><> Os políticos seriam substituídos pelos seguintes parlamentares:

•           Aline Gurgel (Republicanos-AP);

•           Paulo Lemos (PSOL-AP);

•           André Abdon (PP-AP);

•           Professora Marcivania (PCdoB-AP);

•           Tiago Dimas (Podemos-TO);

•           Rodrigo Rollemberg (PSB-DF); e

•           Rafael Fera (Podemos-RO)

O julgamento sobre as "sobras eleitorais" teve início com um recurso apresentado pelo partido PSB (Partido Socialista Brasileiro) em que questionava a decisão do Supremo, em fevereiro deste ano, que a votação não teria o efeito retroativo, ou seja, não atingiria os deputados eleitos em 2022.

•           O que são as sobras eleitorais

Diferentemente da disputa para a presidência, as eleições para o Legislativo (deputados e senadores) acontecem de forma proporcional. Essa última utiliza a regra do quociente eleitoral estabelecido pela Justiça e define os eleitos com base no cálculo entre os votos válidos e a quantidade de cadeiras a que os estados têm direito.

Esse quociente eleitoral estabelece o número mínimo de votos que um partido deve ter para eleger seus candidatos. Quando se atinge essa quantidade, o partido tem direito a eleger o candidato mais votado. Se atingir duas vezes, elege dois deputados e assim por diante.

A questão é que a quantidade de votos é um múltiplo não exato do quociente eleitoral, ou seja, um número não redondo. Assim, a parcela que resta são as sobras eleitorais.

O partido que entrou com recurso no STF sobre esse debate argumenta que uma alteração na legislação eleitoral em 2021 restringiu o acesso dos partidos às "sobras eleitorais" e seria inconstitucional.

 

•           Reportagem da Pública sobre Arthur Lira segue censurada

Nesta semana, notícias publicadas em anos anteriores sobre o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, voltaram a circular. A pedido da defesa de Lira, o STF determinou que algumas dessas publicações fossem retiradas do ar. Em seguida, o Ministro Alexandre de Moraes voltou atrás na decisão. No entanto, reportagem da Agência Pública sobre o mesmo assunto permanece censurada há 9 meses.

Em setembro de 2023, uma reportagem da Pública que trazia um relato inédito de Jullyene Lins, ex-esposa do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, foi censurada a pedido do deputado federal. A 6ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) decidiu pela remoção da reportagem e confirmou a decisão em abril deste ano, quando julgou o agravo de instrumento interposto pela defesa do presidente da Câmara dos Deputados e manteve, por decisão unânime, a censura à reportagem.

A reportagem, feita com base em documentos judiciais e fontes que deram seu depoimento sobre os fatos, teve propósito informativo e de interesse público, sem qualquer ofensa a quem quer que seja. Além disso, trazia novas acusações da ex-esposa do deputado federal, sobre outros fatos graves que teriam ocorrido no ano de 2006 e que não foram analisados pelo STF, que já havia absolvido Arthur Lira do crime de lesão corporal a ele imputado.

A defesa da Pública fez uma reclamação contra a censura ao STF, que foi indeferida por Alexandre de Moraes. Nossa defesa recorreu e o caso foi a julgamento da primeira turma do STF no dia 26 de abril. No momento, o julgamento está suspenso em razão do pedido de vistas da ministra Cármen Lúcia.

Nesta última semana, após a aprovação da tramitação em regime de urgência do Projeto de Lei 1904/24, que equipara o aborto legal de gestação acima de 22 semanas ao crime de homicídio, colocada em pauta por Arthur Lira sem aviso ou discussões prévias, a opinião pública reagiu nas redes sociais relembrando notícias divulgadas anteriormente a respeito de Lira.

Passaram a circular novamente entrevistas antigas de Jullyene Lins. A defesa de Arthur Lira, então, peticionou na reclamação feita pela defesa da Agência Pública ao STF para pedir a retirada do ar de diversos links, perfis no X (antigo Twitter), uma entrevista em vídeo de Jullyene Lins à Folha de S. Paulo em 2021, um vídeo da Mídia Ninja e notícias dos portais Terra e Brasil de Fato que repercutiam nossa reportagem.

O ministro Alexandre de Moraes inicialmente deferiu os pedidos da defesa de Arthur Lira, determinando a retirada das publicações do ar. Na noite de ontem, o ministro voltou atrás e liberou a publicação dos conteúdos da Folha de S. Paulo, Terra e Brasil de Fato. Na decisão, o ministro alega que “as informações obtidas após a realização dos bloqueios determinados, entretanto, demonstram que algumas das URLs não podem ser consideradas como pertencentes a ‘um novo movimento em curso, claramente coordenado e orgânico, e nova replicagem, de forma circular, desse mesmíssimo conteúdo ofensivo e inverídico’, como salientado pelo requerente [Lira], pois são veiculações de reportagens jornalísticas que já se encontravam veiculadas anteriormente, sem emissão de juízo de valor.”

A reportagem da Pública, que reiteramos, teve propósito informativo e de interesse público, foi elaborada “sem emissão de juízo de valor” , assim como as demais, mas segue sob censura. Com isso, a população fica privada do acesso a informações importantes sobre um homem público.

A decisão de manter censurado o nosso jornalismo de interesse público, é uma afronta à liberdade de imprensa e ao bom jornalismo.

Retirar do ar uma reportagem da Agência Pública, veículo reconhecido com mais de 75 prêmios nacionais e internacionais, é uma tentativa lamentável de calar a liberdade de imprensa. Organizações de defesa à liberdade de expressão como Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI), Associação de Jornalismo Digital (Ajor), Repórteres Sem Fronteiras (RSF) e Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) manifestaram preocupação com o caso.

 

Fonte: Fórum/Agencia Pública

 

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