quinta-feira, 20 de junho de 2024

Autor do PL sobre aborto é porta-voz de Malafaia na Câmara e pregou negacionismo na pandemia

Autor do PL Antiaborto por Estupro, o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) é considerado o porta-voz do pastor Silas Malafaia na Câmara e um dos principais herdeiros políticos do ex-presidente da Casa Eduardo Cunha.

O parlamentar eleito pelo Rio de Janeiro é membro da igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo e um dos mais barulhentos defensores de pautas conservadoras no Parlamento.

Aliado fiel de Jair Bolsonaro (PL), anda alinhado com as bandeiras do ex-presidente e exerce papel de liderança dentro da bancada evangélica.

Durante a pandemia da Covid, reverberou teses negacionistas do então chefe do Executivo e defendeu tratamentos comprovadamente ineficazes, apesar de ter visto os medicamentos não surtirem efeito quando ele mesmo contraiu a doença.

Procurado pela reportagem nesta terça-feira (18), o parlamentar não respondeu.

Diante da repercussão negativa do PL, a cúpula da Câmara, comandada pelo deputado Arthur Lira (PP-AL), decidiu criar uma "comissão representativa" para discutir o tema somente no segundo semestre deste ano.

Sóstenes está no terceiro mandato de deputado federal. De 2014 para cá, viu sua votação cair de maneira significativa elegeu-se na primeira vez com 104 mil votos e, na última, com 65 mil, mas manteve o assento no Parlamento.

Apesar de ter perdido apoio nas urnas, seguiu com força dentro do Legislativo. Prova disso é que foi eleito no início de 2023 para o cargo de segundo vice-presidente da Mesa Diretora.

Embora o PL de autoria do deputado tenha sido criticado até por parte da direita, que considerou a condução do debate um tiro no pé, aliados de Sóstenes fazem uma avaliação positiva da controvérsia.

Isso porque a proposta colocou o deputado no centro das atenções e reforçou sua imagem de defensor radical de pautas que bolsonaristas dizem ter origem nos valores cristãos.

Sóstenes ganhou os holofotes e entrou em embate até com o presidente Lula (PT). "O cidadão diz que fez o projeto para testar o Lula. Eu não preciso de teste. Quem precisa de teste é ele. Eu quero saber se uma filha dele fosse estuprada, como ele ia se comportar", afirmou o presidente nesta terça-feira (18).

O projeto do deputado limita o aborto a até 22 semanas de gestação. E prevê pena de 20 anos de prisão para a mulher e quem a auxiliar na interrupção da gravidez.

Com isso, a mulher que fizer o procedimento, se condenada, cumprirá pena de 6 a 20 anos de prisão. Ou seja, a ela será imposta uma pena maior do que a de seu próprio estuprador.

A pena prevista para estupro no Brasil é de 6 a 10 anos. Quando há lesão corporal, de 8 a 12 anos. Cerca de 61% das vítimas de estupro no Brasil em 2021 eram crianças e adolescentes com 13 anos ou menos.

Atualmente, o procedimento é permitido em três situações, que são gestação decorrente de estupro, risco à morte da mulher e anencefalia fetal. Nenhuma delas, porém, prevê um prazo limite da gravidez para ser realizado.

O autor do projeto deu declarações imprecisas para defender a proposta. Nas redes sociais, afirmou que fetos de bebês abortados são usados na indústria de cosmético. Não há, porém, evidências nesse sentido.

"Urgente: Descubra a verdade por trás das motivações do aborto e a relação com empresas multimilionárias que utilizam fetos em produtos farmacêuticos", ele escreveu em publicação somando as visualizações no X e no Instagram, foram mais de 1 milhão.

Além disso, dois médicos citados pelo parlamentar na justificativa que acompanha o PL dizem que o parlamentar apresentou uma versão fantasiosa para um caso rumoroso de aborto em uma menina capixaba estuprada em 2020.

O deputado iniciou sua trajetória na Câmara em 2015 como apoiador da candidatura de Eduardo Cunha à presidência da Casa. Após a vitória, passou a compor a tropa de choque do então chefe da Câmara.

Apesar da relação próxima, a queda de Cunha não foi ruim para ele. Sóstenes tornou-se um dos principais herdeiros políticos do ex-presidente da Câmara. Em 2018, por exemplo, virou o nome preferencial de deputados estaduais que, até então, costumavam fazer dobradinha eleitoral com Cunha.

Outro parlamentar próximo de Sóstenes é o deputado estadual Samuel Malafaia (PL-RJ), irmão do pastor Silas Malafaia.

Na eleição de 2018, o deputado federal doou R$ 471 mil para a campanha de Samuel. A relação dele com a família é de proximidade. À Folha de S.Paulo Sóstenes já deixou clara a proximidade: "Sinto por ele um carinho de pai adotivo", disse sobre Silas em 2022.

•           Soraya critica teatro no Senado e desafia autora de simulação de aborto a encenar estupro

A senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS) fez duras críticas nesta terça-feira (18) ao debate promovido no plenário do Senado sobre aborto e desafiou a contadora de histórias que interpretou um feto a dramatizar também uma mulher sendo estuprada.

"Eu queria até o telefone, o contato daquela senhora que esteve aqui ontem, encenando aquilo que nós vimos. Sabe por quê? Porque eu quero ver ela encenando a filha, a neta, a mãe, a avó, a esposa de um parlamentar sendo estuprada. Eu quero que ela faça a encenação do estupro agora. Por que não? Se encenaram um homicídio aqui ontem, que encenem o estupro", disse.

Thronicke afirmou que é contra o aborto e defendeu que existe vida desde a concepção. Disse, porém, que o Estado é laico e que o aborto é legal no país em três situações: em caso de estupro, de anencefalia fetal ou de risco de morte à gestante.

"A bancada feminina [do Senado] é a favor da vida e o aborto é proibido no nosso país, com três exceções dificílimas: o feto anencéfalo, risco de morte da mãe e o estupro. E não é obrigada a abortar quem foi estuprada e por acaso engravidou. Vai quem quer, de acordo com a sua fé, com a sua consciência. Por quê? Porque o Estado é laico", declarou.

Durante a sessão promovida pelo senador Eduardo Girão (Novo-CE) nesta segunda (17), a contadora de história Nyedja Gennari encenou o que seria um feto gritando durante o procedimento de assistolia fetal. "Não! Quero continuar vivo", gritou ela.

As críticas ao PL e à sessão organizada por Girão foram reforçadas pelos senadores Fabiano Contarato (PT-ES), Teresa Leitão (PT-PE) e Leila Barros (PDT-DF).

"A menarca, senhores deputados, assim como a menopausa, gera um ciclo menstrual alterado. Como é que a menina vai saber que está grávida, porque a sua menstruação foi interrompida, se ela não sabe nem contar direito o seu ciclo menstrual? Quando vem se descobrir, já vai longe", disse Leitão.

O PL Antiaborto por Estupro altera o Código Penal e equipara as penas para abortos realizados após 22 semanas de gestação às penas previstas para homicídio simples.

Após a provocação das senadoras, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que é uma "irracionalidade" e uma "inovação infeliz" a comparação. O senador afirmou ainda que o PL, da forma como foi construído, não parece ser "minimamente viável".

Parte das senadoras da Casa se juntou para acompanhar o discurso de Pacheco durante a sessão plenária. A bancada feminina deve se reunir nesta quarta-feira (19) para anunciar uma posição conjunta sobre o projeto de lei da Câmara.

Na audiência desta segunda, o Senado ignorou especialistas contrários texto e convidou apenas na véspera a presidente da Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia), Maria Celeste Wender.

 

•           Lira se queixa de críticas que recebeu sobre PL Antiaborto por Estupro e quer solução coletiva do texto

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), se queixou a líderes partidários sobre críticas que recebeu por causa da aprovação da urgência do projeto de lei Antiaborto por Estupro na Casa na semana passada. Ele também disse que é necessário encontrar uma solução coletiva para a proposta.

Lira se reuniu com líderes mais cedo nesta terça-feira (18). Segundo relatos de três participantes do encontro, o alagoano se queixou das críticas personalizadas a ele, classificando-as como improcedentes e de ataque pessoal. Também de acordo com participantes da reunião, alguns líderes saíram em defesa do alagoano, numa espécie de desagravo.

Lira também reforçou que a proposta irá tratar de assistolia fetal (procedimento que consiste na injeção de produtos químicos no feto para evitar que ele seja retirado do útero com sinais vitais), algo que já havia sido discutido com líderes previamente e afirmado publicamente pelo alagoano -dessa forma, o conteúdo da matéria, de autoria de Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), deve sofrer alterações.

Ele afirmou também que não é porque o projeto teve a sua urgência aprovada que os parlamentares logo irão se debruçar sobre o mérito do texto.

Na semana passada, os deputados aprovaram em votação-relâmpago conduzida por Lira o requerimento de urgência de um projeto de lei que altera o Código Penal para aumentar a pena imposta àquelas que fizerem abortos quando há viabilidade fetal, presumida após 22 semanas de gestação. A ideia é equiparar a punição à de homicídio simples.

A proposta foi criticada por setores da sociedade civil -com organização de manifestações de rua contra o texto e mirando Lira- e até mesmo por parlamentares do centrão e da direita, que avaliam que ela não deve prosperar. Líderes da esquerda e da direita afirmam que desde o começo havia acordo para votar a urgência do texto, mas não o seu mérito.

O requerimento de urgência acelera a tramitação de propostas na Câmara, já que elas não passam pela análise de comissões temáticas e seguem direto ao plenário.

Também foi discutida na reunião com líderes nesta terça a necessidade de dar um maior disciplinamento ao recurso do requerimento de urgência, sem banalizá-lo. A ideia de Lira é que, a partir de agora, um partido apresente um requerimento no colégio de líderes e, na semana seguinte, as lideranças deliberam se ele cabe ou não ser apreciado em plenário.

Na semana passada, além da urgência do projeto de lei antiaborto, os parlamentares também aprovaram em votação-relâmpago um requerimento de proposta que proíbe delações premiadas de presos.

Segundo um líder que esteve na reunião, Lira afirmou que não pode arquivar a matéria, mas que é preciso que os parlamentares encontrem uma solução de forma conjunta ao projeto de lei. Ele não tomou uma decisão sobre qual será o encaminhamento.

Participantes da reunião levantaram possibilidades acerca do trâmite do projeto de lei. Entre elas a designação de uma relatora para elaborar um texto de consenso, a criação de uma comissão especial para discutir a proposta e até mesmo não pautar o mérito do projeto.

A avaliação de líderes é que o projeto em questão não deve ser uma prioridade na Casa, e que os deputados devem focar a pauta econômica, como a regulamentação da reforma tributária. Há também parlamentares que defendem que o tema só seja discutido novamente após as eleições de outubro.

"O texto do projeto está mal construído, e a direita deu munição para os ataques da esquerda. Isso não é um tema para ser discutido neste momento", diz o líder do Solidariedade, Aureo Ribeiro (RJ).

Líder do PL na Câmara, Altineu Côrtes (RJ) diz que o partido é contra o aborto, mas que é possível "ajustar o texto". Ele disse que a sigla não irá se opor, caso seja decidido criar uma comissão especial para debater a matéria.

De acordo com um parlamentar que esteve no encontro, há uma sinalização de que o tema não será levado à pauta até que seja construído um texto de consenso pelo relator. Lira já indicou que deverá escolher uma mulher de partido de centro e moderada para exercer a função.

A bancada evangélica cobra celeridade para designação da relatora. Nos bastidores, são lembradas as deputadas Simone Marquetto (MDB-SP) e Dani Cunha (União Brasil-RJ).

Lira também se reuniu com parlamentares da oposição. Como a Folha de S.Paulo mostrou, o projeto não é consenso nem mesmo entre representantes da direita no Congresso. Reservadamente, parlamentares de partidos como União Brasil, PP e do próprio PL dizem que o conteúdo da proposta tem problemas.

Uma ala desses deputados e senadores descreve o projeto como um "tiro no pé", já que é uma pauta que poderia ter apoio da sociedade, mas trouxe elementos que são criticados até mesmo pelo eleitor de direita -por exemplo, a possibilidade de uma mulher vítima de estupro que faz aborto ter pena maior do que o seu estuprador.

O PL também foi discutido em reunião mais cedo entre os vice-líderes do governo na Câmara. Na conversa, parlamentares governistas disseram que era preciso cobrar que Lira não pautasse o projeto de lei.

A deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP), que esteve na reunião mais cedo na Câmara, diz à reportagem que não é o momento de designar relatora ou de pensar em alterar o texto, mas, sim, de arquivá-lo.

"Há uma avaliação em comum de que o projeto não deve ser pautado. Não se discute nomes na relatoria ou melhorias no texto, o pedido é pelo arquivamento."

•           Lira anuncia criação de 'comissão representativa' para discutir PL Antiaborto por Estupro no 2º semestre

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), afirmou na noite desta terça-feira (18) que vai criar uma "comissão representativa" para analisar o mérito do projeto de lei Antiaborto por Estupro. A ideia é que o grupo passe a atuar no segundo semestre, para que, segundo ele, o debate não ocorra de forma apressada.

"O colégio de líderes deliberou debater esse tema de maneira ampla no segundo semestre, com a formação de uma comissão representativa. Só iremos tratar disso após o recesso, na formação desta comissão, para tratar este tema com amplo debate. Com a percepção clara de que todas as forças políticas, sociais e de interesse no país participarão deste debate. Todos os segmentos envolvidos, sem pressa e sem qualquer tipo de açodamento ", disse Lira.

A decisão do presidente da Câmara ocorre após pressão de segmentos da sociedade, que se manifestaram contrários ao projeto de lei com organização de manifestações nas ruas, inclusive, e que acabou minando o apoio de parlamentares de partidos do centrão e da direita ao texto. Lideranças avaliam que a proposta não teria como avançar na Casa neste momento.

Na semana passada, os deputados aprovaram em votação-relâmpago conduzida por Lira o requerimento de urgência de um projeto de lei que altera o Código Penal para aumentar a pena imposta àquelas que fizerem abortos quando há viabilidade fetal, presumida após 22 semanas de gestação. A ideia é equiparar a punição à de homicídio simples. O texto pode levar meninas abaixo dos 18 anos a ficarem internadas em estabelecimento educacional por até três anos.

"Nada irá retroagir nos direitos já garantidos e nada irá avançar que traga qualquer dano às mulheres. Nunca foi e nunca será tema de discussão do colégio de líderes qualquer uma dessas pautas", disse Lira nesta segunda.

O presidente da Câmara fez um pronunciamento à imprensa para tratar do tema. Ele estava acompanhado de todos os líderes da Casa, além do líder do governo, José Guimarães (PT-CE), da presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), Caroline de Toni (PL-SC), e da coordenadora-geral da bancada feminina, deputada Benedita da Silva (PT-RJ).

Lira ainda disse que em nenhum momento a Câmara se furtou do debate de projetos, independentemente do tema, se "mais árido ou mais afável, econômico, social ou político".

"Esta é a Casa do povo, o espaço mais democrático que a sociedade tem para debater, para propor leis. Nunca fugiremos dessa responsabilidade de fazer o debate e trazer o debate com transparência", disse o presidente da Câmara.

Mais cedo, Lira se reuniu com líderes da Casa para tratar do projeto de lei. Como a Folha mostrou, o alagoano se queixou das críticas que ele recebeu pela aprovação da urgência da matéria e disse que os parlamentares deveriam encontrar uma solução coletiva sobre a proposta.

Segundo relatos de três participantes do encontro, o alagoano se queixou das críticas personalizadas a ele, classificando-as como improcedentes e de ataque pessoal.

Participantes da reunião levantaram possibilidades acerca do trâmite do projeto de lei, entre elas a criação de uma comissão especial para analisar o projeto. Parlamentares de esquerda pediram que Lira arquivasse a proposta, mas ele disse que não poderia fazer isso.

A avaliação de líderes é que o projeto não deveria ser uma prioridade na Casa. Segundo eles, os deputados devem focar a pauta econômica, como a regulamentação da reforma tributária. Há também parlamentares que defendem que o tema só seja discutido novamente após as eleições de outubro.

 

Fonte: FolhaPress

 

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