quinta-feira, 20 de junho de 2024

As pessoas que defendem corte de gasto são as mesmas que têm isenção, afirma Lula

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse nesta terça-feira (18) que as pessoas que falam em corte de gasto são as mesmas que têm isenção.

O chefe do Executivo disse ainda, em entrevista à CBN, que quer discutir com empresários e parlamentares uma solução para a desoneração da folha de 17 setores, após a devolução da MP do Pis/Cofins. Mas completou: "Não me venha falar de ajuste em cima das pessoas mais humildes deste país".

Lula criticou ainda a taxação das compras internacionais de até US$ 50, a chamada "taxa das blusinhas", mas disse que vai sancionar a proposta, "pela unidade do Congresso, do governo".

"O que me deixa preocupado é que as mesmas pessoas que falam que precisam parar de gastar, são as pessoas que têm R$ 546 bilhões de isenção, de desoneração na folha de pagamento, isenção fiscal. Ou seja, são os ricos que se apoderam de uma parte do orçamento do país. E eles se queixam daquilo que você está gastando com o povo pobre", afirmou.

A declaração ocorre na esteira de queda da Bolsa de Valores e alta do dólar na semana passada, enquanto investidores pressionam por corte de gastos no governo e temem enfraquecimento do ministro Fernando Haddad (Fazenda).

Lula cobrou de empresários contrapartidas pela lei que prorrogou a desoneração da folha de 17 setores e cortou a alíquota previdenciária de prefeituras, algo que ele havia vetado, mas o Congresso derrubou.

"Acabamos de aprovar uma desoneração para 17 setores da indústria brasileira. Qual é a contrapartida que esse setor está dando para o trabalhador? Qual é a estabilidade no emprego que ele garante, qual o aumento de salário? Nenhuma", disse.

"Apenas pega a isenção fiscal, não tem nenhum compromisso com o trabalhador, apenas em aumentar o lucro e acham que isso é normal. Nós não achamos, e eu estou disposto a fazer essa discussão com os empresários em qualquer lugar para que a gente coloque as verdades em cima da mesa e a gente saiba quem é que está gastando", completou.

O benefício da desoneração da folha foi criado em 2011, no governo Dilma Rousseff (PT), e prorrogado sucessivas vezes. A medida permite o pagamento de alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta, em vez de 20% sobre a folha de salários para a Previdência.

A desoneração vale para 17 setores da economia. Entre eles está o de comunicação, no qual se insere o Grupo Folha, empresa que edita a Folha de S.Paulo. Também são contemplados os segmentos de calçados, call center, confecção e vestuário, construção civil, empresas de construção e obras de infraestrutura, entre outros. A prorrogação do benefício até o fim de 2027.

Em outra frente, Lula admitiu também preocupação com o crescimento dos gastos com a previdência social. Mas disse que é preciso "consertar" dos dois lados, tanto crescimento de despesas, quanto da desoneração.

Questionado se está descartada a desvinculação da Previdência do salário mínimo ou mudança nos pisos de saúde e educação e na Previdência dos militares, Lula disse que nada está descartado.

"Eu sou um político muito pragmático. Na hora que as pessoas que me mostrarem as provas contundentes de que coisas estão equivocadas ou estão erradas, a gente vai mudar", afirmou, sem maiores detalhes.

Essas medidas vinham sendo estudadas pela equipe econômica, mas foram alvo de críticas mesmo dentro do governo e da base política do governo no Congresso. O PT, partido do presidente, soltou nota em defesa dessas temas na segunda-feira (17).

"Temos quase R$ 1 trilhão com a Previdência Social. É muito. Agora, se tem muita gente para se aposentar vai sempre aumentar. O que é muito é você ter quase R$ 600 bilhões de isenção, R$ 400 bilhões de desoneração. Isso não é possível, é preciso a gente consertar, e consertar dos dois lados"

Ainda na toada das críticas, o presidente se queixou da taxação das compras internacionais de até US$ 50, a chamada "taxa das blusinhas", do comportamento do empresariado neste tema e na aprovação da medida pelo Congresso. Ainda assim, contudo, disse que vai manter o acordo de sancionar a medida, que já está no Palácio do Planalto.

"Por que taxar um pobre e não taxar o cara que vai no freeshop gastar US$ 1.000? É uma questão de consideração com o povo mais humilde desse país. Gastar US$ 50 e pagar imposto e o cara que gasta US$ 2.000 não paga", disse.

"Vetei, depois houve tentativa de algum acordo e assumi compromisso com Haddad que aceitaria botar PIS/Cofins de 20%, isso tá garantido. Estou fazendo isso pela unidade do Congresso, governo e pessoas que queriam. Eu, pessoalmente, acho equivocado a gente taxar pessoas humildes", completou.

Ele disse ainda que ficou "profundamente irritado" com o fato de a proposta ter entrado como "jabuti" quando algo é colocado dentro de um projeto que não tem a ver com a sua temática original no projeto do Mover, que cria um programa para incentivar a descarbonização de carros.

A isenção de imposto de importação beneficia lojas online conhecidas, como Shopee e Shein. Hoje, os produtos de até US$ 50 vendidos nesses sites já são taxados pelo ICMS, que é estadual e tem alíquotas que variam entre 17% e 19%.

Para os produtos mais baratos, a taxa de importação será de 20% sobre o valor, conforme o projeto aprovado nesta terça. Para itens acima de US$ 50, o imposto previsto é de 60%, mas também foi criada uma faixa intermediária, entre US$ 50 e US$ 3 mil, que terá um desconto de US$ 20 na taxação.

•           Lula fala de Tarcísio como adversário pela 1ª vez, e aliança com Campos Neto irrita governo

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vocalizou nesta terça-feira (18) a irritação não só dele, mas também de integrantes de seu governo e da cúpula petista com a movimentação do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, rumo a uma aliança com o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), em 2026.

Foi a primeira vez que Lula tratou o governador de São Paulo como potencial adversário nas eleições de 2026. Em entrevista à rádio CBN, o petista afirmou que o presidente do BC tem lado político.

"[Tarcísio] Tem mais [poder de influência] que eu. Não é que ele [Campos Neto] encontrou com Tarcísio numa festa. A festa foi para ele, foi homenagem do governo de São Paulo para ele, certamente porque o governador de São Paulo está achando maravilhoso a taxa de juros de 10,5%", disse Lula.

"A quem esse rapaz é submetido, como ele vai numa festa em São Paulo, quase assumindo candidatura um cargo no governo de São Paulo? Cadê a autonomia dele?", questionou o petista, que também comparou o presidente do BC ao ex-juiz da Lava Jato Sergio Moro.

"O presidente do Banco Central, que não demonstra nenhuma capacidade de autonomia, que tem lado político e que, na minha opinião, trabalha muito mais para prejudicar o país do que para ajudar o país", afirmou, após declarar que a autoridade monetária está "desajustada".

A presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), afirmou que o partido prepara uma ação popular contra Campos Neto. "É um escândalo isso. Vi vários comentaristas criticando essa postura. Estamos preparando uma ação popular contra ele. Por violação do interesse público e moralidade administrativa", disse ela.

Segundo Gleisi, Campos Neto mostrou o lado político e conduz o BC para impedir o crescimento do país. "Está fazendo o serviço sujo para a oposição", disse a presidente do PT.

Aliados do presidente divergem sobre a menção a Tarcísio como potencial opositor na corrida presidencial, uma vez que defendem a rivalidade com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) como estratégia política.

No entanto, apontam como importante a responsabilização de Campos Neto pela política de juros, associando o presidente do BC ao bolsonarismo.

Na avaliação de aliados do presidente Lula, a materialização dessa aliança entre o presidente do BC e a oposição pode ser constatada com a presença de Campos Neto em jantares ao lado do governador de São Paulo, além da hipótese de participação em um eventual governo Tarcísio.

JANTARES E HOMENAGEM

Campos Neto jantou com o governador na casa do apresentador Luciano Huck, foi homenageado em outro jantar, no Palácio dos Bandeirantes, e sinalizou a Tarcísio que aceita ser seu ministro da Fazenda caso ele se eleja presidente da República.

Para a homenagem, na semana passada, o governador convidou alguns aliados, banqueiro e empresários. Campos Neto foi junto com sua família ao jantar.

Segundo relatos de presentes, o clima era ameno e descontraído. Nas conversas, Campos Neto era elogiado pela conduta à frente do BC, criticada por Lula.

Horas antes ele foi homenageado com o Colar de Honra ao Mérito Legislativo da Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo), maior condecoração da Casa. A honraria foi proposta pelo deputado bolsonarista Tomé Abduch (Republicanos), vice-líder do governo Tarcísio na assembleia.

Já na semana passada, aliados do presidente Lula foram às redes em protesto. Ex-presidente do PT, o deputado Rui Falcão (SP) foi um dos críticos. "Que vergonha esse presidente do BC! Além de sabotar nossa economia, virou sabujo do Tarcísio", postou.

Gleisi também protestou nas redes, mencionando reportagem da Folha. "Isso é que é a tal 'autonomia' do Banco Central: diz a Folha que Campos Neto faz campanha por Tarcísio Freitas para presidência e topa ser ministro da Fazenda. Aposta na deterioração da economia do país (que ele faz de tudo para atrapalhar) para favorecer o candidato de Jair Bolsonaro. E o cara ainda está sentado na cadeira de presidente do BC! Quando a gente diz que ele é político, jamais um técnico, ficou escancarado agora. Campos Neto não tem sequer resquício de autoridade para comandar o BC", escreveu Gleisi.

 

•           Derrota em MP acirra rixa entre Haddad e Rui Costa no núcleo do governo

O debate sobre a MP (medida provisória) que restringia o uso de créditos tributários do PIS/Cofins acirrou a animosidade que marca a relação dos ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e da Casa Civil, Rui Costa.

Aliados dos dois ministros trocam acusações sobre a responsabilidade pela crise que, na semana passada, culminou com a devolução da MP, fragilizando a imagem de Haddad e fazendo com que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se manifestasse em apoio ao titular da Fazenda.

Interlocutores do chefe da área econômica culpam Costa pelo esvaziamento do poder de negociação da equipe após o titular da Casa Civil ter intermediado um encontro entre Lula e o presidente da CNI (Confederação Nacional das Indústrias), Ricardo Alban, horas antes de uma audiência com o próprio Haddad.

Depois dessa conversa com Lula, Alban afirmou que o governo abriria mão da MP, deixando Haddad sem cacife para a costura de um acordo. Alban foi presidente da Federação das Indústrias da Bahia durante governo Costa.

Os aliados de Costa, por sua vez, acusam Haddad de não estabelecer pontes de diálogo com o empresariado, além de não ter negociado os termos da MP antes de sua apresentação.

Interlocutores de Costa alegam que a mediação de um encontro entre Alban e Lula tomou corpo durante viagem oficial à Árabia Saudita e à China. O chefe da Casa Civil e o presidente da CNI integravam a comitiva, liderada pelo vice-presidente Geraldo Alckmin.

Ainda segundo relatos, contrariado com o encaminhamento da proposta, Alban avisou que deixaria a comitiva para regressar ao Brasil. Foi agendada uma audiência para a manhã da quarta-feira (11), que acabou atrasada em decorrência de problemas no voo do empresário. Mas aconteceu antes da audiência do presidente da CNI com Haddad.

Também segundo relatos, Alban teria reclamado a Lula de dificuldade de negociação com Haddad. O próprio presidente reclamou da desarticulação em torno da proposta, chegando a afirmar que prevaleceu a narrativa de que o agronegócio seria atingido.

Apesar da devolução, a indústria continua insatisfeita com a falta de interlocução com o Ministério da Fazenda. Queixam-se de que, mesmo depois da polêmica, Haddad continue ouvindo mais o mercado financeiro do que os empresários. Um interlocutor influente do indústria diz, de forma irônica, que Haddad está querendo fazer "supletivo" com o mercado financeiro, enquanto o setor, na verdade, nunca apoiou o governo Lula.

Ainda na interpretação desse industrial, o mercado será o primeiro a apoiar a oposição liberal nas próximas eleições, vide a articulação em torno do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicano).

A leitura é que as relações estão desequilibradas. Um dos pontos reforçados é que há setores da indústria que foram os primeiros apoiadores de Lula na campanha de 2022. Não haveria problema de interlocução com o Alckmin e o BNDES, mas faltaria gente na equipe de Haddad que de fato tenha canal com os empresários.

Na avaliação de uma fonte da indústria paulista, Haddad, como responsável pela condução da política econômica, precisa liderar esse diálogo.

Segundo representantes do setor, Alban foi autorizado por Lula a anunciar a desistência da MP, que foi devolvida pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), com aval do governo. Durante reunião com empresários, Alban deu o recado de Lula de que o governo barraria se a MP não fosse devolvida.

Entre os empresários da indústria, há críticas disparadas a Costa pela falta de articulação do ministro da Casa Civil com o setor produtivo e por ter uma agenda própria para o seu estado, a Bahia. A Casa Civil do governo não estaria cumprindo o seu papel de organizar o governo e apoiar a coordenação política.

A leitura é de que o último modelo de coordenação política que funcionou foi o do ex-presidente Michel Temer. O então ministro Eliseu Padilha, que conhecia muito o Congresso, ficava na Casa Civil cuidando dos projetos mais importantes, e a coordenação política cuidava do varejo dos parlamentares.

Já dentro do governo, aliados têm sugerido, com sutileza, que o presidente intervenha para frear a troca de farpas entre os dois principais ministros de sua equipe. Um armistício foi desenhado no ano passado, quando Costa encontrou Haddad na Fazenda em um aceno pela pacificação. Mas os ressentimentos ressurgiram durante o processo de fritura do ex-presidente da Petrobras, Jean Paul Prates. Costa é apontado como um dos responsáveis pela exoneração, da qual Haddad discordava.

Em meio ao desgastante processo de demissão de Prates, Haddad criticou, entre aliados, a atabalhoada forma com que foi anunciado o pacote de medidas voltadas ao setor industrial apresentado em janeiro, em evento no Palácio do Planalto.

 

Fonte: FolhaPress

 

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