terça-feira, 28 de maio de 2024

Para liderar mercado de hidrogênio verde, Brasil tem de acelerar marco regulatório

Não que seja o único caminho. Mas o papel que o hidrogênio verde tem na transição energética global, e principalmente na brasileira, fica cada vez mais nítido a cada tragédia climática que ocorre no mundo. A questão é entender se o País vai realmente embarcar nesse voo para o futuro ou, mais uma vez, perder o bonde da história.

“Muitos consideram o hidrogênio verde uma commodity. Mas é muito mais do que isso. É uma molécula que resulta em um produto sofisticado. A dimensão dos processos envolvidos nesses processamentos equivale quase ao de uma refinaria. São projetos que precisam de muito investimento, mas também apresentam potencial para gerar emprego e renda”, afirma a diretora executiva da Associação Brasileira da Indústria do Hidrogênio Verde (ABIHV), Fernanda Delgado.

Em termos de política industrial, tudo o que está relacionado à produção de hidrogênio verde precisa ser construído. No Congresso, a Comissão Especial para Debate de Políticas Públicas sobre Hidrogênio Verde está à frente de um projeto de lei que caminha de forma acelerada para ser apreciado pelo plenário da Câmara.

O PL 5.816/2023 cria o Programa de Desenvolvimento do Hidrogênio de Baixo Carbono. O texto apresentado pelos senadores Fernando Dueire (MDB-PE), Astronauta Marcos Pontes (PL-SP) e Cid Gomes (PDT-CE) recebeu voto favorável do relator, o senador Otto Alencar (PSD-BA), e tramita nas comissões da Câmara.

“O hidrogênio verde é a energia do futuro. O Brasil tem um potencial muito grande para fabricar e exportar o produto. Exportação, inclusive, na forma da amônia, que é uma produção que pode ser vendida e transportada para outros países e também usada para consumo interno no Brasil”, afirmou Alencar à Agência Senado ao defender o seu texto.

A nova política do hidrogênio, se aprovada, vai implementar uma série de princípios, como o respeito à neutralidade tecnológica, sem incentivos ou subsídios que distorçam a competitividade. Assim como promoverá a inserção do hidrogênio de baixa emissão de carbono na matriz energética brasileira, aproveitará o uso racional da infraestrutura existente dedicada ao suprimento da cadeia de energia e estimulará a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico do hidrogênio verde.

•        Os incentivos fiscais previstos

Outro ponto central do marco regulatório são os dois tipos de incentivos fiscais previstos: os tributários, que incluem a criação de um regime especial e a expansão de benefícios das Zonas de Processamento de Exportação, e os regulatórios, na forma de descontos tarifários em energia elétrica.

A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) deverá regular e fiscalizar o processo de produção, além de autorizar empresas brasileiras, com sede e administração no País, a exercerem as atividades de produção de hidrogênio, segundo o texto do PL. Tudo dentro do escopo de uma Política Nacional do Hidrogênio, que também será criada.

“É interessante dizer também que a questão da exportação do hidrogênio verde não é a única saída. O mercado nacional, em vários setores, desde a produção de fertilizantes e aço, passando pela soja e pela indústria alimentícia, até chegar ao setor químico, vai se beneficiar de forma robusta e intensa de toda a produção”, afirma Fernanda. Segundo a executiva da ABIHV, se, no início, se pensava muito na produção de hidrogênio verde principalmente para substituir as matrizes energéticas sujas da Europa – quase sempre à base de carvão – ou de outras regiões do mundo, esse é um debate que evoluiu muito de quatro anos para cá. E, agora, o mercado nacional é tão importante quanto o internacional.

Apenas o marco regulatório e políticas públicas como o Nova Indústria Brasil ou o Programa de Aceleração da Transição Energética (Paten) não serão suficientes para fazer deslanchar os bilhões de dólares que estão engatilhados em projetos de produção de hidrogênio verde no Brasil, segundo especialistas que acompanham o setor. Muita articulação política para que as intenções dos principais programas se alinhem com as fontes de recursos necessárias e disponíveis é considerado um ponto-chave para não haver desperdício de oportunidades.

•        O potencial do Brasil

Segundo o fundador e presidente da Associação Brasileira de Hidrogênio e Combustíveis Sustentáveis (ABHIC), Sérgio Augusto Costa, os números atrelados ao potencial que o Brasil tem dão vazão ao gigantismo do segmento. O País, conforme o executivo, pode vir a se tornar um dos maiores produtores de hidrogênio do mundo. E com totais condições de atender tanto os mercados interno quanto o externo. “Se falarmos de investimentos, por exemplo, o potencial brasileiro é de US$ 200 bilhões de investimentos nos próximos 20 anos, de acordo com projeção da consultoria McKinsey & Company”, afirma Costa.

Mas o executivo da ABHIC aponta um ponto nevrálgico, a questão do custo de produção, que ainda está bastante elevado. “Essa é uma questão relevante, não só no Brasil, mas no mundo todo.” Se hoje o custo da produção do combustível está entre US$ 5 (R$ 25,75) e US$ 6 (R$ 30,9) por quilo, em termos competitivos ele precisaria cair para de US$ 1,5 (R$ 7,72) a US$ 2 (R$ 10,3), que é o custo de produção do chamado hidrogênio cinza, extraído do gás natural, a partir do metano.

“Ou seja, ainda há muito a fazer para diminuir o custo de produção, bem como melhorar o desempenho dos eletrolisadores na produção de hidrogênio verde para cada dólar investido.”

<><> As classificações do hidrogênio por ‘cor’

•        Cinza: forma produzida a partir da combustão incompleta de combustíveis fósseis. É uma mistura de gases que consiste em monóxido de carbono, dióxido de enxofre, hidrocarbonetos, partículas sólidas e outros contaminantes. É poluente e piora as mudanças climáticas

•        Azul: forma líquida, produzida a partir do gás natural e do óleo. Pode ter uso doméstico e industrial. Contribui para a poluição ambiental

•        Verde: fabricado por fontes renováveis, seja o sol, o vento ou a biomassa. Durante a produção, não há emissões diretas de gases de efeito estufa

 

•        Novos títulos verdes financiarão economia circular e saneamento

Prevista para ocorrer nos próximos meses, a segunda emissão de títulos soberanos sustentáveis do Brasil no mercado internacional financiará projetos de economia circular e de saneamento não contemplados no primeiro lançamento. O Tesouro Nacional incluiu os segmentos no Relatório de Pré-Emissão, divulgado na última sexta-feira (24).

O documento repetiu os limites totais do ano passado, segundo os quais os projetos de meio ambiente ficarão com 50% a 60% dos recursos levantados no exterior. Os projetos sociais terão os 40% a 50% restantes. No entanto, a distribuição interna das atividades a serem financiadas mudou em relação à primeira emissão de títulos verdes, ocorrida em novembro do ano passado na bolsa de Nova York.

O Tesouro divulgou a distribuição do dinheiro a ser levantado no mercado externo. O relatório não apresenta estimativas de quanto pretende arrecadar com a emissão de papéis no mercado estrangeiro, mas o ministério pretende repetir os US$ 2 bilhões, cerca de US$ 10 bilhões pelo câmbio atual, levantados na primeira operação no ano passado.

Segundo o relatório do Tesouro, os recursos obtidos com os títulos soberanos sustentáveis do Brasil serão destinados a projetos de nove segmentos, sete ligados à área ambiental e dois ligados à área social. O órgão elaborou uma estimativa de distribuição para cada um desses segmentos, com sublimites mínimos e máximos de divisão de recursos.

<><> Nos projetos ambientais, a distribuição ficará da seguinte forma:

•     Energia renovável: 30% a 34%;

•     Transporte limpo: 13% a 17%;

•     Controle de emissões de gases de efeito estufa: 4% a 5%;

•     Adaptação às mudanças climáticas: 1% a 4%;

•     Biodiversidade terrestre e aquática: 1% a 2%;

•     Eficiência energética: 0,5% a 1%;

•     Economia circular: 0,5% a 1%;

•     Total: 50% a 60%.

<><> Nos projetos sociais, os sublimites obedecerão aos seguintes intervalos:

•     Combate à pobreza: 36% a 46%;

•     Acesso à infraestrutura básica: 4% a 8%;

•     Total: 40% a 50%.

<><> Diferenças

Na primeira emissão na bolsa de Nova York, em novembro, a prioridade tinha sido dada a projetos de transporte limpos (20% a 25%) e de energia renovável (15% a 20%), no meio ambiente. A nova emissão incluirá o segmento de economia circular, não contemplado no primeiro lançamento internacional de títulos verdes.

Em relação aos projetos sociais, o percentual máximo de projetos de combate à pobreza caiu. Na primeira emissão, o segmento tinha concentrado de 30% a 40% da emissão. Em contrapartida, o Tesouro inseriu o segmento de acesso à infraestrutura básica, que contemplará principalmente saneamento, que substituirá projetos de segurança alimentar, beneficiados na operação do ano passado.

•        Rio Grande do Sul

O Tesouro informou que, neste momento, os recursos obtidos com a emissão dos títulos verdes ajudam a financiar as ações de reconstrução no Rio Grande do Sul já anunciadas pelo governo. O órgão, no entanto, ressaltou que, caso a relação dos projetos com a legislação que regula a emissão de títulos sustentáveis seja demonstrada, o enquadramento pode ser revisto, com a inclusão de projetos.

“Ainda não há informações suficientes para enquadrar as despesas orçamentárias decorrentes dessas medidas [de ajuda ao Rio Grande do Sul] à classificação do Arcabouço Brasileiro para Títulos Soberanos Sustentáveis e, portanto, elas não integraram a seleção indicativa das categorias de despesas elegíveis deste relatório. Mais à frente, se elas se mostrarem aderentes ao referido Arcabouço, poderão vir a ser reportados na alocação de recursos levantados pelos títulos sustentáveis emitidos pelo Tesouro Nacional”, destacou o relatório.

Projetos sustentáveis

Títulos federais lançados no exterior, os papéis verdes são vinculados a compromissos com o meio ambiente. Em vez de receber meros juros financeiros, investidores estrangeiros receberiam os rendimentos de um projeto sustentável, que ficariam entre 6,15% e 8% ao ano para os compradores dos títulos.

Essa será a mesma taxa de retorno do Fundo Nacional sobre Mudança do Clima, relançado há dois meses e que receberá parte dos recursos das emissões dos títulos.

Na última quinta-feira (23), o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, informou que prepara uma segunda emissão de títulos verdes até o fim do ano. “Estamos preparando nova emissão do papel neste ano que, novamente, vai prover recurso para o Fundo Clima”, disse Ceron em evento promovido pela Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib). A data, disse ele, dependerá do melhor momento do mercado internacional.

A primeira emissão de títulos verdes atrasou. Inicialmente prevista para ocorrer em setembro do ano passado, a emissão só ocorreu em novembro. Na ocasião, o Tesouro Nacional conseguiu captar os US$ 2 bilhões com juros de 6,5% ao ano, a serem pagos no vencimento dos papéis.

 

•        UE dá sinal verde para lei mais dura sobre responsabilidade corporativa

Nesta sexta-feira (24), o Conselho da União Europeia deu a aprovação final à Diretiva de Devida Diligência em Sustentabilidade Corporativa  (CSDDD na sigla em inglês), encerrando um drama político de quatro meses que quase resultou no fracasso da diretiva. A CSDDD cria uma responsabilidade legal para as empresas relativa às violações ambientais e dos direitos humanos na sua cadeia de abastecimento. Para chegar a um acordo, o CSDDD final foi significativamente diluído em relação à proposta inicial.

Como o nome indica, o CSDDD, também denominado CS3D, estabelece uma norma de due diligence corporativa em questões de sustentabilidade para empresas que operam na UE. Neste caso, a sustentabilidade aplica-se mais diretamente às preocupações ambientais, às alterações climáticas e aos direitos humanos.

Os novos requisitos de devida diligência aplicam-se não apenas às ações diretas da empresa, mas também às suas subsidiárias e à cadeia de abastecimento. As empresas sediadas na UE, bem como as empresas de países terceiros que realizam um determinado nível de negócios na UE, podem se tornar responsáveis pelas ações dos seus fornecedores.

A versão final do CSDDD, divulgada em 30 de janeiro, inicialmente parecia pronta para fácil aprovação. No entanto, esse apoio diminuiu rapidamente, levando a 45 dias de negociações a portas fechadas, falsos começos e pressão política que foi uma montanha-russa emocional para os defensores da sustentabilidade. O Conselho acabou por aprovar uma versão diluída da diretiva em 15 de março.

Originalmente, o CSDDD impactava empresas com 500 trabalhadores e um volume de negócios de 150 milhões de euros (R$ 840 milhões na cotação atual). Esses números foram aumentados para 1.000 funcionários e um volume de negócios de 450 milhões de euros (R$ 2,5 bilhões).

O CSDDD será implementado gradualmente ao longo de cinco anos. As empresas com 5.000 trabalhadores e um volume de negócios de 1,5 bilhão de euros (R$ 8,4 bilhões) serão impactadas em 2027. As empresas com 3.000 trabalhadores e um volume de negócios de 900 milhões de euros (R$ 5 bilhões) serão impactadas em 2028. As empresas com 1.000 trabalhadores e um volume de negócios de 450 milhões de euros (R$ 2,5 bilhões) serão impactadas em 2029.

No dia 24 de abril, o Parlamento Europeu aprovou o CSDDD. Foi então enviado de volta ao Conselho da União Europeia para aprovação final. Começou no Comitê dos Representantes Permanentes dos Governos dos Estados-Membros junto da União Europeia do Conselho, conhecido como COREPER, para votação em 15 de maio. A votação final foi realizada pelo Conselho de Competitividade do Conselho (Compet), em 24 de maio.

Dos 27 estados da UE, 17 votaram a favor, enquanto 10 se abstiveram na votação do Compet. Devido à natureza dos requisitos de votação, uma abstenção tem o mesmo efeito que votar contra a diretiva. Abstiveram-se: Áustria, Bélgica, Bulgária, República Checa, Estónia, Alemanha, Hungria, Lituânia, Malta e Eslováquia. A favor: Croácia, Chipre, Dinamarca, Finlândia, França, Grécia, Irlanda, Itália, Letónia, Luxemburgo, Países Baixos, Polónia, Portugal, Roménia, Eslovénia, Espanha e Suécia.

Uma vez publicada formalmente no Jornal Oficial da União Europeia, os estados membros da UE terão dois anos para implementar a diretiva a nível nacional. A publicação deverá ocorrer no início de junho de 2024.

 

Fonte: Agencia Estado/IstoÉ/Forbes

 

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