Jeferson
Miola: Crise revela identidade ideológica de Leite com ideário da
extrema-direita
O
governador tucano Eduardo Leite confessou em entrevista [FSP, 20/5] que recebeu
com antecedência os alertas da meteorologia sobre a ocorrência de enchentes,
mas mesmo assim não tomou as providências devidas.
Num
reconhecimento tardio do seu negacionismo climático, e já depois de muito leite
derramado, com a licença para o trocadilho, ele admitiu que “muitos alertas se
revelam agora especialmente relevantes”.
Ora,
pelo menos desde 2022 o governo gaúcho tem conhecimento de que o território do
Rio Grande do Sul é um dos epicentros mundiais de fenômenos climáticos graves.
E,
durante as enchentes de setembro e novembro de 2023, o governo recebeu a
previsão de que novo evento climático severo ocorreria em abril e maio de 2024,
porém nada fez. Ou melhor, destinou ridículos 50 mil reais do orçamento deste
ano para a defesa civil.
Leite
justificou a inação governamental na prevenção e preparação da defesa civil
porque “o governo também vive outras pautas e agendas”.
Mas,
afinal, quais seriam essas “outras pautas e agendas” hierarquicamente mais
relevantes e de prioridade absoluta, que canalizaram todos os esforços e
recursos do Estado do RS e que impediram que o governo protegesse a população e
a economia gaúcha com um plano de contingência frente à previsão do evento
climático severo, conhecido com antecedência de pelo menos nove meses?
O
governador responde que “a agenda que se impunha ao estado era aquela
especialmente vinculada ao restabelecimento da capacidade fiscal do estado
[…]”, não a agenda de salvar vidas e prevenir para que essa situação de terra
arrasada não acontecesse.
Tanto
Leite como o prefeito de Porto Alegre Sebastião Melo não podem ser
responsabilizados pelo evento climático severo.
No
entanto, a omissão, a incompetência e a negligência deles causou graves
prejuízos humanos, ambientais e econômicos que ou poderiam ter sido evitados em
grande medida, ou poderiam ter sido consideravelmente menores, senão mínimos,
se os governantes tivessem agido de outra maneira.
Não
se pode aceitar a narrativa mentirosa de que houve uma catástrofe; uma
fatalidade causada pela malvada natureza ou por um castigo divino. Porque o que
aconteceu foi um crime.
E,
como fica claro na confissão do governador, um crime praticado de modo doloso,
com a consciência sobre os efeitos trágicos que sua omissão causaria.
Esta
confissão do Leite foi precedida de outros tropeços dele na crise.
O
primeiro, quando criou a arrecadação de doações via PIX em contra gerenciada
por entidade privada.
Depois,
no exercício autêntico do seu servilismo ao mercado, Leite cogitou prescindir
de doações humanitárias para favorecer o comércio em detrimento das pessoas e
das famílias que perderam absolutamente todos seus bens e recursos.
Apesar
de Leite ser enquadrado na classificação de direitista que “come com garfo e
faca”, como Fernando Haddad caracteriza direitistas “civilizados”, a crise tem
aprofundado as características conservadoras, iliberais, negacionistas e
primitivistas dele sobre o papel do Estado e a visão de sociedade, que têm
fortes semelhanças com o ideário das extremas-direitas lavajatista e
bolsonarista.
• Não é
catástrofe, é crime. Por Jeferson Miola
Especialistas,
acadêmicos e cientistas convergem no diagnóstico de que falhas da Prefeitura na
manutenção do sistema de proteção contra enchentes causaram a inundação de
Porto Alegre, que poderia ter sido evitada.
Não
precisaríamos estar passando por isso. Decididamente não precisaríamos sofrer
com tamanha devastação, perda e dor.
Não
aconteceu uma catástrofe. Mas catastróficas foram as consequências do evento
climático severo. Que poderiam não ter sido catastróficas – ou, pelo menos, não
teriam sido de magnitude catastrófica –, se a Prefeitura não tivesse sido
negligente, incompetente e irresponsável.
As
falhas, todas evitáveis e preveníveis, ocorreram no contexto de um processo
contínuo de sucateamento, abandono e desmonte das estruturas e da inteligência
técnica das áreas de engenharia, planejamento, gestão hídrica, ambiental e
urbanística da cidade.
Este
debilitamento da capacidade pública do Município, que é metódica e intencional,
integra o ideário do bloco de poder que desde 2005, há 20 anos, se reveza na
Prefeitura com sucessivas gestões conservadoras que transformaram a capital
gaúcha num laboratório de experimentos ultraliberais radicais.
As
oligarquias locais eliminaram barreiras sócio-ambientais modernas e normas
urbanas civilizadas para deixar livre o caminho da penetração agressiva
sobretudo do capital financeiro e imobiliário no território da cidade,
desfigurando a paisagem, degradando as condições ambientais e desprotegendo a
população.
A
Prefeitura não foi pega desprevenida neste evento climático severo. Desde pelo
menos desde 2022, quando da ocorrência de ciclones extratropicais, se sabia que
o Rio Grande do Sul é um epicentro mundial de fenômenos climáticos severos.
Depois,
em setembro e novembro de 2023, quando o nível do Guaíba atingiu
respectivamente 3,18m e 3,46m, houve inundação restrita em algumas áreas da
cidade, e então as falhas de manutenção do sistema ficaram patentes.
Não
se tratavam de problemas complexos. Menos ainda problemas insanáveis ou
onerosos, mas de questões comezinhas, como a falta de borracha de vedação e de
parafuso de pressão para fechar e vedar eficientemente as comportas.
Apesar
desses sinais todos, o governo do prefeito Sebastião Melo negligenciou, não
investiu um único centavo no sistema de proteção contra enchentes e não
providenciou sequer o conserto das comportas, das tampas de esgoto e das bombas
de água defeituosas.
A
Prefeitura tem responsabilidades indiscutíveis pelo descalabro da cidade.
Se
o sistema não tivesse falhado como falhou, por falta de manutenção, a única
área da cidade que ficaria inundada seria o bairro Sarandi, na região norte,
uma vez que o volume do Rio Gravataí fez o Guaíba ultrapassar a cota de 6
metros, que é o limite de nível que o sistema de proteção de enchentes protege.
No
entanto, todas demais áreas, como o centro histórico, a Cidade Baixa, o Menino
Deus, a zona sul, o 4º Distrito, o aeroporto e outras partes do território não
teriam sido inundadas.
Além
de responsável pelos efeitos catastróficos do evento climático, a Prefeitura
também é responsável pelo atraso inaceitável do fim da inundação da cidade, que
poderia terminar em dois ou três dias, se fossem empregadas as soluções
técnicas recomendadas por especialistas ao prefeito e sua equipe inepta.
As
recomendações são exequíveis e estão ao alcance imediato: mergulhadores para
vedar as comportas e impermeabilizar as áreas de infiltração, fechamento
hermético de tampas de dutos forçados e energização das casas de bombas que
devolvem a água invasora para o Guaíba.
Mesmo
com a existência dessa alternativa para acelerar o escoamento das águas, o
governo municipal continua irredutível no erro, na incompetência e no
negacionismo, sujeitando a cidade a ficar semanas alagada, quando poderia
acabar a inundação imediatamente.
Com
isso, o governo municipal aumenta os danos, os prejuízos das pessoas e
empresas, a economia, e expõe a população ao risco de colapso sanitário.
Na
tarde desta 6ª feira, 17/5, a Prefeitura derrubou portões do Muro da Mauá para
permitir que a água retida na parte interna da cidade, em cota superior à do
Guaíba, pudesse escoar para o Lago.
Detalhe:
a Prefeitura não abriu portões, mas derrubou portões do Muro. Significa a
destruição de uma barreira física estrutural de contenção de enchentes. Ou
seja, mais uma irresponsabilidade absurda da Prefeitura.
E
se nos próximos dias o nível do Guaíba voltar a subir consideravelmente,
possibilidade mostrada em modelos meteorológicos, isso significa que as águas
encontrarão os portões abertos para inundarem a cidade indefesa?
Sebastião
Melo faz parte do problema, ele é responsável por sujeitar a população a sofrer
consequências catastróficas do evento climático severo. Não merecíamos passar
por isso.
Porto
Alegre não foi atingida por uma fatalidade inevitável, como sugere a mídia
associada à exploração imobiliária inescrupulosa da cidade. Tampouco foi vítima
de alguma maldade da natureza ou castigo divino.
A
catástrofe poderia ter sido evitada; foi consequência das escolhas ruinosas do
governo Melo.
O
que aconteceu e continua acontecendo é um crime, e os culpados precisam ser
afastados de funções públicas e responsabilizados nas esferas administrativa,
cível e criminal. Arruinaram uma linda cidade.
Porto
Alegre precisa urgentemente de uma governança competente e responsável para
superar a situação de emergência climática, humana e existencial.
• Deputado
acusa prefeitura de Porto Alegre (RS) de negligência: “Causou a tragédia”
O
deputado estadual Matheus Gomes (PSOL-RS) usou seu perfil no X (antigo
Twitter), para fazer uma denúncia contra o prefeito de Porto Alegre, Sebastião
Melo (MDB). De acordo com o parlamentar, a gestão dele recebeu um alerta sobre
os riscos de inundações no Centro, Menino Deus, Cidade Baixa e Sarandi, mas a
tragédia não teria sido evitada por uma postura negligente das autoridades.
Em
uma série de postagens feitas no X/Twitter, Gomes divulgou um documento do DMAE
(Departamento Municipal de Água e Esgotos), de novembro de 2023, quando uma
sequência de chuvas fez o rio Guaíba atingir mais de 3,4 metros e engenheiros
solicitaram reparos urgentes em quatro casas de bombas e apontaram outros
problemas.
De
acordo com os dados exibidos pelo deputado estadual, a prefeitura não atendeu
aos pedidos dos engenheiros do DMAE e as consequências previstas pelos
especialistas se tornaram realidade. “Os engenheiros fizeram o seu papel, mas
quem autoriza as ações negligenciou”, escreveu o político. Confira:
“Tive
acesso a documentos do DMAE que mostram como a prefeitura de Sebastião Melo foi
alertada sobre os riscos de inundações no Centro, Menino Deus, Cidade Baixa e
Sarandi. Agora temos as evidências do que já era especulado: a negligência
causou a tragédia!
Em
novembro de 2023, vivemos uma sequência de chuvas que fizeram o Guaíba atingir
mais de 3,4m. Dias depois, os engenheiros do DMAE solicitaram reparos URGENTES
em quatro casas de bombas: a 17 e a 18, que ficam no Centro; a 13, no Parque
Marinha; e a 20, na Vila Minuano.
Na
17 e 18, foi solicitada a “elevação das paredes do poço de descarga”, uma obra
simples para aumentar a altura da parede e manter as bombas isoladas e
funcionando em casos extremos. O pedido surgiu com a análise dos problemas de
novembro.
O
documento enfático afirmava a “necessidade urgente de resolução da demanda”
para não corrermos o risco de ver “o alagamento da área central de Porto
Alegre, entre a Usina do Gasômetro e a Rodoviária”. Nada foi feito para reparar
o problema verificado pelos técnicos do DMAE.
Na
EBAP 13, que fica no Parque Marinha, foi solicitado o conserto das janelas de
inspeção do poço de descarga, que não estavam devidamente pressurizadas, como
manda o projeto original. O perigo iminente era o alagamento no Menino Deus e
no entorno da Azenha. Nada foi feito!
Por
fim, na EBAP 20, na Vila Minuano, os engenheiros pediram uma avaliação do quão
protegido estava o “poço de descarga”, pois havia a hipótese de que uma
elevação do Arroio Passo da Mangueira geraria o colapso das bombas e graves
consequências na região do Sarandi.
Tragicamente,
toda a descrição dos engenheiros do DMAE aconteceu, e da pior maneira. Se
comprovou o que os estudiosos da hidrologia dizem: a pior inundação é a que
está por vir, por isso, a prevenção é o melhor caminho. Mas o mais estarrecedor
é o que vem agora…
Esse
processo tramitava desde 2018 e sempre parava na incompetência dos gestores do
DMAE. Os engenheiros fizeram o seu papel, mas quem autoriza as ações
negligenciou. Prova disso é que, em 23 de abril de 2024, ainda não havia sequer
um cronograma pra fazer os reparos. A verdade é que, ao contrário do que o Melo
diz, o teste do sistema de proteção contra cheias foi em 2023.
Entre
setembro e novembro, os especialistas viram os problemas e apresentaram
soluções para diminuir os impactos das cheias. Mas, Maurício Loss (DMAE) e Melo
não agiram! O prefeito Sebastião Melo adora aparecer como síndico, zelador,
cuidador dos problemas da capital, mas mostrou que isso é só discurso.
Diante
do “Super El Niño” e da inegável mudança no padrão de chuvas na última década,
o seu negacionismo climático se sobressaiu. Essas informações são só o começo.
Os processos possuem mais de 100 páginas, inúmeras perguntas não respondidas,
detalhes absurdos da inoperância de Sebastião Melo e nós iremos mostrar ponto a
ponto pra vocês.
E
sei que alguns podem se perguntar: será que é a hora? Milhares de pessoas ainda
estão nos abrigos, com suas casas debaixo d’água. Seguimos diariamente nas
ações de solidariedade e construindo alternativas para sairmos dessa crise.
Sim,
é hora de responsabilizar os culpados e o trabalho parlamentar exige
fiscalização séria! Toda a documentação será entregue ao Ministério Público,
também iremos estimular ações investigativas noutros órgãos de controle, além
do parlamento. Sem a responsabilização de quem foi negligente, como Sebastião
Melo, não teremos reconstrução de Porto Alegre e do RS!”
Fonte:
Viomundo/DCM
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