Extremismo nas redes: grupos espalham
discurso de ódio sem moderação das plataformas
Mais de 20 grupos
extremistas estão ativos e organizados no Brasil, e boa parte deles espalha
seus discursos de ódio na internet, sem qualquer moderação das plataformas. Um
mapeamento do Global Project Against Hate and Extremism (GPAHE – Projeto Global
Contra o Ódio e o Extremismo), organização de defesa de direitos humanos, ao
qual a reportagem teve acesso, localizou grupos de extrema direita em atuação
no país e constatou que muitas das organizações extremistas listadas usam as
redes sociais para disseminar mensagens de ódio, violência e
discriminação.
O estudo do GPAHE
lista o Instituto Conservador-Liberal, fundado pelo deputado federal Eduardo
Bolsonaro (PL), filho do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), como entidade
que promove conteúdos LGBTfóbicos, misóginos e de fundamentalismo religioso. Ele
cita também o Partido Liberal (PL) como propagador de discursos LGBTfóbicos e
ódio contra mulheres.
<<<< Por
que isso importa?
- Enquanto o Congresso Nacional não avança na aprovação de
uma lei para regular redes sociais, grupos extremistas seguem espalhando
mensagens de ódio na internet, sem sofrer qualquer restrição.
- Uma pesquisa da Global Project Against Hate and Extremism
mapeou mais de 20 organizações ativas, muitas delas ativas em plataformas
como Facebook e X.
Boa parte das
organizações mapeadas tem perfis em redes como Facebook, X (antigo Twitter),
YouTube e Telegram. Coordenadora do estudo, Heidi Beirich diz que o Brasil é um
terreno fértil para o crescimento de grupos extremistas por ser “a segunda
nação que mais gasta tempo na internet no mundo e pela falta de regulação das
plataformas”. Os debates em torno do Projeto de Lei 2.630/2020, que pretende regular as redes sociais, esquentaram depois dos
ataques do dono da rede X, Elon Musk, ao ministro do STF Alexandre de Moraes.
Contudo, no início de abril, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira
(PP-AL), diminuiu o ritmo para aprovação da proposta quando anunciou a criação
de um grupo de trabalho que vai analisar o texto.
Enquanto isso, a
pesquisadora do GPAHE diz que houve uma “escalada de grupos extremistas no
Brasil à medida que as mídias sociais passaram a ser usadas mais por grupos e
indivíduos para espalhar medo, desinformação e conteúdo desumanizante”. Ela
ainda afirma que “Bolsonaro e sua família foram um fator definitivo no
crescimento do extremismo de extrema direita no Brasil”.
·
Ataques direcionados à população
LGBTQIA+
De acordo com o
mapeamento realizado pelo GPAHE, São Paulo é o estado com mais grupos
extremistas em atividade – oito entre as 22 organizações localizadas na
pesquisa. O Rio de Janeiro e Santa Catarina ficam em segundo e terceiro lugar,
respectivamente. As regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste reúnem 68% dos grupos.
O Norte é a única região onde a pesquisa não apontou organizações em atividade.
A população LGBTQIA+ é
o alvo mais frequente dos ataques. Entre as organizações que estão presentes
nas redes sociais, a Força Nacionalista Brasileira (FNB) faz postagens
misóginas em sua página do X. Quando o Parlamento francês tornou o aborto um
direito previsto na Constituição, a FNB fez postagens associando mulheres
pró-aborto a “cúmplices do morticínio de bebês” e “asseclas do diabo”.
Na rede X, o grupo
nacionalista branco, que defende a seperação do Sul do restante do país,
Falanges de Aço, faz postagens racistas e xenofóbicas contra
nordestinos. Eles espalham cartazes com mensagens de ódio pelas ruas de Porto
Alegre e, em novembro de 2022, participaram de manifestações antidemocráticas
que reuniram bolsonaristas na capital do Rio Grande do Sul.
No ano passado, o
grupo extremista perdeu sua conta do Instagram e um canal no Telegram, segundo
o relatório, mas não se sabe se as contas foram removidas por moderação das
plataformas. A conta do X permanece ativa.
A Resistência Sulista
(RS) é um pequeno grupo separatista que atua em rede com a Milícia Independente
do Sul e a Falange de Aço. Eles perderam o canal do Telegram, mas ainda mantêm
um grupo privado do Facebook, onde dizem que são contra “o liberalismo hegemônico
global em todas as suas formas, seja da direita ou da esquerda”. O grupo, de
acordo com o relatório, tem mais de 500 seguidores.
Em dezembro do ano
passado, o canal da Força Nova do Brasil no Telegram reunia mais de 200
seguidores. Eles são um braço brasileiro do partido político italiano
neofacista Forza Nuova, que defende o nacionalismo branco, critica imigrantes e
pessoas LGBTQIA+. No Brasil, eles celebram a ditadura militar e espalham
conteúdos LGBTfóbicos. A pesquisa da GPAHE localizou também “publicações
que elogiam grupos neonazistas” entre as postagens do grupo.
Já a Frente
Integralista Brasileira, segundo o relatório, é a maior organização do
movimento integralista moderno do Brasil. Eles têm páginas ativas no YouTube e Facebook.
O grupo possui ao todo quase 4 mil seguidores. No site da organização, há
informações que comprovam a instalação de uma sede em São Paulo, uma aba que
especifica membros do conselho diretor nacional, além de uma sessão de
documentos e diretrizes para se tornar membro. Eles realizam uma campanha de
contribuição com mensalidades que podem chegar até R$ 60.
O relatório aponta
também grupos que se sustentam vendendo produtos nazifascistas na internet. O
Movimento Linearista Integralista Brasileiro (MIL-B) mantém uma página com
notícias, podcast, vídeos, e-books e produtos com símbolos integralistas. O
grupo representa o movimento facista nascido na década de 1930, com a Ação
Integralista Brasileira (AIB), cujo lema era “Deus, pátria e família”. Décadas
depois, Bolsonaro usou o mesmo lema em sua campanha para a Presidência.
·
Instituto criado por Eduardo Bolsonaro é
citado como grupo extremista
Criado por Eduardo
Bolsonaro, o Instituto Conservador-Liberal oferece cursos e outros conteúdos a
partir de financiamento dos usuários. Os valores mensais para se tornar aliado
vão de R$ 25 a R$ 250. Já a doação única pode chegar até R$ 5 mil. O estudo do
GPAHE indica que os conteúdos publicados pela entidade têm teor nacionalista,
sexista e antiaborto.
O Instituto
Conservador-Liberal tem site e newsletter e está presente em redes como
WhatsApp, YouTube, Instagram, Facebook e X. Somando as plataformas, eles
ultrapassam 100 mil seguidores. O relatório da GPAHE relaciona o Instituto
Conservador-Liberal à organização americana pró-Trump de extrema direita
Conservative Political Action Conference (CPAC). Em 2022, a Agência
Pública mostrou que o instituto de Eduardo Bolsonaro promoveu eventos da
CPAC com patrocínio da rede social Gettr, comandada pelo ex-assessor de Trump.
A pesquisa da
GPAHE cita também o Partido Liberal (PL), do ex-presidente Bolsonaro e do
seu filho, entre os grupos extremistas. “Esse partido entrou na nossa lista
como grupo extremista de ódio por ser parte significativa do crescimento da
extrema direita no Brasil. Essa escolha se deu porque no PL há demonização de
uma comunidade-alvo, com frente de atuação antimulher e anti-LGBTQIAPN+”, dizem
os pesquisadores.
A Pública questionou
a Meta, Google e YouTube, citadas no estudo entre as plataformas onde grupos
extremistas e de ódio espalham suas mensagens sem sofrer moderação de conteúdo.
Em nota, a Meta informou que “as políticas da rede proíbem conteúdo que incite
ou promova violência, tampouco permite a presença de pessoas ou organizações
que anunciem uma missão violenta ou estejam envolvidas em atos de violência nas
plataformas da Meta. Isso inclui atividade terrorista, atos organizados de
ódio, assassinato em massa (ou tentativas) ou chacinas, tráfico humano e
violência organizada ou atividade criminosa”.
Embora os conteúdos
citados pela reportagem não tenham sido derrubados, a empresa disse que “remove
conteúdo que expresse apoio ou exalte grupos, líderes ou pessoas envolvidas
nessas atividades, e também não permite discurso de ódio no Facebook e no Instagram,
retirando qualquer conteúdo que viole nossos Padrões da Comunidade”. O YouTube e o Telegram não responderam até a publicação.
Fonte: Por Danilo
Queiroz, da Agencia Pública
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