Corais podem evitar R$ 160 bilhões em danos ao litoral do Nordeste
As franjas de recifes de corais que atraem turistas
para a costa do Nordeste brasileiro também funcionam como importantes barreiras
contra a ação do mar em muitas cidades da região.
Um estudo inédito, realizado pela Fundação Grupo
Boticário, mostra que essas formações naturais impedem prejuízos de até R$ 160
bilhões na infraestrutura urbana, reduzindo a força e a altura das ondas que
chegam ao litoral.
O valor foi calculado usando como base o potencial
prejuízo que ressacas e tempestades poderiam causar a estruturas como prédios,
casas, indústrias, portos, rodovias, ruas e calçadas, por exemplo, caso não
houvesse recifes de corais para amortecer as ondas mais fortes.
Quatro cidades foram usadas como parâmetro para o
cálculo (Recife e Ipojuca, em Pernambuco; e Maragogi e São Miguel dos Milagres,
em Alagoas). Os valores encontrados nessas cidades foram depois extrapolados
para outros municípios que também recebem a proteção dos recifes.
Já as cidades costeiras não protegidas por recifes
de corais como Santos ou Rio de Janeiro, por exemplo, enfrentam destruição de
estruturas da orla quando se veem afetadas por ressacas mais fortes.
• Turismo
"Já é conhecido que os recifes de corais
prestam diversos serviços, entre eles a proteção costeira e o turismo. O que
nós trouxemos foram valores, em reais. Todo esse patrimônio, seja cultural,
público ou particular, está sendo protegido diariamente pelos recifes de
coral", explica a bióloga marinha Janaína Bumbeer, gerente de projetos da
Fundação Boticário.
Além de evitar danos bilionários, os 170
quilômetros quadrados (km²) de franjas de recifes de coral que existem no
Nordeste brasileiro também podem gerar, anualmente, R$ 7 bilhões em receitas,
com atividades de turismo como mergulhos e passeios de barco.
O estudo considerou a receita gerada por essas
franjas em Maragogi, São Miguel dos Milagres, Ipojuca (onde fica Porto de
Galinhas), Caravelas (BA) - onde fica o arquipélago de Abrolhos - e Fernando de
Noronha (PE). Esses destinos têm os recifes entre seus principais atrativos.
A partir daí, o estudo também fez extrapolações
para municípios com potencial para explorar turisticamente essas formações
costeiras, mas que ainda não o fazem.
• Corais
Maragogi é um famoso destino da costa Nordeste
brasileira devido às "piscinas naturais" que rendem lindas fotos para
as redes sociais e encantam turistas de todo o país. O que as pessoas chamam de
piscinas naturais, no entanto, são áreas do mar abrigadas da força das ondas e
das correntezas graças aos recifes.
Essas formações que parecem rochas são, na verdade,
esqueletos de corais, animais da classe Anthozoa (a mesma das anêmonas), que
têm seu corpo semelhante a gelatinas, mas que formam exoesqueletos (esqueletos
fora do corpo, assim como os insetos) a partir do carbonato de cálcio.
Acredita-se que essa forma de vida animal tenha
surgido entre 400 e 500 milhões de anos atrás. Sua existência, porém, está
ameaçada em todo o planeta, principalmente devido às mudanças climáticas, que
superaquecem as águas dos oceanos e matam os corais, e também devido a fatores
como poluição, alterações provocadas pelo homem, espécies invasoras, turismo
desordenado e pesca predatória.
Os corais mantêm uma simbiose, ou seja, uma
associação de benefício mútuo, com as algas zooxantelas, que dão cor aos
animais marinhos e fornecem grande parte dos nutrientes necessários para esses
seres.
Quando os corais estão estressados, no entanto,
acabam expulsando as algas, em um fenômeno conhecido como
"branqueamento", que enfraquece os animais e provoca sua morte. Isso
afeta todo o ecossistema, já que várias formas de vida usam os recifes para se
alimentar, se reproduzir e se abrigar.
Os corais ocupam cerca de 0,1% da superfície dos
mares e oceanos, mas concentram 25% da biodiversidade marinha. Segundo o
Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas (Unep), estima-se que de 25% a 50%
dos recifes de corais do mundo já foram destruídos e, do restante, 60% estariam
ameaçados.
"Os corais são filtradores e dependem da
qualidade da água. Além disso, o fato de estarmos ocupando os espaços onde
havia os recifes de coral, aumentando a sedimentação, jogando a areia por cima
[dos recifes], mudando a dinâmica da praia, que é muito delicada, isso tudo
afeta os corais na sua sobrevivência", explica Janaína Bumbeer.
• Ameaças
A reportagem da Agência Brasil visitou o litoral de
Pernambuco entre os dias 24 e 26 de outubro e verificou algumas das ameaças,
como turistas pisoteando recifes e lotando as piscinas naturais, lixo sendo
deixado por esses turistas e flutuando em meio aos corais, construções
polêmicas à beira-mar e água suja fluindo de rios para o mar.
"Na Praia dos Carneiros [em Tamandaré],
derrubaram todas as restingas e construíram um monte de prédio", conta
Mauro Maida, professor do Departamento de Oceanografia da Universidade Federal
de Pernambuco (UFPE).
Segundo ele, os corais têm uma taxa de crescimento
muito lenta, alguns milímetros por ano, o que faz com que sejam necessárias
décadas para se ter uma colônia de tamanho grande.
"Naturalmente ocorre a erosão dos recifes. O
recife é um balanço de construção e erosão. Se você não tem coral, você não tem
construção [do recife]. E se só tem erosão, o recife vai rebaixar e os 2,5
metros de maré, que a gente tem no estado, avançam e causam erosão
costeira".
A bióloga Gislaine Lima, da organização não
governamental Projeto de Conservação Recifal, explica que a capital
pernambucana, por exemplo, sofreu muito com a expansão urbana de sua orla nas
últimas décadas, com a construção de centenas de prédios.
"Cinquenta, 60 anos atrás, a gente tinha três
prédios aqui [em Boa Viagem]. Era uma área de casas de veraneio, para pessoas
mais ricas de Recife, e uma vila de pescadores", explica Gislaine.
"Todas essas construções aumentam o assoreamento".
• Soluções
Para manter a saúde dos recifes de corais e
garantir que eles continuem protegendo a costa e promovendo receitas para os
municípios que vivem do turismo costeiro, o estudo sugere algumas medidas, como
direcionamento de recursos dos governos para as unidades de conservação,
implementação de taxas para a preservação da costa, monitoramento da saúde dos
recifes e promoção de um turismo sustentável.
"Os recifes de coral podem ser mais explorados
de forma positiva, não de forma predatória que vá danificar ainda mais os
corais. Então, é importante a gente investir em turismo sustentável, o turismo
de base comunitária, que envolve as comunidades locais; a ciência cidadã e o
turismo regenerativo, no qual as pessoas fazem parte do processo de ajudar a
restaurar aquele ambiente", explica Janaína Bumbeer.
Por meio de nota, a Secretaria Estadual do Meio
Ambiente de Pernambuco informou que os recifes de corais são um dos principais
ecossistemas marinhos do estado e que, atualmente, há dez projetos voltados
diretamente para sua conservação, como os planos de combate ao lixo no mar e de
combate a espécies invasores; e o estabelecimento de regras e zonas para a
prática de turismo náutico e para a pesca.
Além disso, a Secretaria informou que desenvolve
ações que, "transversalmente, estão a beneficiar os recifes de corais,
como a Política Estadual de Resíduos Sólidos, que envolve a capacitação de
todos os municípios do estado para lidar com seus resíduos e rejeitos sólidos e
líquidos", informa a nota.
Fonte: Agência Brasil
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