terça-feira, 7 de novembro de 2023

Argentina: como Milei e Massa podem driblar rejeição e vencer eleição?

Depois de uma surpresa no primeiro turno das eleições presidenciais da Argentina, com o peronista Sergio Massa em primeiro lugar (36,68%) e o ultraliberal de direita Javier Milei em segundo (29,98%), os dois candidatos mais votados tiveram alguns dias para conseguir superar a rejeição e conquistar votos dos argentinos no segundo turno. Porém, é possível Massa se desligar do fracasso do governo atual, ou o apoio de Patricia Bullrich já cravou a vitória de Milei? O Metrópoles conversou com analistas para entender as possíveis estratégias adotadas por ambos políticos nessa corrida à chefia da Casa Rosada.

Enquanto Massa tenta se aproximar do eleitor médio do Proposta Republicana (Pro, fundado em 2005 pelo ex-presidente Mauricio Macri) — que oficializou apoio a campanha o ultraliberal de direita — em um cenário de forte repressão popular ao peronismo e ao anti-kirchnerismo, Milei deve tentar “suavizar” as colocações polêmicas, como o fechamento do Banco Central, para não perder os votos de Bullrich.

•        Intenção de votos x apoio político

A duas semanas do segundo turno da eleição presidencial da Argentina — prevista para 19 de novembro —, pesquisas de intenção de voto indicam Sergio Massa com uma certa vantagem a Javier Milei. Conforme levantamento da Zuban Córdoba, divulgado pelo jornal Clarín nessa quarta (1º/11), o peronista tem 45,4% de preferência, contra 43,1% do ultraliberal de direita.

Por outro lado, a mesma pesquisa mostra que o índice de rejeição do atual ministro da Economia é significativo. Massa tem 56,7% de rejeição, já Milei, fica com 54,3% de desaprovação. Para fazer o levantamento, foram entrevistados 2 mil eleitores argentinos nos dias 28 e 29 de outubro.

Essa estimativa é uma consequência dos resultados do primeiro turno: quando Milei não conseguiu ampliar, mantendo a mesma base de votos nas primárias, enquanto Massa teve um acréscimo de 15% dos votos desde lá.

Mesmo com o apoio de Patricia Bullrich, o analista político Nicholas Borges, da BMJ Consultores Associados, afirma que é “pouco provável” que os votos sejam computados na conta de Javier Milei.

“A nossa expectativa é que haja de fato uma fragmentação, com uma migração rachada”, estima. Por serem votos vindos de uma coalizão, que envolve partidos com interesses diferentes, os candidatos vão precisar “quebrar o braço” e “lutar” para cravar quem vai conseguir trazer mais eleitores desse racha, segundo Borges.

Já a pesquisa Atlas/Intel, divulgada na última sexta (3/11), aponta Milei com 52% das intenções de votos e Massa com 48% (a margem de erro é de 1.7 p.p. para mais ou para menos).

•        Maiores obstáculos para Sergio Massa

Com uma eleição altamente polarizada, onde são apresentados dois projetos políticos antagônicos, Leonardo Paz, pesquisador do Núcleo de Prospecção e Inteligência Internacional da Fundação Getulio Vargas (FGV NPII), acredita que ambos candidatos têm “uma tarefa difícil” nessa disputa à cadeira presidencial.

“Ambos têm uma tarefa difícil. Isso porque um representa o governo que ele mesmo faz parte, e o outro tem que provar que vai cumprir as promessas. Então, é duro”, analisou.

Conforme o pesquisador da FGV, no momento, o grande desafio de Sergio Massa é se distanciar do grupo que está no poder, mesmo se identificando com o peronismo. No posto de ministro da Economia, ele deve mostrar as propostas para sair da crise que o país vive há décadas e que se intensificou nos últimos anos.

Reprodução

“Se distanciando do governo do qual ele faz parte, que, inclusive, está sendo uma tragédia na economia, ao dizer: ‘Olha tem um outro caminho que eu vou seguir diferente do que estamos fazendo agora’”, pontua Paz.

Para o analista político Nicholas Borges, o distanciamento de Sergio Massa dos eleitores mais jovens é, no momento, uma das maiores dificuldades do candidato peronista. Porém, ele destaca a capacidade de Javier Milei de dialogar e atrair esse nicho eleitoral.

“Então, a gente tem essa grande dificuldade: Massa não consegue trazer esperança para esse segmento da população que viveu e nasceu durante as sucessivas crises econômicas. Por outro lado, a gente tem Milei conseguindo transitar melhor nesse nicho eleitoral”, explicou.

A falta de propostas sólidas sobre a questão econômica do país é outro ponto que o peronista precisa trabalhar para conquistar e garantir confiança aos eleitores, de acordo com Borges. O analista político afirma que é “urgente” a apresentação de um plano estratégico e robusto de como Massa pretende reestruturar a economia da Argentina.

•        Maiores obstáculos para Javier Milei

Conhecido por ter opiniões polêmicas, para vencer as eleições, o auto intitulado anarcocapitalista precisa moderar o discurso no momento, segundo a análise dos especialistas ouvidos pelo Metrópoles.

“Talvez, para o Milei, seja muito mais estratégico rever e moderar os discursos, acenando principalmente para o eleitorado de centro-direita, direita e também para os governadores das províncias do que continuar nesses discursos mais incisivos”, pontua Borges.

Dessa forma, além das declarações controversas, o deputado precisa se preocupar em conquistar a aliança dos governadores, que tem grande influência nas províncias argentinas, que historicamente tem um direcionamento independente de partidos.

Para o internacionalista da FGV, com o apoio oficial do Pro, Milei tenta se aproximar dos eleitores da Bullrich com colocações mais “suavizadas”, começando a ilustrar o projeto político para além das declarações polêmicas.

Borges diz que outro ponto negativo para Milei nessa corrida presidencial são os possíveis impactos no ceticismo da população com o alinhamento dele a partidos tradicionais, em especial o apoio do ex-presidente Mauricio Macri.

“Ele tem que observar até que ponto os eleitores vão pensar: ‘Você ia acabar com a casta e agora está se alinhando com partidos tradicionais da política’. Isso pode ser um ponto de conflito e o Sergio Massa poderia inclusive explorar essa narrativa”, analisou.

Esse último ponto é crucial para o peronista, que segue abordando esse assunto. “Os eleitores argentinos têm consciência de que o acordo com o FMI [Fundo Monetário Internacional] é uma das principais mazelas para a situação econômica atual”.

•        Principais estratégias de Massa e Milei

Com ajuda de especialistas em política internacional e analistas, o Metrópoles listou as principais estratégias dos candidatos à Casa Rosada. Confira:

# Ambos:

•        Apostar na retórica de pessoas antagônicas;

•        Tentar atrair o eleitorado de Patricia Bullrich;

•        Discursar contra as alianças políticas do adversário; e

•        Iniciar uma guerra de narrativas.

# Javier Milei:

•        Amenizar e revisar o discurso das propostas;

•        Continuar conversando com o eleitorado mais jovem; e

•        Apostar na limpeza geral na política.

# Sergio Massa:

•        Adotar discurso de que Milei é um eventual “risco para a democracia”;

•        Apostar na retórica dos serviços públicos de educação e saúde;

•        Criticar e apontar os impactos na questão econômica das propostas de Milei. Por exemplo, a proposta de inserir vouchers na educação e saúde; e

•        Atacar o alinhamento do ultraliberal de direita com o ex-presidente Mauricio Macri.

>>>> Apadrinhamento político pode ser pedra no sapato

Na mesma linha do pesquisador da FGV, o analista político Nicholas Borges também acredita que um dos maiores desafios dos candidatos é conseguir se desvencilhar de algum lado: “Agora, temos de fato uma eleição polarizada na qual o apoio político de figuras tradicionais da Argentina pode ser uma vantagem ou uma desvantagem”.

Para ele, esse período antes do segundo turno vai ser muito importante saber lidar com a questão de apoio político, tanto da base do governo quanto da oposição, e analisar se é favorável se envolver com alguns figurões da política argentina.

Logo, Sergio Massa tem que se desassociar do ex-presidente Alberto Fernandez, conhecido por ser extremamente impopular, e até mesmo do kirchnerismo. Já Javier Milei precisa saber controlar o apoio do Pro, partido de Mauricio Macri — apontado por muitos argentinos como um dos responsáveis pelo agravamento da crise econômica do país, depois de pedir um empréstimo ao FMI.

 

Ø  Lá como aqui! Milei afirma sem provas que Lula financia campanha de Massa

 

Ao ser perguntado se aumentaria o preço das passagens de ônibus e trens caso fosse eleito, o candidato de extrema-direita argentino Javier Milei afirmou, sem apontar prova algum, que o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva financia a campanha de Sergio Massa.

“Não, isso é falso, é absolutamente falso. É parte da campanha negativa que está fazendo. Concretamente, de fato, a equipe de Bolsonaro, e alguns jornalistas do Brasil denunciaram que Lula está interferindo nesta campanha, financiando parte da mesma”, afirmou.

Milei disse ainda que dentro desse pacote há um conjunto de consultores brasileiros que são especialistas, são os melhores especialistas em campanha negativa. E o que há e o que eles fazem é disseminar medo na sociedade. A única coisa que eu posso assegurar à sociedade é que isso não vai acontecer”.

•        Vídeo desmente

Logo a seguir, é mostrado um vídeo anterior, de 18 de outubro, em que Milei afirma que, caso fosse eleito, acabaria com o subsídio às passagens de ônibus, o que provocaria aumento de preços.

 “O que nós dizemos é que os subsídios têm que ser eliminados. E se você fizesse como nós estamos sugerindo, aumentava 100%. Então, vai haver um impacto no preço? Sim”, encerra ele.

•        PT lança documento de apoio a Massa

O PT publicou neste domingo, 5, uma nota oficial na qual declara apoio à candidatura de Sergio Massa à presidência da República na Argentina. "Não temos dúvida em apoiar a candidatura de Sergio Massa, da coalizão União pela Pátria, no nosso país irmão. Defendemos a integração regional para trazer a justiça social, a paz, a democracia e um projeto de desenvolvimento", diz um trecho da nota do PT.

O documento, que traz a data desta segunda-feira, 6, é assinado pela presidente do partido, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), e pelo Secretário de Relações Internacionais do partido, Romênio Pereira.

O peronista Sergio Massa é o atual ministro da Economia do governo de Alberto Fernandez, de centro-esquerda. Ele é o candidato da coalizão União pela Pátria, que tem maioria de partidos de esquerda, embora inclua também legendas de centro e de direita. No dia 19 de novembro, Massa enfrentará o libertário Javier Milei, candidato da coalizão Liberdade Avança. Massa ficou em primeiro lugar no primeiro turno, mas pesquisas indicam uma disputa apertada no segundo turno.

Economista e oriundo do mercado financeiro, Milei defende propostas liberais para a economia, como a dolarização da economia argentina, a redução dos gastos públicos e de impostos. Também prega a desregulamentação do porte de armas e a militarização das prisões.

"(...) Dois projetos de sociedade se enfrentam: um, representado pela candidatura presidencial de Sergio Massa, de perfil democrático e popular, com um programa de governo de desenvolvimento e justiça social; e outro, do candidato Javier Milei, representando a extrema-direita e o ultra neoliberalismo econômico do salve-se quem puder", diz um trecho da nota do PT

"Nós, brasileiros e brasileiras, conhecemos bem essa segunda alternativa de extrema-direita, que também governou nosso país no período anterior. Conhecemos toda a dor e o sofrimento que o descaso com a vida do povo significou para nosso país", continua o texto do partido, referindo-se ao ex-presidente Jair Bolsonaro.

A nota de apoio do PT neste domingo contrasta com o silêncio do principal líder da sigla, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mesmo diante de pedidos de aliados, Lula evitou até o momento declarar formalmente apoio ao candidato peronista - o que não significa que não tenha agido para ajudá-lo. No fim de agosto, Lula reuniu-se com Massa em Brasília.

Massa argentino também foi recebido pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e Brasil e Argentina anunciaram na ocasião um acordo de US$ 600 milhões para garantir o financiamento das exportações brasileiras ao país vizinho, que sofre com a falta de dólares.

Como mostrou o Estadão, Lula atuou em operação para liberar um empréstimo de US$ 1 bilhão do Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF) à Argentina, de modo que a Casa Rosada pudesse pagar uma dívida anterior com o Fundo Monetário Internacional (FMI).

Além disso, profissionais do marketing político ligados ao PT também estão na Argentina atuando na campanha de Massa. Não por acaso, a campanha do peronista usa temas que o PT costuma explorar no Brasil, como o resgate da autoestima e o sentimento de unidade nacional, repetindo estratégia petista usada contra Bolsonaro. Marqueteiros brasileiros como Raul Rabelo, Otávio Antunes e Halley Arrais buscam caracterizar uma eventual gestão do direitista Milei como um "salve-se quem puder", sem regras e nem leis.

 

Ø  Dudu Bananinha dá vexame na Argentina

 

O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), também apelidado de Dudu Bananinha em decorrência de um comentário picante do general e atual senador Hamilton Mourão, adora falar e fazer besteiras. O filhote 03 do ex-presidente, que foi cogitado pelo pai para ser o “embaixador do hambúrguer” nos EUA, é motivo constante de chacota nas redes digitais. Na semana passada, o panaca voltou ao Trending Topics (TTs) do X, ex-Twitter.

Ele foi à Argentina para apoiar a candidatura presidencial do fascista Javier Milei. Durante a viagem custeada com grana pública, Dudu Bananinha pregou em entrevista ao canal C5N a liberação de armas no país vizinho. De imediato, o âncora da TV, Gustavo Sylvestre, cortou sua palavra e zombou do abestalhado: “É generosa a Argentina por receber esse tipo de gente… Por isso que os brasileiros, com lógica, tiraram o seu pai do poder, felizmente”.

·         O mico internacional da semana

A cena ridícula rendeu muitas gozações na internet. A presidenta do PT, Gleisi Hoffmann, foi uma das que não perdeu a oportunidade: “Mico internacional da semana vai pro filho do inelegível, Eduardo Bolsonaro, cortado da entrevista no canal C5N da Argentina ao defender facilitar o acesso às armas à população”. A deputada foi até diplomática. Outros internautas capricharam nos adjetivos contra o imbecil metido a líder da extrema-direita mundial.

A visita de Eduardo Bolsonaro e o apoio do seu paizão à candidatura de Javier Milei parecem que não rendeu os frutos desejados. Segundo Andrei Roman, diretor da Atlas Intel, o único instituto de pesquisas que projetou a vitória do peronista Sergio Massa no primeiro turno da eleição na Argentina, os bolsonaristas prejudicaram o “anarcocapitalista” portenho:

·         Apoio dos Bolsonaros tira votos de Milei

“A minha avaliação é que o apoio de Bolsonaro tira votos. Vamos adicionar essa pergunta na próxima pesquisa para testar a imagem do ex-presidente brasileiro na Argentina. Não há apoio majoritário para ele no país. No caso do Bolsonaro, a rejeição se dá por conta de um governo considerado caótico, principalmente no contexto da Covid-19”, afirmou em entrevista ao jornal O Globo.

Ele ainda acrescentou que “a pauta armamentista é rejeitada no país” e teorizou que “a Argentina é muito mais progressista que o Brasil, em termos de valores. Quase 70% do eleitorado apoia o casamento gay. Há temas que são capitalizados no Brasil por uma direita evangélica que, na Argentina, não existem, porque lá não há esse segmento. Isso é algo que os apoiadores brasileiros do Milei não entendem”.

 

Fonte: Metrópoles/Sputnik Brasil/O Cafezinho

 

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