Brasil
se queixa de tarifaço norte-americano, mas também adota medidas protecionistas;
entenda
O presidente dos
Estados Unidos, Donald Trump, anunciou nas últimas semanas aumentos do imposto
de importação para países como México e Canadá, mantendo-os em suspenso por um mês, ao mesmo tempo em
que subiu as tarifas para a China e sobre produtos específicos, como aço
e alumínio.
Esta última medida, anunciada nesta semana, impacta
diretamente produtores brasileiros. Em 2024, segundo dados do Ministério
do Desenvolvimento, o Brasil exportou US$ 9,3 bilhões em ferro, aço e alumínio.
Desse total, US$ 4,4 bilhões foram para os EUA (47,6% das vendas globais dos
produtos).
·
Como tarifas de Trump a aço e
alumínio do Brasil e do mundo podem prejudicar economia americana
As motivações de
Trump para as sobretaxas são diversas. Em algumas situações, como México e
Canadá, ele cita questões de segurança nas fronteiras. Já no caso da China, a
justificativa é o tráfico de fentanil (droga que causou milhares de mortes nas
últimas décadas) — sendo o país asiático apontado como principal produtor.
Já o aumento do
imposto de importação para o aço e alumínio é justificado pelo presidente
norte-americano com a necessidade de retomar empregos no país. Questões econômicas
também são o motivo de uma possível sobretaxa a produtos da União Europeia,
ainda não formalizada.
·
Reação brasileira
"O presidente
Lula tem dito sempre com muita clareza, outros países também, que guerra
comercial não faz bem para ninguém. O Brasil não estimula e não entrará em
nenhuma guerra comercial. Sempre seremos favoráveis a que se fortaleça cada vez
mais o livre comércio", declarou o ministro de Relações Institucionais,
Alexandre Padilha, nesta terça-feira (11) sobre a taxação de aço e alumínio
brasileiros.
O aumento das
restrições à entrada de produtos nos EUA, inclusive de origem brasileira,
trouxe à tona o debate sobre se a economia nacional não pode também ser
considerada protecionista.
·
🔎O
tamanho do relacionamento de um país com o resto do mundo é uma indicação
disso. Ele é obtido por meio do índice de abertura comercial — que considera a
soma das exportações com as importações, na proporção com o Produto Interno
Bruto (PIB).
Os números mostram que, embora o país tenha
aumentado seu grau de abertura comercial nas últimas décadas, a economia
brasileira ainda é relativamente fechada (protecionista) em sua relação com o
resto do mundo.
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Dados
do Banco Mundial mostram que o índice de abertura comercial (exportações mais
importações) do Brasil foi de 33,85% do PIB em 2023, último ano disponível.
·
O
Brasil ficou acima dos EUA, que registrou um índice de cerca de 25% do PIB em
2023. A economia norte-americana, entretanto, transaciona muito mais com o
exterior, sendo o principal comprador mundial e o segundo maior exportador por
ter um PIB dez vezes maior que o brasileiro.
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A
economia brasileira ficou abaixo, porém, da média da OCDE (países ricos), da
média mundial e também da América Latina e do Caribe.
·
O
Brasil superou a Argentina, mas teve uma abertura comercial menor do que países
europeus, como Alemanha, França e Reino Unido, e também nações emergentes, como
a China, o Chile, o México e a Índia.
"O Brasil
nunca foi muito aberto, e não é só o Brasil. Os quatro países do Mercosul têm
tarifas relativamente altas frente aos outros emergentes", disse Welber
Barral, presidente do Instituto Brasileiro de Comércio Internacional e
Investimentos (IBCI) e ex-secretário de Comércio Exterior do Ministério do
Desenvolvimento.
Ele avalia que, em
termos acadêmicos e práticos, a abertura comercial traz mais concorrência,
investimentos e tecnologia.
"Países que te
uma abertura nos setores que principalmente são mais competitivos, você tem um
ganho de eficiência muito grande", diz o ex-secretário.
Barral defende,
porém, uma abordagem pragmática no comércio, ou seja, observando o
comportamento dos parceiros para tomar decisões, e considerando, também, a
pouca eficácia da Organização Mundial de Comércio (OMC).
"Não dá pra
ser irrealista, doutrinário. Nos produtos onde o Brasil é muito competitivo,
sofre muita barreira comercial. Em produtos agrícolas, carnes e aços por
exemplo", avaliou Barral.
Para o executivo,
o próximo
grande impacto de abertura comercial vai ser o acordo
de livre comércio do Mercosul com a União Europeia, que está concluído mas
aguardando a aprovação dos países e blocos envolvidos.
Segundo Cornelius
Fleischhaker, economista do Banco Mundial no Brasil, o fato de a economia
brasileira ser relativamente fechada está relacionado com escolhas que os
governos fizeram ao longo das últimas décadas de proteger o mercado local e,
com isso, de não participar das chamadas "cadeias globais de valor".
"Vira uma
questão de galinha e ovo. Na economia moderna globalizada, para poder competir
com a sua exportação, sobretudo de produtos manufaturados, mais complexos, você
tem que poder de importar. Se você vê as economias avançadas, quando eles
exportam o produto mais ou menos sofisticado, bens de capital, bens de consumo
durável, ele vai trazer, dentro dele, um monte de componentes e partes
importadas. Quando você fecha a importação de produtos intermediários, você não
deixa a possibilidade de ter competitividade nos produtos finalizados",
explica Fleischhaker, do Banco Mundial.
Ele observa que, de
fato, o Brasil tem alguns problemas que impedem uma competição mais direta com
países desenvolvidos, como um sistema tributário obsoleto, e uma taxa de juros
elevada, além de falta de mão de obra qualificada, mas avalia que isso não pode
ser motivo para não participar das cadeias globais.
"A indústria
vai sempre se queixar e dizer que não consegue competir. Não que não seja
verdadeiro, mas geralmente quando
uma indústria está exposta à competição, ela encontra um jeito de se virar. Ou
eles deixam o mercado, que também faz parte do desenvolvimento econômico",
diz o economista.
Fleischhaker avalia
que uma maior competição pode ser um incentivo ao investimento, por exemplo, em
mão de obra qualificada, e lembra que a reforma tributária melhora, nos
próximos anos, o ambiente tributário no país. O economista ainda pontua que o
Brasil poderia sim se beneficiar de um nível maior de abertura comercial.
"Isso deveria
fazer com que a produtividade possa finalmente aumentar, que foi o grande
desafio do Brasil nas últimas décadas, fora do setor agrícola. Obviamente, isso
teria disfunções. É necessário que as empresas que não conseguem fazer produtos
de boa qualidade a um preço razoável saiam do mercado, mas obviamente tem de se
pensar em como ajudar os trabalhadores que possivelmente perderão os
empregos", conclui ele.
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Como
o protecionismo é aplicado?
No caso do Brasil,
o protecionismo a determinados produtos, ou seja, aumento do imposto de
importação, tem de ser combinado com os demais países do Mercosul (Argentina,
Paraguai e Uruguai) — bloco comercial criado em 1991.
·
➡️Desde 1994, vigora a chamada Tarifa Externa Comum (TEC), com
alíquotas definidas pelos países do Mercosul, que vão de zero a até 20%.
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➡️Os produtos com maior valor agregado (tecnologia)
costumam ter tarifa mais alta.
·
➡️E há, ainda, uma lista de exceção à TEC,
por meio da qual o governo brasileiro pode reduzir ou aumentar o valor do
imposto de importação para alguns produtos.
·
➡️Com isso, a alíquota de importação pode
subir a até 35% (limite da OMC), ou ser reduzida a zero, se estiver enquadrada
na lista de exceções à TEC.
·
➡️Considerando essas regras, o IBCI estimou que a alíquota média de
importação no Brasil é de 12%, bem superior à dos Estados Unidos (3%).
Dependendo do
entendimento do governo brasileiro, em cada momento de sua história, as
sobretaxas podem ser aumentadas ou reduzidas, por meio da lista de exceções ou
acordos com os países membros do Mercosul.
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Quando
há desabastecimento de algum produto em um país do Mercosul, a nação pode
retirar esse item da sobretaxa e reduzir o imposto por
meio de sua inclusão na lista de exceção à TEC.
·
Em
geral, máquinas e equipamentos, e produtos usados na Zona Franca de Manaus, têm
alíquotas baixas de importação, além de itens destinados a regimes específicos
do Brasil, como Repetro e Reporto, entre outros.
·
Há
acordos automotivos entre países do Mercosul com regras específicas de
comércio, e tarifas altas para veículos de fora do bloco comercial.
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Acordos comerciais entre o Mercosul e
outros blocos, ou países, também são uma forma de aumentar o nível de abertura
da economia brasileira.
Em 2013, por exemplo, no governo da
presidente Dilma Rousseff, um decreto criou uma lista de 100 produtos que
tiveram as tarifas de importação aumentadas. A lógica era impedir
importações consideradas predatórias à indústria local.
Em contraponto, em
2022, o governo formalizou uma redução em 10%
das alíquotas da TEC do Mercosul. A decisão, defendida pela equipe
econômica do governo Bolsonaro, buscava estabelecer uma "estrutura
tarifária mais eficiente para ampliar a inserção dos países do Mercosul no
comércio internacional, além de aumentar a competitividade e a integração das
economias do bloco".
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O aumento da abertura internacional era
defendido pelo então ministro da Economia da gestão Bolsonaro, Paulo Guedes, como uma medida
para aumentar a competitividade da indústria local e fomentar o crescimento do
país.
·
O
governo de Donald Trump, nos EUA, por sua vez, não está adotando princípios
liberais em termos e comércio exterior ao aumentar o protecionismo. Na
realidade, está indo na direção oposta.
Em termos
históricos, o índice de abertura da economia brasileira somou 20,6% na média
entre 1960 e 2023. O menor indicador, registrado no início da série, em 1960,
foi de 12,6% do PIB (exportações mais importações). O maior índice de abertura
aconteceu na gestão do presidente Jair Bolsonaro, em 2022, com quase 39% do
PIB.
No início da década
de 90, o Brasil teve uma onde de abertura
comercial, com o plano Collor I. Houve uma redução gradual das tarifas de
importação. A ideia era que, com importados mais baratos, os produtores
nacionais seriam forçados a reduzir seus preços e melhorar a qualidade dos
produtos.
Esse processo de
aumento da abertura comercial continuou nos governos do presidente Fernando
Henrique Cardoso, entre 1995 e 2002, e no primeiro mandato de Lula. A abertura
comercial teve queda no segundo mandato de Lula, mas teve prosseguimento
gradual nos anos seguintes.
¨ ‘Tarifaço’:
Alckmin defende diálogo com Trump para negociar cotas de exportação de aço e alumínio
O vice-presidente e ministro
de Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin (PSB), defendeu que o
Brasil adote uma postura de diálogo com os Estados Unidos após o anúncio do
aumento das tarifas de importação de aço e alumínio pelo governo Donald Trump,
dos Estados Unidos. Segundo Alckmin, o governo Lula (PT) vai procurar os
norte-americanos para definir a melhor solução. As informações são do g1.
"Olha, [a taxação] não
foi contra o Brasil. Foi para o mundo inteiro. Os EUA são um importante
parceiro comercial do Brasil. (...) É o maior investidor no Brasil e temos
tradição de 200 anos de relação diplomática e vamos continuar. Isso é do
cotidiano. Todo dia você tem essas questões de alteração tarifária. Vamos
procurar o governo norte-americano para buscar a melhor solução", disse.
O vice-presidente defendeu
que a melhor saída para o “tarifaço” de Trump é negociar cotas para a
exploração de determinada quantidade de aço e alumínio sem pagar a íntegra da
taxação aos EUA. "Essa é uma boa solução [cotas]. O caminho é o diálogo.
Estamos abertos, tem várias alternativas, uma delas é o estabelecimento de
cotas, explicou.
¨ Indústrias
siderúrgicas brasileiras pedem tarifa de 25% sobre aço chinês após taxação de
Trump
Representantes da indústria
siderúrgica brasileira pedem ao governo federal a imposição de uma tarifa de
25% sobre as importações de aço da China, como resposta à alta das tarifas
aplicadas pelo presidente estadunidense Donald Trump. A medida visa proteger a
produção local, que pode perder competitividade diante do novo cenário
internacional, em que o aço chinês tem se tornado uma ameaça crescente para os
produtores brasileiros.
A solicitação dos
industriais será discutida em um encontro com o vice-presidente e ministro do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin (PSB), ainda neste mês.
Segundo os representantes da indústria ouvidos pela CNN Brasil, a China teria adotado práticas semelhantes ao
"dumping", uma vez que o governo chinês subsidiou a produção de aço,
como uma forma de manter empregos em meio à desaceleração da construção civil
no país.
Com a demanda interna
enfraquecida, a China passou a exportar aço a preços subsidiados extremamente
baixos, o que, em alguns casos, faz com que o produto seja oferecido a valores
abaixo do custo de produção no Brasil. Isso resultou em um aumento expressivo
nas importações de aço chinês, com valores que saltaram de menos de US$ 100
milhões no início dos anos 2000 para mais de US$ 2 bilhões em 2022.
Apesar de um sistema de
cotas de importação ter sido adotado no ano passado para tentar equilibrar a
competitividade, os industriais argumentam que as cotas não são suficientes
para resolver o problema diante do novo cenário.
Porém, a alegação das
indústrias brasileiras é refutada por representantes do comércio chinês.
Charles Tang, presidente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China,
afirmou que os subsídios à indústria de aço chinesa já não existem há anos.
Para ele, a tributação adicional ao aço chinês só prejudicaria os consumidores
brasileiros, já que a medida encareceria os produtos manufaturados no país e
aumentaria a inflação. Tang ressaltou que a baixa do preço do aço chinês no mercado
mundial se deve à tecnologia avançada e aos custos operacionais mais baixos da
China, e não aos subsídios governamentais.
Ainda segundo ele, o
"custo Brasil" é o principal fator que impacta a competitividade da
indústria brasileira, apontando para altos impostos e problemas logísticos que
dificultam a produção nacional. "A indústria brasileira é eficiente até
chegar na porteira, onde enfrenta a cascata de impostos, falta de logística
eficiente, entre outros [problemas] que alimentam o custo Brasil", ressaltou
Tang, de acordo com a reportagem.
Fonte: g1/Brasil
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