terça-feira, 2 de julho de 2024

Supremo dos EUA blinda Trump

Em uma decisão inédita que garante imunidade a presidentes, a Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu nesta segunda-feira (01/07) que o republicano e ex-ocupante da Casa Branca Donald Trump não pode ser processado por atos realizados no exercício do cargo. A imunidade, porém, não vale para coisas que Trump tenha feito como indivíduo.

Endossado por seis votos contra três, o julgamento derruba uma decisão de uma corte inferior que negava a imunidade a Trump em processos criminais relacionados às tentativas do ex-presidente de se manter no poder após a derrota eleitoral para o democrata Joe Biden.

A decisão vem a quatro meses das eleições presidenciais americanas, que Trump disputará pelo partido Republicano pela terceira vez consecutiva.

A decisão, vista como uma vitória para Trump, deve atrasar os julgamentos dos processos, que podem acontecer apenas depois das eleições presidenciais, em 5 de novembro. O ex-presidente é candidato pelo Partido Republicano.

"Grande vitória para a nossa Constituição e democracia. Orgulho de ser americano!", festejou Trump nas redes sociais.

A decisão não concede imunidade automática para Trump, mas aponta que ex-presidentes dos EUA têm direito a pedi-la em casos na esfera criminal. Com isso, o caso voltará a tribunais da 2ª instância, que terão de julgar se Trump é imune em cada um dos três processos.

Os seis juízes que votaram favoráveis ao ex-presidente são conservadores. Os três que votaram contra a imunidade parcial dele são liberais.

"Concluímos que, sob a nossa estrutura constitucional de separação de poderes, a natureza do poder presidencial requer que um ex-presidente tenha alguma imunidade contra processos criminais decorrentes de atos oficiais praticados durante seu mandato", consta da decisão redigida pelo presidente da corte, ministro John Roberts.

"Ao menos em relação ao exercício dos poderes constitucionais centrais do presidente, essa imunidade tem que ser absoluta. Quanto aos demais atos oficiais, ele também tem direito a imunidade", continuou Roberts.

Este é o caso do processo que acusa Trump de ter conspirado para reverter o resultado das eleições de 2020 e incentivado manifestantes a invadirem o Capitólio, a sede do Lesgislativo dos EUA, em 6 de janeiro de 2021. Ele havia perdido as eleições para o presidente atual, Joe Biden, mas ainda estava na presidência -- Biden tomou posse dias depois da invasão.

Trump se tornou réu nesse processo em agosto de 2023, mas a data para o julgamento ainda não foi marcada.

Em sua própria rede social, a Truth Social, Donald Trump celebrou a decisão, que classificou de uma "grande vitória para a nossa Constituição e a democracia".

O assessor-chefe da campanha de Joe Biden disse que "a decisão de hoje não altera os fatos, por isso sejamos muito claros sobre o que aconteceu em 6 de janeiro (de 2021): Donald Trump encorajou uma multidão a derrubar os resultados de uma eleição livre e justa".

A sentença da Suprema Corte desta segunda também determina que, agora, os tribunais inferiores são os que deverão decidir sobre a imunidade como aplicar a nova decisão ao caso de Trump. O caso, originalmente, foi julgado em um tribunal da 2ª instância, que rejeitou o pedido do ex-presidente por imunidade.

Os advogados de Trump apresentaram recurso, e o caso subiu, então, para a Suprema Corte.

No pedido original, Trump argumentou que estaria imune porque era presidente quando tomou as medidas que levaram a todos os processos -- como as acusações de que ele incitou manifestantes a invadirem o Capitólio e de que pressionou autoridades eleitorais do estado da Georgia a recontar os votos.

A Suprema Corte dos EUA tem maioria conservadora -- seis juízes foram indicados por presidentes republicanos, três deles pelo próprio Donald Trump. Os outros três foram indicações democratas.

Na sentença, a juíza Sonia Sotomayor, indica pelo ex-presidente democrata Barack Obama e que deu voto contrário à imunidade, argumentou que, com direito a serem imunes, presidentes e ex-presidente se tornaram "reis acima da lei".

·        Que atos concretos estão cobertos pela imunidade?

O julgamento se debruçou sobre quatro categorias de conduta listadas na denúncia contra Trump: as discussões com agentes do Departamento de Justiça logo após as eleições de 2020, a suposta pressão sobre o então vice-presidente Mike Pence para que bloqueasse a certificação da vitória de Biden, seu suposto papel em reunir falsos apoiadores e a conduta dele relacionada à invasão do Capitólio em 6 de janeiro de 2021.

Trump é acusado de conspiração para defraudar os Estados Unidos, conspiração para obstruir um procedimento oficial, conspiração envolvendo o processo de certificação de voto no Capitólio em 6 de janeiro de 2021 e por levar adiante essa obstrução, além de conspiração por violação de direitos civis, em relação às tentativas de reverter a seu favor os resultados eleitorais em diferentes estados do país nas eleições de 2020. Ele alega inocência.

Apenas em um deles, o julgamento já aconteceu. Em maio, o ex-presidente foi condenado por fraude contábil ao ocultar um pagamento de US$ 130 mil para comprar o silêncio da ex-atriz pornô Stormy Daniels na eleição de 2016, que ele venceu.

A pena da condenação estava prevista para ser determinada pelo juiz do caso em julho. Até a última atualização, o juiz não havia informado se adiaria a sessão para estipular a pena por conta da nova decisão da Suprema Corte.

Neste caso, no entanto, a imunidade não se aplicaria, já que ele não estava no poder quando cometeu o crime, segundo entendimento da Justiça.

Pela decisão da Suprema Corte, Trump tem imunidade total pelas conversas com agentes do Departamento de Justiça. Os demais três casos foram remetidos a tribunais inferiores, que deverão analisar se é o caso de estender ou não essa imunidade.

Nos outros dois processos, a defesa de Trump poderia pedir que ele seja imune, seguindo a compreensão dos juízes da Suprema Corte.

Em um deles, Trump é acusado de ser o chefe de uma organização criminosa com o objetivo de fraudar a eleição no estado da Georgia.

Neste caso, segundo a Promotoria, o ex-presidente chegou a telefonar pessoalmente para secretário de Estado da Georgia e para a autoridade eleitoral máxima do estado com o objetivo de pressioná-los a alterar o resultado da contagem local de votos, que davam vitória aos democratas. Na ocasião, ele era presidente dos EUA.

No quarto processo, Donald Trump é julgado por ter levado para sua residência uma série de documentos confidenciais da Casa Branca quando deixou a presidência, no fim de janeiro de 2021 -- neste caso, ele também ainda estava no poder ao cometer o crime.

No entanto, agora caberá aos juízes da 2ª instância decidir se a imunidade se aplicará em cada um dos casos ou não, e de que forma.

Com isso, o processo criminal contra Trump sofre novo atraso, diminuindo a probabilidade de que o caso dele venha a ser julgado antes das eleições, em 5 de novembro.

A decisão da Suprema Corte, somada à rejeição de esforços para barrar a candidatura dele diante das tentativas de se manter no poder depois da derrota para Joe Biden, é um indicativo do papel que os ministros estão desempenhando nas eleições de novembro.

·        Decisão inédita

É a primeira vez na história da Suprema Corte que um ex-presidente tem sua imunidade declarada em relação a acusações criminais em qualquer instância. A decisão foi motivada por um recurso de Trump contra a decisão anterior que negava imunidade a ele.

A defesa do candidato argumentava que ele tinha imunidade porque as acusações diziam respeito a ações praticadas durante o seu mandato como presidente, e que se ele não tivesse a imunidade declarada, isso sujeitaria futuros presidentes a "chantagem e extorsão" de rivais políticos.

Contrária à imunidade de Trump, a ministra do Supremo Sonia Sotomayor criticou o julgamento, afirmando que ele "zomba do princípio fundamental da nossa Constituição e do nosso sistema de governo de que ninguém está acima da lei".

A acusação argumentou que dar "imunidade absoluta" a Trump, conforme ele desejava, blindaria presidentes de responsabilização criminal por propina, traição, assassinato e, no caso em questão, tentativa de golpe.

Ao analisar o caso, os ministros mencionaram hipoteticamente a venda de segredos nucleares, o recebimento de propina e o comando de um golpe ou homicídio com motivação política. O argumento da defesa de Trump era que, se essas ações fossem conduta oficial, um ex-presidente só poderia ser acusado se sofresse primeiro um impeachment na Câmara dos Representantes e depois fosse condenado no Senado – algo que nunca aconteceu na história dos EUA.

 

¨      Steve Bannon diz que vai mobilizar 'exército' pró-Trump de dentro ou fora da prisão

Um dos principais conselheiros de Donald Trump nas campanhas presidenciais, Steve Bannon, disse à BBC que não tem medo de ir para a prisão ou assistir à campanha de 2024 do ex-presidente atrás das grades.

Depois de ser condenado por desacato ao Congresso, o homem que era visto como um dos mais poderosos nos bastidores da Casa Branca no início do mandato presidencial de Trump em 2017 se apresentará a uma prisão federal em Connecticut nesta segunda-feira (01/07).

Ele ainda está recorrendo contra sua condenação por se recusar a comparecer à comissão da Câmara que investiga o ataque de 6 de janeiro de 2021 ao Capitólio, em Washington por apoiadores de Trump.

Bannon afirmou que as conversas que teve com o presidente naquele dia deveriam ser protegidas sob privilégios do Executivo.

Mas na semana passada, a Suprema Corte decidiu que ele não poderia adiar sua sentença até que o recurso fosse ouvido, e agora Bannon terá que cumprir a sentença de quatro meses na prisão.

“Eu sirvo meu país há cerca de 10 anos focando nisso”, disse ele em uma entrevista, referindo-se à política e ao movimento Make America Great Again (Maga).

“Se eu tiver que fazer isso em uma prisão, eu faço em uma prisão - não faz nenhuma diferença”, acrescentou Bannon.

Ele disse que não estava preocupado em perder uma parte crucial da campanha de Trump, pois há um “exército Maga” pronto para garantir que o ex-presidente derrote Joe Biden e retorne à Casa Branca.

“Estou pronto para ir (para a prisão)”, disse ele. “Estou inteiramente pronto.”

Embora seu esforço para adiar sua sentença tenha falhado, Bannon disse à BBC que pretendia transmitir uma última edição de seu programa de TV e podcast de direita do lado de fora dos portões da prisão antes de se entregar às autoridades.

Depois disso, seu programa — descrito como um “centro de comando militar para o Maga” — permanecerá no ar em sua ausência.

Ele providenciou para que outros apresentadores assumam o programa War Room (sala de guerra, em português) junto com todos os seus colaboradores regulares.

Ex-operador financeiro do banco de investimentos Goldman Sachs que se tornou figura da mídia de direita alternativa, Bannon era visto pelos democratas como o cérebro por trás não apenas da extraordinária ascensão política de Trump, mas também de algumas de suas políticas mais polêmicas.

Ele ganhou destaque nacional como chefe executivo da bem-sucedida campanha presidencial de Donald Trump em 2016 e depois se tornou uma das figuras mais poderosas de Washington como estrategista-chefe da Casa Branca no início do governo Trump.

No entanto, sete meses depois, ele foi demitido, deixando de frequentar a Casa Branca, de onde comandava as postagens e iniciativas nas redes sociais, e passou algum tempo à deriva do círculo íntimo de Trump.

O aspecto desafiador da personalidade de Bannon advém de que “a maioria dos comentaristas se divide entre chamá-lo de mentor e dizer que ele é irrelevante”, disse Benjamin Teitelbaum, autor de War for Eternity: Inside Bannon's Far-Right Circle of Global Power Brokers (Guerra para a Eternidade: Por Dentro do Cícrulo da Direita Radical de Bannon para os Figurões do Poder Global, em tradução livre).

“Ele é os dois extremos ao mesmo tempo.”

Nesse ínterim, Bannon parece ter voltado ao grupo de Trump e, nos últimos cinco anos, comandou o War Room — de onde continuou apoiando o ex-presidente e seu movimento.

·        Dentro da 'sala de guerra'

A verdadeira “sala de guerra” de Bannon fica no porão de uma elegante casa no Capitólio, a poucos passos da Suprema Corte dos EUA.

Cada canto está repleto de livros de capa dura sobre política, finanças e teorias da conspiração.

Sobre a lareira, entre diversas iconografias religiosas, está uma citação impressa que Bannon - que se vê como um pastor da agenda populista Maga - cunhou: “NÃO há conspirações, mas NÃO há coincidências”.

O volumoso manual do “Projeto 2025" está posicionado em um lugar de orgulho na sala.

O livro de 900 páginas elaborado pela Heritage Foundation — um think tank conservador — contém planos detalhados de como um segundo mandato de Trump transformará o governo americano e o poder do Executivo.

Estávamos cercados pelas luzes, câmeras e microfones que Bannon usa para transmitir sua mensagem, por quatro horas, todos os dias da semana, quando me disse que ele e seu programa tiveram um papel importante na capacitação e mobilização de milhares de ativistas apoiadores de Trump, a quem chamou de “combatentes de rua”.

Embora não seja capaz de liderá-los a partir da prisão, ele disse que esse “exército Maga” que “não pode e não vai parar até a vitória final” seguirá normalmente em sua missão.

Afinal, disse ele, o movimento populista Maga é maior do que ele — e até mesmo do que Donald Trump. De acordo com Bannon, não importa quem transmita sua mensagem.

Bannon continua fazendo a falsa alegação de que a eleição de 2020 foi roubada de Trump — na realidade, os tribunais rejeitaram dezenas de ações judiciais contestando os resultados e nenhuma evidência de fraude generalizada surgiu.

Bannon disse que no dia da eleição, 5 de novembro, o “exército Maga” estará pronto para se deslocar por todo o país, presente nas seções eleitorais e nas contagens de votos para garantir a vitória do ex-presidente.

Esses apoiadores - incluindo observadores de pesquisas e advogados - contestariam cédulas que não acreditam que deveriam ser concedidas a Joe Biden, disse ele.

Teitelbaum, no entanto, duvida que o próprio público de Bannon esteja “organizado o suficiente para ser conduzido da maneira que ele descreve”.

·        O que acontece depois da prisão?

Confiante de que Trump vencerá em novembro, Bannon estava ansioso para discutir qual seria a agenda do ex-presidente quando ele retornar ao governo — e o apresentador do War Room sair da prisão.

Ele acredita que a próxima Casa Branca de Trump será influenciada pelas ideias que ele promoveu em seu programa.

A imigração continua sendo prioridade máxima, disse Bannon. Ele disse ter certeza de que no “primeiro dia” Trump fechará a fronteira para “impedir a invasão” e, em seguida, iniciaria a “deportação em massa de 10 a 15 milhões de invasores estrangeiros ilegais”.

O ex-presidente voltaria para a economia depois disso, disse ele, e manteria os cortes de impostos de seu primeiro mandato, que beneficiaram amplamente indivíduos e corporações ricas. Ele afirmou que o republicano acabaria com as “guerras eternas” na Ucrânia e em Gaza, embora não estivesse claro como Trump faria isso.

Bannon não hesitou em discutir como um segundo governo Trump atacaria seus inimigos políticos.

O próprio Trump disse que, se reeleito, poderá imputar responsabilidade a indivíduos que ele acha que o investigaram erroneamente — especialmente aqueles que estiveram envolvidos nos vários processos criminais contra ele.

As agências policiais e os militares seriam “responsabilizados” e teriam que prestar contas sob uma futura administração Trump, disse Bannon, e o presidente Joe Biden também seria processado.

Embora tenha acusado o presidente de ter “vendido o país”, a comissão de supervisão que é controlada pelos republicanos na Câmara dos Deputados, e que investiga tais alegações, não apresentou nenhuma evidência de irregularidade criminal cometida pelo presidente, nem agiu para pedir seu impeachment.

E, a partir de agora, é Bannon quem está prestes a ir para a prisão. E pouco antes de sua partida, ele deixou um aviso sinistro sobre qualquer resultado eleitoral que não considerasse Trump o vencedor.

É “impossível”, ele me disse, que Joe Biden ganhe a eleição em novembro. E, portanto, não há como ele, Bannon, e seu “exército Maga” aceitarem o resultado se o presidente for reeleito.

Como ele disse em um discurso recente em uma conferência política conservadora, ele vê a eleição como um jogo de soma zero — e, disse à multidão de apoiadores de Trump, ela resultará em “vitória ou morte”.

 

Fonte: Deutsche Welle/g1/BBC News EUA

 

Nenhum comentário: