segunda-feira, 8 de julho de 2024

Qual será a política externa do Irã sob o novo presidente?

Masoud Pezeshkian foi eleito novo presidente do Irã nesta sexta-feira (5), substituindo Mohammad Mokhber, que substituiu em 20 de maio temporariamente Ebrahim Raisi no cargo, após a morte do último em um acidente de aviação em 19 de maio.

Pezeshkian falou à Sputnik na véspera das eleições sobre as principais prioridades da política externa do Irã: o reforço das relações com a Rússia e a China, a presença ativa do Irã no BRICS e na Organização para Cooperação de Xangai (OCX), a restauração do Plano de Ação Conjunto Global (JCPOA, na sigla em inglês) e o levantamento das sanções.

"A Rússia é amiga e parceira do Irã, e considero uma prioridade aprofundar e expandir as relações com a Rússia e a China, bem como intensificar as atividades de política externa na direção asiática em geral. E certamente, em todos os níveis – bilateral, regional e internacional – continuaremos nossos esforços para expandir nossa interação com a Federação da Rússia", considerou ele.

Ele defendeu uma "política unidirecional" do Irã, como "defensor do princípio da multipolaridade".

"Além disso, a cooperação regional é uma das prioridades da minha agenda de política externa e, para esse fim, o Irã expandirá sua presença no BRICS e na OCX, e buscará uma cooperação mais ativa com a UEE [União Econômica Euroasiática] para realizar mais plenamente o potencial das relações comerciais e econômicas com seus Estados-membros", previu.

Na sua opinião, a saída unilateral dos EUA do JCPOA, o acordo nuclear assinado entre vários países internacionais e o Irã, prejudicou seriamente o Irã e seu povo.

"Como o lado russo tem sublinhado repetidamente, o Irã cumpriu suas obrigações, e consideramos que nossa tarefa é trazer as outras partes de volta a esse acordo o mais rápido possível e conseguir o levantamento das sanções. Estou confiante de que os governos amigos da Rússia e da China apoiarão e ajudarão o Irã a resolver essa questão", segundo o presidente iraniano recém-eleito.

·        Primeiro presidente reformista da República Islâmica

O ex-ministro da Saúde de 69 anos, parlamentar e cirurgião cardíaco, era um político pouco conhecido no início da campanha, mas foi ganhando popularidade com uma mensagem de moderação, aproximação ao Ocidente e críticas à obrigatoriedade do véu muçulmano para as mulheres.

Ele conseguiu conquistar os votos dos descontentes com críticas a seu antecessor, o ultraconservador Ebrahim Raisi, morto num acidente de helicóptero em maio, sob cujo governo aumentou a repressão social e política. Ao mesmo tempo Pezeshkian alimentou o medo do eleitorado em relação a seu adversário Jalili, também ultraconservador com reputação de intransigente.

Pezeshkian será o primeiro presidente iraniano reformista. Esse grupo moderado busca uma certa abertura social e política num país em meio fortes tensões regionais, sobretudo devido à guerra de Israel contra o movimento islamista palestino Hamas, na Faixa de Gaza. Internamente, a imposição do véu e a falta generalizada de liberdades são igualmente fonte de insegurança.

Enquanto chefe de governo, o presidente do Irã tem capacidade de decisão em assuntos nacionais e, em menor medida, na política exterior e na segurança. Nestas e outras questões de Estado, o líder supremo detém amplos poderes. Desde 1989 o cargo é ocupado por Ali Khamenei.

¨      Quem é Masoud Pezeshkian, o novo presidente do Irã que promete acabar com isolamento do país

O reformista Masoud Pezeshkian foi eleito novo presidente do Irã ao superar seu oponente conservador de linha dura, Saeed Jalili.

Pezeshkian, de 70 anos, foi declarado vencedor ao receber 53,3% dos mais de 30 milhões de votos contados no segundo turno do pleito presidencial. Já Jalili recebeu 44,3%.

O segundo turno aconteceu depois que nenhum dos candidatos recebeu a maioria dos votos no primeiro turno realizado em 28 de junho — que teve comparecimento às urnas de 40% do eleitorado, o mais baixo desde a fundação da República Islâmica do Irã em 1979.

O pleito foi convocado depois que o presidente anterior, Ebrahim Raisi, morreu em um acidente de helicóptero em maio. Outras sete pessoas morreram na queda.

Ao saber dos resultados, Pezeshkian agradeceu a seus partidários e pediu a todos os iranianos que o acompanhem na dura tarefa que tem pela frente.

"As eleições terminaram e este é só o começo da nossa aliança", escreveu em sua conta na rede social X.

"O difícil caminho que temos pela frente não será fácil exceto pela companhia, empatia e confiança de vocês. Eu estendo minha mão a vocês e juro que não os abandonarei", disse.

Vídeos publicados nas redes sociais mostraram festas de rua pela vitória de Pezeshkian em Teerã e em várias outras cidades do país.

As imagens mostravam muitos jovens dançando e balançando a bandeira verde, que é característica de sua campanha, entre carros que buzinavam.

<><> Reforma sem ruptura

Pezeshkian, que é cirurgião cardíaco e parlamentar, criticiou a polêmica polícia moral do Irã e chamou atenção por prometer tentar acabar com o fim do isolamento iraniano no mundo.

O presidente eleito pediu "negociações construtivas" com as potências ocidentais sobre a renovação do acordo nuclear de 2015 — no qual o Irã acordou frear seu programa nuclear em troca por um alívio de sanções ocidentais.

No entanto, Pezeshkian não pode ser considerado uma pessoa que defende uma ruptura. Pelo contrário, sua carreira deixa claro o seu apego pelo líder supremo do país, o aiatolá Ali Khamenei.

"Sou um 'principista' (pessoa que defende os conceitos que sustentam a República Islâmica) e a partir destes princípios é que buscamos reformas", disse ele, durante a campanha.

Pezeshkian também não é novato na política, pois já foi parlamentar durante cinco legislaturas.

Em sua passagem pelo Parlamento, ele gerou polêmica por defender a descriminalização das drogas.

"Desde que o governo não se transforme no provedor das drogas, não conseguimos frear o vício", disse.

Entre 2001 e 2005, ele foi ministro da Saúde durante o segundo governo de Mohammad Khatami (1997-2005), que é considerado o primeiro presidente reformista da República Islâmica.

Khatami apoiou a candidatura de seu antigo ministro, assim como fez Mehdi Karrubi, um clérigo dissidente que em 2009 tentou chegar à Presidência do Irã nas questionadas eleições daquele ano, e que desde então está em prisão domiciliar, segundo o serviço de notícias em farsi da BBC.

<><> Terceira tentativa

Pezeshkian já tentou se eleger presidente em 2013 e 2021. Na primeira tentativa, retirou sua candidatura para apoiar outro candidato. Na segunda, ele foi desqualificado da disputa pelo Conselho dos Guardiões, um órgão formado por 12 clérigos e juristas.

O motivo foi seu apoio aos protestos que estouraram contra os resultados do pleito de 2009.

Além de reduzir as tensões com o Ocidente e buscar a reinserção do Irã no palco internacional, o presidente eleito prometeu a seus compatriotas que buscará implementar "reformas estruturais" que permitam o país atingir um desenvolvimento mais justo e equilibrado.

Já seu rival, Saeed Jalili, defende a continuidade do status quo e considera que as propostas do vencedor fazem parte de um modelo falido. Ele fez parte da equipe de negociadores nucleares do Irã e tem forte apoio das comunidades mais religiosas do país.

Jalili é conhecido por sua postura anti-Ocidente de linha dura e oposição a restaurar o acordo nuclear, que segundo ele viola as "linhas vermelhas" do Irã.

Mais pessoas votaram no segundo turno, realizado na sexta-feira (5/7), do que no primeiro turno, quando a participação havia sido a mais baixa desde a Revolução Islâmica de 1979, em meio a um descontentamento generalizado.

Até agora a participação em urnas está em 49% — nove pontos a mais do que no primeiro turno, segundo autoridades eleitorais.

Alguns que se abstiveram no primeiro turno votaram em favor de Pezeshkian agora, para evitar que Jalili ganhasse.

Eles temem que uma vitória de Jalili pudesse levar a maior tensão com o Ocidente, algo que provocaria mais isolamento e novas sanções.

Ambos os candidatos se submeteram a investigações do Conselho de Guardiões para poderem seguir com suas campanhas.

Esse processo eliminou 74 candidatos da corrida — incluindo diversas mulheres.

O Conselho é criticado por grupos de direitos humanos por desqualificar candidatos que não são suficientemente leais ao regime.

<><> Desconfiança

Após anos de distúrbios civis que culminaram em protestos contra o governo em 2022 e 2023, muitos jovens iranianos de classe média desconfiam profundamente do establishment. No passado, eles se negaram a votar.

Nas redes sociais iranianas, a hashtag "minoria traidora" viralizou — com grupos pedindo que eleitores não votem em nenhum dos candidatos.

Mas o aiatolá Ali Khamenei rejeitou as acusações de que a baixa participação nas urnas seja uma rejeição ao modelo teocrático do Irã vigente desde 1979.

"Há motivos [pela baixa participação nas urnas] e os políticos e sociólogos examinarão eles, mas se alguém pensa que quem não votou está contra o establishment, está totalmente equivocado", disse.

Em uma declaração incomum, Khamenei reconheceu que alguns iranianos não aceitam a situação atual.

"Estamos escutando e sabemos o que nos dizem, e não é como se estivessem escondidos e não fossem vistos", diz o aiatolá.

No Irã, os meios de comunicação estimularam as pessoas a votar.

O jornal reformista Sazandegi disse: "O futuro está ligado aos seus votos". O Hamminah disse: "Agora é a sua hora".

O Hamshahri, dirigido pelo governo de Teerã, publicou um artigo com o título "Cem motivos para se votar". O jornal da emissora Jaam-e Jam disse que o Irã estava "aguardando seu povo".

¨      Xi Jinping exalta relação com o Irã se diz pronto para trabalhar com o presidente eleito do país

O presidente da China, Xi Jinping, declarou neste sábado (6) que está pronto para trabalhar com o presidente eleito do Irã, Masoud Pezeshkian, para aprofundar as relações bilaterais entre os países. A informação foi dada pelo Ministério das Relações Exteriores da China.

"Atribuo grande importância ao desenvolvimento das relações China-Irã e estou pronto para trabalhar em conjunto com o sr. presidente para aprofundar a parceria estratégica abrangente China-Irã", escreveu o líder chinês em sua mensagem de felicitações a Pezeshkian.

Xi Jinping acrescentou que os dois países desfrutam de uma longa história de intercâmbios amistosos e de desenvolvimento estável das relações bilaterais desde que as relações diplomáticas foram estabelecidas, há mais de meio século.

Ele lembrou ainda que, nas condições do difícil ambiente regional e internacional, a China e o Irã sempre se apoiaram e trabalharam juntos, reforçaram constantemente a confiança estratégica mútua, desenvolveram intercâmbios e cooperação em diferentes domínios e mantiveram a coordenação nos assuntos regionais e internacionais, o que que não só beneficiou o seu povo, mas também contribuiu positivamente para a paz e a estabilidade na região e em todo o mundo.

Mais de 61 milhões de iranianos foram às urnas para escolher o próximo presidente do país. O primeiro turno das eleições ocorreu em 28 de junho, com uma participação eleitoral de cerca de 40%.

Quatro candidatos concorreram na disputa: o chefe do Parlamento, Mohamad Bagher Ghalibaf; o ex-secretário do Conselho Superior de Segurança Nacional, Saeed Jalili; o ex-ministro do Interior, Mostafa Pourmohamadi; e o deputado Masoud Pezeshkian, o único considerado reformista.

Nenhum dos candidatos obteve a maioria de 50% mais um dos votos, o que levou a um segundo turno entre os dois candidatos com mais votos, Pezeshkian e Jalili.

Pezeshkian que obteve 16.384.403 dos 30.510.157 votos computados no segundo turno. Entre suas propostas está a cooperação com o Ocidente para aliviar as sanções impostas contra Teerã.

As eleições presidenciais do Irã estavam previstas para 2025, mas foram antecipadas após a morte do presidente Ebrahim Raisi, em maio, em um acidente de helicóptero em 19 de maio.

¨      Eleição no Irã: Arábia Saudita fala em aprofundar laços, China em desenvolver e Rússia em expandir

O premiê da Arábia Saudita, Mohammed bin Salman, parabenizou Pezeshkian por sua eleição, informou a agência de notícias estatal SPA, citada pela Reuters.

"Afirmo meu interesse em desenvolver e aprofundar as relações entre nossos países e povos e servir aos nossos interesses mútuos", disse MBS.

Em março de 2023, o Teerã e Riad assinaram um acordo histórico mediado pela China para restabelecer relações após anos de rivalidade regional.

Já o presidente chinês, Xi Jinping, declarou que está pronto para trabalhar com o presidente eleito, assim como aprofundar as relações bilaterais.

"Atribuo grande importância ao desenvolvimento das relações China-Irã e estou pronto para trabalhar em conjunto com o presidente para aprofundar a parceria estratégica abrangente", escreveu o líder do país asiático na sua mensagem de felicitações.

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, também Putin parabenizou Pezeshkian, expressando seu desejo de que a cooperação entre Rússia-Irã se desenvolva em todas as áreas.

"Espero que sua atividade como presidente contribua para uma maior expansão da cooperação bilateral construtiva em todas as áreas, em benefício de nossos povos amigos, no interesse de simplificar a segurança e a estabilidade regionais", disse Putin em uma mensagem publicada no site do Kremlin hoje (6).

Pezeshkian, que é ex-cirurgião cardíaco, falou à Sputnik na véspera das eleições sobre as principais prioridades da política externa do Irã: o reforço das relações com a Rússia e a China, a presença ativa do Irã no BRICS e na Organização para Cooperação de Xangai (OCX), a restauração do Plano de Ação Conjunto Global (JCPOA, na sigla em inglês) e o levantamento das sanções ocidentais.

¨      Rússia e Irã conectam sistemas de pagamento, anuncia presidente do Banco Central iraniano

Moscou e Teerã assinaram um acordo cambial bilateral para garantir a liquidez das moedas nacionais em transações comerciais, disse o presidente do Banco Central do Irã, citado no sábado (6) pela agência iraniana Tasnim.

Na primeira fase, que estará totalmente operacional até o final de agosto, os cidadãos iranianos poderão usar seus cartões Shetab sob o esquema de cartão de débito inteligente Kahroba para retirar rublos de caixas automáticas em toda a Rússia, detalhou Mohammad Farzin.

Durante a segunda fase, explicou, os viajantes russos poderão usar seus cartões russos Mir no Irã, enquanto na terceira fase os cidadãos iranianos serão autorizados a usar seus cartões Shetab nos terminais de ponto de venda de todas as lojas em toda a Rússia.

Além disso, referiu Farzin, os sistemas Shetab e Mir já estão atualmente conectados.

 

Fonte: Sputnik Brasil/BBC Pérsia

 

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