quarta-feira, 10 de julho de 2024

Povo francês de ambos os espectros políticos está 'insatisfeito com presidência de Macron', diz analista

A situação na França, onde a agitação foi desencadeada pelos resultados das recentes eleições, realça o fato de que "ninguém está feliz [...] exceto uma pequena minoria de pessoas privilegiadas", diz Emmanuel Leroy, presidente do think tank Institut 1717 e ex-conselheiro de Marine Le Pen.

"Tanto os franceses que se autodenominam de esquerda como os que se autodenominam de direita estão profundamente insatisfeitos com a presidência do sr. [Emmanuel] Macron", explica Leroy.

As três principais potências políticas na França — a coalizão de esquerda liderada por Jean-Luc Mélenchon, o Reagrupamento Nacional (RN) de direita e o partido de centro-direita de Macron — encontram-se agora em um impasse, uma vez que cada uma delas tem uma influência comparável após o resultado das eleições, mas estão relutantes em formar uma aliança entre si, observa Leroy.

"Como isso se desenrolará nas próximas semanas e meses? Essa é a grande incógnita hoje", refletiu o analista. "Neste momento, ninguém pode falar de um primeiro-ministro, uma vez que não surge nenhuma cabeça no campo da maioria ou da esquerda. E em qualquer caso, a situação será extremamente difícil de manter."

"É possível que o senhor [Emmanuel] Macron aposte em um governo técnico e o menos politizado possível, para ter uma espécie de consenso geral durante pelo menos um ano e no final deste ano, para garantir que pode dissolver novamente a Assembleia Nacional e fazer o país voltar às urnas para novas eleições legislativas", acrescenta. "Esperemos que desta vez a maioria consiga sair dessa."

Leroy também argumenta que quaisquer protestos violentos que eclodiram após as eleições "são obra de pequenos grupos de agitadores políticos, muitas vezes em conivência com o governo em vigor e que pretendem criar uma atmosfera de desconforto, uma atmosfera de caos".

"Hoje, é quase certo que nenhum dos partidos políticos com representação nacional no parlamento tenha realmente incitado os motins ou os maus comportamentos que se observaram desde a noite passada", afirma.

<><> Franceses receberam os resultados das eleições parlamentares entre euforia e confrontos 

As comemorações pela vitória da coligação Nova Frente Popular nas eleições parlamentares deste domingo (7) desencadearam confrontos com a Polícia.

A coligação está se preparando para ser a primeira força política no Parlamento, enquanto a coligação Together do presidente Emmanuel Macron foi relegada para segundo lugar. Em terceiro lugar ficou o partido Reunião Nacional (RN).

As pessoas se reuniram para a celebração na Place de la République, em Paris. No entanto, aproximadamente às 23h do horário local, ocorreram confrontos entre os que ali se encontravam e as forças do Estado.

Segundo relatos, a polícia dispersou as pessoas com gás depois de terem sido atirados projéteis contra elas. Confrontos também foram relatados em Lyon após os resultados das eleições.

A polícia deteve 25 pessoas na cidade francesa de Rennes durante uma manifestação após o anúncio dos resultados da segunda volta das eleições parlamentares, noticiou o jornal Le Figaro, citando fontes policiais.

"Em Rennes, 25 pessoas foram detidas durante uma manifestação proibida e realizada sem aviso prévio", noticia o jornal, citando fontes policiais.

¨      Macron vê governabilidade ameaçada em meio ao 'polarizado' parlamento eleito na França

Em uma das eleições mais acirradas e concorridas na história da democracia francesa, a coalizão Nova Frente Popular, que reúne vários partidos de esquerda, conquistou o primeiro lugar com 182 cadeiras. Porém, nenhuma frente teve maioria no Parlamento e o futuro político do país deve seguir uma incógnita por semanas ou até meses.

País em que o voto não é obrigatório e que convive com um sistema semi-parlamentarista, a França registrou no último fim de semana a eleição com maior participação popular dos últimos 40 anos, em que quase 60% dos eleitores compareceram às urnas. Para além desse feito histórico, o resultado também mostrou uma reviravolta após a Nova Frente Popular, coligação que reúne vários partidos de esquerda, conquistar o maior número de assentos na Assembleia Nacional, seguida pelo Juntos, do presidente Emmanuel Macron, com 168 assentos, e a Reunião Nacional, de Marine Le Pen, com 143. No primeiro turno, a última sigla, de direita, liderava a corrida parlamentar.

Apesar disso, nenhuma coalizão conquistou as 289 vagas necessárias para indicar o primeiro-ministro do país, o que deve levar a longas e incertas negociações. O professor da pós-graduação em ciência política da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e coordenador do Centro de Estudos sobre a União Europeia da Universidade Federal de Sergipe, Rodrigo Barros de Albuquerque, ressalta em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, que a situação mostra um país extremamente polarizado e com a governabilidade ameaçada. Além disso, representa mais uma derrota interna para Macron, que convocou o pleito após o resultado pífio do partido nas eleições para o Parlamento Europeu no fim de maio.

Depois de a Reunião Nacional liderar o primeiro turno, Juntos e Nova Frente Popular chegaram a fazer uma aliança informal na segunda etapa das eleições para barrar o avanço histórico no país da direita. "Nas eleições para o Parlamento Europeu, a maior parte dos candidatos franceses eleitos eram de alguma forma ligados à direita. Então, foi uma estratégia do Macron [convocar eleições antecipadas no país] que claramente não foi bem sucedida no primeiro turno. Considerando o resultado final, a sorte ficou no outro lado, com os partidos de esquerda terem se mobilizado para impedir a ascensão da Reunião Nacional, o que deu certo, mas não por conta do presidente. Deu certo por outras figuras ficarem preocupadas com a situação e reagirem", resume.

O especialista pontua ainda que Macron caiu em uma armadilha que pode comprometer o atual governo ainda mais. "Eu acho que ele pensou isso como uma boa estratégia, é algo comum em regimes como o da França, que é semi-presidencialista, de se pedir a antecipação de eleições como uma forma de tentar restaurar alguma força perdida recentemente. Então você dissolve o parlamento e tenta promover uma certa reação da população para você ter um novo parlamento que seja mais favorável ao governo", explica, ao acrescentar que ambos os espectros políticos do país mostraram insatisfação com a condução do país por Macron.

·        Quando termina o mandato do presidente da França?

Reeleito em abril de 2022 para um mandato de cinco anos na França após uma intensa disputa com Marine Le Pen, Macron tem acumulado derrotas internas nos últimos meses, como protestos por conta da Reforma da Previdência e crise no governo após o endurecimento das leis de imigração. "Nessa situação agora tão divisiva que ficou a Assembleia Nacional, é muito difícil ele ter governabilidade, já que não tendo apoio de uma parte significativa do parlamento, você não vai conseguir governar. E uma coisa é você ter a formação da nova frente popular para barrar o período eleitoral que o partido de Marine Le Pen subisse, a outra coisa é você continuar encampando todos os projetos aos quais eles tecem críticas constantemente do governo atual", argumenta.

E mesmo após perder a liderança no segundo turno, a Reunião Nacional conquistou um espaço histórico no parlamento, com um aumento de 55 assentos na comparação com o último pleito, enquanto o Juntos perdeu 82. "Se nós tivemos um grande vencedor, não foi o Macron com toda certeza [...]. E acredito que Marine Le Pen, apesar dessa queda brusca que teve entre o primeiro e o segundo turno, ainda saiu como grande vitoriosa. Conseguiu muita visibilidade para o partido e alcançar um espaço que nunca teve", enfatiza.

Rodrigo Barros de Albuquerque enfatiza também a diferença entre a agenda da esquerda e a coalizão governista, mais equilibrada com relação às questões migratórias e que busca melhorar a situação dos trabalhadores do país, o que levou a rejeitarem inclusive a mudança previdenciária de Macron.

·        Quem ganhou a eleição na França, esquerda ou direita?

Com a vitória da esquerda, o atual primeiro-ministro Gabriel Attal chegou a pedir a renúncia do cargo, mas foi convencido por Macron a permanecer, pelo menos até a situação ficar mais definida no país. Enquanto o impasse sobre quem ficará no comando da política interna francesa permanece, a atuação do país no globo não deve sofrer muitas mudanças, avalia o professor da UFPE. "Enquanto chefe de Estado, que normalmente conduz a política externa do país é o próprio Macron, é o presidente. Então, ele permanece na cadeira e acredito que não vai ter muitas mudanças em relação a isso", diz.

Já o professor de relações internacionais do IBMEC, Marcio Sette Fortes, afirma à Sputnik Brasil que as eleições francesas tiveram mais perdedores que vitoriosos em ambos os espectros políticos. "O que vai acontecer a partir de agora deixa muito claro que deixou um cenário de impasse, um cenário de uma França bastante polarizada. Nós temos agora uma situação em que a direita, que saiu vitoriosa no primeiro turno das eleições e que esperava um resultado melhor agora, foi eclipsada por uma aliança foi feita pelos centristas com a esquerda", enfatiza.

Para o especialista, a própria configuração da coalizão de esquerda que envolve diversos movimentos políticos pode se tornar um empecilho para alcançar algum consenso sobre quais rumos tomar. "Se a estratégia era barrar a Reunião Nacional da Marine Le Pen, ou seja, barrar aqueles que são chamados de direita, eles lograram êxito, é verdade. Mas, por outro lado, conseguiram mais cadeiras, mas sem maioria para governar. Então fica uma situação que deixa a desejar no futuro da política francesa, que exigirá aí muita negociação entre eles para que se possa conduzir a política do país", complementa.

Tudo isso, segundo Fortes, pode ser classificado como "um tiro no pé" dado pelo próprio Macron, que perdeu a maioria no Parlamento e passa a ter uma oposição ainda mais forte. "Antes você tinha um presidente com baixa popularidade, que após as eleições legislativas, continua com baixa popularidade, mas com um panorama ainda pior. Antes você tinha um presidente que tinha maioria na Assembleia Nacional e por isso estava livre para escolher o seu primeiro-ministro, para formar o seu ministério e até aprovar certas leis que fossem rejeitadas pelos deputados", explica.

·        Um país cada vez mais polarizado

Por fim, o professor do IBMEC acredita que países muito polarizados como a França deixam de conviver com uma divergência política saudável para terem o predomínio de embates constantes. "O que impera não é o bem-estar da população, mas, é brigar com o seu inimigo político. Em ambientes muito polarizados, deixa de existir o adversário e passa a existir o inimigo. E, quando isso acontece, não importa se você tem um grande projeto para a nação, se você tem leis que possam trazer melhorias, basta isso ser trazido pela oposição e será combatido ferozmente pelo partido que está no governo ou pelo partido que está na oposição".

¨      Partido de Le Pen deve se juntar ao novo bloco europeu apoiado por Orbán, diz mídia

O Reagrupamento Nacional (RN) de Marine Le Pen, da França, deve se juntar à nova aliança de direita que cresce no Parlamento Europeu liderada pelo primeiro-ministro húngaro Viktor Orbán, disse o porta-voz do governo da Hungria nesta segunda-feira (8).

De acordo com a Reuters, o novo grupo político liderado pelo Fidesz de Orbán, apelidado de Patriotas pela Europa, deve fazer um pronunciamento oficial em Bruxelas na tarde desta segunda-feira, para anunciar seu novo grupo constituído por 12 nacionalidades e 84 parlamentares, sugerindo, inclusive, que a presidência seja francesa "se todos concordarem", disse o eurodeputado Jean-Paul Garraud, do RN, à mídia.

Os Patriotas pela Europa vão formar um novo grupo no Parlamento Europeu como o terceiro maior bloco que desafia o Partido Popular Europeu (PPE), de centro-direita, que apoia Ursula von der Leyen para um segundo mandato como presidente da Comissão Europeia.

Na última eleição parlamentar na França, o RN de Le Pen sofreu um golpe em suas ambições ao terminar em terceiro lugar na corrida para a Assembleia Nacional Francesa, no domingo (7), graças à articulação Republicana entre o Juntos, de Emmanuel Macron, e a Nova Frente Popular.

Em paralelo ao que ocorre na França, diversos partidos de direita na Europa, como o Partido da Liberdade (FPO) da Áustria, o Fidesz húngaro e o partido populista tcheco ANO, liderado por Andrej Babis, já tinham concordado em unir forças, motivados pelo argumento da "luta contra a imigração ilegal", para tentar transferir mais poderes de Bruxelas de volta aos Estados-membros.

Atualmente os partidos de direita na Europa se dividem entre a liderança de Orbán com os Patriotas pela Europa, e da primeira-ministra italiana Giorgia Meloni, com os Conservadores e Reformistas Europeus (ECR, na sigla em inglês).

Ainda segundo a apuração, o partido de Orbán está pressionando para reforçar a sua presença a nível europeu depois do partido da oposição húngara, Tisza, ter afirmado que aderiu ao PPE de von der Leyen no mês de junho.

Para formar um novo grupo político no Parlamento Europeu, são necessários 23 eurodeputados que representem pelo menos um quarto dos Estados-membros da União Europeia (UE).

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

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