O diretor
de escola que chocou o Reino Unido ao abusar de alunas adolescentes por anos
O
diretor escolar condenado no País de Gales por aliciar e abusar sexualmente de
quatro meninas adolescentes poderia ter sido impedido, segundo o pai de uma
filha que passou por sessões individuais com ele sem supervisão.
Durante
o julgamento de Neil Foden, vieram à tona preocupações levantadas por
professores em 2019, sobre a conduta do diretor com uma de suas vítimas. Mas as
autoridades de educação não as investigaram e Foden chegou a ser nomeado
posteriormente "superdiretor" de outra escola.
O
pai declarou à BBC que esta falta de ação foi "imperdoável".
O
conselho da região de Gwynedd, no noroeste do País de Gales, declarou ter
ficado "chocado" com os crimes de Foden. O conselho irá promover uma
análise independente do histórico do tratamento dedicado pelo conselho às
questões levantadas em 2019.
Neil
Foden tem 66 anos. Ele foi diretor da escola secundária Ysgol Friars, na cidade
galesa de Bangor, na região de Gwynedd, e "superdiretor" estratégico
temporário de outra escola secundária.
Em
maio, ele foi considerado culpado em 19 acusações de abusos cometidos entre
2019 e 2023.
Foden
negou todos os abusos, afirmando que suas vítimas estavam mentindo. Ele
declarou ser incapaz de manter relações sexuais devido a uma condição médica.
Mas,
na segunda-feira (1/7), ele foi condenado a 17 anos de prisão. O juiz Rhys
Rowlands o chamou de "agressor... depravado", com "obsessão por
meninas adolescentes".
Durante
o julgamento, as vítimas de Niel Foden descreveram um padrão de aliciamento e
abusos sexuais que incluía mensagens de texto sexualizadas e referências a um
fetiche do diretor.
A
polícia realizou buscas no carro de Foden e encontrou no porta-malas um par de
algemas de renda com traços do seu DNA e de uma das meninas que sofreram
abusos.
Neil
Foden era conhecido no sistema educacional galês – um ex-dirigente sindical que
costumava aparecer nos noticiários da TV.
Ele
era diretor da Ysgol Friars desde 1996. Seu estilo disciplinar e suas opiniões
controversas o mantinham constantemente nas manchetes.
Durante
o julgamento, duas das quatro vítimas de Foden decidiram encará-lo no tribunal
sem telas. Uma das meninas declarou que queria que ele ouvisse
"pessoalmente o impacto que ele causou" na vida dela.
Enquanto
elas falavam, Foden mantinha a cabeça baixa pela maior parte do tempo, sem
fazer contato visual com as meninas de quem ele abusou.
A
detetive Jemma Jones, da polícia do norte do País de Gales, era sargenta e
detetive em exercício em setembro de 2023, quando foi transferida para a
investigação. Ela soube que uma das vítimas havia acusado o conhecido diretor
escolar naquela manhã.
Jones
declarou, em um recente documentário de TV da BBC, que "uma criança havia
revelado ter mantido, nas suas palavras, um relacionamento amoroso com Neil
Foden".
A
criança que apresentou as alegações ficou conhecida como Criança A. Ela havia,
segundo a detetive, mostrado mensagens de texto com conteúdo adulto trocadas
entre ela e Foden.
Os
textos tinham relação com atos sexuais. A criança também mostrou a um adulto
uma foto dela com Foden no carro do diretor.
A
detetive e seus colegas iniciaram uma investigação, que recebeu o nome de
Operation Stone (Operação Pedra). Neil Foden foi preso e levado em custódia.
Ao
longo de todos os interrogatórios, ele não fez nenhum comentário para a
polícia.
Criança
A contou aos policiais que Foden a levava de carro para locais remotos na zona
rural que ele encontrava no Google Maps. Em uma das vezes, ela viu fardos de
feno pela janela.
Ela
contou que os beijos e abraços precederam os toques íntimos. E que ele também
satisfez um fetiche. A menina contou que ele pedia que ela bebesse muita água e
pressionava em seguida sua bexiga, tentando fazer com que ela urinasse.
Nas
buscas no computador de Foden, a polícia descobriu que ele havia feito
pesquisas online sobre o fetiche, conhecido como urofilia.
Foden
advertiu à menina que não contasse a ninguém o que eles fizeram. Ele disse que
ela deveria "levar aquilo para o túmulo".
A
polícia descobriu que ela pesquisou no Google expressões como "acho que
estou sendo aliciada sexualmente, o que devo fazer?" e "como contar
aos seus pais que você foi aliciada".
A
detetive Jones declarou que a coragem da menina para fazer a denúncia foi
"fundamental para a investigação". Para ela, "com as suas
revelações, ela praticamente deu às outras a confiança de conseguir falar, eu
acho".
Nas
semanas que se seguiram, quando surgiram as acusações contra Neil Foden sobre a
Criança A, outras vítimas se apresentaram, descrevendo um padrão similar de
aliciamento para ganhar a confiança delas.
Este
padrão era seguido por segurar as mãos delas, abraçá-las e tocá-las. Ele
beliscou a parte interna da coxa de uma das meninas e acariciou suas costas por
baixo das roupas. Foden discutia com elas atividades sexuais e a perda da sua
virgindade.
Em
outubro de 2023, mais uma vítima se apresentou. Ela ficou conhecida como a
Criança E.
"A
Criança E, novamente, [era] vulnerável, mas por outros motivos", afirmou a
detetive Jones.
"Como
posso explicar? Ela tem uma personalidade bastante forte. Ela também foi
fundamental para este caso porque os abusos que ela descreveu voltavam a 2019.
Ou seja, estávamos examinando outro período de tempo."
Foden
começou a aliciar e abusar sexualmente da Criança E em 2019. Ele teve sexo com
a vítima e a restringia, às vezes, com um cinto ou algemas de renda, antes de
abusar dela sexualmente.
Foden
se referia a esta vítima como seu "brinquedo sexual". A menina também
viajava com Foden para eventos e, às vezes, ficava com ele em hotéis.
Todas
as vítimas de Foden foram descritas como vulneráveis, de uma forma ou de outra.
Era por esta razão que ele as abordava.
A
detetive Jones declarou que ele "era considerado uma pessoa poderosa e
influente na comunidade que ele atendia. Acho que está claro que ele se
aproveitou da sua posição para abusar dessas crianças."
• Preocupações não investigadas
Durante
o julgamento de Neil Foden, surgiu a informação de que diversas pessoas haviam
expressado preocupações sobre sua proximidade com a Criança E em 2019, mas as
preocupações se concentravam na reputação do próprio Foden.
As
questões foram apresentadas ao chefe de educação de Gwynedd da época, Garem
Jackson. Ele declarou à Justiça que havia transmitido as preocupações para um
responsável pela segurança. A resposta foi que, como não havia acusações
específicas, não haveria nenhuma investigação.
Jackson
foi instruído a conversar com Foden por telefone, relembrando a ele que
"mantivesse distância apropriada" das jovens. A resposta do diretor,
segundo Jackson, foi que as preocupações eram "excessivamente
dramáticas" e ele garantiu que nada estaria acontecendo.
Jackson
declarou ao tribunal que "não tinha registro por escrito" de nenhuma
das comunicações, exceto pelo e-mail original que ele havia recebido.
Durante
o julgamento, o juiz criticou o conselho por não ter investigado a questão, o
que ele considerou "muito preocupante".
Neil
Foden foi posteriormente nomeado diretor estratégico de outra escola, chamada
Ysgol Dyffryn Nantlle, em Penygroes – perto da cidade de Caernarfon, na mesma
região galesa de Gwynedd. Ele ocupou o cargo por pouco mais de um ano, entre
junho de 2021 e agosto de 2022.
O
pai de uma estudante conversou com a BBC em condição de anonimato, para
proteger a identidade da filha. Ele contou que não sabia das questões
levantadas em 2019 e procurou Neil Foden pedindo ajuda depois daquela data.
Ele
acredita que, se o conselho tivesse investigado, os abusos de Foden poderiam
ter sido evitados.
"Aquilo
poderia ter feito com que ele parasse", declarou ele. "Este fator foi
decisivo. Nada mudou no seu comportamento."
A
filha do homem acabou tendo sessões individuais com Neil Foden por vários
meses. A menina não foi uma das vítimas, mas seu pai, agora, acredita que o
diretor pode ter planejado aliciá-la.
Ele
mostrou à BBC cópias de telas com mensagens de texto entre ele e Neil Foden.
Nelas, Foden dizia repetidamente para que ele não falasse com a filha sobre as
sessões.
A
família da menina, agora, está assombrada pelo medo do que poderia ter
acontecido.
"É
muito mais fácil para mim pensar que nunca teria acontecido", declarou o
pai.
Mas
"a realidade é que, provavelmente, se ele tivesse qualquer intenção, teria
feito."
"Passei
tempo demais pensando nisso, com medo de até onde ele teria chegado se a
Criança A não tivesse feito a denúncia."
Uma
Revisão de Prática Infantil independente irá determinar as lições que podem ser
aprendidas com este caso.
Em
declaração, o conselho de Gwynedd afirmou estar "chocado" com os
crimes de Foden e elogiou a coragem e a resiliência das suas vítimas.
O
presidente e o vice-presidente do conselho diretor atual renunciaram após o
julgamento. Em uma carta anunciando a renúncia, eles disseram que o veredicto
foi um "momento significativo" para eles.
Após
a divulgação da sentença, a vereadora Beca Brown, membro do gabinete de
educação do conselho, declarou ter ficado "claro" que as vítimas
haviam sido "ludibriadas" e que ela gostaria que houvesse uma
consulta pública.
"Seja
qual for o resultado da revisão sendo realizada, no centro de tudo estão as
jovens que sofreram uma experiência horrível", declarou ela, "e o que
aconteceu com elas nunca deverá acontecer outra vez."
"Estou
disposta a colaborar com a revisão e agradeceria por qualquer recomendação
inicial ou ideia de lições a serem aprendidas para seguirmos adiante. Apoio a
nomeação do presidente e dos investigadores independentes, que têm muita
experiência nesta área, e quero que o alcance da análise seja amplo e completo,
com evidências fornecidas por todos, conforme o necessário."
Garem
Jackson afirmou em uma declaração que a segurança era "prioridade
fundamental" para ele enquanto chefe de educação. Ele deixou o cargo por
razões pessoais, pouco depois da prisão de Neil Foden.
Ele
afirmou que irá cooperar totalmente com a análise independente e acrescentou:
"Nas
raras circunstâncias em que me foram apresentadas diretamente preocupações, eu
as encaminhei ao responsável apropriado, para seguir suas instruções, e foi o
que eu fiz neste caso."
"Meus
pensamentos estão com as vítimas de Foden e com todos aqueles que foram
afetados pelos seus atos."
Fonte:
Por Jenny Johnson e Elen Wyn, da BBC News, País de Gales
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