Gonzalo Vecina: As doenças de nosso Brasil
No Brasil dos dias de
hoje, cerca de 35% das mortes são devidas a causas cardiovasculares. Cerca de
20% são devidas aos canceres. Estes dois grupos de mortes nos deixam muito
temerosos e em parte sabemos o que devemos combater e sabemos os riscos com os quais
convivemos diuturnamente – o inimigo habita conosco – hipertensão, diabetes,
obesidade, vida sedentária, má alimentação, excesso de açúcar/gorduras/sal nos
alimentos ultraprocessados.
E em parte além de
conviver com a doença, também a cada dia que passa, aparecem aliados produzidos
pela ciência – um novo remédio que ajuda a emagrecer! Ainda é caro, mas
consegue fazer milagres. Novos medicamentos e procedimentos que desentopem
nossos vasos sanguíneos e nos salvam milagrosamente, em uma parte dos casos de
infarto e de derrame, o acidente vascular cerebral. Novos tratamentos para o
câncer também surgem todos os dias.
Então sabemos as
principais doenças que podem ser a causa da morte, convivemos relativamente bem
com as causas dessas doenças e vemos a ciência começar a ganhar muitas dessas
batalhas.
A terceira causa de
morte em nosso país, responsável por 15% das mortes e com tendência a crescer,
não é uma doença. É um sintoma de uma doença ainda muito desconhecida por todos
nós. Uma doença complexa por ser um mal social e não ter um diagnostico tão
simples como diabetes. Esse mal é a violência.
Essa doença, de todas
é a que mais mata os pobres, portanto ela não é tão democrática como as outras
causas de morte, embora também as outras causas de morte prefiram matar mais os
pobres. De preferencia pretos.
A grande questão da
violência são os remédios. Não vendem nas farmácias, não são produzidos por
multinacionais ávidas por lucro. A violência é fruto direto de como nós
estruturamos a sociedade e de como nós vivemos. Os homens são transformados
neste espaço social em violentadores, ladrões, assassinos. Vejamos um tema do
momento – o estupro e suas consequências.
De acordo com o IPEA,
em 2023 tivemos cerca de estimados 1500 estupros por dia no Brasil. 1500! Cerca
de 89% cometidos contra mulheres e 62% contra meninas menores de 14 anos. 57%
delas negras. Impressionante é verificar que os violentadores em 64% das vezes
eram parentes das vitimas!
Não eram bandidos,
eram parentes. Viviam no mesmo teto!
E essas mulheres,
melhor dito, meninas, que antes dos 14 anos são estupradas e quando reconhecem
a agressão em parte se reprimem e se envergonham e escondem a gravidez, estão
para ser condenadas por nossos eleitos legisladores a serem presas por não quererem
ser mães pela vontade de um agressor.
Um bom pastor de
crentes acha que é esse o caminho que elas devem trilhar. Mais, um medico que
fez o juramento de Hipócrates, representou no congresso um ato de escárnio
contra as vítimas da maneira como se colocou contra a assistolia fetal
provocada para diminuir o sofrimento das meninas que forem levadas a realizar o
aborto terapêutico após a vigésima segunda semana.
A questão a ser
debatida, é como diminuir a violência?
No caso do aborto ela
está em nossas casas. A violência é fruto de uma condição social que nós todos
geramos em nossa sociedade. Temos que partir da constatação que o remédio para
ter um mundo mais pacifico está em cada um de nós. Temos que construir uma
sociedade melhor, mais justa.
Voltemos ao aborto.
Onde ocorre proporcionalmente o maior número de casos?
No Amapá, no Acre e em
Rondônia. Coincidentemente os estados com maior numero de mortes por 100 mil
habitantes do Brasil. O que estes estados tem em comum – a desigualdade social.
A causa mais importante de mortes de negros entre 15 e 45 anos em nossa sociedade
é homicídio!
Essa é a doença a ser
tratada. Temos que enfrentar a desigualdade social se quisermos ter uma
sociedade menos violenta. E tenham a certeza que a violência atinge a todos.
É muito complexo
entender a violência. Em nossa sociedade grassa a ignorância sobre estas
causas. A politica da bala e da repressão policial não conseguirão diminuir a
violência. Ela agrega mais violência.
A educação, o acesso a
serviços públicos essenciais como transporte, seguridade social, saúde,
justiça, segurança, poderão ser remédios eficazes. Estes são direitos em uma
sociedade evoluída e civilizada.
Direitos.
Mas com certeza
diminuir o temor da fome também será fundamental, como uma boa vacina.
Mas, antes de qualquer
ação, temos que nos informar e entender como a violência aparece. Como um
cidadão de bem dono de um carro de luxo, atropela e mata e não socorre um outro
cidadão de bem. Com certeza a impunidade está nesse ambiente que produz criminosos.
Mas não é a punição que irá melhorar a nossa sociedade. Temos que entender que
são vários remédios e que um deles é mais fundamental que os outros, assim como
um stents em uma veia entupida – esse remédio, presente em uma sociedade
evoluída chama-se IGUALDADE.
Fonte: CNN Brasil
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