segunda-feira, 1 de julho de 2024

Glauco Faria: ‘Biden, Trump e a senilidade dos EUA’

Ao comentar o debate realizado na noite desta quinta-feira (27) entre os candidatos à Presidência dos Estados Unidos Joe Biden e Donald Trump, a pesquisadora e antropóloga Letícia Cesarino publicou, em seu perfil no ex-Twitter:

“Tem um certo universal antropológico (trabalhado por Graeber e outros) segundo o qual o corpo do ‘rei’ é um espelho do corpo sócio-político como um todo, notadamente suas dinâmicas de decadência e renascimento. lembrei disso vendo o debate ontem… os Estados Unidos acabou.”

Obviamente, como ela mesma disse na sequência, não significa que o poder imperial encontrou seu fim imediato, mas é a reafirmação de uma tendência de declínio evidente. Se na quarta-feira (26), o mundo assistiu ao vivo uma tentativa de golpe de Estado ser rechaçada na Bolívia, o debate estadunidense do dia seguinte expôs todas as veias abertas de uma potência que pretendia ser a única dominante após a queda da União Soviética e hoje tropeça nos limites da sua democracia formal fragilizada.

As próprias aparências de alguma representatividade já estavam em ruínas na série de ineditismos presentes no encontro televisivo. Pela primeira vez os presidenciáveis iriam dialogar (sic) sem participação do público, com microfones mutados quando não estivessem com a palavra, prova de que a dita civilidade não havia sido convidada para o embate. A precocidade do embate, distante mais de quatro meses da votação, também é incomum.

Diferentemente de eleições passadas, os dois pretendentes chegavam ainda sem participação em debates prévios nas primárias de seus partidos. E, como só aconteceu em 2016, ambos têm imagens mais desfavoráveis do que favoráveis diante do eleitorado, fazendo uma revanche que a maioria da população não gostaria de assistir.

O fato de Trump e Biden terem chegado nesta condição é prova de um alheamento completo do sistema político do país em relação à vontade popular. Isso sem levar em conta de que se trata de um sistema de eleição indireta, no qual o bipartidarismo é favorecido por uma estrutura que, na prática, impede candidaturas que saiam de um roteiro restrito de terem alguma chance de êxito.

·        A força da grana

O poder econômico sempre foi central na disputa pela presidência dos EUA, mas o quadro se tornou especialmente pior com a introdução dos Super PACs. Após a decisão da Suprema Corte no caso Citizens United v. Federal Election Commission, em 2010, os chamados comitês de ação política passaram a poder receber recursos financeiros de forma ilimitada, contanto que não tenham um vínculo oficial com as campanhas. Uma mera formalidade na grande maioria dos casos.

Assim, surgem articulações não somente para apoiar candidatos, mas também para atacar adversários. Não à toa, a disputa eleitoral nos Estados Unidos se tornou uma arena de agressões e xingamentos, ataques apócrifos ou não, fake news e manipulações de toda sorte, como se vê na atual corrida eleitoral. A gramática do ódio é a regra.

Neste cenário, é bom lembrar que os presidenciáveis de 2024 se baseiam justamente no ódio devotado ao rival para vencerem a corrida à Casa Branca. A campanha de Biden assume que sua melhor chance de triunfo é justamente ter Trump como adversário, e a recíproca é verdadeira. Um duelo entre rejeições que é um retrato da política em forma de desilusão.

Poderiam ser outros os candidatos se há um repúdio tão grande da maioria do país? A pegunta cabe às cúpulas dos dois partidos, rendidos aos grandes doadores e a um simulacro de realpolitik que, na prática, afasta o cidadão comum do exercício político.

·        Os dois antis

Remontando às origens dos dois postulantes à Casa Branca como candidatos, temos Donald Trump surfando na antipolítica em 2016, quando poucos acreditavam que ele poderia conseguir a candidatura pelo Partido Republicano. Não só conseguiu como venceu aquela eleição, assegurando ainda a vaga em 2024, batendo com facilidade seus adversários na legenda.

Muitos viram esse triunfo do bilionário como o fim de um partido que se via subjugado a um homem só. Mesmo seus rivais internos pela nomeação emulavam o discurso trumpista, defendendo suas teses e até seus maneirismos. Sim, era uma vitória também, como gostam de mencionar os extremistas, na seara da “batalha cultural”.

O colapso não era somente entre os republicanos, contudo, ainda que o espetáculo fosse mais chamativo. A dupla derrota de Bernie Sanders nas nomeações democratas, em 2016 e 2020, mostrava, pela forma como aconteceram, que a cúpula partidária preferia o limbo de uma representação formal a qualquer tentativa de renovação ou de atração dos mais jovens e de pessoas afastadas da atividade política. Para os donos da legenda, a política precisava ficar com os políticos profissionais. E com quem os financiam.

Foi assim que a legenda enviou para o embate com Trump, em 2016, a ex-secretária de Estado Hillary Clinton, já bastante impopular àquela altura, apostando (como a história se repete como farsa…) na alta rejeição do candidato republicano. Deu errado.

Quatro anos mais tarde, a candidatura de Biden nasce também como um “anti”. Ali, contudo, ele era o anti-Sanders. O objetivo era derrotar o senador por Vermont, claramente situado à esquerda e então favorito. Para desbancá-lo, Biden contou com a movimentação dos principais dirigentes da sigla para assegurar o apoio de três pretendentes à nomeação democrata – o ex-prefeito de South Bend Pete Buttgieg, a senadora de Minessotta Amy Klobuchar e o bilionário Tom Steyer.

A primeira vitória de Biden nas primárias de 2020, na Carolina do Sul, a quarta realizada naquele ano, fez com que US$ 10 milhões fossem arrecadados para sua candidatura em 48 horas. A cúpula democrata, que havia cogitado até uma convenção contestada, respirava aliviada por achar seu anti-Sanders e os mega doadores também. A pandemia e a impossibilidade de mobilizações de rua sacramentaram a candidatura do ex-vice-presidente de Barack Obama.

·        A decadência escancarada

Na mistura da antipolítica, da antiparticipação popular, e de campanhas baseadas no antagonismo pessoal, e não em agendas propositivas e de confrontos de ideias, chega-se ao debate de quinta.

Quem acompanhou, poderá falar da acuidade mental de Biden, dos momentos em que ele “congelou” ou formulou mal suas frases. Também lembrará das mentiras contadas por Trump, um mitômano qualificado, ou das ofensas trocadas entre ambos. Mas vai ter dificuldade em lembrar de algo que tenha sido discutido com um mínimo de profundidade ou um pingo de seriedade.

Se os extremistas em todo o mundo buscam a construção de um cenário despolitizado em sua essência para crescer, também é verdade que o chamado centro, quando não adere ao ideário reacionário para lucrar eleitoralmente, não se interessa em engajar segmentos sociais por conta de seu ideário. Nos Estados Unidos, este grupo prefere abrir espaço para o campo inimigo do que arejar e transformar o seu.

Não é só 6 de janeiro a prova da decadência do sistema dos Estados Unidos. E tampouco os efeitos se limitam a suas fronteiras, já que na área externa sua influência também sofre abalos, embora seu tamanho ainda faça com que o resto do planeta olhe temeroso para a sua ruína. A “maior democracia do mundo” nunca foi uma alcunha verdadeira, mas está cada vez mais próxima da pura ficção.

 

¨      'Declínio' de Biden é conhecido no entorno democrata há meses, afirma jornalista que ganhou Pulitzer

Amigos e pessoas com informações privilegiadas já têm conhecimento da "deterioração mental" do presidente dos EUA, Joe Biden, há meses, afirmou nesta sexta-feira (28) o jornalista investigativo norte-americano Seymour Hersh.

"Tenho ouvido há meses sobre o isolamento crescente do presidente, inclusive de seus antigos amigos no Senado, que descobrem que ele é incapaz de retornar às suas atividades", comentou Hersh em sua conta na plataforma Substack.

O jornalista destacou que pelo menos um líder estrangeiro, após uma reunião privada com Biden, disse a outros que o declínio do presidente era tão visível "que era difícil entender como, como me foi dito, 'ele poderia enfrentar o rigor' de uma campanha de reeleição. Tais avisos foram ignorados", continuou ele.

Ainda segundo Hersh, o debate presidencial realizado na noite desta quinta-feira (27) entre Biden e seu adversário, Donald Trump, mostrou aos Estados Unidos e ao mundo que o presidente dos EUA não tem condições de exercer suas funções.

"O declínio do presidente Joe Biden rumo ao vazio tem sido contínuo por meses, enquanto ele e seus assessores de política externa têm instado por um cessar-fogo que não acontecerá em Gaza, ao mesmo tempo em que continuam a fornecer armamentos que tornam um cessar-fogo menos provável. Existe um paradoxo similar na Ucrânia, onde Biden tem financiado uma guerra que não pode ser vencida e se recusado a participar de negociações que poderiam encerrar o massacre", pondera o jornalista em sua coluna.

Dado "o óbvio declínio de Biden", o jornalista questionou o fato de a Casa Branca ter concordado com debates com Donald Trump antes das eleições.

"Uma ideia, me disseram, era que se Biden se saísse bem, como fez em seu discurso do Estado da União em março, a questão de sua capacidade mental seria adiada. Uma má performance daria à campanha de Biden tempo para melhorar a preparação para o segundo debate programado."

Outra fonte, segundo ele, afirmou que o Partido Democrata está enfrentando agora "uma crise de segurança nacional" pelo fato de o país estar apoiando "duas guerras devastadoras com um presidente que claramente não está à altura".

"Pode ser hora de começar a redigir um discurso de renúncia que corresponda ou supere o dado em março de 1968 pelo presidente Lyndon Johnson após sua estreita vitória sobre o senador Eugene McCarthy na primária de New Hampshire", contou. "O que aconteceu com a 25ª Emenda que autoriza o vice-presidente e a maioria do gabinete a declarar o presidente incompetente? O que está acontecendo na Casa Branca de Biden?", completou o colunista.

¨      'Ininteligível': democratas 'surtaram' com Biden e pensam em como retirar sua candidatura, diz mídia

Segundo informações veiculadas pela revista Time nesta sexta-feira (28), pânico não é uma palavra muito forte para descrever o sentimento que "percorreu o Partido Democrata de cima abaixo enquanto o debate se desenrolava".

Entre as preocupações dos caciques democratas está a de como seria possível ser feita a retirada da candidatura de Biden "para o bem do partido".

De acordo com a publicação, de progressista a pragmático, o veredito entre os democratas foi talvez o mais unido que as altas patentes do partido têm sido em décadas.

"Ininteligível deve ter sido a [performance de Biden] [...]. Teria sido o mais honesto [ele ter desistido]", disse outro estrategista democrata sênior, segundo afirma a revista.

A publicação continua sugerindo que, quase imediatamente após o término do debate, "os democratas começaram a perguntar se e como Biden poderia ser convencido a se retirar para o bem do partido, da nação e do próprio candidato".

A revista insinua que "os leais a Biden correram para a brecha. A vice-presidente Kamala Harris fez uma rodada de ataques noturnos ao fim, fazendo o melhor esforço para afastar os sonhos dos ativistas do partido de abandonar Biden, e talvez Harris também".

Imediatamente após o debate, de acordo com o artigo publicado, "houve rumores de uma revolta, com democratas anônimos do Congresso, cautelosos com sua própria vulnerabilidade eleitoral, jurando que dessa vez uma intervenção dos líderes do partido seria desencadeada".

·        EUA e o debate presidencial

Realizado pela CNN, o debate ocorreu na cidade de Atlanta e teve duração de 90 minutos, em um estúdio sem plateia. Apenas o microfone de quem falava ficou aberto.

A idade de Biden, 81 anos, que o torna o homem mais velho a servir como presidente dos Estados Unidos, foi explorada pelo adversário, de 78 anos, bem como a saúde mental e física do atual mandatário.

Trump e Biden voltarão a debater em 10 de setembro, em um evento moderado pela ABC News. Apesar das críticas, o presidente afirmou que "fez as coisas bem" no debate.

¨      'Não representa os democratas': mídia dos EUA pede que Joe Biden retire sua candidatura

O desempenho de Joe Biden no debate de quinta-feira (27) fez com que veículos norte-americanos se posicionassem contrários à sua candidatura.

É o caso do conselho editorial do The New York Times. Nesta segunda-feira (28), o corpo editorial pediu que Biden abandone a corrida pela Casa Branca.

"Biden disse que é o candidato com maior probabilidade de enfrentar a ameaça da tirania e derrotá-la. O seu argumento é baseado em grande parte no fato de ter derrotado Trump em 2020 […] Mas isso já não é uma justificativa boa o suficiente para Biden ser o candidato democrata este ano", crava o editorial.

O jornal The Wall Street Journal e a revista The Economist também publicaram editoriais na noite desta sexta defendendo a desistência do democrata. Em nova capa divulgada nesta tarde, a revista Time mostra uma imagem de Biden extrapolando as bordas da revista e a palavra "pânico".

EUA e o debate presidencial

Realizado pela rede CNN, o debate ocorreu na cidade de Atlanta e teve duração de 90 minutos em um estúdio sem plateia. Apenas o microfone de quem falava ficou aberto.

A idade de Biden, 81 anos, que o torna o homem mais velho a servir como presidente dos Estados Unidos, foi explorada pelo adversário, de 78 anos, bem como a saúde mental e física do atual mandatário.

Trump e Biden voltarão a debater em 10 de setembro, em um evento moderado pela ABC News. Apesar das críticas, o presidente afirmou que "fez as coisas bem" no debate.

 

Fonte: Outras Palavras/Sputnik Brasil

 

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