Glauco
Faria: ‘Biden, Trump e a senilidade dos EUA’
Ao
comentar o debate realizado na noite desta quinta-feira (27) entre os
candidatos à Presidência dos Estados Unidos Joe Biden e Donald Trump, a
pesquisadora e antropóloga Letícia Cesarino publicou, em seu perfil no ex-Twitter:
“Tem
um certo universal antropológico (trabalhado por Graeber e outros) segundo o
qual o corpo do ‘rei’ é um espelho do corpo sócio-político como um todo,
notadamente suas dinâmicas de decadência e renascimento. lembrei disso vendo o
debate ontem… os Estados Unidos acabou.”
Obviamente,
como ela mesma disse na sequência, não significa que o poder imperial encontrou
seu fim imediato, mas é a reafirmação de uma tendência de declínio evidente. Se
na quarta-feira (26), o mundo assistiu ao vivo uma tentativa de golpe de Estado ser
rechaçada na Bolívia, o debate estadunidense do dia seguinte expôs todas as
veias abertas de uma potência que pretendia ser a única dominante após a queda
da União Soviética e hoje tropeça nos limites da sua democracia formal
fragilizada.
As
próprias aparências de alguma representatividade já estavam em ruínas na série
de ineditismos presentes no encontro televisivo. Pela primeira vez os presidenciáveis iriam dialogar (sic) sem
participação do público, com microfones mutados quando não estivessem com a
palavra, prova de que a dita civilidade não havia sido convidada para o embate.
A precocidade do embate, distante mais de quatro meses da votação, também é
incomum.
Diferentemente
de eleições passadas, os dois pretendentes chegavam ainda sem participação em
debates prévios nas primárias de seus partidos. E, como só aconteceu em 2016,
ambos têm imagens mais desfavoráveis do que favoráveis diante do eleitorado, fazendo uma revanche que a maioria da população não gostaria
de assistir.
O
fato de Trump e Biden terem chegado nesta condição é prova de um alheamento
completo do sistema político do país em relação à vontade popular. Isso sem
levar em conta de que se trata de um sistema de eleição indireta, no qual o
bipartidarismo é favorecido por uma estrutura que, na prática, impede
candidaturas que saiam de um roteiro restrito de terem alguma chance de êxito.
·
A força da grana
O
poder econômico sempre foi central na disputa pela presidência dos EUA, mas o
quadro se tornou especialmente pior com a introdução dos Super PACs. Após a
decisão da Suprema Corte no caso Citizens United v. Federal Election
Commission, em 2010, os chamados comitês de ação política passaram a poder
receber recursos financeiros de forma ilimitada, contanto que não tenham um
vínculo oficial com as campanhas. Uma mera formalidade na grande maioria dos
casos.
Assim,
surgem articulações não somente para apoiar candidatos, mas também para atacar
adversários. Não à toa, a disputa eleitoral nos Estados Unidos se tornou uma
arena de agressões e xingamentos, ataques apócrifos ou não, fake news e
manipulações de toda sorte, como se vê na atual corrida eleitoral. A gramática
do ódio é a regra.
Neste
cenário, é bom lembrar que os presidenciáveis de 2024 se baseiam justamente no
ódio devotado ao rival para vencerem a corrida à Casa Branca. A campanha de
Biden assume que sua melhor chance de triunfo é justamente ter Trump como adversário, e a recíproca é verdadeira. Um duelo entre rejeições que é um retrato da política em forma
de desilusão.
Poderiam
ser outros os candidatos se há um repúdio tão grande da maioria do país? A
pegunta cabe às cúpulas dos dois partidos, rendidos aos grandes doadores e a um
simulacro de realpolitik que, na prática, afasta o cidadão
comum do exercício político.
·
Os dois antis
Remontando
às origens dos dois postulantes à Casa Branca como candidatos, temos Donald
Trump surfando na antipolítica em 2016, quando poucos acreditavam que ele
poderia conseguir a candidatura pelo Partido Republicano. Não só conseguiu como
venceu aquela eleição, assegurando ainda a vaga em 2024, batendo com
facilidade seus adversários na legenda.
Muitos
viram esse triunfo do bilionário como o fim de um partido que se via subjugado
a um homem só. Mesmo seus rivais internos pela nomeação emulavam o discurso
trumpista, defendendo suas teses e até seus maneirismos. Sim, era uma vitória
também, como gostam de mencionar os extremistas, na seara da “batalha
cultural”.
O
colapso não era somente entre os republicanos, contudo, ainda que o espetáculo
fosse mais chamativo. A dupla derrota de Bernie Sanders nas
nomeações democratas, em 2016 e 2020, mostrava, pela forma como aconteceram,
que a cúpula partidária preferia o limbo de uma representação formal a qualquer
tentativa de renovação ou de atração dos mais jovens e de pessoas afastadas da
atividade política. Para os donos da legenda, a política precisava ficar com os
políticos profissionais. E com quem os financiam.
Foi
assim que a legenda enviou para o embate com Trump, em 2016, a ex-secretária de
Estado Hillary Clinton, já bastante impopular àquela altura, apostando (como a
história se repete como farsa…) na alta rejeição do candidato republicano. Deu
errado.
Quatro
anos mais tarde, a candidatura de Biden nasce também como um “anti”. Ali,
contudo, ele era o anti-Sanders. O objetivo era derrotar o senador por Vermont,
claramente situado à esquerda e então favorito. Para desbancá-lo, Biden contou
com a movimentação dos principais dirigentes da sigla para assegurar o
apoio de três pretendentes à nomeação democrata – o ex-prefeito de South Bend Pete Buttgieg, a senadora de
Minessotta Amy Klobuchar e o bilionário Tom Steyer.
A
primeira vitória de Biden nas primárias de 2020, na Carolina do Sul, a quarta
realizada naquele ano, fez com que US$ 10 milhões fossem arrecadados para sua candidatura em 48 horas. A cúpula democrata, que havia cogitado até
uma convenção contestada, respirava aliviada por achar seu anti-Sanders e os
mega doadores também. A pandemia e a impossibilidade de mobilizações de rua
sacramentaram a candidatura do ex-vice-presidente de Barack Obama.
·
A decadência
escancarada
Na
mistura da antipolítica, da antiparticipação popular, e de campanhas baseadas
no antagonismo pessoal, e não em agendas propositivas e de confrontos de
ideias, chega-se ao debate de quinta.
Quem
acompanhou, poderá falar da acuidade mental de Biden, dos momentos em que ele
“congelou” ou formulou mal suas frases. Também lembrará das mentiras contadas
por Trump, um mitômano qualificado, ou das ofensas trocadas entre ambos. Mas
vai ter dificuldade em lembrar de algo que tenha sido discutido com um mínimo
de profundidade ou um pingo de seriedade.
Se
os extremistas em todo o mundo buscam a construção de um cenário despolitizado
em sua essência para crescer, também é verdade que o chamado centro, quando não
adere ao ideário reacionário para lucrar eleitoralmente, não se interessa em
engajar segmentos sociais por conta de seu ideário. Nos Estados Unidos, este
grupo prefere abrir espaço para o campo inimigo do que arejar e transformar o
seu.
Não
é só 6 de janeiro a prova da decadência do sistema dos Estados Unidos. E
tampouco os efeitos se limitam a suas fronteiras, já que na área externa sua
influência também sofre abalos, embora seu tamanho ainda faça com que o resto
do planeta olhe temeroso para a sua ruína. A “maior democracia do mundo” nunca
foi uma alcunha verdadeira, mas está cada vez mais próxima da pura ficção.
¨
'Declínio' de Biden é
conhecido no entorno democrata há meses, afirma jornalista que ganhou Pulitzer
Amigos
e pessoas com informações privilegiadas já têm conhecimento da
"deterioração mental" do presidente dos EUA, Joe Biden, há meses,
afirmou nesta sexta-feira (28) o jornalista investigativo norte-americano
Seymour Hersh.
"Tenho
ouvido há meses sobre o isolamento crescente do presidente, inclusive de seus
antigos amigos no Senado, que descobrem que ele é incapaz de retornar às suas
atividades", comentou Hersh em sua conta na plataforma Substack.
O
jornalista destacou que pelo menos um líder estrangeiro, após uma reunião
privada com Biden, disse a outros que o declínio do presidente era tão visível
"que era difícil entender como, como me foi dito, 'ele poderia enfrentar o
rigor' de uma campanha de reeleição. Tais avisos foram ignorados",
continuou ele.
Ainda
segundo Hersh, o debate presidencial realizado na noite desta quinta-feira (27)
entre Biden e seu adversário, Donald Trump, mostrou aos Estados Unidos e ao
mundo que o presidente dos EUA não tem condições de exercer suas funções.
"O
declínio do presidente Joe Biden rumo ao vazio tem sido contínuo por meses,
enquanto ele e seus assessores de política externa têm instado por um
cessar-fogo que não acontecerá em Gaza, ao mesmo tempo em que continuam a
fornecer armamentos que tornam um cessar-fogo menos provável. Existe um
paradoxo similar na Ucrânia, onde Biden tem financiado uma guerra que não pode
ser vencida e se recusado a participar de negociações que poderiam encerrar o
massacre", pondera o jornalista em sua coluna.
Dado
"o óbvio declínio de Biden", o jornalista questionou o fato de a Casa
Branca ter concordado com debates com Donald Trump antes das eleições.
"Uma
ideia, me disseram, era que se Biden se saísse bem, como fez em seu discurso do
Estado da União em março, a questão de sua capacidade mental seria adiada. Uma
má performance daria à campanha de Biden tempo para melhorar a preparação para
o segundo debate programado."
Outra
fonte, segundo ele, afirmou que o Partido Democrata está enfrentando agora
"uma crise de segurança nacional" pelo fato de o país estar apoiando
"duas guerras devastadoras com um presidente que claramente não está à
altura".
"Pode
ser hora de começar a redigir um discurso de renúncia que corresponda ou supere
o dado em março de 1968 pelo presidente Lyndon Johnson após sua estreita
vitória sobre o senador Eugene McCarthy na primária de New Hampshire",
contou. "O que aconteceu com a 25ª Emenda que autoriza o vice-presidente e
a maioria do gabinete a declarar o presidente incompetente? O que está
acontecendo na Casa Branca de Biden?", completou o colunista.
¨
'Ininteligível':
democratas 'surtaram' com Biden e pensam em como retirar sua candidatura, diz
mídia
Segundo
informações veiculadas pela revista Time nesta sexta-feira (28), pânico não é
uma palavra muito forte para descrever o sentimento que "percorreu o
Partido Democrata de cima abaixo enquanto o debate se desenrolava".
Entre
as preocupações dos caciques democratas está a de como seria possível ser feita
a retirada da candidatura de Biden "para o bem do partido".
De
acordo com a publicação, de progressista a pragmático, o veredito entre os
democratas foi talvez o mais unido que as altas patentes do partido têm sido em
décadas.
"Ininteligível
deve ter sido a [performance de Biden] [...]. Teria sido o mais honesto [ele
ter desistido]", disse outro estrategista democrata sênior, segundo afirma
a revista.
A
publicação continua sugerindo que, quase imediatamente após o término do
debate, "os democratas começaram a perguntar se e como Biden poderia ser
convencido a se retirar para o bem do partido, da nação e do próprio
candidato".
A
revista insinua que "os leais a Biden correram para a brecha. A
vice-presidente Kamala Harris fez uma rodada de ataques noturnos ao fim,
fazendo o melhor esforço para afastar os sonhos dos ativistas do partido de
abandonar Biden, e talvez Harris também".
Imediatamente
após o debate, de acordo com o artigo publicado, "houve rumores de uma
revolta, com democratas anônimos do Congresso, cautelosos com sua própria
vulnerabilidade eleitoral, jurando que dessa vez uma intervenção dos líderes do
partido seria desencadeada".
·
EUA e o debate presidencial
Realizado
pela CNN, o debate ocorreu na cidade de Atlanta e teve duração de 90 minutos,
em um estúdio sem plateia. Apenas o microfone de quem falava ficou aberto.
A
idade de Biden, 81 anos, que o torna o homem mais velho a servir como
presidente dos Estados Unidos, foi explorada pelo adversário, de 78 anos, bem
como a saúde mental e física do atual mandatário.
Trump
e Biden voltarão a debater em 10 de setembro, em um evento moderado pela ABC
News. Apesar das críticas, o presidente afirmou que "fez as coisas
bem" no debate.
¨
'Não representa os
democratas': mídia dos EUA pede que Joe Biden retire sua candidatura
O
desempenho de Joe Biden no debate de quinta-feira (27) fez com que veículos
norte-americanos se posicionassem contrários à sua candidatura.
É o
caso do conselho editorial do The New York Times. Nesta segunda-feira (28), o
corpo editorial pediu que Biden abandone a corrida pela Casa Branca.
"Biden
disse que é o candidato com maior probabilidade de enfrentar a ameaça da
tirania e derrotá-la. O seu argumento é baseado em grande parte no fato de ter
derrotado Trump em 2020 […] Mas isso já não é uma justificativa boa o
suficiente para Biden ser o candidato democrata este ano", crava o
editorial.
O
jornal The Wall Street Journal e a revista The Economist também publicaram
editoriais na noite desta sexta defendendo a desistência do democrata. Em nova
capa divulgada nesta tarde, a revista Time mostra uma imagem de Biden
extrapolando as bordas da revista e a palavra "pânico".
EUA
e o debate presidencial
Realizado
pela rede CNN, o debate ocorreu na cidade de Atlanta e teve duração de 90
minutos em um estúdio sem plateia. Apenas o microfone de quem falava ficou
aberto.
A
idade de Biden, 81 anos, que o torna o homem mais velho a servir como
presidente dos Estados Unidos, foi explorada pelo adversário, de 78 anos, bem
como a saúde mental e física do atual mandatário.
Trump
e Biden voltarão a debater em 10 de setembro, em um evento moderado pela ABC
News. Apesar das críticas, o presidente afirmou que "fez as coisas
bem" no debate.
Fonte:
Outras Palavras/Sputnik Brasil
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