Eutanásia: O que diz a lei no Brasil sobre
morte assistida
O fim da vida é uma
certeza da existência humana, mas a forma como tudo acaba continua sendo uma
dúvida. A eutanásia, legalizada em alguns
países, define o dia e a hora para pessoas que decidem pela morte assistida, em
sua maioria, pacientes terminais ou com problemas severos de saúde.
No Brasil, tanto
a eutanásia quanto o suicídio assistido são considerados ilegais.
“A eutanásia e o
suicídio assistido são considerados crimes no Brasil porque a Constituição
Federal prevê como direito fundamental e, portanto, irrenunciável, o direito à
vida”, diz a professora do curso de Direito da Universidade Católica de Brasília, Mariana Madera.
A especialista explica
que a prática da eutanásia ou do suicídio assistido aparece no Código Penal que
prevê as seguintes penalidades:
- Homicídio privilegiado / para quem pratica a eutanásia: Pune-se como homicídio, mas com diminuição de pena de um
sexto a um terço, se comprovado motivo de relevante valor moral. Pena é
reclusão de seis anos a 20 anos.
- Instigação, induzimento ou auxílio a suicídio: Para quem auxilia no suicídio assistido, a pena de
reclusão é de seis meses a dois anos.
Por ser crime no
Brasil, a jovem Carolina Arruda, de 27 anos, moradora de Minas Gerais está juntando dinheiro para viajar para
a Suíça onde o procedimento é legalizado. A
estudante de medicina veterinária foi diagnosticada com Neuralgia do Trigêmeo e tem dores intensas e constantes no rosto.
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Tipos de morte
assistida
A palavra eutanásia
tem origem no grego, onde "eu", significa boa e "tanathos",
quer dizer morte, ou seja "boa morte", remetendo para o ato
de tirar a vida de alguém por solicitação, de modo a acabar com o seu
sofrimento, uma morte digna.
- Eutanásia: é
diferente de suicídio assistido.
- O suicídio assistido ocorre quando uma
equipe médica fornece medicamentos para o procedimento, mas é o próprio
paciente que administra a dose fatal
- Na eutanásia, a equipe médica administra a
dose no paciente
Assim foi o caso de Jan e Els que buscaram intervenção médica para acabar
com suas vidas após 50 anos felizes de casamento. Ambos
sofriam com questões de saúde e optaram pela duo-eutanásia, que é legal na
Holanda.
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Veja outras situações:
- Ortotanásia: A
morte acontece sem interferência e de forma natural. Neste caso evitam-se
métodos extraordinários de suporte de vida, como medicamentos e aparelhos,
em pacientes com quadro terminal e que já tenham sidos submetidos a
suporte avançado de vida.
Não havendo a
possibilidade de cura do paciente, a ortotanásia pode ocorrer mediante
autorização do próprio paciente ou de sua família, em caso de incapacidade do
doente. Ela é permitida no Brasil e regulamentada pelo Conselho Federal de
Medicina, na resolução nº 1.805/2006.
- Distanásia: Quando
se tem um prolongamento da vida, através de meios artificiais, de um
paciente incurável que está com tratamentos médicos considerados
desproporcionais. Também por ser conhecido como "obstinação
terapêutica".
- Mistanásia: A
morte não desejada, ocorrendo de forma sofrida em decorrência de má gestão
da saúde e omissão dos responsáveis. Quando o paciente morre de maneira
evitável por falta de atendimento de qualidade, de insumos ou de leitos,
comprovando uma violação do direito à saúde que é garantido pela
Constituição Federal.
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Projetos que tramitam no Congresso Nacional sobre
morte assistida
No Congresso Nacional
há projetos em tramitação que tratam da morte assistida. Em sua maioria,
são sobre ortotanásia, mas há também um PL que busca deixar de tipificar a
eutanásia como homicídio no Brasil:
- PL 6.715/2009: propõe
a alteração do Código Penal para excluir a ilicitude da ortotanásia
- PL 3002/2008: propõe
a regulamentação da prática da ortotanásia no território nacional
brasileiro
- PL 6544/2009: propõe
o desligamento autorizado de máquinas que mantêm o paciente vivo
- PL 236/2012: busca
a instituição de um Novo Código Penal, passa a tipificar a eutanásia
como um delito autônomo e não mais como forma privilegiada de homicídio
De acordo com o
professor da Universidade de Brasília (UnB), que criou o curso de pós-graduação em bioética na
universidade, Volnei Garrafa, a discussão sobre a eutanásia no Congresso
Nacional não deve chegar ao plenário da Casa.
"Não se abre [a
discussão] no Congresso por medo, pois são discussões delicadas. [...] Nunca
foi ao Plenário uma discussão sobre eutanásia, trava na Comissão de Justiça. O
Congresso tem obrigação moral de pautar esses temas, mas não pauta. É um conservadorismo
moral, político", diz o professor de bioética.
Para o professor, em
termos de leis sobre a morte assistida o Brasil é um "um deserto
legislativo". Volnei Garrafa arrisca dizer que o tema nunca chegará ao
plenário porque "não consegue ultrapassar as barreiras das
comissões".
A advogada Daniela
Ito, especialista em Direito Médico e da Saúde, aponta que a discussão
"ainda é rasa por conta do conservadorismo moral e da questão ser,
muitas vezes, associada aos costumes religiosos".
"Existe uma
grande influência de credo, costumes sociais envolvidos nesse tipo de assunto.
[...] Está muito ligado às questões religiosas, e se afasta de discussões mais
aprofundadas", diz a advogada.
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Em quais países a
eutanásia é permitida❓
Alguns países
autorizam a realização da eutanásia e tem leis específicas – com certas
condições para sua realização, como existência de doença incurável, sofrimento
exacerbado, altos índices de dores ou impossibilidade de suicídio
assistido – para realizar os procedimentos, como o caso da Holanda, o
primeiro a legalizar o ato no mundo em 2002.
Além da Holanda,
Bélgica, Luxemburgo, Espanha e Portugal,
autorizam a eutanásia na Europa.
Nas Américas, Canadá,
Equador, Colômbia e alguns estados dos Estados Unidos (Oregon, Vermont,
Washington, Califórnia e Montana) também permitem a eutanásia. Cuba
aprovou a prática em dezembro de 2023 e o Peru permitiu a prática uma vez, em 2022.
Na Oceania, a
eutanásia é permitida na Austrália e na Nova Zelândia.
A morte assistida
também é discutida em outras partes do mundo, com o debate em diferentes
estágios. Na Alemanha e na Suíça, por exemplo, é permitido o suicídio
assistido. Na Itália também, embora sob condições restritas, já há uma lei
sobre a eutanásia.
A advogada Daniela Ito
explica que nos países onde os procedimentos de morte assistida são permitidos,
o assunto é tratado como um processo judicial. Ele depende da legislação e do
tempo de processo de cada país, e pode levar alguns meses ou anos, não
existe um prazo definido.
"Os pacientes
precisam fornecer provas da condição médica, passar por avaliações
psiquiátricas e demonstrar um desejo claro e consistente de pôr fim à
vida", explica.
A médica especialista
em medicina legal e perícia médica Caroline Daitx diz que o uso da medicação
injetada para a realização dos procedimentos de morte assistida é o mais comum
onde a prática é permitida por lei.
"Medicação
injetada de forma endovenosa para que a pessoa não tenha nenhum sofrimento.
Medicações que vão fazer um adormecimento muito profundo semelhante a uma
anestesia geral", diz a médica.
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E onde entra a
medicina paliativa❓
A médica Cristiane
Cordeiro, do setor de Referência Técnica Distrital de Cuidados Paliativos da
Secretaria de Saúde do Distrito Federal, explica que cuidados paliativos
não têm nenhuma conexão com a eutanásia e são uma forma de cuidar olhando para
o paciente em sua totalidade, não só para a doença.
"A medicina
paliativa não abrevia a vida. Ela entra junto com o médico do paciente para
prolongar a vida do paciente. Prolonga e prolonga com qualidade [...].
Eutanásia não tem nada a ver com cuidados paliativos", diz a médica.
Segundo a Organização
Mundial da Saúde (OMS), cuidados paliativos consistem
na assistência promovida por uma equipe multidisciplinar, que tem como objetivo
melhorar a qualidade de vida do paciente – que enfrenta uma doença que ameaça a
vida – e de seus familiares. A prevenção e o alívio do sofrimento são
feitos por meio de identificação precoce, avaliação impecável e tratamento de
dor e demais sintomas físicos, sociais, psicológicos e espirituais.
Para a médica
Cristiane Cordeiro, a medicina paliativa é um olhar para todas as
dimensões do sofrimento do paciente. Ela explica que há ferramentas utilizadas
pela equipe de cuidados paliativos para que o paciente tenha autonomia dentro
do seu próprio tratamento.
<><> Algumas
ferramentas utilizadas são:
- Diretivas antecipadas de vontade: É um documento médico que fica no prontuário do
paciente e que tem as percepções e preferências dele em relação ao seu
próprio cuidado médico. É um direcionamento que o paciente vai dar com
relação ao tratamento dele.
- Planejamento avançado do cuidado do paciente: A equipe conversa com a família quando o paciente não
responde mais por ele mesmo. Com ajuda de parentes, a equipe consegue
elaborar um cuidado para o paciente levando em conta o que é importante
para ele, a biografia dele.
"O prolongamento
que a gente faz não é de maneira artificial. Não abrevia a vida, e não promove
a distanásia – manter o coração batendo sem perspectiva de melhora do paciente
e manter a vida de forma artificial, dentro da UTI, entubado. Não abreviamos a
vida e não prolongamos o processo de morrer", diz a médica Cristiane
Cordeiro.
De acordo com
Cristiane Cordeiro, no Distrito Federal, oito hospitais da rede pública
contam com equipes de cuidados paliativos: Hospital de Base, Hospital Regional
da Asa Norte (HRAN), Hospital Regional de Samambaia, Hospital da Criança de
Brasília, Hospital Regional de Ceilândia, Hospital Regional de Taguatinga,
Hospital Região Leste, Hospital de Apoio de Brasília.
Fonte: g1
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