Dólar em
alta: Brasil e outras economias emergentes poderiam depender menos da moeda
americana?
Apesar
da queda da influência dos Estados Unidos, parte da economia mundial, sobretudo
no Ocidente, ainda se guia, em grande medida, pela cotação do dólar. No Brasil
não é diferente. Por que o país ainda é tão dependente das variações da moeda
norte-americana e que problemas isso traz para a sua economia?
Nos
últimos dias, a alta do dólar, atribuída a atitudes do governo do presidente
Luiz Inácio Lula da Silva, chamou a atenção sobre a importância da moeda
estrangeira para a economia brasileira, sobretudo em um momento em que o país
conta com outros indicadores positivos no setor.
Um
levantamento da Austin Rating, considerando o Ptax (média diária do dólar,
calculada pelo Banco Central), comparando 118 moedas do mundo mostra que não é
só o real que está perdendo valor em relação ao dólar. Outras 84 moedas/nações
também estão se desvalorizando ante a moeda americana, por diferentes fatores —
como inflação nos EUA e em vários países e juros altos.
No
Brasil, no entanto, o aumento foi visto por muitos como um grande problema
resultante principalmente de medidas e de declarações de Lula, cujas críticas
ao presidente pró-mercado do Banco Central, Roberto Campos Neto, e defesas de
mais investimentos sociais têm sido tratadas como indícios de
irresponsabilidade fiscal.
Reduzir
a dependência do dólar é uma preocupação que já foi manifestada por diferentes
membros do atual governo brasileiro. E, atualmente, é uma das principais pautas
debatidas pelo grupo BRICS, do qual o Brasil é um dos principais membros.
Embora complicado e longo, esse processo é considerado cada vez mais plausível
por diferentes atores do cenário internacional.
·
Alta do dólar e impactos no Brasil
Elton
Gomes, doutor em ciência política e professor da Universidade Federal do Piauí
(UFPI), abordou a questão da hegemonia do dólar e seu impacto na economia
mundial e, especificamente, na brasileira. De acordo com ele, a posição
dominante de uma moeda na economia global não é permanente, mas fruto de um
processo histórico.
"Tem
vários exemplos históricos, mas o que eu sempre digo é isso: hoje, o Brasil é
um país que tem a sua economia grandemente carreada para a venda para o
exterior, ou seja, para exportação. Nós temos uma diplomacia de comércio, o que
faz com que o Brasil não possa ter nem aliados incondicionais e nem inimigos
declarados, ou seja, o Brasil precisa manter sempre uma grande capacidade de
exportação para manter as suas capacidades econômicas", exemplifica.
Nessa
dinâmica, na qual a manutenção de uma forte capacidade de exportação é vital
para a saúde econômica da nação brasileira, o dólar desempenha um papel
crucial, sendo o principal referencial para a precificação internacional dos
bens exportados e importados pelo Brasil.
A
elevação do valor do dólar, e consequentemente a desvalorização do real, tem um
efeito cascata sobre todos os bens e serviços consumidos no país, alerta o
analista. Isso inclui desde serviços básicos, como transporte, até operações
complexas envolvendo multinacionais e grandes players econômicos.
À
reportagem, o economista e mestre em desenvolvimento regional e urbano, Bruno
Mota vai ao encontro do que diz Gomes.
"A
alta do dólar afeta a vida dos brasileiros mais pobres, principalmente por meio
do aumento dos preços dos produtos importados e daqueles que têm componentes
importados. Além disso, produtos essenciais, como alimentos e medicamentos,
podem se tornar mais caros, pois muitos são importados ou dependem de insumos
estrangeiros. Isso reduz o poder de compra das famílias, aumentando o custo de
vida e dificultando o acesso a bens e serviços básicos", detalha Mota à
agência.
O
economista continua: "É plausível que o cenário internacional tenha um
impacto significativo na desvalorização do real. Fatores como a política
monetária dos EUA, tensões geopolíticas, e flutuações no preço das commodities
podem afetar a moeda brasileira".
Ele
pontua, ainda, que o Banco Central, que é independente do governo, pode e deve
intervir, vendendo reservas de dólares para aumentar a oferta e tentar reduzir
o valor da moeda americana, diminuindo o impacto sobre nossa economia e sobre a
população mais pobre.
Para
o economista especializado em planejamento e gestão pública pela Faculdade de
Ciências Aplicadas da Universidade de Pernambuco (UPE) Brenno Almeida, a alta
real do dólar é muito mais resultado de um movimento especulativo de mercado,
"que interfere naturalmente na oferta dessa moeda no mercado, e do próprio
comportamento do Banco Central, que, de certa forma, apresenta uma relativa
permissividade a esse comportamento especulativo".
"O
controle de gastos está sendo feito, o governo não está se locupletando,
gastando dinheiro para ampliar apoio político, muito pelo contrário, as coisas
estão sendo feitas por conta de necessidades de reconstrução do país. É
importante a gente considerar que a gente está num contexto em que grande parte
da máquina administrativa está sendo redimensionada para as demandas reais do
país, investimentos públicos estão sendo feitos de maneira a reconfigurar o
perfil da nossa economia. A ampliação do crédito para o setor rural, por
exemplo, é um fator significativo e com relação a isso o mercado fica
calado", arremata Almeida.
·
Saúde fiscal
Gomes
destaca que tanto a balança de pagamentos do Brasil como sua saúde fiscal são
fatores interligados ao valor do dólar. Para ele, o Brasil já seguiu políticas
macroeconômicas bem-sucedidas, iniciadas no governo de Fernando Henrique
Cardoso, e mantidas nos governos subsequentes.
No
entanto, segundo ele, essas políticas começaram a ser subvertidas no governo
Dilma Rousseff, resultando em uma grave recessão. Apesar de tentativas de
correção nos governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro, em sua avaliação, o
professor observa uma mudança de direção com o atual governo de Lula, que tende
a aumentar o gasto público sem cortes significativos, influenciado pela
necessidade de atender múltiplos interesses dentro do presidencialismo de
coalizão brasileiro.
"As
metas de superávit, as metas de inflação, metas de juros para poder impedir a
inflação e superconsumo, elas foram mantidas no Brasil durante o período de
Fernando Henrique, foram mantidas e até tornadas mais ortodoxas nos governos
iniciais de Lula", arguiu. "Mas elas [as metas] começaram a ser
subvertidas no governo Dilma, gerou a maior recessão no período recente. Depois
você teve a correção de rumos, a retomada disso lá no governo Temer. No governo
Bolsonaro, se manteve um parâmetro semelhante, mas, aí, veio a pandemia, ainda
assim se adotaram os elementos do receituário macroeconômico, que, sim, tem
sido bem sucedido no Brasil. Mas, ao retornar ao poder, o presidente Lula abriu
mão de manter, ou parece querer abrir mão de manter os instrumentos de política
monetária que foram utilizados pelo Brasil com sucesso nos últimos 20
anos", argumentou.
O
analista também mencionou as recentes políticas do ministro da Fazenda,
Fernando Haddad, que incluem aumentos de tributos, refletindo uma tentativa de
angariar recursos para políticas assistenciais e de intervenção estatal na
economia.
"As
medidas que foram defendidas pelo ministro da Fazenda atual, o ministro
Fernando Haddad, que resultaram em majoração de tributos, então, o dólar
elevado tem efeito sistêmico, sobretudo na economia, aumenta o preço de
passagem, aumenta o preço da alimentação, aumenta o preço da informação e da
tecnologia, produtos indispensáveis no mundo moderno. Então isso tem que ser
levado em consideração", afirmou.
Desdolarização
no horizonte do Sul Global
Elton
Gomes sublinha a competição entre o dólar, como moeda dominante, e outros
desafiantes emergentes, como o yuan chinês e o rublo russo, moedas de países
que têm liderado os esforços para reverter o papel desempenhado pela moeda
americana no sistema internacional.
Ele
enfatiza que a hegemonia do dólar não se sustenta apenas pela força econômica
dos Estados Unidos, mas também pela aceitação global da moeda. O grande desafio
a essa hegemonia, em sua avaliação, é, justamente, fazer com que outras moedas
tenham o mesmo grau de aceitação. Algo que não acontece de um dia para o outro.
O
economista Brenno Almeida ressalta que economias periféricas, em sua maioria,
as economias do Sul Global, onde grande parte dos países do BRICS está,
"são economias que têm o dólar como seu termo de troca importante, mas são
economias hoje que concentram parcela significativa dos consumidores e da
produção mundial. Então, a gente vê um horizonte aí [para] que novas mediações
possam ser feitas".
"No
âmbito do Mercosul, isso também pode ser feito. Importante a gente lembrar que,
na medida em que economias menos desenvolvidas operam com dólar como termo de
troca principal, essa economia, ela tem bastante dificuldade de se desenvolver,
porque para ela o dólar é mais caro. [...] Então a oferta de dólares é muito
baixa nessas economias, e isso termina resultando em problemas."
De
acordo com Almeida, diante dos problemas ligados à dependência do dólar
"novas configurações estão sendo feitas" de maneira a garantir
"a outras economias menos desenvolvidas uma possibilidade de participar
das trocas econômicas em âmbito global" de maneira mais efetiva.
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Brasil repassa quase
R$ 900 milhões a organismos internacionais como a ONU no 1º semestre
O
Brasil realizou o pagamento das dívidas com organismos internacionais de quase
R$ 900 milhões no primeiro semestre deste ano, informaram nesta quarta-feira
(3) os ministérios do Planejamento e Orçamento e das Relações Exteriores.
Conforme
o comunicado, a maior parte do valor (R$ 325 milhões) é referente à quitação
integral da contribuição com a Organização das Nações Unidas (ONU) — os países
que realizam o pagamento nos seis primeiros meses do ano passam a integrar o
quadro de honra da entidade e, por conta disso, o Brasil recebeu um
agradecimento público.
"Ao
honrar suas contribuições junto a organismos internacionais, o Brasil fortalece
sua atuação no cenário global, reafirma o compromisso com o multilateralismo e
reforça a integração regional", acrescenta o texto divulgado pela Agência
Brasil.
No
ano passado, o governo brasileiro desembolsou mais de R$ 4,6 bilhões para o
pagamento de dívidas de anos anteriores com as entidades internacionais.
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Além da ONU, o valor se refere ao pagamento das contribuições para:
Comunidade
dos Países de Língua Portuguesa (CPLP)
Organização
Mundial da Saúde (OMS)
Organização
Internacional do Trabalho (OIT)
Organização
Mundial do Comércio (OMC)
Organização
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco)
Organização
Mundial de Propriedade Intelectual (OMPI);
Agência
Internacional de Energia Atômica (AIEA)
Faculdade
Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), entre outros organismos
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Luis Arce destaca o
papel importante que o Brasil tem nas relações com a Bolívia
A
recente tentativa de golpe de Estado na Bolívia no dia 26 de junho despertou
não apenas a atenção do mundo para a região, mas colocou o governo de Arce sob
alerta quanto ao interesse internacional sobre os recursos do país, o que
fortaleceu o compromisso do presidente com seus parceiros.
No
início da tarde do dia 26 de junho, tropas comandadas pelo general Juan José
Zúñiga ocuparam a Praça Murillo, onde ficam os prédios do governo boliviano, e
chegaram a invadir o palácio presidencial. A tentativa de golpe foi denunciada
pelo presidente Luis Arce, que pediu apoio da comunidade internacional e que a
população fosse às ruas para proteger a democracia.
Apesar
da recente tensão política, a agenda do governo Arce não ficou paralisada. Na
última terça-feira (2), a Comissão de Política Internacional do Senado da
Bolívia aprovou por unanimidade um projeto de lei que ratifica a adesão do país
ao Mercosul, que agora segue para o plenário da câmara alta.
Em
entrevista à Sputnik, o presidente boliviano comentou os últimos eventos em seu
país e explicou quais são os interesses em pauta com o Brasil, falando ainda
sobre alguns dos temas que pretende tratar com o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva em sua próxima reunião na próxima semana.
"Vemos
isso [tentativa de golpe], primeiro, com muita cautela porque não é por acaso,
os interesses não desapareceram sobre os nossos recursos naturais, então temos
que estar alertas, essa é a lição", ressaltou Arce ao comentar o episódio
sui generis enfrentado pelo país. Ele destacou ainda que "temos que
trabalhar muito, há muitas coisas que temos que continuar fazendo e vamos
continuar fazendo pelo maior tempo possível enquanto estivermos na Casa Grande
do Povo".
O
presidente destacou o importante papel que seus aliados na América Latina
tiveram, entre eles o Brasil, para que a democracia boliviana encontrasse apoio
internacional caso a situação política se deteriorasse e acredita que
"deveríamos nos unir ainda mais" para evitar episódios desta
natureza.
"Com
o presidente Lula temos uma agenda bastante extensa. Há muitas coisas que
precisamos conversar. [Dentre os principais temas] estão os fertilizantes que
temos que falar conjuntamente com o Brasil para fazer novas plantas. Falar de
comércio entre Bolívia e Brasil, de investimentos, de cooperação na fronteira.
A fronteira mais longa da Bolívia é com o Brasil, a mais extensa",
destacou o líder boliviano.
A
Bolívia, que já possui estreitas relações com o Brasil na exploração de
hidrocarbonetos, vem pleiteando uma vaga no BRICS graças ao novo impulso de
investimentos que o país tem experimentado também na exploração de suas
reservas de lítio. Para além disso, Arce reforçou que o interesse nas relações
com o Brasil, vão além das relações comerciais.
"Então
temos que falar não só de comércio, investimentos etc., mas também de proteger
adequadamente, de lutar contra o narcotráfico, de lutar contra as forças
criminosas que operam em nossas fronteiras. Enfim, tudo isso é um conjunto de
temas que vamos abordar nesta reunião."
O
presidente Lula viaja a Santa Cruz de La Sierra, na semana que vem, para uma
visita bilateral com o presidente Arce. Lula já disse que pretende prestar
apoio ao homólogo boliviano durante a viagem, após a denúncia da tentativa de
golpe de Estado no país, uma vez que o governo brasileiro não mudou sua posição
de condenar "qualquer tentativa de golpe", segundo o Itamaraty.
Fonte:
Sputnik Brasil
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