Da fraude de Hillary Clinton a servidor na
Ucrânia: relembre o histórico obscuro da CrowdStrike
Uma atualização
desleixada de software feita pela gigante norte-americana de segurança
cibernética CrowdStrike deixou fora do ar PCs e servidores usados por companhias aéreas, ferrovias, bancos e até mesmo hospitais em todo o mundo. Para quem acompanha a política dos EUA ao longo da última década, o nome da empresa é estranhamente familiar.
CrowdStrike está nas
manchetes globais (e causando dores de cabeça globais) esta semana, depois que
uma atualização lançada na manhã de sexta-feira afetou milhares de máquinas
corporativas executando produtos Microsoft com o infame erro de tela azul da morte.
Embora a empresa já
tenha lançado uma solução, espera-se que a atualização com erros cause bilhões
de dólares e horas em perda de produtividade, e os especialistas dizem que pode
levar "semanas" para que empresas e governos em todo o mundo se recuperem
totalmente.
Mas por trás da
reputação da empresa como um importante fornecedor de produtos de segurança de
endpoint está o estranho costume de seu nome surgindo na política dos EUA.
Durante as eleições
presidenciais dos EUA em 2016, a campanha de Clinton pediu ajuda a ninguém
menos que a CrowdStrike para investigar o ataque hacker contra o Comitê
Nacional Democrata – que revelou informações embaraçosas sobre os esforços do
partido para fraudar o processo de nomeação a favor da candidata.
A investigação da
CrowdStrike deu origem às primeiras alegações de que a Rússia estava por trás
do hack do DNC, e a empresa forneceu suas "evidências e análises
forenses" ao FBI, dando início à teoria da conspiração Russiagate de que
Donald Trump estava conspirando com a Rússia para "roubar" a eleição.
O executivo da
CrowdStrike, Shawn Henry, admitiu sob juramento em depoimento no Congresso dos
EUA em 2017 que a empresa não tinha "evidências concretas" para
apoiar sua história de "hackers russos", mas a essa altura já era
tarde demais e Trump passou praticamente todo mandato perseguido pelas
alegações de "conluio".
O nome da CrowdStrike
também apareceu no infame telefonema de 2019 entre Trump e Vladimir Zelensky,
com o então presidente dos EUA pedindo a Zelensky que "nos fizesse um
favor" e "descobrisse o que aconteceu" com o servidor da CrowdStrike,
que Trump disse estar na Ucrânia.
A equipe de Trump
estava convencida de que a CrowdStrike plantou provas no servidor do DNC para
incriminar a Rússia, ao mesmo tempo que encobria os esforços da própria Ucrânia
para "enfraquecer o movimento de Trump" durante a corrida eleitoral de
2016. Os políticos democratas e os meios de comunicação anti-Trump consideraram
as suspeitas do presidente infundadas.
O telefonema
Trump-Zelensky, no qual ele também pediu a Kiev que investigasse o papel do
então ex-vice-presidente Joe Biden na demissão de um promotor ucraniano que
investigava as supostas atividades corruptas de seu filho Hunter Biden enquanto
trabalhava para a empresa de energia ucraniana Burisma, acabou desencadeando o
primeiro pedido de impeachment de Trump em 2019.
A CrowdStrike também
foi uma das poucas empresas contratadas pela Agência de Segurança Cibernética e
de Infraestrutura dos EUA (CISA) em 2021 para elaborar um plano de defesa
cibernética para "toda a nação". A iniciativa foi criticada como uma tentativa
de fortalecer a inteligência dos EUA e os poderes de vigilância das Big Tech
usando a segurança cibernética como cobertura.
No mesmo ano, o CEO da
CrowdStrike, George Kurtz, culpou os hackers russos pelo ataque hacker da
SolarWinds em 2020 ao governo federal dos EUA, mas curiosamente admitiu que a
empresa não tinha informações próprias "para corroborar essa descoberta".
·
'Pesadelo de relações públicas'
"O aspecto de
relações públicas é, obviamente, um pesadelo para a CrowdStrike", disse o
veterano especialista independente em segurança cibernética Lars Hilse à
Sputnik, comentando a interrupção de sexta-feira e o impacto que teve na imagem
da empresa e no preço das ações.
A capitalização de
mercado da CrowdStrike despencou US$ 12,5 bilhões (R$ 70 bilhões), e seu CEO,
George Kurtz, viu mais de US$ 320 milhões (R$ 1,8 bilhão) reduzidos de sua
fortuna pessoal. O preço das ações da empresa caiu de cerca de US$ 343 (R$
1.920) para US$ 302 (R$ 1.691) por ação, sinalizando que cerca de 12% do valor
de mercado da empresa foi eliminado.
Curiosamente, nem
todos na empresa saíram da interrupção no vermelho, com o diretor de segurança
Shawn Henry vendendo 4.000 ações ordinárias da CrowdStrike Holdings em 15 de
julho por US$ 371,32 (R$ 2.079,43) por ação, ou US$ 1,49 milhão (R$ 8,34
milhões) no total, de acordo com a Comissão de Valores Monetários dos EUA
(Security and Exchange Comission).
Hilse diz que a
principal “lição” da bagunça do CrowdStrike será a exigência de que as empresas
de segurança cibernética melhorem os testes antes de lançar atualizações
críticas – algo especialmente importante se forem feitas como "uma única
atualização sendo enviada para uma infinidade de clientes que executam
atualizações baseadas em nuvem, incluindo aqueles responsáveis pela operação de
infraestruturas críticas como aeroportos,
bancos, etc."
"Com a crescente
dependência da tecnologia, surge um impacto exponencialmente crescente na
sociedade se essas tecnologias falharem, seja através de um ataque
deliberado/direcionado ou de um software defeituoso, como neste caso",
enfatizou Hilse.
O especialista russo
em segurança cibernética Aleksei Lukatskiy disse a Sputnik que a Rússia
conseguiu se esquivar da bala CrowdStrike graças a fortes empresas nacionais de
segurança cibernética. As interrupções de sexta-feira servem, portanto, como
outra "lição" importante para a Rússia, que tem "passado
gradualmente de produtos de fornecedores estrangeiros para produtos
russos", de que está no caminho certo, disse.
Outra conclusão
importante, segundo Lukatskiy, é o nível cada vez mais crítico de dependência
do mundo moderno em relação aos computadores. "A TI penetrou numa ampla
gama de áreas diferentes, e os proprietários de empresas que trabalham em
indústrias críticas devem compreender todas as consequências e avaliar os
eventos inaceitáveis que podem ocorrer devido à aparente falha de um computador comum".
¨ Microsoft e Amazon: apagão revela risco de concentração de dados
em clouds privadas, alerta Amadeu
O apagão cibernético,
que gerou caos no mundo com a "tela azul da morte" no sistema
Windows, revela os riscos da dependência global da tecnologia, concentrada nas
mãos de poucas empresas privadas.
O alerta - ou "os
alertas" - foram feitos pelo sociólogo Sergio Amadeu, professor da
Universidade Federal do ABC (UFABC) e um dos maiores especialistas em redes
digitais do país.
"Antes é preciso
esclarecer que a falha no acesso a uma série de serviços online ocorreu devido
a uma atualização incorreta e, ainda não detalhada, da solução de segurança
chamada CrowdStrike Falcon Sensor, utilizada em computadores com windows que trabalhavam
na nuvem da Microsoft Azure", explica.
Amadeu, no entanto,
faz dois alertas importantes. "O primeiro alerta é que a computação em
nuvem pode ser imediatamente mais barata, mas pode gerar problemas graves como
a perda de acesso a dados e a sistemas indispensáveis ao funcionamento de empresas
e instituições no país", afirma em publicação no Instagram.
O segundo alerta diz
respeito justamente à concentração de dados tanto de empresas, quanto de
instituições nas mãos de poucas big techs, como são chamadas as gigantes de
tecnologia.
"Segundo alerta é
o tamanho da concentração de dados e de operações digitas nas mãos de tão
poucas empresas. Não é por menos que são empresas trilionárias. A Amazon Web
Server e a Microsoft Azure dominam mais de 60% do modelo de negócios da nuvem
como infraestrutura como serviço hoje", afirma.
Segundo dados do
Synergy Research Group, que realiza pesquisas de mercado nos setores de redes e
comunicações, das 10 maiores empresas de "clouds" - o armazenamento
de dados em nuvem -, 8 delas estão sediadas nos Estados Unidos.
Somente a Alibaba
Cloud, responsável por 4% do mercado, com sede na China, e a OVHCloud, que tem
menos de 1% do serviço no mundo, localizada na França, estão fora do território
estadunidense.
Segundo a Synergi, a
Amazon Web Services (AWS) tem 32% do mercado, a Microsoft Azzure - onde ocorreu
o apagão desta sexta-feira (19) - responde por outros 22%, e a Google Cloud
Platform (GCP) abocanha 11% do setor. No total, as 3 big techs concentram 65%
dos dados em nuvem armazenados no planeta.
Para se ter a noção do
tamanho do mercado, de acordo com a Synergi, no primeiro trimestre de 2024 os
gastos globais com serviços de infraestrutura em nuvem cresceram US$ 13,5
bilhões ou 21% em comparação com o primeiro trimestre de 2023, elevando os gastos
totais para mais de US$ 76 bilhões nos três meses encerrados em 31 de março.
"Em termos de
taxa de execução anualizada, temos agora um mercado de US$ 300 bilhões que
cresce 21% ao ano", disse John Dinsdale, analista-chefe do Synergy
Research Group em entrevista ao blog da empresa.
"Veremos o
mercado continuar a expandir-se substancialmente. Prevemos que duplicará de
tamanho nos próximos quatro anos", emendou sobre os dados, divulgados em
maio deste ano.
¨ Apagão global: um filme e uma série que previram o caos digital
Nesta sexta-feira
(19), o mundo sofreu um apagão cibernético devido a uma falha no sistema de
segurança da empresa CrowdStrike, que faz a segurança de vários sistemas
importantes no mundo, entre eles, a Microsoft.
Com o apagão, o
sistema operacional do Windows ficou fora do ar em várias regiões do mundo, o
que levou caos para aeroportos, hospitais e sistemas bancários em todo o
planeta, era como se estivéssemos diante da materialização das distopias que,
até aqui, se limitavam a filmes, livros e séries.
Porém, foi justamente
um filme e uma série que previram uma pane no sistema como o mundo vivenciou
nesta sexta-feira, são eles: "Mr. Robot" (Amazon) e "Um Mundo
Depois de Nós" (Netflix).
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"Mr. Robot"
Criada por Sam Esmail,
"Mr. Robot" (Prime Video Amazon)
acompanha a vida do hacker Elliot Alderson (Rami Malek), que trabalha na
empresa Allsafe Cybersecurity (que desenvolve a mesma função da CrowdStrike) e,
fora da empresa, integra o grupo revolucionário Fsociety, que organiza um
ataque em massa para derrubar o sistema operacional da Evil Cor, o maior
conglomerado do sistema financeiro.
Dessa maneira, Elliot
e seu grupo executam o plano. Imagine o caos digital de hoje elevado a uma
escala 10 vezes maior, pois é, o mundo vai abaixo, governos caem, bancos
quebram e o dia seguinte será repleto de surpresas... como reagem os detentores
da riqueza do mundo diante de um ataque hacker em escala global?
"Mr. Robot"
é considerada uma série visionária e o que aconteceu nesta sexta-feira (19)
mostra que, de fato, ela foi, pois desenhou como se darão as guerras digitais
ao longo do século XXI.
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"O Mundo Depois de Nós"
Ironicamente, o filme "O Mundo Depois de Nós" (Netflix) é dirigido por Sam
Esmail, a mente brilhante por trás de "Mr. Robot".
A trama inicia com uma
família em início de férias que se dirige para uma casa alugada. Hospedados,
todos começam a curtir o tão esperado descanso, mas, na primeira noite longe
dos afazeres cotidianos, a paz é interrompida com a chegada de um pai e sua filha,
que alegam serem os donos da casa. Isolados, os hóspedes não entendem por que
eles foram para lá, e aqui começa o fim: todo tipo de comunicação caiu,
inclusive as realizadas por satélite.
Sem comunicação e
acesso à informação, só resta a paranoia e pessoas estranhas que terão de
construir algum laço de confiança para lidar com a situação. Mas, o que está
acontecendo? É a partir deste vácuo que toda sorte de delírio começa a tomar
conta de todos os presentes na casa de veraneio.
¨ Apagão cibernético evidencia urgência de regulação da
Inteligência Artificial, diz Pacheco
Ao comentar a pane cibernética
mundial que ocorreu nesta sexta-feira (19), o presidente do Senado, Rodrigo
Pacheco (PSD-MG), "Causa-nos apreensão os efeitos do apagão cibernético
que atingiu operações de transporte, saúde e bancárias em regiões do planeta e
no Brasil. Que os responsáveis atuem de maneira célere e transparente para o
restabelecimento dos serviços e, principalmente, da segurança adequada aos
usuários. A conectividade contribui para a amplitude de serviços essenciais do
cotidiano. Mas quando há uma falha, a reação em cadeia é prejudicial a milhares
de pessoas", afirmou Pacheco, em declaração oficial.
As maiores empresas
aéreas americanas relataram um grande mau funcionamento e suspenderam voos. Em
seguida, os relatórios de possíveis atrasos de voos começaram a vir da Europa.
Brasil enfrentou problemas em companhia aéreas, bancos e instituições como aplicativos
bancários e sistemas de hospital, em menor escala que nos EUA e na Europa.
O motivo foi uma falha
na atualização de conteúdo relacionada ao sensor de segurança da empresa
CrowdStrike Falcon, usado para detectar invasões de hackers, e é utilizado por
empresas como a Microsoft, proprietária do Windows.
A empresa responsável
pela falha nos sistemas Windows, utiliza inteligência artificial no
aperfeiçoamento dos seus serviços de segurança cibernética.
Autor do projeto que
regulamenta a inteligência artificial no Brasil (PL 2.338/2023), Pacheco pediu
que o país aprove uma legislação para o setor. O projeto está na Comissão
Temporária sobre Inteligência Artificial (CTIA) no Senado e a votação foi
adiada pela terceira vez na última semana por divergências:
"Esse ambiente
nos alerta para os riscos da segurança cibernética, e nos lembra ser essencial
a regulamentação da inteligência artificial, projeto de minha autoria, para que
tenhamos um cenário mais claro, seguro e adequado em relação ao uso de ferramentas
virtuais e seus efeitos práticos sobre a sociedade", acrescentou.
O texto define
"sistema de inteligência artificial" como um sistema baseado em
máquina que infere, a partir de dados, resultados que influenciam o ambiente
virtual ou real.
O documento apresenta
um sistema de classificação de riscos, similar ao europeu AI Act e ao AI
Executive Order, dos Estados Unidos, mas com abordagem híbrida que considera as
especificidades brasileiras.
O projeto garante
direitos às pessoas e aos grupos afetados pela IA, como direito à informação
prévia, à privacidade, à participação humana em decisões de inteligência
artificial e à não discriminação.
Dentre as proibições,
destacam-se o uso de IA para manipulação prejudicial à saúde, sistemas de armas
autônomas sem controle humano e análise de personalidade para avaliação de
riscos criminais. Além disso, é proibida a criação de materiais que representem
exploração sexual infantil.
O texto propõe ainda
criação de um Sistema Nacional de Regulação e Governança de IA (SIA), com a
Autoridade Nacional de Proteção de Dados Pessoais (ANPD) como a principal
entidade reguladora. A ANPD seria responsável por criar critérios de avaliação
de riscos e supervisionar os sistemas de IA.
Fonte: Sputnik Brasil/Fórum
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