Como
Giorgia Meloni está se tornando 'locomotiva' da direita radical na Europa
Quando Giorgia Meloni chegou
ao poder como primeira-ministra da Itália em 2022, muitos questionavam sua
capacidade de liderar. Mas quase dois anos depois, a política da direita
radical comanda um dos governos mais estáveis na Europa atual, segundo
especialistas.
Ela
ainda é alvo de muitas críticas por impulsionar políticas domésticas
controversas e fazer declarações apontadas como racistas e homofóbicas. Mas
parece estar se estabelecendo como uma importante voz na União Europeia.
Seu
partido, o Irmãos da Itália, obteve o maior número de votos na eleição italiana para o Parlamento Europeu no início de junho.
E
não muito tempo depois Meloni ganhou destaque como a anfitriã da reunião de
cúpula do G7 no início de junho, quando conseguiu retirar uma menção ao direito ao aborto seguro do
documento final.
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Quem é Giorgia Meloni?
Primeira
mulher premiê da história do país, ela fundou o partido Irmãos da Itália
(Fratelli d'Italia ou FdI, na sigla em italiano) em 2012.
A
legenda tem suas raízes políticas no Movimento Social Italiano (MSI), que
surgiu das cinzas do fascismo do ditador Benito Mussolini.
O
partido mantém o logotipo das legendas de inspiração fascista do pós-guerra: a
chama tricolor, muitas vezes interpretada como o fogo queimando no túmulo de
Mussolini.
Meloni
também certa vez enalteceu Mussolini como "um bom político",
acrescentando que "tudo o que ele fez, ele fez pela Itália".
Mas
o rótulo fascista é algo que ela rejeita com veemência em declarações públicas.
Em
agosto de 2022, pouco antes de ganhar as eleições, ela gravou uma mensagem em
inglês, francês e espanhol dizendo que não era uma ameaça à democracia. E
argumentou que a ideologia fascista seria coisa do passado.
"A
direita italiana entregou o fascismo à história há décadas, condenando
inequivocamente a supressão da democracia e as ignominiosas leis
antijudaicas", disse.
Mas
alguns temem que Meloni e o seu partido não tenham se afastado o suficiente das
suas origens políticas.
Na
adolescência, ela fez parte da ala juvenil do neofascista MSI, tornando-se
depois presidente do ramo estudantil do sucessor do movimento, a Aliança
Nacional.
Em
seu livro de 2021, Io Sono Giorgia (Eu Sou Giorgia), ela ressalta
que não é fascista, mas se identifica com os herdeiros de Mussolini:
"Peguei o bastão de uma história de 70 anos".
Durante
a campanha eleitoral que levou à sua eleição em 2022, ela recuperou um dos
lemas de Mussolini: "Deus, pátria e família".
Mais
recentemente, foi criticada por não condenar publicamente um ato envolvendo
centenas de homens vistos fazendo saudações fascistas durante um comício em
Roma em janeiro deste ano.
Antes
de ser eleita, Meloni fez campanha contra os direitos da comunidade LGBTQ+,
estimulou um bloqueio naval da Líbia para impedir que barcos de imigrantes
chegassem à Europa e alertou repetidamente contra os migrantes muçulmanos.
Crítica
ferrenha da União Europeia, ela entrou na corrida prometendo promover mudanças
estruturais de dentro da instituição.
·
No centro das atenções
Depois
da vitória de 2022, o resultado das eleições para o Parlamento Europeu foi o segundo
grande sucesso do seu partido nas urnas.
O
Irmãos da Itália foi o grande vencedor entre os italianos, com quase 29% dos
votos.
Isso
fez de Meloni uma das poucas líderes europeias cujo partido terminou em
primeiro lugar na eleição. Já líderes de centro e de esquerda, como o
presidente francês, Emmanuel Macron, e o chanceler alemão, Olaf Scholz, viram
seus partidos perderem espaço na eleição europeia para siglas de ultra direita.
No
Parlamento Europeu os deputados das diferentes nações se organizam de forma
supranacional, alinhados em bancadas conforme ideologias e objetivos políticos.
E o grupo do qual Meloni faz parte, o Reformistas e Conservadores Europeus
(ECR), é agora a terceira maior força.
Com
isso, ela pode ganhar mais voz nas negociações internas do bloco e se
fortalecer como líder da direita radical na Europa, afirma o pesquisador
italiano Alessio Scopelliti, da Universidade de Bristol.
Para
ele, essa posição dá destaque para a Itália em um contexto em que o processo de
integração europeia é historicamente dominado por França e Alemanha.
"Nesse sentido, Giorgia Meloni e o Irmãos de Itália estão desempenhando um
papel fundamental na formação - não apenas do cenário político de
extrema-direita -, mas também do cenário político de direita em geral",
diz.
Pouco
depois das eleições europeias, Meloni ganhou as manchetes novamente como
anfitriã do encontro anual dos líderes do G7 (grupo composto por Alemanha,
Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido).
Ela
teria sido a responsável por impedir que uma referência ao "aborto seguro e legal" fosse incluída
na declaração final da cúpula.
A
frase estava no comunicado da reunião do grupo no ano passado, mas o documento
aprovado desta vez mencionava apenas "direitos sexuais e
reprodutivos".
A
mudança desagradou outros líderes do G7, em especial o presidente francês
Emmanuel Macron, que lamentou a decisão.
·
Política internacional
Especialistas
veem a atenção recebida pela premiê italiana nas últimas semanas como um sinal
do seu ganho de posição internacional.
Segundo
analistas consultados pela BBC News Brasil, a vantagem alcançada está bastante
ligada à capacidade que Meloni tem de dialogar com diferentes alas da política
europeia e mundial.
Ela
mantém relações próximas com outros líderes da direita radical mundial, como
Marine Le Pen, da França, e Viktor Orbán, da Hungria.
Apesar
disso, a primeira-ministra italiana não faz parte do mesmo bloco partidário de
Le Pen no Parlamento Europeu. A política francesa chegou a apelar para que o
Irmãos da Itália se juntasse à sua coalizão para concorrer à eleição, mas isso
acabou não acontecendo.
As
duas defendem muitos temas comuns, mas se distanciam principalmente em sua
posição sobre a guerra na Ucrânia.
Enquanto
Meloni e seus aliados condenam veementemente a invasão da Ucrânia, o grupo de
Le Pen evita tocar no assunto e já foi descrito pela direita tradicional
europeia como “fantoche” do presidente russo Vladimir Putin.
Mas
Meloni foi uma das únicas líderes europeias a defender Orbán depois da
aprovação de uma resolução pelo Parlamento Europeu que rejeitava a existência
de democracia na Hungria.
Ao
mesmo tempo, a italiana também está conseguindo dialogar com lideranças mais
moderadas da direita tradicional. Prova disso é sua relação com a atual
presidente da Comissão Europeia, a alemã de centro-direita Ursula von der
Leyen.
As
duas formaram o que a imprensa mundial classificou como “uma aliança
improvável” em torno de diversos temas internos da União Europeia.
A
italiana apoiou, por exemplo, a reforma do pacto europeu de imigração, que
estabelece um sistema de realocação, entre os países, de imigrantes em situação
irregular que solicitam asilo.
Antes,
esse pedido tinha de ser feito no país de entrada, o que sobrecarregava a
Itália, principal ponto de desembarque no Mediterrâneo. Agora, pode ser
dividido com outros membros.
É o
chamado sistema de "solidariedade obrigatória", que oferece aos
Estados-membros a opção de recolocar um certo número de requerentes de asilo,
pagar 20 mil euros referentes às despesas de cada requerente que se recusem a
recolocar no seu país, ou financiar suporte operacional.
A
novidade foi duramente criticada pelo grupo de Le Pen, mas apoiada por Meloni.
A
premiê italiana também teria sido essencial para convencer o premiê húngaro
Viktor Orbán a aprovar um acordo para envio de 50 bilhões de euros em ajuda
financeira à Ucrânia.
Orbán
havia vetado a proposta alegando que não queria que os fundos viessem do
orçamento da União Europeia. Mas críticos dizem ser evidente que existe uma
antipatia pessoal entre ele e o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky.
Ao
contrário de seus aliados de direita, Meloni não apoia Putin e é pró-Otan e
pró-Ucrânia.
O
jornal The New York Times chegou a afirmar que ela “solidificou suas
credenciais internacionais” depois de sua interferência na questão da
assistência à Ucrânia.
Para
Paul Loveless, professor da Universidade de Bolonha, a líder italiana é uma
política habilidosa e tem se mostrado mais pragmática do que outros líderes da
direita radical.
"Ela
é bastante carismática, boa em se comunicar e é bem recebida na Europa. Ela tem
uma mão firme, mas não é alguém que chega com o pé na porta", diz.
"Ela
é esperta e está desempenhando um papel muito inteligente."
Mas
o analista lembra que boa parte da atenção recebida por ela durante o G7 está
relacionada, na verdade, ao fato de ela ser a anfitriã do evento.
A
situação vivida pelos outros líderes do grupo também fez com que Meloni se
destacasse.
Além
de Emmanual Macron e Olaf Scholz, que tiveram desempenhos fracos na eleição
para o Parlamento Europeu, os demais chefes de Estado parecem estar se afogando
em crises internas.
Joe
Biden, dos Estados Unidos, está totalmente focado em sua campanha de reeleição
contra Donald Trump e o premiê britânico Rishi Sunak também enfrenta uma
eleição difícil no Reino Unido.
Já
Justin Trudeau, do Canadá, e Fumio Kishida, do Japão, passam por momentos de
muito baixa popularidade.
·
Política doméstica
Mas
se no cenário internacional Meloni consolidou uma imagem mais moderada, com
alianças com a centro-direita, no contexto doméstico tem mantido muitas de suas
promessas de campanha mais controversas.
O
discurso anti-imigração se intensificou desde os primeiros meses do governo,
mesmo com o envelhecimento da população italiana e a baixa taxa de natalidade
no país indicando necessidade crescente de mão-de-obra estrangeira.
Em
maio de 2023, para reprimir a imigração irregular, o Parlamento italiano
aprovou o controverso decreto Cutro, referindo-se à cidade da Calábria, no sul,
onde mais de 90 pessoas morreram em fevereiro num naufrágio.
A
nova lei limita o estatuto de proteção especial que autoridades italianas podem
conceder a imigrantes que não têm direito a asilo, além de eliminar o acesso a
cursos de línguas e aconselhamento jurídico em centros de acolhimento.
Sob
sua gestão, o Parlamento também aprovou um acordo para abertura na Albânia de
centros de acolhida de imigrantes que chegam na Itália por barcos.
O
plano foi classificado como “desumano” por organizações do terceiro setor e
pela oposição.
Meloni
ainda fez da retórica anti-LGBT um dos pilares de sua campanha eleitoral,
prometendo proteger os valores tradicionais. E tem impulsionado a aprovação de
uma lei que críticos afirmam que poderia dificultar a adoção por casais do
mesmo sexo.
A
proposta tem como foco o uso de barrigas de aluguel. A prática é proibida na
Itália e na maior parte da Europa, mas muitos casais viajam para países onde
ela é permitida - como Estados Unidos e Canadá.
Mas
se o projeto de lei for aprovado, o uso de barrigas de aluguel poderia se
tornar um “crime universal”, um delito tão grave que pode levar a condenação
mesmo quando cometido no exterior.
O
governo de Meloni já instruiu a prefeitura de Milão a parar de registrar casais
gays como pais. A decisão foi uma reação à postura considerada progressista do
prefeito Giuseppe Sala de facilitar o reconhecimento de crianças por casais
homoafetivos, nos casos em que o bebê tiver sido gestado por um deles.
Também
na pauta de costumes, o Parlamento aprovou uma medida apoiada por Meloni que
permite o acesso de grupos contrários ao aborto a clínicas que realizam o
procedimento.
Na
Itália, o aborto foi legalizado em1978. O procedimento pode ser realizado até
os 90 dias de gravidez.
A
primeira-ministra disse que não pretendia limitar o acesso a esse direito no
país, mas queria garantir que as mulheres que consideram fazer o procedimento
pensassem em outras opções.
A
professora Leila Talani, da Kings College de Londres, ainda vê tendências
autoritárias em ataques de seu governo contra a imprensa livre e na tentativa
de alterar a constituição italiana para permitir a eleição direta do
primeiro-ministro.
Atualmente
o país tem um sistema parlamentarista em que o chefe de governo é eleito de
forma indireta.
"Ela
é moderada quando se trata de política externa, pois sabe que tem que manter
boas relações com os EUA e com a Europa", diz.
"Mas
internamente ela não tem se mostrado moderada. Ela é de direita e está
cumprindo as promessas políticas que fez na campanha."
Especialistas
dizem que o governo de Meloni tem agido de forma sutil e até meio silenciosa,
mas cumprido ao pouco suas promessas.
E
para Alessio Scopelliti, da Universidade de Bristol, assim como outros líderes
da direita radical pelo mundo, ela está passando por um processo de
normalização. Isso significa que estão sendo percebidos com mais naturalidade
pelo público – mas sem deixar de adotar, na prática, posições radicais.
"Ela
tenta parecer mais moderada aos olhos do eleitorado em uma perspectiva
econômica, mas em questões sociais ou culturais é muito muito radical",
diz. "Na verdade ela pode ser vista como uma forte representante da
direita radical atual na Europa e no mundo, especialmente graças à sua
liderança na implementação das políticas de ultradireita."
¨
Raí discursa contra a
extrema direita para manifestantes em Paris
O
ex-jogador Raí está
em Paris, na França,
onde compareceu a uma manifestação nesta terça-feira (3) e discursou contra a
extrema direita às vésperas do segundo turno das eleições parlamentares
francesas, que ocorrem no próximo domingo (8).
No
primeiro turno, o Reunião Nacional liderado por Marine Le Pen saiu vencedor com 33% dos votos. A Nova Frente Popular, de
esquerda, obteve 28%, e o bloco de centro direita do presidente Emmanuel Macron teve 20% dos votos.
Além
de ídolo do São Paulo e tetracampeão do mundo com a seleção brasileira em 1994,
Raí também é ídolo do Paris Saint Germain, o principal clube de futebol da
capital francesa. Ele ficou quase 7 anos no clube, onde conquistou a Ligue 1
(Campeonato Francês) na temporada 1993-94, foi bicampeão da Copa da França
(94-95 e 97-98) e campeão da Recopa Europeia (95-96).
O
ex-jogador, aclamado pelos torcedores parisienses, fez seu discurso durante o
comício da Nova Frente Popular, a coligação de partidos de esquerda que
pretende formar um bloco com a centro-direita de Macron para fazer frente a
extrema direita.
“Conheço
bem a extrema direita. O que eles fazem de melhor é mentir. Eu os conhecia no
poder. A extrema direita é o fim do mundo, é o fim dos direitos humanos, da
humanidade”, disse o ex-jogador.
Raí
é conhecido como um defensor da democracia e em 2022 fez campanha pela eleição
do presidente Lula (PT) a fim barrar uma catastrófica reeleição de Jair
Bolsonaro (PL). Na tentativa de incentivar os franceses a derrotar a extrema
direita, ele alertou para os estragos que Bolsonaro causou no Brasil.
“No
Brasil vivemos um pesadelo. Foram quatro anos de misoginia, quatro anos de
homofobia, preconceito, milhares de mortes, desmatamento. A extrema direita é o
ódio. Se quisermos mudar nossa realidade, nosso poder de compra e nossas vidas,
vamos mudar com uma estratégia, um projeto, uma nova política. Mas os nossos
valores fundamentais nunca devem mudar”, discursou.
Raí
finalizou o discurso pedindo para que os franceses compareçam às urnas e
derrotem a extrema direita no domingo. “Vão votar, meus amigos
franceses, vão convencer seus amigos, sua família a votar, pela França, pela
humanidade, pelo planeta, pela raça humana. Viva a França, viva a República e
viva a democracia”, declarou.
¨
Pesquisas eleitorais
do Reino Unido mostram Partido Conservador 'belicista' prestes a deixar o poder
Em
meio aos problemas internos como aumento exorbitante do custo de vida e
incertezas externas, Rishi Sunak anunciou no fim de maio a antecipação das
eleições parlamentares no país, apesar do término do mandato só em meados de
janeiro de 2025.
As
pesquisas eleitorais mais recentes apontam que o partido de figuras como David
Cameron Boris Johnson vai deixar o poder após 14 anos, e por uma boa diferença:
os últimos dados para as eleições gerais apontam o Partido Trabalhista com 40%
dos votos no Parlamento, enquanto os Conservadores devem conquistar 21% e o
Reform UK está bem perto, com 18%. A última sigla é liderada por Nigel Farage,
um dos principais incentivadores no país do Brexit.
Também
há levantamentos que apontam que os Conservadores podem conquistar menos
assentos que até mesmo que os Democratas Liberais. Caso esse cenário ocorra, a
sigla não será sequer o partido principal da oposição.
O
primeiro-ministro britânico, Rishi Sunak, grava mensagem de vídeo sobre a
situação israelense em Chequers, a residência oficial do premiê, perto de
Aylesbury. Inglaterra, 8 de outubro de 2023 - Sputnik Brasil, 1920, 13.06.2024
·
Sunak esperava que 'boas notícias'
econômicas mudassem o cenário
No
país, especialistas lembravam que Sunak esperava que boas notícias econômicas
jogassem a favor dos Conservadores, mas a inflação permanece acima da meta de
2%, atualmente em 2,3%, enquanto a economia do Reino Unido atingiu apenas 0,6%
de crescimento no primeiro trimestre de 2024 após uma breve recessão técnica.
O
apoio à sigla começou a declinar na fase final do governo de Boris Johnson e
entrou em queda livre durante o período de Liz Truss, amplificado pelos
desafios pós-Brexit, crise energética, o impacto das sanções contra a Rússia e
o conflito na Ucrânia.
Esse
período inclusive é responsável pelo aumento do apoio dos Trabalhistas até
entre a faixa etária de 50 aos 64 anos, historicamente ligada à direita.
A
iminente derrota eleitoral de Sunak espelha o desastre do presidente francês
Emmanuel Macron no primeiro turno das eleições legislativas. Ambos os líderes
são defensores declarados de armar a Ucrânia em meio à operação militar
especial russa.
Fonte:
BBC News Mundo/Fórum/Sputnik Brasil
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