Afinal, como está a Argentina de Milei?
Números da destruição
Enquanto países da
América do Sul estão reunidos para planejar estratégias e assinarem novos
acordos no Mercosul, o presidente da Argentina Javier Milei veio em visita ao
Brasil para um Congresso de extrema direita, onde confraternizou com o
ex-presidente Jair Bolsonaro, com quem compartilha o objetivo de destruir o
país que governa.
Orientado pelos
cachorros que o guiam, com quem se comunica através de uma espírita que faz a
tradução da linguagem dos animais, Milei já levou a Argentina ao maior nível de
pobreza dos últimos 20 anos — 57%.
Mas, afinal, como está
a Argentina de Milei?
<><> A
Argentina de Milei em números
• indústria siderúrgica , a queda foi de
25 por cento
• caiu a produção de outros insumos de
construção como cimento (-28,2 por cento), argila e produtos cerâmicos não
refratários (-44,9 por cento) e louças sanitárias (-60,4 por cento) , pisos
cerâmicos e coberturas (-41,8) e tijolos vazados (-35,8 por cento)
• alimentos e bebidas, a queda foi de 6,4
por cento
• a produção de refrigerantes, águas,
refrigerantes, cervejas, sucos diluídos, sidras e bebidas espirituosas
apresenta um decréscimo homólogo de 25,2 por cento
• preparação de frutas, legumes e
leguminosas registrou um decréscimo homólogo de 25,5 por cento
• setor da carne caiu 8,8 por cento
• a moagem de cereais caiu 9,5 por cento
devido ao setor do arroz, enquanto a produção de erva-mate, chá e café também
caiu
• setor metalomecânico teve uma quebra
homóloga de 22 por cento, em resultado da quebra na produção de máquinas
agrícolas, setor afetado por dificuldades no fornecimento de componentes
importados e pela contração da procura interna
• a produção de eletrodomésticos apresenta
uma queda homóloga de 27,9 por cento em Maio, principalmente devido à menor
produção de frigoríficos e congeladores, máquinas de lavar roupa, e aquecedores
e fogões
• setor automotivo também caiu, com 19,7%
• as vendas aos concessionários nacionais
de automóveis e utilitários registraram uma queda homóloga de 36,2 por cento
• exportações de automóveis e utilitários
nacionais, segundo informação da ADEFA, caíram 24,1 por cento em termos
homólogos
• madeira, papel, edição e impressão,
registrou-se em Maio uma queda interanual de 18,4 por cento. A indústria de
papel e produtos de papel representa o principal impacto negativo no mês em
análise, com uma queda homóloga de 18,8 por cento
• produção de substâncias e produtos
químicos apresentou queda interanual de 8,3%. Os principais incidentes
negativos são observados na produção de produtos farmacêuticos, detergentes,
sabões e produtos pessoais e tintas
Não é à toa que Milei
vive se exibindo pelo mundo como um animador de circo, procurando desviar o
olhar das pessoas da situação terrível por que passa o país vizinho.
Nada diferente do que
ele avisou em seu comunicado ao povo no final do ano: uma Argentina próspera
somente daqui a...45 anos.
Em essência, nossas
reformas implicariam em níveis de liberdade econômica que em um período de 45
anos nos permitiriam multiplicar por dez o nosso PIB per capita, alcançando
nível similar ao da Irlanda, que hoje se encontra 50% acima do dos Estados
Unidos.
¨
Argentina: A memória
como exercício de cura. Por Sergio Ferrari
Em 11 de maio de 2018,
o Tribunal Federal Oral de Santa Fé, na Argentina, havia condenado os
ex-comandantes da Gendarmaria Nacional Juan Ángel Domínguez e Adolfo
Kushidonchi a 17 e 22 anos de prisão, respectivamente, por crimes contra a
humanidade como diretores daquela prisão durante a última ditadura
cívico-militar (1976-1983).
O que parecia ser uma
etapa encerrada, não foi. Há poucos dias, na primeira quinzena de junho, o
Ministério Público Federal de Santa Fé, onde fica Coronda, indiciou uma dúzia
de ex-guardas prisionais, oficiais da Gendarmaria Nacional, pessoal médico, bem
como um militar aposentado, todos com responsabilidades na época naquela
prisão.
Entre 1974 e o início
de 1979, 1.153 presos políticos foram detidos em Coronda, dos quais três, Juan
Carlos Voisard, Raúl Manuel San Martín e Luis Alberto Ormaeche, morreram devido
à falta de cuidados médicos adequados. E um quarto, Daniel Gorosito, foi morto
após uma transferência daquela prisão. Tudo isto no quadro de um regime
cotidiano calcado no isolamento quase total dos reclusos –dentro da prisão e
com o mundo exterior– e executado com base no slogan “tudo é proibido”. A única
coisa permitida era a agressão ilimitada aos detidos por parte da maioria dos
funcionários, desde os diretores até ao último guarda prisional, passando por
médicos e enfermeiros.
·
Compromisso contra a
impunidade e o esquecimento
Essa nova causa tem
várias fontes, explica a feminista e ativista de direitos humanos Lucila Puyol.
Integra fatos vividos naquela prisão e que foram apresentados nas audiências de
debate da causa Coronda I (que decorreu entre dezembro de 2017 e maio de 2018).
Além disso, contribuições de outro processo judicial que anos antes havia
tramitado na cidade de Rosário, que envolveu 66 vítimas, muitas das quais
estiveram presas em Coronda. Também inclui elementos de uma causa especial pela
morte de Juan Carlos Voisard.
Puyol lembra que, no
processo Coronda I, o grupo de advogados querelantes –do qual ela era membro–
representando a Associação El Periscopio (que reúne ex-presos políticos daquela
prisão), já havia solicitado que fossem remetidas para a Procuradoria Federal
de Santa Fe “as provas documentais e testemunhais coletadas neste julgamento
(…) para efeitos de continuação da investigação do mesmo”. Formalmente, o
querelante, conforme consta dos autos, mencionava 18 guardas prisionais; dois
alferes e dois comandantes da gendarmaria; três médicos e um enfermeiro, além
de dois membros do antigo pessoal de inteligência civil. Os nomes e
responsabilidades de todos eles que implementaram o regime desumano de Coronda
apareceram nos depoimentos de muitas das mais de 70 testemunhas que
testemunharam no Caso Coronda I.
Ou seja, “todo o
material documental e testemunhal do primeiro julgamento constitui prova neste
novo processo em curso”, explica Lucila Puyol. Ela destaca o importante papel
desempenhado ao longo desse longo processo de busca por justiça pela Associação
Civil El Periscópio, “que deu aos ex-presos políticos daquela prisão o lugar de
protagonistas, como vítimas, testemunhas e promotores da causa”. Segundo a
advogada e ativista do Grupo HIJOS de Santa Fé (Filhos e Filhas pela Identidade
e Justiça contra o Esquecimento e o Silêncio) seria importante que o grupo de
ex-presos continuasse desempenhando esse papel, como autor da ação, também
nesse novo julgamento que está começando.
A Associação El
Periscopio nasceu em 2003. Leva o nome de um pequeno instrumento/invenção usado
pelos presos em Coronda para observar o movimento dos guardas de dentro das
celas. O periscópio foi construído com um pequeno pedaço de vidro, que tinha
massa de pão enegrecida nas costas, adquirindo as propriedades de um espelho.
Com a ajuda de uma cerda de vassoura era possível passá-lo pelos orifícios
inferiores da porta e, assim, monitorar o movimento dos guardas no pavilhão.
A Associação foi
criada em 2003 para dar status legal à publicação do livro coletivo, anônimo e
testemunhal Del otro lado de la mirilla. Olvidos y memorias de ex
presos políticos de Coronda 1974-1979, que já conta com três edições e mais
de 12 mil exemplares vendidos em vários idiomas. A Associação promoveu o
projeto de tradução e publicação das versões francesa (Ni fous ni morts,
Vevey, Suíça, 2020), italiana (Grand Hotel Coronda, Roma, Itália, 2022) e
portuguesa (Nem loucos, nem mortos, São Paulo, Brasil, 2023). Em 2017,
El Periscopio assumiu o papel de parte acusadora no julgamento de Coronda.
·
A memória como desafio
e exercício de cura
O regime diário que
sofremos em Coronda tinha como objetivo “a destruição física, psicológica e
ideológica dos presos políticos abertamente reconhecidos pelos repressores
daquela prisão e pelos militares que transformaram a prisão em um laboratório
onde foram aplicando, sucessivamente e de forma escalonada, um regime cada vez
mais vexatório e violento”, lembra Froilán Aguirre.
Aguirre foi preso em
1977 quando tinha apenas 17 anos, passou por diferentes centros de detenção,
incluindo alguns clandestinos e, quando completou 18 anos, foi transferido para
Coronda. “Eles nos proibiam de tudo: falar, ler, escrever, assobiar, fazer atividade
física na cela, dormir durante o dia. Eles nos castigavam permanentemente por
qualquer coisa segundo o capricho dos guardas que nos vigiavam noite e dia”. E
acrescenta: “O próprio regime de Coronda constituía uma tortura diária. Não há
desculpas. Todos eram responsáveis: desde os militares e o diretor do gendarme
e seus assistentes, até os guardas que faziam o trabalho sujo e realizavam
espancamentos e castigos, até os médicos cúmplices que não nos atendiam”,
lembra Aguirre, que continua sendo um ativista político ativo em Santa Fe, além
de ser membro do Conselho Diretor do El Periscopio.
Para ele, esse novo
processo que se inicia e no qual já há uma dezena de imputados, não é mais do
que “um novo e essencial exercício de memória coletiva e de justiça. Isso nos
motiva a continuar denunciando essas brutalidades da ditadura. E embora tenha levado
muitos anos para se materializar, torna-se, novamente, um exercício de cura,
não apenas para aqueles de nós que sofremos humilhações diárias, mas para a
sociedade como um todo.
Essa nova Causa
Coronda II tem, segundo Aguirre, um valor muito especial: começa em um momento
em que os discursos de ódio e os ares negacionistas estão soprando na
Argentina, lançando dúvidas sobre o que a ditadura realmente significava.
“Hoje, a luta pelos direitos humanos adquire uma importância ainda maior para a
nossa sociedade como um todo”, enfatiza.
A pergunta é direta:
Por que El Periscopio sustenta que a contribuição da Associação para a memória,
a verdade e a justiça, tanto com o livro em suas diferentes línguas quanto com
os processos legais, constitui um exercício de cura para a sociedade como um
todo? A resposta não admite dúvida para Froilán Aguirre, que, na primeira
pessoa do singular/plural, avança um exemplo esclarecedor. “Sabemos diretamente
e estamos conscientes do processo de debate que essas causas legais estão
provocando na própria cidade de Coronda, cuja vida gira há décadas em torno da
prisão. Há um debate público sobre a responsabilidade de um e de outro e sobre
os horrores que esta prisão abrigou durante a ditadura”.
Aguirre explica que El
Periscopio, há anos, é convidado na própria Coronda para palestras públicas,
atividades culturais, feiras de livros, encontros com jovens nas escolas. “Para
nós é uma contribuição essencial, do nosso grupo de ex-prisioneiros, operar
como um antídoto para o esquecimento e tentar fazer com que o próprio povo de
Coronda, como muitos já estão fazendo, se distancie do paradigma cidade-prisão
que define aquela cidade de 17 mil habitantes em que muitos ex-agentes
penitenciários ou seus herdeiros ainda vivem.” E observa um fato que considera
essencial: não se trata apenas de denunciar, mas também de compartilhar com a
sociedade, em particular com os jovens, como nessas circunstâncias muito
difíceis, em uma relação de força absolutamente desfavorável, “nossa
resistência unitária, coletiva, humana, solidária, nos permitiu sobreviver, nos
desenvolver como seres humanos e nos consolidar como militantes em favor de uma
Argentina melhor e de um Outro Mundo Possível”.
·
Presente com futuro
Se esse novo processo
legal for continuado sem interrupção, é muito possível que em alguns meses –ou
anos– novas responsabilidades sejam comprovadas e haja novas condenações.
Talvez alguns dos
acusados sejam poupados de cumpri-las porque já morreram. Possivelmente, muitos
dos ex-prisioneiros ou seus parentes que sofreram esses horrores não terão o
direito de se sentirem justificados pelo resultado dessa nova etapa de justiça atualizada.
“Os tempos judiciais são particulares e respondem às suas próprias
circunstâncias e políticas gerais que nem sempre são controláveis por aqueles
de nós que acusamos e exigemos a verdade”, reflete Froilán Aguirre. No entanto,
“sabemos que estamos fazendo a coisa certa e que estamos contribuindo, muito
humildemente, para uma sociedade futura mais saudável, justa e melhor”.
Lucila Puyol concorda,
concorda e completa sobre o papel dos ex-prisioneiros corondaes e
periscopianos (como eles se autodenominam) na divulgação e na
transmissão desses julgamentos à sociedade e à mídia, “uma contribuição
pedagógica essencial e objetivo transcendente na construção da memória. O
judiciário tem sido muito lento para responder a eventos ocorridos há mais de
40 anos, mas, sem dúvida, a justiça é sempre necessária e reparadora”.
Em sua reflexão final,
ele incorpora o trabalho permanente que os membros do El Periscopio vêm
realizando há décadas, na Argentina e no exterior, com seu livro sobre Coronda
com centenas de apresentações em seus diferentes idiomas. E também com os
julgamentos, exigindo justiça. “Um trabalho, insisto, essencial para a
construção da memória coletiva. Foram capazes de transformar o exílio de
muitos corondaes –fato doloroso no pessoal e familiar– em um
poderoso movimento internacionalista que difunde o que foi o terror ditatorial
argentino. Mas, ele não se limita a denunciar, mas também compartilha os sonhos
e esperanças de uma geração que lutou por um país melhor, reatualizando e
valorizando o que foi a resistência coletiva, solidária e em unidade no
Presídio Coronda como força de sobrevivência, de vida e de compromisso
transformador”.
**NdT: A Lei da
Obediência Devida (Argentina, presidente Raúl Alfonsín, 1987), determinava a
impunibilidade judicial de oficiais militares abaixo da patente de coronel que
cometeram crimes contra a humanidade na ditadura, entre 1976 e 1983. Na
Argentina, esse perigoso conceito de “obediência devida” aos superiores
hierárquicos serviu para proteger assassinos e torturadores.
Fonte: Forum/Outras
Palavras
Nenhum comentário:
Postar um comentário