A ciência da beleza: como ver algo belo
pode melhorar seu humor e até cognição
Imagine que a sua
espaçonave esteja girando sem controle. Você está prestes a cair sobre o
planeta Arakis e a única salvação é disparar os retropropulsores térmicos.
Qual dos dois botões
abaixo faria você disparar os propulsores a tempo?
Em outras palavras,
você teria maior probabilidade de sobreviver se o projetista do painel de
controle tivesse instalado o botão da esquerda ou da direita?
Se você escolheu o
botão da esquerda, parabéns! A ciência indica que você teria evitado o
desastre.
Mas o que têm esses
dois botões para fazer você escolher um em vez do outro? A resposta é simples:
a sua beleza.
O botão da esquerda é
esteticamente mais atraente que o da direita, o que nos faz identificá-lo mais
rapidamente. Pode parecer surpreendente, mas a beleza é mais importante para
nós do que costumamos perceber.
Como disse o poeta
inglês John Keats (1795-1821): "A beleza é a verdade, a verdade é a
beleza. É tudo o que sabeis na Terra e tudo o que precisais saber."
Quanto mais gostamos
de algo e mais aquilo nos parece belo, mais envolvente é o seu efeito sobre a
nossa experiência e o nosso comportamento.
Pesquisas indicam que,
quando vemos algo bonito – seja uma pessoa, uma pintura ou uma chaleira –,
atribuímos àquilo todo um conjunto de atribuições positivas, como verdade,
inocência e eficiência.
A beleza surge de
diferentes propriedades do objeto adorado.
É claro que existe
certo grau de subjetividade sobre o que apreciamos – eu posso adorar algo e
você não. Mas, quando o assunto é beleza, existem algumas características
estabelecidas que são importantes.
Elas incluem certas
propriedades do próprio objeto, como proporção, simetria e curvatura, bem como
a relação entre o objeto e o observador, incluindo o grau de familiaridade.
Nós tendemos a
apreciar a arquitetura clássica – o Partenon grego, por exemplo – devido às
suas fascinantes proporções, como a proporção áurea. E tendemos a achar que
pinturas com motivos familiares são mais bonitas que as desconhecidas.
Um princípio
geralmente aceito que explica por que gostamos de algumas coisas e não de
outras é a teoria da fluência de processamento: quanto mais fácil for entender
alguma coisa, mais gostamos dela.
• A estética é importante
Mas por que nos
preocupamos com a beleza? Por que não usamos uma abordagem utilitarista e
adotamos a funcionalidade acima de tudo?
Resumidamente, a
estética é importante e aparece no nosso comportamento e no nosso desempenho.
Nós nos rodeamos
daquilo de que gostamos, objetos que são atraentes para os olhos. Visitamos as
galerias de arte e observamos as belas pinturas. Colocamos objetos agradáveis à
nossa volta pela casa.
Também tendemos a
perseverar mais com aquilo de que gostamos. Um caso interessante é a matemática
– nós preferimos uma equação bela e elegante em detrimento de outra que seja
mais confusa.
Temos a tendência de
pensar que coisas bonitas irão funcionar melhor e serão mais fáceis de aprender
e usar. Às vezes, estamos certos – quando pegamos um apontador de lápis
simples, por exemplo, acreditando que ele irá funcionar melhor do que outro com
aparência mais complexa.
Mas a estética também
pode influenciar o desempenho em tarefas em que a eficiência (velocidade e
precisão) é importante, mesmo quando não temos consciência disso.
Nas minhas pesquisas,
minha colega Siné McDougall e eu pedimos aos participantes que encontrassem
ícones em uma tela no nosso laboratório.
Nós controlamos
diversas variáveis – como complexidade, significado, familiaridade e
tangibilidade – e concluímos que os participantes indicaram os ícones mais
atraentes com maior rapidez do que os menos interessantes.
Mas isso só ocorreu em
tarefas difíceis. Ou seja, quando os ícones eram complexos, abstratos ou
desconhecidos, houve uma clara vantagem em favor dos sinais esteticamente
atraentes.
Por outro lado, quando
os ícones eram visualmente simples, concretos ou familiares, o apelo estético
deixava de ter importância. A tarefa já era suficientemente fácil por si
própria.
Na figura acima, os
dois ícones do retropropulsor são complexos, mas o da esquerda apresenta maior
apelo estético. É por isso que o botão da esquerda seria o mais indicado para o
painel da sua espaçonave.
• A estética pode vencer a tristeza
As lojas costumam
selecionar cuidadosamente suas músicas, objetos e aromas que podem influenciar
o nosso comportamento de consumo. No nosso estudo recente, demonstramos como e
por que isso funciona.
Nós colocamos os
participantes em humor positivo ou negativo ouvindo uma música alegre ou triste
e lendo uma lista de afirmações. Em seguida, pedimos a eles que conduzissem uma
tarefa de pesquisa com tempo determinado.
Pesquisas anteriores
já haviam demonstrado que o humor negativo pode prejudicar o nosso desempenho.
As pessoas com estado
de ânimo positivo encontraram os ícones atraentes com mais facilidade que os
não atraentes. E também observamos este benefício entre os participantes com
humor negativo, mas apenas algum tempo depois.
Concluímos que os
estímulos de atração podem ser inerentemente recompensadores e o apelo estético
ajuda a superar os efeitos prejudiciais do humor negativo sobre o desempenho.
Ou seja, o apelo pode vencer a tristeza.
Aparentemente, o humor
positivo nos torna mais propensos a interagir com objetos belos. Mas, mesmo com
humor negativo, os objetos atraentes podem capturar nossa atenção e influenciar
o nosso comportamento, desde que fiquemos expostos a eles por tempo suficiente.
Existem cada vez mais
evidências de que pequenas doses de psicodélicos em ambientes controlados, como
clínicas, podem ajudar a tratar a depressão. Essas substâncias produzem
tipicamente intensas experiências de beleza – em termos de cores e formas – e
ajudam a nos sentirmos integrados ao nosso ambiente.
• Efeito pequeno, mas significativo
O apelo estético pode
reduzir o tempo de reação do participante em cerca de um décimo de segundo.
Pode parecer pouco,
mas é muito significativo. A economia até mesmo de alguns milissegundos de cada
vez se acumula, quando enfrentamos uma fraca conexão de WiFi ou o sinal lento
de 3G em um smartphone.
Líderes e inovadores
visionários tiveram, há muito tempo, uma visão intuitiva da importância do
apelo estético e da simplicidade em projetos industriais. O maior deles talvez
tenha sido o fundador da Apple, Steve Jobs (1955-2011). Seus compromissos com a
estética e a simplicidade são uma lenda.
Infelizmente, parece
que muitos designers não seguiram a intuição visionária de Jobs. Talvez o
crescente número de dados de pesquisa finalmente os convença que o design traz
impactos significativos sobre o desempenho.
Por isso, na próxima
vez em que você estiver projetando um aplicativo inovador para o celular, ou
até o centro de controle da sua espaçonave, lembre-se de como a estética e a
beleza são importantes. Assim, você poderá até evitar que a nave seja destruída.
Fonte: Por Irene
Reppa, para The Conversation
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