A
ansiedade climática é um diagnóstico clínico? Deveria ser?
O
último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas deixou
um “alerta final” sobre a crise climática. O documento destacou diversos
desafios para a saúde mental associados ao aumento das temperaturas, aos
traumas provocados por eventos extremos e à perda de meios de subsistência e
culturas.
O
relatório foi divulgado logo após a notícia de que a sentença de prisão de uma
manifestante climática que bloqueou a Ponte da Baía de Sydney foi anulada por
um juiz, que levou em consideração o diagnóstico de ansiedade climática da
ativista.
Um
artigo divulgado pela revista Nature afirma que a ecoansiedade está aumentando,
mas o que ela é? Trata-se de uma resposta emocional normal a uma ameaça real e
iminente coletiva ou é uma condição que exige tratamento clínico
individualizado? Na verdade, pesquisas indicam que saber direcionar a
“ecorraiva” pode levar a melhores resultados de saúde mental e é um fator
emocional adaptativo essencial para o engajamento com a crise climática.
Conforme
eventos relacionados ao clima afetam mais pessoas, muitas sentem ansiedade,
irritação e tristeza em relação ao estado do planeta. A “ansiedade climática”
descreve uma sensação de pânico, preocupação e medo diante das consequências e
incertezas trazidas pelas mudanças climáticas. O termo é, às vezes, usado de
forma intercambiável com “ansiedade ecológica”, uma expressão que alguns
profissionais de saúde e pesquisadores usam para descrever a ansiedade
relacionada a questões ecológicas mais amplas. Pesquisadores sugerem que a
ansiedade climática pode ser influenciada pelo ambiente ao nosso redor, como o
tipo de mídia consumida, as opiniões das pessoas próximas ou as respostas das
comunidades e governos.
Pesquisas
indicam que a ansiedade climática é sentida globalmente, especialmente entre os
jovens. Entretanto, não é oficialmente reconhecida como um distúrbio de saúde
mental nos manuais de diagnóstico usados por psicólogos, psiquiatras e outros
profissionais de saúde. Muitos especialistas alertam contra a medicalização
dessa resposta compreensível e esperada.
A
ansiedade é uma reação natural quando nos sentimos em perigo, ajudando-nos a
nos preparar e reduzir ameaças ao nosso bem-estar e segurança. Por exemplo,
pode nos ajudar a evitar um animal selvagem ou a nos preparar para um exame
difícil. As conclusões do último relatório climático indicam que a humanidade
tem muito a se preparar e agir para reduzir as ameaças das mudanças climáticas.
De certa forma, é necessário experienciar algum nível de ansiedade climática
para desencadear as mudanças necessárias para um futuro sustentável.
No
entanto, a ansiedade pode se tornar avassaladora e ser diagnosticada como um
transtorno clínico. No Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais
(DSM-5), os transtornos de ansiedade são marcados por uma ansiedade
persistente, excessiva e geralmente desproporcional à ameaça. A pesquisa mostra
que a ansiedade climática pode prejudicar a capacidade das pessoas de
trabalhar, estudar, concentrar-se, dormir ou até mesmo aproveitar o tempo com
amigos e familiares.
Entretanto,
independentemente de a ansiedade climática ser vista como um diagnóstico
clínico, a solução precisa ser vista de modo coletivizado. Afinal, como tratar
da saúde mental se as pessoas estão ficando sem acesso à água, à moradia segura
e aos alimentos saudáveis?
Apesar
dos impactos negativos no bem-estar mental, pesquisas realizadas em 32 países
mostram que algumas pessoas canalizam sua ansiedade climática para ajudar o
meio ambiente, por meio de comportamentos pró-ambientais e ativismo, como os
protestos climáticos. Dados australianos indicam que experimentar a “ecorraiva”
— raiva ou frustração em relação a questões ecológicas — leva a melhores
resultados de saúde mental e é um fator emocional adaptativo essencial para o
engajamento com a crise climática. Contudo, frustração e raiva intensas em
relação às mudanças climáticas estão associadas a maiores esforços pessoais
para resolver a questão, sugerindo que a raiva pode motivar ações.
Na
ausência de diagnósticos oficiais ou tratamentos reconhecidos, a ação coletiva
contra as mudanças climáticas pode ser uma solução eficaz para a ansiedade
climática. Há outras medidas que podem ser adotadas para gerenciar essa
ansiedade. Embora mais pesquisas sejam necessárias para identificar as
estratégias mais eficazes, profissionais de saúde sugerem:
• Passar tempo na natureza
• Engajar-se em ativismo ambiental
• Aprender técnicas de grounding para
lidar com emoções angustiantes
• Buscar apoio
• Praticar atividade física intensa
• Praticar yoga
• Meditar
• Fazer pausas para evitar esgotamento
• Realizar pequenas ações cotidianas de
autocuidado
Quando
a ecoansiedade se torna avassaladora, buscar o apoio de um profissional de
saúde “consciente do clima” pode ser um passo importante. Mas é preciso cuidado
para não normalizar a patologização de uma resposta natural da sobrevivência
humana.
Fonte:
eCycle
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