VIOLÊNCIA DE GÊNERO: Brasil registra 1
estupro a cada 6 minutos; maioria das vítimas é de meninas de até 13 anos
O Brasil bateu um novo
recorde e registrou um crime de estupro a cada 6 minutos em 2023. O dado é do
18° Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado nesta quinta-feira (18),
que também aponta para o crescimento de todas as formas de violência contra a
mulher.
De acordo com o
documento, feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o crime de estupro
cresceu 6,5% em relação a 2022 e 91,5% se comparado aos últimos 12 anos. Em
2023, foram 83.988 vítimas de estupro e estupro de vulnerável.
O perfil das vítimas
se repete: meninas (88,2%), negras (52,2%) de até 13 anos (61,6%). Na faixa de
10 a 13 anos, foram 233,9 casos para cada 100 mil habitantes, o que representa
uma taxa quase seis vezes maior que a média nacional, de 41,4 por 100 mil. A
taxa de estupros entre bebês e crianças de 0 a 4 anos também é superior à média
nacional, chegando a 68,7 casos por 100
mil habitantes.
Entre os agressores,
os principais são familiares e conhecidos. No caso de estupro contra vítimas de
0 a 13 anos, eles são autores de 64% dos crimes; já contra vítimas maiores de
14 anos, familiares representam 31,2% e parceiros íntimos 28,1%.
O Anuário também
aponta que a grande maioria (54%) dos casos de estupro ocorrem dentro da casa
da vítima. Em segundo lugar, estão as vias públicas. Entre as principais
cidades com as maiores taxas de estupro e estupro de vulnerável, estão: Sorriso
(MT), Porto Velho (RO), Boa Vista (RR), Itaituba (PA) e Dourados (MS).
• Crescimento de todas as formas de
violência
O levantamento apontou
que o Brasil registrou crescimento em todas as formas de violência contra a
mulher, como a doméstica, psicológica, ameaças e tentativa de feminicídio. O
crime de importunação sexual foi o que mais aumentou. Em 2023, foram 41.371 ocorrências,
um aumento de 48,7% em relação ao ano passado.
Em segundo lugar, o
crime que mais aumentou foi o de divulgação de cena de estupro / sexo/
pornografia (7.188 casos), registrando um aumento 47,8%.
Em terceiro lugar, foi
registrado o crime de stalking (77.083) casos que aumentaram 34,5%. Para o
Fórum, esse dado é relevante porque o stalking (perseguição) pode ser o
primeiro passo para a ocorrência de outros crimes, como o feminicídio.
Em relação às outras
formas de violência, foram registradas as seguintes taxas de aumento:
• Violência psicológica: 33,5% (38.507
casos);
• Assédio sexual: 28,5% (8.135 casos);
• Ameaças: 16,5%; (778.921 casos);
• Violência doméstica: 9,8% (258.941
casos);
• Tentativa de homicídio contra mulheres:
9,2% (8.372);
• Tentativa de feminicídio: 7,1% (2.797
casos).
Entre as vítimas do
feminicídio, as principais são mulheres negras (63,6%) e a maioria é
assassinada dentro da própria casa (63,3%). Os principais assassinos são
parceiros íntimos (63%). Ex-parceiros representam 21,2% e familiares 8,7%.
Os homens
O coordenador de
projetos do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, David Marques, afirma que o
aumento dos registros de violências contra a mulher pode estar relacionado
tanto ao aumento dos crimes quanto ao aumento das denúncias. “Por um lado,
vários trabalhos estão tentando discutir a respeito do crescimento da própria
violência, do fenômeno da violência, e por outro lado, também com variáveis que
indicam também um maior nível de registro desse fenômeno acontecendo”.
Para David, é preciso
se atentar ao fato de que a grande maioria dos crimes são protagonizados por
homens, o que pode parecer óbvio, principalmente para as mulheres, mas que
reforça a urgência de políticas públicas voltadas para eles. “O que é
incontornável, quando a gente olha para o perfil, por exemplo, dos agressores,
sempre são os homens. 90% dos assassinos das mulheres são homens. E geralmente
é parceiro íntimo, ex-parceiro íntimo. Em outras modalidades também, o homem
aparece como o agressor", diz o coordenador.
Ele acrescenta que é
necessário discutir sobre o aprimoramento das políticas públicas para o
atendimento dessas mulheres vítimas de violência e, por outro lado, falar do
papel do homem como o autor das violências.
“Os homens precisam
participar desse debate e a gente precisa pensar, enquanto sociedade, em como
ter ações, ter proposições para que a gente mude, inclusive socialmente, o
papel dos homens nessa posição de autores de violência", defende.
O coordenador reafirma
que a mudança na forma de abordagem é urgente, "senão o debate vai ser
sempre apenas como melhor atender às vítimas de violência, e não o que a gente
pode fazer para tentar evitar que essas tendências, que esse fenômeno da violência
contra a mulher, continue crescendo”.
• Meninas de até 14 anos são as principais
vítimas de violência sexual, mostra pesquisa
Meninas de até 14 anos
foram as principais vítimas de violência sexual em 2022, segundo o Atlas da
Violência, que reforçou, em dados, que o
Brasil continua sendo um dos países mais perigosos para as mulheres.
Ao todo, mais de 221
mulheres e crianças foram vítimas de algum tipo de violência naquele ano e 46%
dos casos de natureza sexual foram contra meninas de até 14 anos. A pesquisa
mostrou, também, que a maioria dessas violência ocorre dentro da casa da vítima.
Na faixa etária entre 0 e 4 anos, a residência correspondeu a 67,5% do local de
violência e, entre 10 e 14 anos, a 65,6%.
Além disso, o estudo
revela que essas meninas são vítimas, principalmente, de seus próprios pais e
padrastos.
Para o Fórum
Brasileiro de Segurança Pública, os dados do Atlas revelam uma
"epidemia" de violência sexual contra crianças. A pesquisa também
mostrou que entre bebês e meninas de 0 e 9 anos, esse tipo de violência
corresponde a 30,4%.
Violência sexual, por
definição, é "qualquer ação na qual uma pessoa, valendo-se de sua posição
de poder e fazendo uso de força física, coerção, intimidação ou influência
psicológica, com uso ou não de armas ou drogas, obriga outra pessoa, de qualquer
sexo e idade, a ter, presenciar ou participar de alguma maneira de interações
sexuais, ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, com fins de lucro,
vingança ou outra intenção".
O estudo também
mostrou que a violência acompanha as mulheres por toda a sua vida,
independentemente da faixa etária. De acordo com os dados, entre 0 e 9 anos, a
violência mais frequente é negligência, já nas faixa de 10 a 14, a violência
sexual prevalece. A partir dos 15 até os 69 anos, ou seja, em toda a vida
adulta da mulher, a violência física passa a ser a mais comum. A partir dos 70,
a negligência volta a ser uma forma de violência bastante presente na vida das
mulheres, crescendo até o fim da vida.
"Ou seja, se
tivéssemos que descrever o que é ser uma mulher no Brasil, poderíamos dizer que
na primeira infância é a negligência a forma mais frequente de violência, cujos
principais autores são pais e mães, na mesma proporção. A partir dos 10 até os
14 anos, essas meninas são vitimadas principalmente por formas de violência
sexual, com homens que ocupam as funções de pai e padrasto como principais
algozes. Dos 15 até os 69 anos, é a violência física provocada por pais,
padrastos, namorados ou maridos a forma de violência prevalente entre as
mulheres. Quando idosas, as mulheres voltam a ser vítimas de negligência e a
participação feminina entre os autores volta a crescer.
Em disparado,
alcançando quase 90%, os homens são os principais agressores dessas mulheres,
entre familiares e companheiros. Em 86,6% dos casos, as violências foram
protagonizadas por eles.
O Atlas da Violência
foi produzido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum
Brasileiro de Segurança Pública e também traz outros dados relativos a
violências contra pessoas negras, com deficiência, indígenas e outros grupos.
• MSF realiza treinamento sobre
atendimento a sobreviventes de violência sexual em Portel, na região da Ilha do
Marajó, no Pará
Equipes de Médicos Sem
Fronteiras (MSF) estão trabalhando em parceria com a Secretaria Municipal de
Saúde de Portel, na região da Ilha do Marajó, no Pará, para otimizar o
atendimento a sobreviventes de violência sexual no município. Como organização
internacional médico-humanitária, MSF tem vasta experiência na criação de
fluxos e no atendimento de saúde a casos de violência sexual em diversos
países.
Em Portel, as equipes
de MSF colaboram em dois eixos principais relacionados à essa temática: na
definição das etapas necessárias para o atendimento humanizado às pessoas
sobreviventes e na capacitação de profissionais que realizam o acompanhamento
de saúde a esses pacientes.
Recentemente, mais de
100 profissionais do Hospital Municipal e de Unidades Básicas de Saúde (UBS)
participaram de um treinamento sobre os impactos da violência sexual na saúde
física e mental dos sobreviventes. Médicos, enfermeiros e assistentes sociais
são algumas das especialidades dos participantes dessa série de treinamentos
realizada por MSF, a pedido das autoridades de saúde do município, entre junho
e julho de 2024.
“Nosso objetivo é
apoiar o desenvolvimento das habilidades desses profissionais para um
atendimento adequado que uma emergência médica deste tipo requer, de acordo com
as etapas estabelecidas no protocolo clínico e de apoio psicossocial
estabelecidos pelo Ministério da Saúde . Ao mesmo tempo, é fundamental que o
atendimento a esses pacientes seja feito de forma humanizada e empática,
evitando a revitimização dos pacientes”, explica a gerente de saúde mental e
apoio psicossocial de MSF Veronica Yanic.
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Trabalho de MSF na região da Ilha do Marajó
O trabalho de Médicos
Sem Fronteiras (MSF) relacionado à temática de violência sexual em Portel faz
parte de uma parceria com a Secretaria Municipal de Saúde iniciada em março de
2023, quando a organização começou as atividades na região da Ilha do Marajó
para levar cuidados de saúde à população, principalmente em comunidades
ribeirinhas localizadas em áreas remotas.
Desde então, equipes
de MSF trabalham para ampliar a oferta de cuidados de saúde mental e saúde
sexual e reprodutiva, apoiando Unidades Básicas de Saúde (UBS) e postos de
saúde nas zonas urbana e rural. Além disso, contribuem capacitando
profissionais (médicos, enfermeiros e agentes comunitários) que atuam na
atenção básica voltada a sobreviventes de violência sexual e em temas de saúde
sexual e reprodutiva.
Fonte: Fórum/MSF –
Imprensa
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