Por que conservadores tiveram um resultado
tão ruim na eleição do Reino Unido
O Partido Conservador se
acostumou a ser quase o Manchester City da política.
Uma máquina azul
e vencedora durante tanto
tempo que alguns dos seus principais membros mal conseguiam se lembrar de mais
nada.
Mas a sua sequência –
que rendeu primeiros-ministros conservadores em quatro eleições consecutivas –
teve um fim dramático.
Muitos conservadores
estão quase sem palavras e ainda processam a situação.
Um deles me disse que
eles “não foram coerentes” com os eleitores.
Agora os conservadores
estão começando a apurar o que deu errado com as suas táticas e liderança e o
que vão fazer a seguir.
Quando falo com os
conservadores, vários temas surgem repetidamente.
Alguns sentem que a
proposta política do Partido Trabalhista não foi drasticamente diferente dos
adversários, mas pensam que a escolha do eleitor britânico se baseou mais na
percepção de “competência”.
Acontecimentos
sísmicos, do Brexit à covid e a múltiplas disputas de liderança, dividiram o
partido em alas ideológicas. Alguns Conservadores gastaram mais energia
conspirando para derrubar uns aos outros do que a oposição - e nunca realmente
consertaram as coisas.
Os escândalos abalaram
a trajetória de uma forma violenta, desde festas durante o confinamento da
pandemia a alegações de má conduta sexual e um orçamento que contribuiu para
aumentar as taxas de juros.
Quando perguntei ao
ex-chefe do partido, Mark Spencer, durante a campanha, se o partido tinha
problemas de conduta, ele mencionou que outros partidos também tiveram de
suspender deputados por mau comportamento - o que é verdade - mas admitiu que
isso tinha se tornado frequente.
Depois houve o desejo
indubitável de mudança – uma palavra que o Partido Trabalhista utilizou na sua
campanha.
O custo de vida, as
listas de espera do NHS (o serviço de saúde britânico) e os pequenos barcos que
levam imigrantes foram questões levantadas pelos eleitores - e eles sentiram
que as coisas estavam piorando, em vez de melhorar.
O ingresso tardio de
Nigel Farage na eleição significou que este último tema se tornou um problema
particular para os conservadores, com alguns eleitores de direita que migraram
para o Reform UK (partido de direita radical) em busca de políticas de imigração
mais duras e impostos mais baixos.
A retórica e as
políticas que adotaram para conquistar os antigos eleitores levaram alguns
conservadores mais centristas a trocarem o partido pelo Trabalhista ou pelos
Liberais Democratas.
Essa foi uma mudança
mais confortável para alguns centristas que não sentiam que podiam votar no
Partido Trabalhista sob Jeremy Corbyn, antecessor de Keir Starmer, e tido como
mais esquerdista em suas políticas.
Essas circunstâncias
significavam que a derrota era inevitável? A maioria dos Conservadores com quem
falei descrevem o resultado como “não inesperado”, mas alguns sentem que a
escala da derrota poderia ter sido menor.
Houve gafes evitáveis – como Rishi Sunak saindo mais cedo das
comemorações do Dia
D.
Embora Boris Johnson
também fosse propenso a gafes, alguns de seus fãs achavam que Sunak não
retribuía o encanto dos eleitores da mesma maneira. O ex-primeiro-ministro
ainda entoava gritos de ‘Boris! Boris!’ num comício de última hora para tentar
energizar a campanha.
Ainda existe uma
perplexidade entre alguns sobre o motivo pelo qual Sunak decidiu convocar as
eleições em julho.
O guru da sua
campanha, Isaac Levido, defendeu uma data posterior - esperando que até lá houvesse
mais resultados "mensuráveis" para demonstrar que as suas políticas
estavam tendo impacto positivo.
Uma fuga de
requerentes de asilo para Ruanda, por exemplo, ou uma redução das taxas de
juro.
Mas ele perdeu esse
argumento. E os conservadores tinham poucas provas de que algumas das suas
políticas estavam funcionando quando se dirigiam ao eleitorado.
O risco de adiar a
decisão de convocar uma eleição era que mais más notícias pudessem surgir para
os Conservadores - mais travessias do Canal da Mancha este verão, mais
infratores sendo libertados devido à superlotação das prisões, ou algumas
universidades falindo.
Mas em termos de
política e identidade, o que mais poderiam os conservadores ter feito? É aí que
estará o foco deles agora.
·
O que – e quem –
poderia vir a seguir?
Sunak confirmou que
renunciará ao cargo de líder conservador assim que forem tomadas medidas para
escolher seu sucessor.
Há boatos nas últimas
semanas sobre se um líder interino será nomeado para evitar o constrangimento
de, por exemplo, o antigo primeiro-ministro ter de participar do Prime Minister
Questions — a sessão no Parlamento em que o premiê e o líder da oposição debatem
toda quarta-feira.
Poderia ser alguém que
serviu no gabinete anteriormente - como Oliver Dowden, James Cleverly ou mesmo
Jeremy Hunt, que quase conseguiu voltar à Câmara dos Comuns (equivalente à
Câmara de Deputados brasileira)?
Nesse caso,
provavelmente seria necessário ser alguém que não queira realmente concorrer à
liderança no futuro.
Caso contrário, Sunak
poderá permanecer no cargo até a próxima disputa pela liderança conservadora
terminar.
Há alguns deputados
que têm trabalhado nos bastidores há muito tempo para reforçar o seu apoio,
incluindo Kemi Badenoch (o favorito entre as apostas), que está à direita do
partido, e Tom Tugendhat, que está mais ao centro.
Ex-candidatos como
Suella Braverman e Robert Jenrick, ex-aliado de Sunak que se tornou crítico,
também devem concorrer.
Ambos passaram algum
tempo no Ministério do Interior, estão à direita do partido e criticaram o
histórico do governo em matéria de imigração.
Uma coisa
interessante, porém, é quem são os demais deputados conservadores e o que isso
pode significar para quem ganha o apoio entre o partido parlamentar.
Dei uma breve olhada
na nova entrada de parlamentares conservadores e quem eles apoiaram na primeira
disputa de liderança conservadora de julho-setembro de 2022.
Curiosamente, a
maioria são apoiadores de Sunak, com uma grande parcela de apoiadores de Liz
Truss também.
Suella Braverman e
Kemi Badenoch perderam alguns dos seus principais aliados à direita do partido
parlamentar. Alguns apoiadores de Tugendhat também se foram.
Por que as tendências
dos restantes deputados são importantes? Bem, em parte porque isso determinará
como o partido Conservador decidirá se moldar no futuro.
Vão decidir eleger
alguém da direita do partido, como a deputada Badenoch, a deputada Braverman ou
Jenrick, para tentar evitar a influência crescente do Reform UK, que já
conquistou vários assentos?
Alguns membros do
partido argumentam que não ter sido mais duro em questões como a imigração foi
parte da sua queda.
Ou tenta regressar ao
centro com um candidato como Tugendhat ou Hunt para recuperar parte do espaço
que os trabalhistas estão tentando ocupar agora no espectro político?
Alguns membros do
partido argumentam que a tendência dos conservadores para a direita foi parte
do problema e alienou eleitores socialmente liberais, mas fiscalmente
conservadores.
A resposta será o
resultado de muitas brigas e provas de consciência nas próximas semanas.
¨ 6 pontos que explicam derrota histórica de conservadores no
Reino Unido
O Partido Trabalhista
britânico venceu com maioria esmagadora e voltou ao poder após 14 anos de
governo conservador. Da saída da União Europeia a alguns escândalos, o Partido
Conservador foi perdendo a confiança da população nos últimos anos.
<><> A seguir, confira seis pontos fizeram este
partido naufragar:
·
Brexit
Aprovado em plebiscito
em 2016, o Brexit —que tirou Reino Unido da União Europeia — demorou mais de
três anos para sair do papel. Desde então, a economia do Reino Unido patinou. O
principal argumento dos conservadores era de que, com o Brexit, o Reino Unido
estaria livre das amarras da UE e poderia fechar acordos comerciais com outros
países. Na prática, aconteceu o contrário: os custos de vida e dos negócios
subiram, a burocracia aumentou e parte da mão de obra estrangeira deixou o
país.
·
Imigração
Os conservadores, no
poder há 14 anos, transformaram a luta contra a imigração irregular em uma
prioridade desde o Brexit, mas não conseguiram reduzir as travessias no Canal
da Mancha. Com a aproximação das eleições, eles recebem muitas críticas no tema
por sua suposta incapacidade de impedir a imigração irregular.
·
Colapso dos serviços públicos
O NHS (Sistema
Nacional de Saúde) do Reino Unido se deteriorou significativamente desde que os
conservadores assumiram o poder, em 2010. Além da pandemia, quando os hospitais
ficaram sobrecarregados, ainda existe um acumulo de pacientes —e longas filas —
que buscam tratamentos para diversas doenças.
·
Economia estagnada
Estagnada há quase
dois anos, a economia britânica entrou em recessão no segundo semestre de 2023.
Segundo a agência de notícias Reuters, analistas afirmaram que as famílias
britânicas deveriam sentir a primeira queda nos padrões de vida —entre uma
eleição e outra — desde a Segunda Guerra Mundial.
·
Aumento da inflação
Ao mesmo tempo em que
o crescimento econômico estava lento, a inflação disparou —e tornou o custo de
vida mais caro. Críticos argumentaram que as políticas do governo favoreciam
desproporcionalmente os mais ricos e faziam pouco para aliviar as dificuldades
econômicas da população em geral.
·
Escândalos
A imagem do Partido
Conservador foi manchada por falhas éticas de ministros. Durante o lockdown na
pandemia, Boris Johnson deu festas em escritórios do governo. Já sua sucessora,
Liz Truss, ficou apenas 45 dias no cargo depois de suas políticas econômicas
arruinarem a economia.
¨ Novo premiê britânico anuncia o fim do plano para deportar
imigrantes para Ruanda
Em seu primeiro
anúncio político desde que foi alçado ao posto de primeiro-ministro do Reino
Unido, em uma vitória esmagadora do Partido Trabalhista sobre o Partido
Conservador, Keir Starmer afirmou que vai acabar com o polêmico plano de
deportar para Ruanda imigrantes que chegam ilegalmente ao país.
O plano foi anunciado
pelo Partido Conservador, no final de abril, como promessa de campanha de Rishi
Sunak, derrotado por Starmer. As conversas sobre a proposta, no entanto,
ocorrem desde 2022.
"O plano de
Ruanda estava morto e enterrado antes de começar. Nunca foi um impedimento
[para travessias de pequenos barcos no canal da Mancha]", disse Starmer,
em coletiva.
A expectativa do
Partido Conservador era colocar o plano em vigor em 24 de julho, mas a medida
dependia do resultado das eleições para o Parlamento britânico.
O número de migrantes
que entrou no Reino Unido pelo canal da Mancha em pequenos barcos chegou a
quase 46 mil em 2022, em comparação com 299 quatro anos antes, segundo dados
das autoridades. Em 2023, o número caiu para 29,4 mil, após uma campanha para
reprimir contrabandistas de pessoas.
Em 2022, o governo
britânico, liderado pelo então premiê Boris Johnson, anunciou que havia fechado
um acordo com Ruanda no valor de US$ 158 milhões (R$ 826 milhões), para enviar
milhares de requerentes de asilo ao país. O valor aumentou e em janeiro o Reino
Unido pagou US$ 300 milhões (R$ 1,55 bilhão) ao governo de Ruanda.
·
Premiê britânico
Starmer diz estar 'preparado para usar' armas nucleares
O recém-empossado
primeiro-ministro britânico Keir Starmer revelou na quarta-feira (3) que dará
continuidade à política externa do governo do Partido Conservador, incluindo a
doutrina implícita do Reino Unido de "usar primeiro" um ataque nuclear
ofensivo contra seus adversários.
Questionado […] em um
evento de campanha na cidade de Bury, Starmer disse: "É claro que eu
estaria preparado para usar armas nucleares", cita na sexta-feira (5) o
portal Declassified UK.
"Cercado por
candidatos que eram veteranos das Forças Armadas, o líder trabalhista foi mais
além: 'É uma parte vital da nossa defesa. E, é claro, isso significa que temos
que estar preparados para usá-la", acrescenta o jornalista Richard Norton-Taylor
sobre o novo primeiro-ministro, que substituiu Rishi Sunak (2022-2024) no
cargo.
A doutrina militar
britânica, com a suposta justificativa de "defesa da OTAN", permite
explicitamente que o país inicie um ataque nuclear.
"O Reino Unido
não tem uma política de 'não usar primeiro'", indicam documentos da
biblioteca oficial do governo na Câmara dos Comuns britânica, o que significa
que o país permite o uso de armas nucleares contra adversários que não
representam uma ameaça nuclear.
"A Revisão
Integrada de 2021 anunciou que os compromissos [de desarmamento nuclear] de
2010 não poderiam mais ser cumpridos devido ao atual ambiente de
segurança", continua o documento, sem definir as circunstâncias que ele
apresenta como justificativa para anunciar a expansão de seu estoque nuclear em
40%.
Segundo ele, a revisão
"anunciou que o limite do estoque nuclear será aumentado e que as
informações sobre o estoque operacional, os mísseis e ogivas implantados não
serão mais disponibilizadas".
"A retórica [de
Starmer] reforça sua mensagem principal: o Partido Trabalhista mudou",
escreve Norton-Taylor, explicando os esforços do novo líder do partido para se
distinguir do líder anterior, Jeremy Corbyn.
Corbyn atraiu a ira
das elites britânicas por suas críticas ao militarismo ocidental, criticando a
colonização israelense da Palestina e o apoio do Reino Unido à guerra dos EUA
contra o Iraque.
Fonte: BBC News Mundo/AFP/Sputnik
Brasil
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