O que são seitas e por que as pessoas se
juntam a elas?
A morte de mais de 80
integrantes de uma seita cristã no Quênia — que teriam sido levados pelo líder
do grupo a jejuar até a morte — destacou os perigos que podem representar
organizações do tipo.
"Existe uma seita
por perto onde quer que você esteja no mundo", disse à BBC Alexandre
Stein, psicólogo do Reino Unido especializado em extremismo ideológico e
fenômenos sociais perigosos.
Grupos como a Good
News International Church, suspeito de estar por trás da tragédia no Quênia,
atuam em todo o mundo e nem sempre têm religião como pano de fundo.
O que todos eles têm
em comum é a capacidade de atrair seguidores — e, posteriormente, dificultar a
saída das pessoas.
• O que é uma seita?
A American
Psychological Association (APA) define uma seita como um "grupo religioso
ou quase religioso caracterizado por crenças incomuns ou atípicas, isolamento
do mundo exterior e uma estrutura autoritária".
Embora as seitas sejam
frequentemente de natureza religiosa, também podem se organizar em torno de
outros assuntos, como a política.
"É um mito que as
seitas são apenas religiosas e extremistas", explicou Richard Turner, um
conselheiro que trabalha com membros atuais e que pertenceram a seitas.
“Seu próprio local de
trabalho pode ser como uma seita se você for obrigado a se comprometer com
coisas como trabalhar constantemente por mais horas”, acrescentou ele,
observando também que alguns grupos de marketing de pirâmide implementam
táticas de recrutamento muito semelhantes às seitas.
• Quem decide entrar em uma seita?
Stein disse que as
pessoas não devem julgar as vítimas de seitas, especialmente sobre a falta de
formação educacional e habilidades sociais.
"As pessoas
sempre querem dizer que entrar em uma seita é resultado de alguém ser estúpido
e carente, mas o estudo sobre seitas mostra o contrário."
Os líderes de um
culto, acrescentou ela, querem recrutar "pessoas produtivas e
inteligentes", porque é mais provável que tragam recursos para o grupo.
"As seitas não
querem pessoas que eles teriam que tomar conta."
Stein advertiu que um
dos mitos em torno das seitas é que as pessoas se juntam a elas
conscientemente.
"Eles realmente
não anunciam 'venha e junte-se à nossa seita'. O apelo é perfeitamente benigno
no início."
No entanto, Stein
aponta que as tragédias envolvendo um grande número de mortes, como o recente
caso do Quênia, não são comuns no comportamento desses grupos.
"Não é como se os
líderes da seita inicialmente pensassem que matariam todas aquelas
pessoas."
Stein disse que este
não era o objetivo inicial do Heaven's Gate, um movimento religioso dos EUA que
ganhou as manchetes internacionais em 1997, quando 39 membros morreram em um
pacto de suicídio, acreditando que seriam resgatados e ressuscitados por alienígenas.
"Marshall
Applewhite, o líder do grupo, acreditava que tinha câncer e queria levar todas
aquelas pessoas com ele."
"Suicídio e
assassinatos só vão acontecer se for isso que o líder pensa naquele momento
específico."
Exploração e
maus-tratos, incluindo abuso sexual, são os perigos mais comuns.
• Por que líderes de seitas são tão
perigosos?
Em seus estudos sobre
o comportamento de seitas, Stein descobriu que os líderes são invariavelmente
figuras carismáticas que geralmente vêm de experiências semelhantes nas quais
aprenderam a usar técnicas de persuasão para reunir seguidores.
"Eles aprendem os
truques e seguem em frente quando acham que podem fazer as coisas
sozinhos", disse. "Líderes de culto não são estúpidos. Na verdade,
eles são altamente inteligentes e cheios de energia, porque é preciso muito
para fazer um culto funcionar."
Os líderes de seita
são em sua maioria homens, embora uma exceção famosa tenha sido Valentina de
Andrade, uma clarividente no Brasil que liderou um grupo chamado Lineamento
Universal Superior, que foi investigado e absolvido na década de 1990 por um
incidente envolvendo uma série de assassinatos de crianças.
• Por que as pessoas têm dificuldades de
deixar uma seita?
De acordo com Turner,
é "muito fácil" para uma pessoa ser atraída porque os líderes do
culto são ótimos em "bombardeio amoroso" — uma tentativa de
influenciar uma pessoa com demonstrações efusivas de atenção e afeto.
É algo que ele
experimentou em primeira mão. Em 2013, ele foi atraído para o que chama de
"culto cristão moderno" enquanto procurava um emprego trabalhando com
vítimas de tráfico humano.
“Não importa quão
rica, bem-sucedida ou inteligente seja uma pessoa, todos passam por uma
oscilação em algum momento de suas vidas, como perda de emprego, luto ou outra
mudança perturbadora”, explicou Turner.
"Então eles
destroem sua autoestima, criando um vício e dando a você a droga. Uma seita
sempre tentará isolá-lo de seus amigos e entes queridos para tornar mais fácil
tirar vantagem de você."
O conselheiro lembrou
que em algum momento de seus "anos de seita" ele dava seu salário
direto para a organização, tamanha era a influência deles em sua vida.
"Eu só os deixei
porque eu desmoronei completamente, e as seitas geralmente perdem o interesse
pelos seguidores quando isso acontece."
• Como perceber se uma organização é uma
seita?
Turner adverte que não
é fácil para as pessoas perceberem que uma organização é uma seita. Mas uma
simples pesquisa na internet pode dar pistas.
"Veja o que as
pessoas estão dizendo sobre um determinado grupo online, incluindo o próprio
grupo. Aprendi que se um deles escreve algo discutindo 'por que eles não são
uma seita', geralmente é porque eles são", disse ele.
"Além disso,
tenha cuidado se o grupo ao qual você se juntou começar a dizer coisas
negativas sobre seus amigos e parentes e tentar fazer com que você se
comprometa cada vez mais com as atividades, incluindo aquelas que exigem
pagamentos."
No entanto, o
conselheiro acredita que a maneira mais eficaz é ouvir seus instintos.
"Confie no seu
instinto", diz ele.
Especialistas como
Stein e Turner são rápidos em apontar que a prevenção é muito mais fácil do que
remediar quando se trata de seitas. Ambos pedem um trabalho mais coordenado dos
governos para manter seitas sob controle.
"Não estamos
tomando as medidas [necessárias] para educar as pessoas sobre grupos
perigosos", disse Stein.
“Os governos
geralmente ficam nervosos em tentar regulá-los, especialmente aqueles que se
projetam como igrejas”.
Fonte: BBC World
Service
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