sexta-feira, 26 de julho de 2024

Mudar de casa várias vezes na infância aumenta risco de depressão na vida adulta

Crianças e adolescentes que mudam de casa várias vezes antes dos 15 anos têm 40% mais chance de terem depressão na vida adulta. É o que sugere um estudo publicado na semana passada na revista científica Jama Psychiatry.

A pesquisa analisou os locais de residência de quase 1,1 milhão de pessoas nascidas na Dinamarca entre 1981 e 2001 e que permaneceram no país nos primeiros 15 anos de suas vidas. Em seguida, acompanhou essas mesmas pessoas até a idade adulta e descobriu que, pelo menos, 35 mil daqueles que ainda viviam no país receberam diagnóstico de depressão.

O estudo descobriu, pela primeira vez, uma relação entre experiências de mudanças durante a infância — seja entre ou dentro de bairros carentes de renda, ou aqueles mais abastados — e a maior probabilidade de desenvolver depressão na idade adulta. Além disso, análise mostrou que a frequência com que essas mudanças ocorrem pode aumentar ainda mais esse risco.

Segundo os pesquisadores, crianças que se mudam uma vez entre 10 e 15 anos têm 41% mais chance de serem diagnosticadas com depressão do que aquelas que não se mudam. Já aquelas que se mudam duas ou mais vezes nesse mesmo período apresentam um risco 61% maior em comparação com quem não se muda.

A pesquisa mostra que o efeito das mudanças frequentes pode ser ainda maior do que crescer em um bairro de baixa renda — estudos anteriores já sugeriram que viver a infância nesses bairros pode aumentar a chance de depressão na vida adulta.

Para os pesquisadores, os achados demonstram que crescer em um ambiente doméstico estável, em termos de localização, pode ser uma forma de proteção contra transtornos relacionados à saúde mental.

“Sabemos que há uma série de fatores que levam uma pessoa a ser diagnosticada com uma doença mental. No entanto, esta é a primeira evidência que sugere que mudar para um novo bairro durante a infância está entre eles, e acreditamos que os números que estamos vendo podem ser a ponta do iceberg”, afirma Clive Sabel, professor de Big Data e Ciência Espacial da Universidade de Plymouth e principal autor do estudo, em comunicado.

•        Qual é a possível relação entre mudanças de casa e saúde mental?

Os achados do estudo corroboram com evidências anteriores que mostram que crianças que se mudam com mais frequência desde o nascimento até a metade da adolescência têm mais probabilidade de sofrer resultados adversos, incluindo tentativa de suicídio, criminalidade violenta, doença mental e abuso de substâncias.

Na visão de Sabel, durante a infância, as crianças estão construindo suas redes sociais através da escola, grupos esportivos e outras atividades. “Cada vez que elas têm que se adaptar a algo novo, isso pode ser perturbador, então potencialmente precisamos encontrar novas maneiras de ajudar as pessoas a superar esses desafios”, afirma.

Apesar de o estudo ter incluído apenas pessoas dinamarquesas, os pesquisadores acreditam que resultados semelhantes podem ser encontrados em outras partes do mundo. “Este estudo enfatiza a importância de políticas globais que permitam e apoiem infâncias sedentárias, mas que levem em consideração identidades regionais e culturais”, completa Sabel.

 

•        “A Geração Ansiosa”: como elo entre redes sociais e ansiedade impacta crianças

O timing para a chegada às livrarias brasileiras de “A Geração Ansiosa – como a infância hiperconectada está causando uma epidemia de transtornos mentais”, lançado nesta terça (16), não poderia ser mais adequado.

A ansiedade saiu dos consultórios médicos para se tornar estrela de cinema. A animação “Divertida Mente 2”, lançada no mês passado, em poucas semanas superou US$ 66 milhões em arrecadação e se tornou a maior bilheteria da história dos cinemas brasileiros.

A animação da Disney fala das emoções que povoam o cérebro de uma adolescente de 13 anos – e a Ansiedade ganha papel de destaque.

Já o livro do psicólogo americano Jonathan Haidt condensa, em pouco mais de 400 páginas, uma série de estudos que mostram que o uso das redes sociais não apenas está correlacionado a transtornos mentais em crianças e adolescentes da geração Z, mas é sua causa.

Apesar da densidade dos dados apresentados – são 44 páginas de notas de rodapé e outras 36 de referências bibiliográficas –, o autor é didático e resume em tópicos os assuntos de cada capítulo. Segundo ele, “os custos de utilizar redes sociais são particularmente altos na adolescência, em comparação com a vida adulta, e os benefícios são mínimos”.

Haidt recupera o período entre 2010 e 2015, quando a vida social dos adolescentes americanos começou a ser impactada pela presença constante de smartphones, com acesso permanente a redes sociais, jogos on line etc. Haidt chama essa mudança social de “Grande Reconfiguração da Infância”, e, de acordo com ele, foi a principal razão da onda gigante de transtornos mentais em adolescentes do início da década de 2010.  

Assim, a primeira geração de jovens americanos (mas não só, já que mais à frente Haidt apresenta dados de outros países) que entraram na puberdade com acesso a smartphones apresenta maiores índices de ansiedade, depressão, automutilação e suicídio. É a chamada “geração Z”, que veio depois dos millennials, que em sua maior parte já haviam saído da puberdade quando a Grande Reconfiguração teve início, em 2010. 

Essa onda gigante de ansiedade, depressão e automutilação impactou mais as meninas que os meninos, e mais ainda as pré adolescentes.  A taxa de suicídio de adolescentes começou a aumentar por volta de 2008 nos Estados Unidos, e cresceu muito mais na década seguinte.  

Haidt até cita teorias como o impacto de guerras e do aquecimento global na saúde mental dessa faixa etária, mas, argumenta, nenhuma outra teoria explica por que os índices de ansiedade e depressão aumentaram entre os adolescentes em tantos países, ao mesmo tempo e da mesma maneira. “É claro que outros fatores contribuíram para o declínio da saúde mental, porém o agravamento sem precedentes entre 2010 e 2015 não pode ser explicado pela crise financeira mundial ou por quaisquer eventos que tenham ocorrido nos Estados Unidos ou em outros países em particular”, afirma.

<><> Superproteção no mundo real também causa prejuízo a crianças

Para o autor, que é professor na Stern School of Business da Universidade de Nova York, há ainda um fator social que ajuda a ampliar os índices de ansiedade. “Há uma segunda história, que é a da guinada bem intencionada porém desastrosa em direção à superproteção das crianças e à restrição de sua autonomia no mundo real. A afirmação central destas páginas é que essas duas tendências — superproteção no mundo real e subproteção no mundo virtual — são as principais responsáveis por tornar as crianças nascidas depois de 1995 a geração ansiosa”.

O autor demonstra como a “infância baseada no brincar” entrou em declínio na década de 1980 e foi substituída pela “infância baseada no celular”, acompanhada por uma hiperconectividade que alterou o desenvolvimento social e neurológico dos jovens e tem causado privação de sono, privação social, fragmentação da atenção e vício.

•        Como pais, escolas e a sociedade podem atuar por uma infância digital saudável

De acordo com Haidt, a saída para evitar que o cenário se agrave é uma ação coordenada, com escolha de ações mais benéficas para todos no longo prazo. Ele cita quatro reformas fundamentais:

1 Nada de smartphone antes do nono ano (o equivalente ao 1º ano do ensino médio no Brasil). Antes disso, os pais devem dar aos filhos apenas celulares básicos (com aplicativos limitados e sem navegador de internet). “Smartphones, tablets, computadores e televisões não são apropriados para crianças muito pequenas. Em comparação com outros objetos e brinquedos, esses aparelhos transmitem estímulos sensoriais intensos e absorventes. Ao mesmo tempo, incentivam o comportamento passivo e o consumo de informações, o que pode retardar o aprendizado”, argumenta.

2 Nada de redes sociais antes dos 16 anos. As crianças devem passar pelo período mais vulnerável do desenvolvimento cerebral sem ter acesso a um fluxo sem filtro de comparações sociais e influenciadores escolhidos por algoritmos.

3 Escolas não devem permitir celulares. Durante todo o período de aula, em todas as escolas, desde o ensino fundamental até o médio, os alunos devem deixar trancados celulares, smartwatches e quaisquer outros dispositivos pessoais que enviem ou recebam mensagens, atrapalhando a capacidade de concentração.

4 As crianças devem brincar mais de maneira não supervisionada e independente na infância. Dessa maneira, desenvolvem naturalmente habilidades sociais, superam a ansiedade e se tornam jovens adultos autônomos.

“A humanidade evoluiu na Terra. Crianças evoluíram para a brincadeira física e a exploração. Elas prosperam quando têm raízes em comunidades do mundo real, não em redes de contatos virtuais e descorporificadas. Crescer no mundo virtual promove ansiedade, anomia e solidão. A Grande Reconfiguração da Infância tem sido um fracasso catastrófico. É hora de dar fim a esse experimento. Vamos trazer nossas crianças de volta para casa”, conclui.

 

Fonte: CNN Brasil

 

Nenhum comentário: