Eleitores
franceses no Brasil rejeitam ultradireita e Le Pen
O primeiro
turno das eleições legislativas francesas no domingo passado (30/06) resultou
numa marca histórica para o partido de ultradireita Reunião Nacional (RN), de
Marine Le Pen, que acabou sendo o mais votado para a formação da Assembleia
Nacional, a câmara dos deputados do país.
Com
cerca de 30% dos votos, o RN foi seguido pela coalizão de partidos de esquerda
Nova Frente Popular (NFP), com 28%. Já a coligação do presidente centrista
Emmanuel Macron, chamada Juntos, amargou um terceiro lugar, com apenas 20%.
Mas,
se a eleição dependesse apenas dos eleitores franceses que vivem no exterior,
os resultados seriam substancialmente diferentes. Não houve "onda de
ultradireita” em nenhuma das 11 zonas eleitorais francesas que reúnem eleitores
espalhados pelo globo.
Na
zona da América Latina, por exemplo, a candidata apoiada por Le Pen amargou o
terceiro lugar, ficando atrás de um ambientalista de esquerda e de uma
macronista de centro. Já especificamente entre os eleitores franceses no
Brasil, essa candidata de ultradireita caiu para o quarto lugar, sendo
ultrapassada também por um conservador.
Na
França metropolitana e nos territórios ultramarinos – que concentram 566 das
577 cadeiras da Assembleia Nacional –, o RN elegeu 37 deputados no primeiro
turno e ainda tem 444 disputando o segundo.
Já
a eleição para as 11 cadeiras do exterior foi um terreno bem mais difícil para
a ultradireita. Ao final da contagem, o partido de Le Pen não consegui colocar
nenhum dos seus candidatos no segundo turno nas 11 zonas. Os nomes do RN
acabaram amargando terceiras e quarta colocações, em contraste com o que
ocorreu na França.
O
segundo turno vai ocorrer no próximo domingo (07/07), quando a composição final
da Assembleia Nacional será conhecida. Para ter maioria, um partido precisa
garantir 289 cadeiras.
• Esquerda e macronistas lideram no
exterior
Se
na França a coligação de Macron saiu humilhada do primeiro turno, o mesmo não
pode se dizer dos seus candidatos no exterior.
A
aliança do presidente, chamada Juntos, elegeu apenas 2 deputados na França no
primeiro turno e conseguiu levar 304 candidatos ao segundo turno. Destes, 10
estão nas 11 zonas do exterior. Há ainda um independente com laços próximos com
o macronismo que está na disputa pela zona eleitoral que engloba a Espanha e
Portugal.
Destes
11 candidatos macronistas no exterior, cinco terminaram o primeiro turno na
liderança. É um contraste significativo com a França metropolitana e
territórios, onde macronistas só conseguiram a liderança em 64 dos 566
distritos.
Já
a aliança de partidos de esquerda Nova Frente Popular (NFP), que conta com
legendas como A França Insubmissa (LFI) e o tradicional Partido Socialista
(PS), entre outros, conseguiu passar 10 candidatos para o segundo turno nas 11
zonas do exterior. Cinco deles terminaram a primeira rodada na liderança.
Na
França metropolitana, a NFP já elegeu 32 deputados no primeiro turno e tinha
413 disputando o segundo turno na noite de domingo. Desde então dezenas que
estavam em disputas triangulares (quando há mais de dois candidatos no segundo
turno) desistiram para tentar fortalecer rivais moderados com mais chances de
frear candidatos da ultradireita.
Ainda
no exterior, o partido conservador Os Republicanos (LR) – outrora uma das
grandes forças políticas da França, mas hoje em declínio – conseguiu passar um
de seus candidatos para o segundo turno na zona que reúne Chipre, Grécia,
Israel, Itália, Malta e Turquia.
Neste
caso, o candidato, o franco-israelense Meyer Habib, terminou na liderança e vai
disputar a nova rodada com um macronista. Nos últimos dias, Meyer Habib
despertou interesse da imprensa francesa porque seu nome foi citado numa lista
de republicanos que haviam fechado uma aliança com o RN, de Le Pen. Habib, no
entanto, negou ter aceitado tal aliança, ao contrário de outros republicanos na
França.
No
total, 1,6 milhão de franceses estavam aptos a votar nas 11 zonas no exterior.
A taxa de comparecimento foi de 36,55%. Em contraste, na França a taxa chegou a
66,7%.
• Eleitores franceses no Brasil
preferiram esquerda e centro
Na
zona eleitoral 2, que reúne a América Latina e o Caribe, também não houve
"onda de ultradireita", e o segundo turno será disputado entre um
membro da esquerda e uma macronista.
Os
dois candidatos mais votados foram o franco-chileno Sergio Coronado, do partido
ambientalista e membro da aliança de esquerda NFP, com 36,16% dos votos, e a
macronista franco-dominicana Éléonore Caroit, com 33,49%.
A
candidata do RN, Marie-Nathalie Gonçalves, acabou amargando o terceiro lugar na
América Latina, com 13,28% e ficou fora do segundo turno. Assistente
parlamentar do RN na França, ela é filha de uma mãe brasileira e um pai
português.
No
Brasil, os resultados foram similares ao do restante da zona eleitoral 2, mas
levemente piores para o RN.
O
ecologista Coronado encabeçou a preferência da maioria dos franceses no Brasil,
recebendo 40% votos. Já a macronista Caroit recebeu 30%. Mas a ultradireitista
Gonçalves acabou em quarto lugar no Brasil, com 10,9%, sendo ultrapassada
também pelo candidato republicano Bertrand Dupont – um residente do Brasil –,
que teve 11,4%.
O
ecologista Coronado também ficou em primeiro lugar em três das quatro seções
consulares francesas no Brasil: Recife, Brasília e Rio de Janeiro. Ele só ficou
atrás de Caroit na seção de São Paulo.
No total,
15.999 franceses estavam aptos a votar no Brasil. Destes, 3.861 votaram nas
seções consulares ou por via eletrônica – uma taxa de comparecimento de 24%.
• Na França, centristas e esquerda
tentam deter ultradireita
Em
um esforço articulado para impedir a ultradireitista Reunião Nacional (RN) de
formar maioria no Parlamento francês no segundo turno da eleição legislativa,
marcado para o próximo domingo (07/06), partidos de centro e de esquerda então
retirando candidaturas que concorrem entre si com a RN.
A
estratégia visa concentrar em uma só candidatura do campo democrático os votos
dos eleitores que não querem ver a eurocética e anti-imigração RN no comando da
Assembleia Nacional – um cenário que levaria o governo do presidente Emmanuel
Macron à paralisia.
A
RN de Marine Le Pen conseguiu a liderança no primeiro turno, realizado no
domingo passado, com 33,15% dos votos, seguida pela coalizão de partidos de
esquerda Nova Frente Popular (NFP), com 27,99%, e pela coligação centrista de
Macron, a Juntos, com 20,04%.
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501 dos 577 assentos do Parlamento serão definidos no 2º turno
Mas
a votação do primeiro turno só definiu 76 dos 577 deputados da Assembleia
Nacional, que obtiveram maioria absoluta. Destes, 37 foram da RN, enquanto a
NFP fez 32 e o Juntos, apenas dois. A decisão sobre os demais 501 assentos
ficou para o segundo turno. Só que em 306 dessas 501 disputas, três candidatos
se qualificaram. Boa parte deles é ligada à RN – que está em quase todas as
votações do segundo turno –, à NFP (272) ou ao Juntos (239), segundo a Rádio
França Internacional.
Com
isso, candidatos da esquerda e do centro se veem competindo entre si – uma
situação que pode beneficiar a RN, que já largou na frente em 260 disputas,
contra 127 da NFP e 68 do Juntos, conforme um levantamento do jornal francês Le
Monde.
Pesquisas
realizadas antes do primeiro turno sugerem que uma grande maioria dos eleitores
de esquerda e uma maioria menor de centristas estaria disposta a apoiar outro
candidato para manter a RN fora do governo francês – na França
semipresidencialista, é o Parlamento quem indica o primeiro-ministro e forma o
gabinete de governo.
O
Le Monde afirma que houve renúncias de candidaturas em ao menos 167 disputas, a
maioria vindas da NFP ou do Juntos.
O
prazo para retirada de candidaturas se encerra na noite desta terça-feira.
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Centristas mais relutantes
A
própria NFP já havia anunciado que abriria mão de candidaturas em disputas onde
houverem concorrentes do campo democrático mais bem votados e, portanto, com
maiores chances de derrotar a ultradireita.
Macron
indicou que sua coligação faria o mesmo, desde que os candidatos beneficiados
pertençam a partidos que compartilham dos "valores da República". Já
o conservador partido Os Republicanos, que teve 6,6% dos votos e só elegeu um
deputado no primeiro turno, disse que pretende não retirar nenhuma candidatura.
Alguns
aliados de Macron sugeriram, porém, que não ajudariam a eleger candidatos da
sigla de esquerda radical França Insubmissa, equiparando-a à RN. Foi o caso do
premiê francês Gabriel Attal, que acusou o partido de "evitar uma
alternativa crível" a um governo de ultradireita.
"Nenhum
voto deve ser dado aos candidatos da Reunião Nacional, mas também aos
candidatos da França Insubmissa, de quem diferimos em princípios
fundamentais", afirmou o ex-primeiro-ministro Eduoard Philippe, outro
aliado de Macron.
O
cenário de segundo turno, com numerosas disputas "triangulares" –
como são chamadas as eleições entre três candidatos – é incomum na França. Isso
porque, para se qualificar para um segundo turno, candidatos precisam ter mais
de 12,5% dos votos do eleitorado – algo difícil diante do usual desinteresse
dos franceses, que não são obrigados a votar.
No
domingo, porém, a taxa de eleitores que compareceram às urnas foi de quase 67%
– a maior desde 1997, e muito acima dos 47,5% vistos na última eleição
parlamentar, em 2022.
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Macron dissolveu Assembleia Nacional após vitória da ultradireita nas eleições
europeias
Em
9 de junho, após ver sua aliança centrista derrotada pela Reunião Nacional (RN)
nas eleições ao Parlamento Europeu, Macron anunciou a dissolução da Assembleia
Nacional e a convocação de eleições antecipadas.
Ao
convocar uma eleição-relâmpago, o francês esperava voltar a atrair os eleitores
que se opõem à ultradireita de Le Pen, como ocorrera nas presidenciais de 2017
e 2022, e eventualmente eleger uma Assembleia Nacional mais favorável.
• Le Pen e o uso do feminismo pela
ultradireita. Por Nina Lemos
Há
alguns anos, o partido de ultradireita AfD (Alternativa para a Alemanha)
resolveu fazer uma campanha "engraçadinha" (no mau sentido) e
espalhou pelo país cartazes com imagens estereotipadas da Alemanha e dos
muçulmanos. Num dos cartazes, uma foto de mulheres jovens de biquíni era
acompanhada do texto "Burca? Nós gostamos de biquínis!". Em outro, os
olhos de uma mulher usando burca eram seguidos da frase "a liberdade das
mulheres não é negociável".
Quem
via sem prestar atenção talvez não percebesse o quanto aqueles cartazes eram
xenófobos e até poderia comprar a ideia de que eles eram um pouco feministas.
Quem não te conhece, que te compre. O partido, além de xenófobo, é extremamente
conservador.
Lembrei
desses cartazes do partido cuja co-líder Alice Weidel foi reeleita para o cargo
no fim de semana passado ao ver o sucesso eleitoral de outra mulher da
ultradireita na Europa. Falo, claro, de Marine Le Pen, cujo partido, o RN
(Reunião Nacional), venceu o primeiro turno da eleição parlamentar na França no
domingo passado (30/06), com 33% dos votos. O resultado parcial (o final será
definido no próximo domingo, no segundo turno) assustou a parte democrática e
humanitária da Europa e do mundo. Afinal, não é nada legal ver o crescimento da
ultradireita no continente, o que indica que o ódio, a xenofobia e o racismo
estão crescendo a níveis alarmantes.
E
isso não acontece só na França. Na eleição para o Parlamento Europeu, a AfD
teve 16% dos votos, o que significa que eles cresceram quase 50% desde a última
eleição europeia, em 2019.
Weidel
e Le Pen têm muito em comum. Elas representam, junto com Giorgia Meloni, a
primeira-ministra da Itália, do partido Irmãos da Itália, a ascensão de
mulheres a cargos de lideranças em partidos da ultradireita europeia. E têm
feito sucesso, o que lamento.
Le
Pen e outras líderes femininas dessa direita radical demonizam imigrantes e
usam xenofobia travestida de luta pelo direitos das mulheres para espalhar ódio
e ganhar votos. As mulheres europeias, segundo esses partidos, precisam ser
protegidas de "estrangeiros estupradores e agressores". Na narrativa
da ultradireita europeia, homens, principalmente muçulmanos e refugiados, são,
todos, uma ameaça às mulheres, o que não é verdade.
Se
existe violência de imigrantes na Europa? Existe, sim. Mas os números mostram
que o maior perigo para as mulheres ainda são os próprios europeus.
Na
Alemanha, segundo dados do Ministério do Interior, 133 mulheres foram mortas
por seus parceiros ou ex-parceiros em 2022, ou seja, por pessoas que elas
conheciam intimamente.
No
caso da França, a pauta de que só os estrangeiros colocam mulheres em risco
também não se sustenta. Segundo dados do Ministério do Interior, em 2022, 118
mulheres foram vítimas de feminicídio no país. O número de tentativas de
assassinatos de mulheres por parceiros aumentou 45%. O perfil típico do autor,
segundo o ministério, é, em sua maioria, formado por homens de nacionalidade
francesa, com idades entre 30 e 49 anos.
• Suavizada na imagem
O
sucesso das líderes da ultradireita não se deve só às pautas xenófobas e
anti-imigração. Segundo estudiosos, mulheres como Le Pen, Meloni e Weidel
também ajudam a dar uma "suavizada" na imagem da ultradireita.
Afinal, essas mulheres são muito diferentes de misóginos grosseiros como os
ex-presidentes Donald Trump e Jair Bolsonaro. Isso atrai votos de mulheres, que
costumam votar menos do que os homens na ultradireita. No Brasil, esse papel
tem sido cumprido por Michele Bolsonaro, muito mais articulada que o marido.
No
caso da França, o perfil de eleitores já mudou. Em 2019, a ultradireita teve
19% dos votos femininos na eleição do Parlamento Europeu. Em 2024, esse número
subiu para 30%.
Não
digo que Le Pen, Weidel e Meloni estejam sendo manipuladas. Acho que elas
acreditam mesmo no que pregam. E que são muito perigosas para o mundo e para a
democracia.
Mas,
confesso, me dói mais ver uma mulher líder da ultradireita do que um homem.
Afinal, somos um grupo que ainda tem que lutar por pautas básicas, como
igualdade salarial, por exemplo. Somos a parte que costuma se dar mal no mundo.
E me dói, sim, ver pessoas que são historicamente oprimidas lutando para
oprimir outras pessoas (principalmente imigrantes e estrangeiros, no caso).
Mas, como disse um amigo: "Caráter não tem gênero".
E
não, gente, nós, mulheres, não precisamos ter "sororidade" com
mulheres de ultradireita. Sororidade é sobre ser companheira e tentar entender
o lado de mulheres ao nosso redor. Mas existem mulheres que não estão do mesmo
lado que nós e que representam ideias que precisam ser combatidas. Simples
assim.
Fonte:
Deutsche Welle
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