terça-feira, 23 de julho de 2024

Como 'estresse hídrico' vai assolar América Latina nos próximos 25 anos

México registrou em 2023 o seu ano mais seco, e o governo uruguaio declarou uma emergência hídrica devido aos baixos níveis das suas reservas de água. Neste ano, os reservatórios de água no Chile e em cidades como Bogotá (Colômbia) e Cidade do México, estão perigosamente perto de se esgotar.

Muitas cidades e países estão expostos ao que os cientistas definem como "estresse hídrico": muita procura e falta de oferta de água numa área.

A demanda global por água duplicou desde 1960, e os recursos hídricos disponíveis estão se tornando cada vez mais escassos. As projeções sugerem que dentro de 25 anos metade da população mundial viverá em áreas de escassez de água.

Na América Latina, espera-se que a procura de água aumente 43% até 2050, quase o dobro do crescimento médio mundial, que deverá aumentar entre 20 e 25%.

A seguir, veja por que o consumo está aumentando tanto na região e como está a situação do Brasil em relação aos vizinhos da região.

·        Três causas principais

Expansão agrícola, atividades industriais e crescimento populacional (e fluxos migratórios) são as três principais causas identificadas pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).

Embora circunstâncias semelhantes se repitam em outras partes do mundo, na América Latina elas ocorrem a um ritmo acelerado.

"O que está acontecendo é extremamente preocupante", diz à BBC News Mundo (serviço em espanhol da BBC) Michelle Muschett, chefe da Diretoria para a América Latina e o Caribe do Pnud.

Por um lado, o consumo de água aumenta e, por outro, a quantidade de água disponível diminui à medida que aumentam os eventos extremos relacionados com as mudanças climáticas, com aumento progressivo das temperaturas e das secas.

·        Emergência e racionamento

O estresse hídrico, explica Muschett, não é apenas um problema ambiental.

A escassez de água aumenta as desigualdades e tem um sério impacto na nutrição, porque os alimentos podem se tornar escassos e mais caros.

Também afeta a saúde, pois pode incentivar o consumo de água contaminada e causar problemas de higiene, além de prejudicar a subsistência de muitas famílias quando as terras secam.

Só no ano passado, houve uma perda de 30% de algumas culturas alimentícias na Argentina e de 80% no Peru.

As secas sem precedentes também perturbaram o tráfego de navios através do Canal do Panamá, afetando o crescimento econômico do país e uma parte significativa do comércio marítimo global.

Outra consequência da escassez de água é o seu impacto na energia.

Nas últimas duas décadas, mais da metade da energia produzida na região veio de usinas hidrelétricas, marcando uma tendência crescente.

Embora a energia hidrelétrica seja uma fonte de energia renovável considerada "verde", o problema é que a escassez de água a torna menos confiável.

Isso ficou evidente no Equador, que depende de centrais hidroelétricas para mais de três quartos da sua eletricidade. Em abril deste ano, o país declarou estado de emergência e começou a racionar eletricidade devido à falta de chuva.

O Brasil também depende muito da energia hidrelétrica: 55% de toda a nossa eletricidade é produzida por esse tipo de usina.

Mas a falta de chuva é apenas uma face da moeda.

As projeções científicas indicam que alguns países terão estações chuvosas mais curtas e, ao mesmo tempo, a precipitação será mais extrema.

Nestas circunstâncias, como os aquíferos e os solos não conseguem absorver o excesso de água, perde-se uma parte importante dos recursos hídricos - e pode haver inundações com graves consequências.

·        Os países mais afetados da América Latina

Atualmente, 25 países no mundo sofrem de estresse hídrico extremo.

Na América Latina, o Chile é o único nessa categoria, segundo análise do World Resources Institute.

Os outros países mais afetados pela escassez de água na região são o México e o Peru, ambos com um elevado nível de estresse hídrico.

No Brasil, o estresse hídrico é considerado médio/baixo no momento (veja gráfico acima).

Até 2050, o Chile continuará a liderar o ranking da América Latina de estresse hídrico extremo, enquanto o México e o Peru continuarão expostos a um nível elevado.

Os níveis foram calculados utilizando o cenário intermédio, ou seja, se os esforços atualmente em curso para mitigar os efeitos das alterações climáticas não aumentarem nem reduzirem.

Mas em 2080, o México e o Chile serão os dois países da região afetados por um estresse hídrico extremo, enquanto o Peru e El Salvador estarão num nível elevado, se as atuais políticas ambientais forem mantidas.

·        Estresse hídrico no Chile

Embora a escassez de água afete toda a região, no Chile a situação é crítica.

O país sul-americano concentra várias das áreas mais secas do mundo e uma parte importante da sua economia depende tanto da mineração quanto da agricultura.

"Essas duas atividades demandam grandes quantidades de água. E a isso se soma o fortíssimo impacto das mudanças climáticas", argumenta Muschett, do Pnud.

Para enfrentar o problema, acrescenta, o país deve aumentar seus esforços para que as atividades que geram maior estresse hídrico possam ser feitas de forma planejada.

Uma das chaves para enfrentar o problema, afirma a especialista, é que haja uma gestão integrada da água que garanta o consumo humano e as atividades econômicas do país, onde participem os setores público e privado.

E outro elemento fundamental, acrescenta Muschett, é que o planejamento seja feito com as comunidades.

Os esforços, em última análise, deveriam visar a "um equilíbrio entre as aspirações econômicas e as aspirações ambientais", segundo ela.

·        A crise hídrica no resto do mundo

Os 25 países afetados pelo estresse hídrico extremo abrigam um quarto da população mundial, de acordo com o Atlas de Risco Hídrico elaborado pelo World Resources Institute, localizado em Washington DC, Estados Unidos.

Viver com um nível tão elevado de escassez de água põe em perigo a vida das pessoas, o emprego e a segurança alimentar e energética, observa o estudo.

Sem uma intervenção mais profunda (como o investimento em infraestruturas hídricas e uma melhor governança da água), argumenta o centro de investigação, o estresse hídrico continuará a piorar, especialmente em locais com populações e economias em rápido crescimento.

Os países com maior escassez de água no mundo são Bahrein, Chipre, Kuwait, Líbano, Omã e Catar. O estresse hídrico nestes países deve-se principalmente à baixa oferta e à elevada procura de utilização doméstica, agrícola e industrial.

E as regiões com maior estresse hídrico são o Médio Oriente e o Norte de África, onde 83% da população está exposta a um estresse hídrico extremamente elevado.

Até 2050, espera-se que mais de 1 bilhão de pessoas vivam com um estresse hídrico extremamente elevado.

Apesar desta perspectiva, o estresse hídrico não conduz necessariamente a uma crise hídrica, argumentam os pesquisadores.

Por exemplo, locais como Singapura e a cidade americana de Las Vegas (Estado de Nevada) demonstram que as sociedades podem prosperar mesmo nas condições de maior escassez de água, recorrendo a técnicas como e eliminação da pastagem intensiva, a dessalinização e o tratamento e reutilização de águas residuais.

O Atlas de Risco Hídrico aponta que "resolver os desafios hídricos globais é mais barato do que se imagina".

"O que falta é a vontade política e o apoio financeiro para tornar realidade estas soluções económicas", diz a publicação.

¨      Brasil pode ficar ‘inabitável’ em 50 anos, alerta Nasa

Um novo estudo da NASA aponta que os impactos das mudanças climáticas podem tornar alguns locais do mundo inabitáveis no futuro. Entre eles, o Brasil. E, diferentemente do que possa se imaginar, este quadro alarmante não deve demorar muito para se tornar realidade.

<><> Calor pode atingir níveis insuportáveis no Brasil

Os pesquisadores mapearam cinco regiões do planeta onde o calor pode atingir níveis insuportáveis para humanos ao longo dos próximos 50 anos. A pesquisa estima que, até 2070, o calor e a umidade vão chegar a patamares extremos nas regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste do Brasil.

Além do nosso país, o Golfo Pérsico, o Mar Vermelho, partes da China, do sudeste asiático e do sul da Ásia serão fortemente afetadas. Os resultados foram descritos em estudo publicado na revista científica Science Advances.

Durante o trabalho, a equipe utilizou imagens de satélite e projeções da temperatura de bulbo úmido. Essa medida considera temperatura e umidade do ar para indicar conforto térmico.

Se a temperatura de bulbo úmido ficar acima dos 35ºC por mais de seis horas, até as pessoas mais saudáveis poderão enfrentar sérios problemas de saúde. Essa temperatura equivale a 45ºC com 50% de umidade. E neste patamar, a sensação térmica é de assustadores 71ºC.

Até os anos 2000, considerava-se impossível que a temperatura de bulbo úmido chegasse a esse nível. No entanto, isso se tornou realidade a partir de 2005 em áreas do Golfo Pérsico e do Paquistão.

O estudo ainda alerta que a tendência é o mundo esquentar cada vez mais se as emissões de gases do efeito estufa continuarem em ritmo acelerado. Com isso, a umidade pode também chegar a níveis insustentáveis, deixando a vida (dos humanos) na Terra cada vez mais difícil.

<><> Estudos já mostram problemas climáticos no Brasil

A única área verde do Nordeste pode virar deserto. O agreste, vegetação semiárida característica de alguns estados da região, está sendo engolido pelas áreas desérticas ao redor e já diminuiu em mais de 50% só no ano passado. O motivo são as secas-relâmpago que, apesar de rápidas, podem ser mortais.

O agreste é uma vegetação semi-árida que fica entre a zona da mata litorânea e as terras mais áridas do Nordeste, como a Caatinga e o sertão. Ele inclui 11 estados brasileiros, mas está diminuindo.

As informações estão presentes em um estudo da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), via Laboratório de Processamento de Imagens de Satélites (LAPIS). Os dados mostram que 55% já foi perdido devido às secas-relâmpago, fenômeno que dura de uma semana a um mês, mas costuma ser mortal. Com isso, a região pode ir de semiárida para deserto.

<><> Cerrado também está em risco no Brasil

Cerrado brasileiro está em seu pior momento em sete séculos, mostrou estudo publicado na Nature Communications. O aquecimento global é tão intenso na região central do Brasil que, quando a chuva cai, a água evapora sem sequer se infiltrar no terreno. E a temperatura ainda não atingiu seu máximo. O trabalho foi conduzido por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP).

Os cientistas destacaram que o Cerrado brasileiro, o segundo maior bioma da América do Sul, localizado principalmente na região centro-oeste, está vivendo uma seca sem precedentes em pelo menos 700 anos.

¨      COP29: Azerbaijão propõe novo fundo de financiamento climático

O Azerbaijão, sede da 29ª Conferência das Nações Unidas sobre o clima (COP29), que ocorre em novembro, propôs na sexta-feira (19) a criação de um novo fundo climático junto aos produtores de combustíveis fósseis para financiar a transição energética e a adaptação às mudanças climáticas nos países em desenvolvimento.

A ideia é angariar um montante inicial de 1 bilhão de dólares (R$ 5,5 bi) em “contribuições voluntárias” de países e empresas do setor de óleo de gás, sob a forma de um montante fixo a ser determinado, incluindo a possibilidade desse valor ser proporcional ao volume de produção.

O Azerbaijão, uma potência do petróleo e do gás, não revelou o montante da sua própria contribuição para este projeto do "Fundo de Ação para o Financiamento Climático (FCFA)", que terá sede em Baku, nem se outros produtores de combustíveis fósseis manifestaram o seu interesse.

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“Este é um conceito inicial nesta fase”, disse o negociador principal da COP29, Yalchin Rafiev. O fundo só começaria quando a meta financeira fosse alcançada e 10 países contribuintes anuais fossem reunidos. Sobre o formato, seria um fundo multilateral cuja gestão incluiria representantes das empresas públicas e privadas de petróleo e gás, sob o controle de uma “auditoria independente”.

É uma “tentativa interessante de tornar realidade o princípio do ‘poluidor-pagador’”, avaliou Li Shuo, especialista em negociações climáticas do Asia Society Policy Institute. E uma “maneira inteligente de iniciar a conversa sobre quem pagará mais antes do grande confronto”, acrescentou à agência AFP em referência à COP29, em Baku, que terá como tema principal o financiamento climático.

As tratativas prometem. Para Friederike Röder, vice-presidente da ONG Global Citizen, “o que é necessário é um verdadeiro imposto, e não apenas um mecanismo voluntário opaco”, cravou.

 

Fonte: BBC News Mundo/Olhar Digital/Um só Planeta

 

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